Redes Comunitárias
Contexto
A expansão das redes às áreas urbanas desatendidas, rurais ou remotas tem sido um princípio norteador da ampliação de acesso no país. Tanto o mercado como o governo apresentaram nos últimos anos iniciativas nesse sentido, como o aumento da presença das Prestadoras de Pequeno Porte (PPP) em pequenos municípios, a criação do Comitê das PPP (Resolução da Anatel nº 698/2018), o Regulamento sobre prestação do Serviço Telefônico Fixo Comutado (STFC) fora da Área de Tarifa Básica (Resolução da Anatel nº 622/2013), os Planos Gerais de Metas de Universalização (PGMU), o Plano Estrutural de Redes de Telecomunicações (PERT) e os Editais de Licitação nº 002/2007/SPV (“Edital 3G”), nº 004/2012/PVCP/SPV (“Edital 4G”) e nº 1/2021-SOR/SPR/CD-ANATEL (“Edital 5G”) .
O Decreto de Políticas Públicas de telecomunicações nº 9.612/2018 também se norteou nesse princípio ao estabelecer como um dos objetivos gerais do governo a ampliação do acesso à internet em banda larga em áreas onde a oferta seja inadequada, tais como áreas urbanas desatendidas, rurais ou remotas, além de direcionar os compromissos de expansão de banda larga fixados pela Anatel, para a expansão das redes de transporte de telecomunicações de alta capacidade (fixa e móvel) priorizado o atendimento de cidades, vilas, áreas urbanas isoladas, aglomerados rurais e rodovias federais que não disponham desse tipo de infraestrutura.
Uma das iniciativas que tem se multiplicado no mercado atual são as Redes Comunitárias. No âmbito da Consulta Pública n° 20/2018 sobre o Plano Estrutural de Redes de Telecomunicações (PERT), pessoas físicas, entidades civis e associações apresentaram contribuições em prol do fortalecimento do acesso comunitário e assimetrias para provedores comunitários.
Características das Redes Comunitárias
De acordo com o estudo “The Community Network Manual: How to Build the Internet Yourself”, essas redes são colaborativas, desenvolvidas em um modelo bottom-up por grupos ou indivíduos que concebem, desenvolvem e gerenciam a nova infraestrutura de rede de bem comum. Além disso, o estudo aponta que elas têm importantes características a favor de um desenvolvimento sustentável: organização social com objetivos compartilhados, equilíbrio cultural e educacional e definições de governança – com medidas regulatórias focadas em apoiar a interconexão ao backhaul e backbone de companhias já consolidadas no mercado – e custo e benefícios compartilhados entre as comunidades relacionadas. Como uma alternativa às opções de investimento tradicionais, estas iniciativas trazem a possibilidade de construir redes de acesso em regiões com baixos retornos financeiros, sejam ela wireless ou fibra ótica, particularmente em áreas rurais e isoladas.
Como as Redes Comunitárias são tratadas na regulamentação
Alguns países como Argentina e México regulamentaram as Redes Comunitárias. No Brasil, as redes comunitárias podem atuar seguindo as diretrizes da Resolução da Anatel nº 617/2013, que aprova o Regulamento do Serviço Limitado Privado (SLP), cujo art. 3º traz a seguinte definição:
Art. 3º O SLP é um serviço de telecomunicações, de interesse restrito, explorado em âmbito nacional e internacional, no regime privado, destinado ao uso do próprio executante ou prestado a determinados grupos de usuários, selecionados pela prestadora mediante critérios por ela estabelecidos, e que abrange múltiplas aplicações, dentre elas comunicação de dados, de sinais de vídeo e áudio, de voz e de texto, bem como captação e transmissão de Dados Científicos relacionados à Exploração da Terra por Satélite, Auxílio à Meteorologia, Meteorologia por Satélite, Operação Espacial e Pesquisa Espacial.
Em linhas gerais, a autorizada a prestar o Serviço Limitado Privado (SLP) pode ser tanto pessoa natural como jurídica. A autorização para exploração do SLP é expedida pela Anatel por prazo indeterminado a título oneroso, sendo que independe de autorização a exploração do SLP nos casos em que as redes de telecomunicações de suporte à exploração do serviço utilizarem exclusivamente meios confinados e/ou equipamentos de radiocomunicação de radiação restrita. Nas situações de dispensa de autorização, a interessada necessita realizar apenas um cadastro na página da Agência na internet, o qual deve ser mantido atualizado durante todo o período em que explorar o serviço, bem como obedecer a regulamentação da Anatel.
