Nota Pública nº 02/2024 - CIAMP-Rua manifesta preocupação sobre incêndio em Pousada de Porto Alegre/RS que abrigava Pessoas em Situação de Vulnerabilidade

O Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento da Política Nacional para População em Situação de Rua Nacional 2023-2025 (CIAMP-Rua), no exercício de suas atribuições estabelecidas no Decreto nº 11.472 de 06 de abril de 2023, de acompanhar os estados, o Distrito Federal e os Municípios, vem apresentar os seguintes fatos e solicitar algumas previdências.

Considerando que a República Federativa do Brasil tem como fundamentos a cidadania e a dignidade da pessoa humana (artigo 1º, II e III, CF/88), possui como objetivos fundamentais a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, a erradicação da pobreza e da marginalização, a redução das desigualdades sociais e regionais, a promoção do bem de todos sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (artigo 3º, I, III, IV, CF/88).

Considerando o Decreto Federal nº 7.053, de 23 de dezembro de 2009, que instituiu a política nacional para a população em situação de rua, a Resolução nº 40, de 13 de outubro de 2020, do Conselho Nacional dos Direitos Humanos que dispõe sobre as diretrizes para promoção, proteção e defesa dos direitos humanos das pessoas em situação de rua, a Resolução nº 425, de 08 de outubro de 2021, que institui no âmbito do Poder Judiciário, a Política Nacional Judicial de Atenção a Pessoas em Situação de Rua e suas interseccionalidades.

Diante da tragédia ocorrida na madrugada desta sexta-feira, 26 de abril de 2024, com incêndio na Pousada Garoa, da Avenida Farrapos, em Porto Alegre, que resultou em 10 (dez) mortos e mais de uma dezena de feridos, o CIAMP-RUA ao lado dos movimentos sociais que assistem a essa população, manifesta sua solidariedade aos feridos, profunda tristeza pelos falecidos e indignação pelas precárias condições dos locais que abrigam a população em situação de rua de Porto Alegre.

Conforme os registros oficiais, esta é a maior tragédia de Porto Alegre desde o incêndio do Prédio das Lojas Renner em 1976, que vitimou 41 (quarenta e uma) pessoas e deixou dezenas de feridos. Conforme as informações oficiais, o local servia de hospedagem temporária contratado pela gestão municipal ao custo mensal de R$ 540,00 (quinhentos e quarenta reais) por pessoa beneficiada. Somente no ano de 2023, conforme o Portal da Transparência da Prefeitura de Porto Alegre a empresa contratada responsável pelo prédio onde ocorreu o sinistro recebeu R$ 2,7 (dois milhões e setecentos mil reais) pelo contrato de prestação de serviço. A informação dos usuários da conta de que eram locais sem condições de habitabilidade, sem ventilação, com fiação elétrica exposta e insalubres. A ocorrência confirma uma tragédia já anunciada pelas precárias condições do local.

É importante salientar que o Corpo de Bombeiros afirmou que a Pousada Garoa funcionava em caráter irregular, sem a existência de um Plano de Prevenção e Proteção Contra Incêndios (PPCI). Essa informação denota que não houve fiscalização de quem deveria manter a vigilância sobre as condições de acolhimento. Houve desproteção de quem deveria proteger. Diante do exposto, o CIAMP-RUA, juntamente com os movimentos sociais, que atendem a essa população, reivindicam junto aos órgãos de fiscalização e controle a investigação isenta e total do fato ocorrido e da situação que originou o incêndio. Ao mesmo tempo, a certificação das condições previstas no contrato de prestação de serviço e as responsabilidades pelo cumprimento das condições estabelecidas no contrato. Também, reivindica que a perícia do local seja conduzida de forma técnica e imparcial, a fim de apontar as verdadeiras causas da ocorrência. Por fim, é necessário que sejam exemplarmente responsabilizados, conforme as previsões legais, aqueles que foram negligentes e omissos diante de tamanha tragédia que ceifou o maior bem da humanidade que são as vidas humanas.

Considerando a urgência e a gravidade dos fatos narrados, vimos solicitar ao Governo do Estado do Rio Grande do Sul a criação de instrumentos que fortaleçam as políticas públicas no Estado para que municípios possam ser assessorados, orientados a atuarem na defesa dos direitos da população em situação de rua, em especial na política de moradia digna, em vez de serviços superfaturados, precários e que colocam em risco a saúde e a vida das pessoas em situação de rua. Na oportunidade, que também seja instado o Ministério Público e Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul para apuração e acompanhamento dos fatos narrados e responsabilização dos agentes violadores dos direitos fundamentais das pessoas em situação de rua.

Colhe-se, por fim, o ensejo para reafirmar o interesse deste comitê em cooperar interinstitucionalmente para promoção dos direitos humanos, reiteramos nosso apoio às famílias em situação de vulnerabilidade, e colocamo-nos à disposição para diálogo com vistas a garantia da proteção social às pessoas em situação de rua.

Brasília, 29 de abril de 2024

COMITÊ INTERSETORIAL DE ACOMPANHAMENTO E MONITORAMENTO DA POLÍTICA NACIONAL PARA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA