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TURISMO RELIGIOSO
Círio de Nazaré: a fé do Norte que emociona e atrai romeiros e turistas
Procissão do Círio de Nazaré. Crédito: Paula Rosa/Ascom MTur
“O Círio de Nazaré não se explica, se vive!” A afirmação cheia de saudades de uma amiga paraense que há anos mora fora do seu estado, não fazia muito sentido, até desembarcarmos em Belém (PA) na segunda semana do mês de outubro. Havia algo diferente. Uma cidade mais colorida, com hinos de louvores ecoando das casas e que deixavam todos com lágrimas nos olhos, tomados por uma emoção arrebatadora.
Não era só religião ou fé ou devoção. Não era só reunião do povo nortista ou manifestação cultural ou tradição que resiste ao tempo e se perpetua por gerações, idades e classes sociais. Havia uma emoção genuína, uma gratidão honrosa, um amor que transbordava de forma única e especial. E que transcende barreiras, atraindo visitantes de todo o país que, nesses dias, se transformaram em um só povo, rendendo homenagens à Virgem Peregrina Nossa Senhora de Nazaré, a Rainha da Amazônia.
Em 2022, o Círio de Nazaré contou com um sentimento a mais: a saudade. As tradicionais romarias, quando a Santa Peregrina deixa os templos religiosos e percorre toda a cidade, foram suspensas na pandemia e retornaram oficialmente neste ano. Foi o Círio do reencontro e de intensas homenagens.
Os devotos acompanharam a Imagem de Nossa Senhora de Nazaré pelas ruas, dirigindo carros; pelas águas, com suas embarcações no Círio Fluvial; pilotando motos, na Moto romaria; de pés descalços, na Transladação da Basílica até à Catedral; de joelhos, no retorno da Santa à Basílica, na Grande Procissão do domingo.
A paraense Sílvia Conceição, que mora há mais de 30 anos em São Paulo e vem todos os anos viver o Círio, conta que este ano foi ainda mais especial. “É um sentimento maior. Imagina, dois anos sem a gente ter essa festa. A gente tem a oportunidade de estar aqui de novo. É uma benção. Passamos por uma fase bem pesada e estamos hoje, aqui, para agradecer”, conta emocionada.
A procissão do domingo, considerada a maior das romarias, reuniu mais de 3 milhões de pessoas. Centenas de romeiros acompanharam o cortejo do Círio segurando a corda grossa que cerca a berlinda, um andor fechado com uma caixa de vidro onde vai a imagem de Nossa Senhora de Nazaré.
Também no percurso, de cerca de 4 km, era possível ver pessoas pagando promessas de joelhos no asfalto, sendo ajudadas por amigos e parentes que estendiam papelão para não causar muitas lesões; carregando objetos ou réplicas de parte do corpo para agradecer graças alcançadas ou pedindo para alcançar sonhos; pais e filhos descalços, caminhando juntos; crianças vestidas como anjos, enquanto os pais levavam grandes velas.
Carregando uma cruz de 45kg desde a sua casa, que fica à 15km da Catedral da Sé, o romeiro Ribamar Silva agradecia pela saúde da filha e da neta. “Quase que a gente perde a nossa filha e a nossa neta. Foi um parto muito complicado e pedimos muito pela saúde das duas. Hoje, estão aí, lindas, saudáveis. Tenho dois anos de promessa com Nossa Senhora de Nazaré”, contou enquanto descansava sentado em um papelão.
TURISMO RELIGIOSO – Além dos romeiros que estão na cidade pagando promessas, o Círio de Nazaré reuniu mais de 50 mil turistas, que buscam ver, de perto, a demonstração de fé. O fotógrafo paulista Guilherme Sakurai conta que quis ir a Belém para entender mais sobre o Círio. “É uma coisa que transcende a religião, isso eu acho fantástico. Todo o apoio que o pessoal dá para os romeiros, eu acho isso lindo, fantástico, é realmente muito emocionante”, afirmou.
A estimativa da Secretaria Estadual de Turismo (Setur) e do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese/PA), é que o evento tem a capacidade de movimentar em torno de R$ 98,3 milhões, estimulando a economia local e a geração de empregos por meio do turismo.
A comerciante Maria de Lourdes Ferreira, que trabalha há 40 anos vendendo artigos religiosos em frente à Basílica Nossa Senhora de Nazaré, agradece o retorno do Círio. “Foi muito triste esse período, perdi meu pai de Covid-19, mas a gente tem que continuar! Nós pensávamos que não ia ter, mas estamos vendo aumentar muito a quantidade de pessoas. É muito emocionante, é uma coisa que a gente pede a Deus que chegue. Tudo que eu tenho, conquistei daqui”, afirma.
RECONHECIMENTO INTERNACIONAL – A história do Círio de Nazaré começou em 1700, quando o caboclo Plácido José de Souza achou a imagem de Nossa Senhora de Nazaré às margens de um riacho localizado perto de onde se ergue a Basílica Santuário Nossa Senhora de Nazaré.
Em 1793, com o crescimento da devoção, ocorreu a primeira procissão dedicada à padroeira dos paraenses. O Círio é considerada a maior concentração católica no mundo e há 18 anos é reconhecido como bem imaterial do Patrimônio Cultural do Brasil pela Unesco.
Para o paraense, o Círio de Nazaré é como se fosse o Natal. Após a procissão do domingo há sempre comidas típicas, como pato no tucupi; maniçoba; moquecas de peixe e camarão e muita confraternização familiar. Nas ruas, todos desejam um “Feliz Círio”! Apesar de vivenciar quatro dias intensos dessa festa de fé e gratidão, ainda não consigo explicar o que é tudo isso e agora entendo o que aquela amiga querida paraense fala: “o Círio de Nazaré não se explica, se vive!”
Por Paula Rosa, enviada especial