Na hipótese, porém, de a rede comunitária estar restrita aos limites de uma mesma edificação ou propriedade móvel ou imóvel, como um condomínio fechado, por exemplo, e essa rede utilizar exclusivamente meios confinados e/ou equipamentos de radiocomunicação de radiação restrita, até mesmo o cadastro é desnecessário, pois a atividade realizada independe de qualquer autorização ou dispensa de autorização, nos termos do artigo 75 da Lei nº 9.472/1997. Mais informações disponíveis na página de outorga do site da Anatel.
Seja qual for o caso – necessidade de autorização de SLP, dispensa de autorização ou hipótese em que a atividade independe de autorização –, há que se ressaltar que todos os equipamentos utilizados devem possuir homologação prévia da Anatel. A consulta acerca da certificação pode ser efetuada diretamente na página da Agência na internet.
Na exploração do SLP, incidirão os preços públicos pelo direito de exploração de serviço de telecomunicações (PPDESS) e, quando houver uso de radiofrequências, pelo direito de uso de radiofrequências (PPDUR). Não há qualquer preço quando do enquadramento em hipótese de dispensa de autorização.
Havendo o uso de radiofrequências para a exploração do SLP por meio do emprego de equipamentos não caracterizados como de radiação restrita, ou seja, sendo utilizadas as chamadas “faixas licenciadas”, deve-se obter prévia outorga de autorização da Anatel, cujas condições estão estabelecidas em regulamentação específica (Resolução nº 671/2016).
No âmbito da prestação de SLP, a Rede Comunitária pode se dar a partir: a) da construção da rede pela própria comunidade; ou b) pela contratação da rede de outra prestadora, sendo a rede comunitária uma usuária. O último modelo de negócio é particularmente propício às Prestadoras de Pequeno Porte (PPPs) presentes nas regiões mais remotas do país.
Estudo sobre Redes Comunitárias no Brasil
Em 10 de setembro de 2020, foi firmado o Memorando de Entendimento (Memorandum of Understanding - MoU) entre a Anatel e a Embaixada Britânica com o objetivo de ampliar o acesso digital no Brasil. Nesse sentido, o primeiro resultado desse acordo foi a produção de estudos relacionados ao incentivo às Redes Comunitárias no Brasil.
A operacionalização dos trabalhos do estudo sobre Redes Comunitárias se deu por parte da Association for Progressive Communication (APC) que, após pesquisas, entrevistas e diversas reuniões com o setor e com a equipe técnica da Anatel, realizou a entrega, em 14 de dezembro de 2021, dos seguintes produtos:
Policy Brief - Consiste numa análise aprofundada do cenário atual das Redes Comunitárias no Brasil, incluindo o mapeamento das redes existentes, a visão dos principais atores envolvidos por meio de pesquisa documental e consultas às partes interessadas, de forma a identificar os principais desafios para o desenvolvimento dessas redes, resultando em recomendações para a melhoria e expansão do desenvolvimento do acesso digital no país.
Sumário Executivo do Policy Brief - Resumo dos principais temas abordados no Policy Brief
- Sumário Executivo do Policy Brief - versão em português
- Sumário Executivo do Policy Brief - versão em inglês
Manual de Redes Comunitárias com principais recomendações para os interessados em implantar essas redes no país
Vídeos de divulgação sobre Redes Comunitárias
- Vídeo de divulgação sobre Redes Comunitárias - versão curta, áudio em português com tradução em libras.
- Vídeo de divulgação sobre Redes Comunitárias - versão curta, áudio em português com tradução em libras e legendas em português.
- Vídeo de divulgação sobre Redes Comunitárias - versão curta, áudio em português com audiodescrição.
- Vídeo de divulgação sobre Redes Comunitárias - versão curta, áudio em português com legendas em inglês.
- Vídeo de divulgação sobre Redes Comunitárias - versão longa, áudio em português com tradução em libras.
- Vídeo de divulgação sobre Redes Comunitárias - versão longa, áudio em português com tradução em libras e legendas em português.
- Vídeo de divulgação sobre Redes Comunitárias - versão longa, áudio em português com audiodescrição.
- Vídeo de divulgação sobre Redes Comunitárias - versão longa, áudio em português com legendas em inglês.
A partir dos produtos entregues, principalmente o Policy Brief, será possível à Anatel mapear possíveis necessidades de melhoria na regulação pela Anatel, a fim de promover as Redes Comunitárias no País.
Além disso, os demais produtos entregues, nomeadamente o Manual de Redes Comunitárias e os vídeos de divulgação constituem-se como ferramenta de grande utilidade para que possíveis interessados tenham acesso a informação objetiva e de qualidade para a expansão das redes comunitárias, contribuindo, diretamente, para o incremento do acesso digital entre as populações mais vulneráveis.
Grupo de Trabalho de Redes Comunitárias (GT-RCOM)
O Grupo de Trabalho de Redes Comunitárias (GT-RCOM) foi constituído pela Portaria Anatel nº 2597, de 29 de março de 2023 (SEI nº 10025504, no processo nº 53500.008719/2023-19).
A referida Portaria prevê, inicialmente, os objetivos do referido grupo de trabalho:
Art. 1º Constituir o Grupo de Trabalho “GT-Redes Comunitárias” com o objetivo de promover o diálogo entre a Agência e os representantes de Redes Comunitárias:
I - fomentando o debate sobre as possíveis formas de colaboração da Anatel, dentro do limite de suas atribuições, no sentido de fortalecer as Redes Comunitárias e seu importante papel nas políticas de expansão das redes de transporte de telecomunicações de alta capacidade (fixa e móvel) às áreas urbanas desatendidas, rurais ou remotas, onde a oferta de acesso à Internet em banda larga se mostra inadequada;
II - esclarecendo sobre a abrangência da atuação da Anatel em relação às Redes Comunitárias (diferenciando a camada de infraestrutura de conectividade daquelas de aplicativos, conteúdos, entre outros aspectos); e
III - trazendo insumos à Agência para o debate no âmbito do item 5 da Agenda Regulatória 2023-2024, sobre a reavaliação das regras aplicáveis às Redes Comunitárias.
A Portaria prevê também a composição do GT-RCOM:
Art. 2º O Grupo de Trabalho “GT-Redes Comunitárias” será composto pelos seguintes membros efetivos:
I - Representantes da Anatel e do Ministério das Comunicações:
a) Conselheiro da Anatel, Presidente e Coordenador do Grupo;
b) 2 (dois) representantes da Superintendência de Planejamento e Regulamentação (SPR);
c) 1 (um) representante da Superintendência de Outorga e Recursos à Prestação (SOR);
d) 1 (um) representante da Superintendência de Competição (SCP);
e) 1 (um) representante do Ministério das Comunicações (MCOM);
II - Representantes de Entidades de Classe de Prestadoras de Serviços de Telecomunicações e de Redes Comunitárias:
a) 1 (um) representante das Entidades de Classe das Prestadoras de Pequeno Porte (PPP);
b) 1 (um) representante das Entidades de Classe das Prestadoras de Serviço de Telecomunicações;
c) até 4 (quatro) representantes de Redes Comunitárias.
O GT-RCOM é presidido pelo Conselheiro Vicente Bandeira de Aquino Neto, conforme Portaria de Pessoal nº 417, de 6 de abril de 2023 (SEI nº 10070772).
A íntegra dos documentos e demais informações referentes ao GT-RCOM estão disponíveis na página da Anatel na internet, em: https://www.gov.br/anatel/pt-br/composicao/grupos-de-trabalho/gt-rcom.
Relatório Final do GT-RCOM
O Grupo de Trabalho sobre Redes Comunitárias (GT-RCOM) produziu seu Relatório Final, em atendimento à Portaria 2597 de 29/03/2023, do qual se destacam os seguintes capítulos:
Mapeamento das redes comunitárias existentes e do cenário de oferta de acesso à internet em suas regiões:
Este capítulo consiste em um compilados de dados da pesquisa realizada pelo Comitê Gestor da Internet (CGI) sobre redes comunitárias. A seguir, apresentam-se os resultados mais relevantes, considerando uma amostra feita em 40 redes comunitárias:
- 28 das redes comunitárias (70% da amostra) estão localizadas em municípios que apresentam Produto Interno Bruto (PIB) per capita abaixo do nacional.
