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A ZFM de 2016 a 2036 em debate na SUFRAMA
Drones, o exemplo do lutador José Aldo, incentivos extrafiscais e a necessidade de se criar um polo de bioindústrias foram alguns aspectos mencionados no painel de debate “Zona Franca de Manaus: 2016-2036 – das perspectivas à concretude de ações”. O evento, que fez parte da programação alusiva ao 49º aniversário da SUFRAMA, ocorreu nesta terça-feira (23), no auditório da autarquia, e reuniu especialistas, pesquisadores e representantes do governo e dos setores da indústria e da agropecuária.
A superintendente Rebecca Garcia abriu o evento explicando a razão do painel se concentrar nos próximos 20 anos do modelo Zona Franca de Manaus (ZFM). “A indústria não faz nada sem se programar para um cenário de, no mínimo, 20 anos. Assim, a SUFRAMA também não pode pensar em planejamento com um horizonte de tempo menor. Temos que encontrar respostas e soluções para deixar o modelo mais fortalecido até 2036”, explicou.
O painel foi dividido em duas temáticas de discussão: a indústria e a agropecuária. Na primeira, foi tratado o “Plano Diretor Industrial 2016 -2036 e os cenários factíveis para a Indústria no Amazonas”, com coordenação do economista Mauro Thury.
O primeiro palestrante foi o diretor da Coordenadoria de Política Econômica e Desenvolvimento Industrial da Federação das Indústrias do Estado do Amazonas (Fieam), Raimundo Lopes. Lopes destacou os principais gargalos do modelo, como a infraestrutura (falta de um porto público, por exemplo); a logística (nossos rios precisam, de fato, se tornarem hidrovias) e o excesso de burocracia. “Cada órgão que concede incentivos, como a Sudam e a SUFRAMA, tem um processo diferente e específico na elaboração e acompanhamento de um projeto industrial. Por que não padronizar, unificar? Isso facilitaria a vida do investidor”, frisou. O palestrante também frisou a importância do Polo Industrial de Manaus (PIM) estar constantemente inserido no processo de renovação tecnológica. “As feiras de tendências mostram que a febre do momento é o drone. Ou seja, o PIM deveria estar produzindo drones”, observou.
Renúncia e José Aldo
Na palestra seguinte, o presidente do Centro das Indústrias do Estado do Amazonas (Cieam), Wilson Périco, procurou rebater as principais críticas feitas ao modelo, como a de que a ZFM seria um paraíso fiscal e que os incentivos tributários concedidos não dariam o devido retorno ao País. “Dados da Receita Federal apontam que, dos 27 entes federativos (26 Estados mais o Distrito Federal), somente oito devolvem para a União, em arrecadação de tributos federais, valores acima do repasse compulsório que recebem. O Amazonas devolve 2,5 vezes esse valor; a atividade industrial da cidade de Manaus recolhe mais de 50% dos tributos federais da Região Norte, o que lhe confere o papel de um dos principais pontos da geração de receitas públicas no País”, pontuou.
Périco ressaltou ainda que a maior parte dos incentivos fiscais concedidos no Brasil vão para as regiões mais ricas. “O Norte, incluindo o Tocantins, em 2014, utilizou 12% da renúncia fiscal do País, enquanto a Região Sudeste abocanhou 53% do total da renúncia fiscal da federação. De um total de R$ 1 trilhão investido pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), de 2009 a 2014, o Amazonas recebeu apenas R$ 7 bilhões de financiamento para desenvolvimento regional, enquanto o Estado de São Paulo, mais rico, usufruiu de R$ 245 bilhões. Mais do que o Norte e o Nordeste juntos”, disse. Ao citar a Universidade do Estado do Amazonas (UEA) como exemplo de contrapartida social do PIM, ressaltando que a instituição é integralmente financiada pela indústria local, Périco destacou alguns custos. “Cada aluno da UEA custa R$ 15 mil por ano. Cada aluno diplomado custa R$ 122 mil por ano”, frisou.
O empresário salientou ainda que o lutador amazonense José Aldo deve inspirar o PIM na superação da atual crise econômica. “O José Aldo fez um grande esforço para ser campeão. Perdeu uma luta. Mas, isso invalida toda a sua história? Ele não sabe quando vai voltar a disputar o título, mas ele não está só esperando. Ele está treinando. Assim, a gente também não pode ficar apenas aguardando a crise passar. A gente tem que lutar para resgatar o nosso cinturão”, discursou.
Cenários
Em seguida, o conselheiro consultivo do Conselho Regional de Economia do Estado do Amazonas (Corecon-Am), José Laredo, enfatizou que, para atrair mais investimentos, a ZFM deveria “sair do armário” quanto aos incentivos fiscais e ser mais agressivo na divulgação das vantagens tributárias competitivas. “Países que facilitam a aplicação de capitais estrangeiros enriqueceram consideravelmente. Temos que avançar na criação de facilidades fiscais e financeiras e aliar isso ao fator preservação da Amazônia”, explicou. O economista fez algumas sugestões para estimular novos investimentos, como incentivos extrafiscais. “Uma indústria que trouxesse um componentista, por exemplo, teria direito a um prazo maior para fazer a compensação do ICMS, de 15 dias para 120 dias. Isso não traria nenhum prejuízo para o Estado, que não receberia nenhum centavo a menos e ainda aumentaria o capital de giro da indústria. Todos ganhariam”, detalhou.
Na condição de convidado especial da sociedade civil, o economista José Alberto da Costa Machado ratificou as contribuições trazidas por Cieam e Fieam e posicionou-se preocupado com a ausência da construção de cenários socioeconômicos, como premissa básica para alcançar novos mercados. Ele também abordou a relevância de centros de estudos sobre o futuro, relembrando o caso da borracha quando a região sofreu uma grave crise por não estar preparada para a mudança de cenário. “Faz alguns anos que a ZFM sofre por conta da concorrência asiática, que produzia em escala maciça. Agora, entretanto, eles mudaram a estratégia. A China está adquirindo complexos industriais na África e na América Latina. Comprou o porto de Manta no Equador. E a ZFM como fica? Devemos nos defender ou aproveitarmos isso? Não podemos ficar à parte, sem percebemos as vantagens e as consequências dessas movimentações”, esmiuçou.
Para o especialista, o modelo precisa encontrar nova função na lógica produtiva nacional. “Antes, foi a substituição da importação. Depois, evitar o desmatamento. E o próximo papel, qual será?”, disse, ressaltando que a transformação da SUFRAMA numa agência executiva traz grandes oportunidades, mas também riscos, e que a autarquia precisa recuperar seu papel de interlocução junto ao governo federal.
O secretário de Estado de Planejamento, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação (Seplan-cti), Thomaz Nogueira, salientou ações do governo do Estado voltada para dois vetores: o fortalecimento e a expansão do PIM e a diversificação da Economia do Amazonas. Investimentos na piscicultura, inclusive, dando à atividade um caráter exportador, e o projeto “Porta Única” foram destacados pelo secretário. “Com o Porta Única, queremos desburocratizar o processo de abertura de empresas, por exemplo, juntando todos os processos pedidos pela Seplancti, Sefaz, Arsam”, explicou.
A respeito das críticas ao modelo, Nogueira destacou que a melhor estratégia é a propagação da informação. “Gosto de dar como o exemplo o caso do ar condicionado. Em 2012, o produto estava com sua produção quase zerada devido à facilidade de importação. Ou seja, a venda de ar-condicionado feita naquela época não estava gerando quase nada de emprego e renda no Brasil. Foi necessária a intervenção tarifária. Ano passado, a produção foi maior que três milhões de unidades. Não se pode dizer que isso foi renúncia fiscal”, explicou Nogueira.
Agropecuária
A segunda temática do painel abordou a “Governança e desenvolvimento estratégico da Agricultura e Pecuária no Amazonas” e foi coordenada pelo administrador e economista Evandro Brandão Barbosa.
A importância da criação de um polo de bioindústrias foi ressaltada na palestra do vice-diretor do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), Luiz Antonio Oliveira, como estratégia de fortalecimento do modelo ZFM.
O pesquisador destacou que a falta de oferta contínua de matéria-prima é o principal obstáculo para a concretização do projeto. “Hoje, há problemas como falta de guaraná para concentrados e extratos; falta de seringueira para as fábricas de pneus e de cupuaçu, o que inibe o surgimento de fabricantes, por exemplo, de manteiga de cupuaçu”, disse.
Para o pesquisador, é preciso criar uma política de Estado em que sejam priorizadas apenas 100 espécies da biodiversidade amazônica com maior potencial de geração de bioprodutos. A concentração, explica, evitaria a pulverização de pesquisas e traria avanços no desenvolvimento e criação de produtos. “Da laranjinha pode-se criar produtos que eliminem a cárie, do patauá dá para produzir álcool”, exemplificou.
Também palestraram no evento representantes da Federação da Agricultura e Pecuária do Amazonas (Faea), da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e do Núcleo de Socioeconomia da Faculdade de Ciências Agrarias da Universidade Federal do Amazonas (Ufam).