- 21 das redes comunitárias (53% da amostra) estão nos municípios que concentram as 25% piores notas do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb).
- 82,5% das comunidades verificadas situam-se em territórios ocupados por comunidades tradicionais (comunidades quilombolas, aldeias indígenas, áreas ribeirinhas, dentre outros).
- Identifica-se maior concentração das redes comunitárias em áreas com baixa densidade de acesso à banda larga.
Mapeamento das informações a respeito do funcionamento das redes comunitárias e suas principais demandas:
A grande maioria das redes comunitárias tem sua infraestrutura baseada em equipamentos de radiação restrita. Eventualmente, utilizam também equipamentos para enlaces direcionais que utilizam frequências licenciadas e homologadas pela Anatel. Os atores envolvidos majoritariamente são pessoas de baixa renda em áreas vulneráveis e remotas, resultando em custos logísticos elevados para equipamentos, insumos e serviços.
A principal dificuldade relatada em relação ao link de internet contratado é o custo. A comunicação com a internet geralmente ocorre por meio de rede satelital ou link doméstico compartilhado, os quais geralmente apresentam capacidade de tráfego insuficiente, afetando a qualidade do serviço. Quando a fibra óptica não está disponível (maioria dos casos), é necessário incorrer em custos adicionais como a construção de torres, aquisição de equipamentos e insumos para enlaces de rádio, além dos custos eventuais para outorga pela Anatel de frequências licenciadas.
As redes comunitárias no Brasil vão além de somente ofertar internet ou intranet, pois também promovem a união comunitária ao redor de questões de suma importância, como direitos humanos, autonomia territorial, acesso a trabalho e renda, economia circular, segurança digital e bom uso das plataformas, entre outros aspectos. As redes consultadas são ou gostariam de ser espaços comunitários que oferecem serviços locais como bibliotecas online, cursos, plataforma de negócios locais entre outros serviços que contribuam para o desenvolvimento comunitário, compartilhando os conhecimentos técnicos e de gestão da rede.
Conclusões e recomendações
Da lista de conclusões e recomendações do Relatório, ressaltam-se as seguintes:
- Atualizar o Plano Estrutural de Redes de Telecomunicações (PERT) no sentido de identificação de projetos que viabilizem a construção e ampliação das redes comunitárias e, assim, possibilite o uso de recursos diversos de origem regulatória (por exemplo, obrigações de fazer, Termos de Ajustamento de Conduta – TAC, outorga e renovação de radiofrequências, entre outros).
- Avaliar a possibilidade de utilização de recursos de fundos governamentais (FUST, FNDCT, FND, FNDE, etc) para estimular as atividades desempenhadas pelas redes comunitárias.
- Realizar articulação interministerial para inclusão de redes comunitárias como parte das diretrizes da política de inclusão digital do Governo Federal de forma a estimular e apoiar estas iniciativas.
- Avaliar a realização de parcerias privadas para viabilizar modelos de redes comunitárias sustentáveis.
- Reavaliar os regulamentos da Anatel com o objetivo de tornar o ambiente regulatório mais simplificado e ampliar o acesso aos insumos.
- Avaliar a criação de políticas de formação continuada em diversas áreas: técnica, gestão financeira, liderança, entre outras, a fim de promover a apropriação tecnológica da conectividade pelas comunidades para o desenvolvimento de habilidades e letramento digital de forma sustentável.
- Elaborar cartilha com orientações às redes comunitárias tratando os aspectos regulatórios afetos a essas redes.
- Criar formulário de coleta de dados para identificação das redes comunitárias, de suas demandas para fins de pesquisa e estatística na elaboração de políticas voltadas para essas redes, bem como da demanda por novas redes comunitárias.
Consulte a seguir, a íntegra do Relatório Final e seus anexos: Relatório Final | Anexo I | Anexo II | Anexo III