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Morre um dos pioneiros da soja em Mato Grosso
Pesquisadores, produtores rurais e a cadeia do agronegócio divergem em várias questões, mas são unânimes sobre a fazenda Progresso, em Sorriso, que para eles foi o maior centro de pesquisa agronômica privado sobre a soja no Brasil, numa época em que a lavoura daquela leguminosa ensaiava seus primeiros cultivos no Centro-Oeste. Afinal, quem estava por trás daquela propriedade rural e os trabalhos nela desenvolvidos? A resposta é conhecida pelo agro e, pra quem não sabe, era Munefumi Matsubara, o seo Muni, considerado Pai da Soja abaixo do Paralelo 13. Empresário de visão, que enxergava além do seu tempo, Matsubara escreveu uma importante página da economia mato-grossense. Aos 81 anos, lutando contra um câncer, fechou os olhos para sempre no sábado, 7, num hospital em Sinop, onde residia. Seu corpo foi inicialmente velado naquela cidade e depois em Maringá (PR), onde baixou sepultura.
O desenvolvimento agrícola de Mato Grosso – base econômica estadual -não foi obra do acaso. Além de fatores climáticos, localização e topografia, contou com a ousadia de loucos no melhor sentido da palavra, a exemplo de Matsubara, que era dono da fazenda Progresso, de 10 mil hectares no município de Sorriso, mas ao lado de Lucas do Rio Verde.
A soja era completamente estranha em Mato Grosso, até que em 1973 o produtor rural Adão Riograndino Mariano Salles cultivou sua primeira lavoura na fazenda São Carlos, em Rondonópolis. Daquele município a lavoura da chinesinha Glycine max espalhou-se por Jaciara, Campo Verde, Primavera do Leste, Poxoréu, Guiratinga, Itiquira, Alto Garças, Alto Araguaia e Alto Taquari. A produção era pequena, a produtividade baixa e os tratos culturais tinham um quê da agricultura de toco.
À época, Matsubara trocou o Paraná pelo Nortão, sonhando em cultivar soja. Foi sua segunda migração: primeiro deixou sua paulista Vera Cruz pelo solo vermelho paranaense. O problema – não para ele, que não acredita em problema – para muitos era geográfico: acreditava-se que a leguminosa não produziria no cerrado e na mata de transição abaixo do Paralelo 13, a região da fazenda Progresso.
Até 1978 ambos os biomas deixavam com o pé atrás os produtores de soja interessados na região, pois até então não havia nenhum indicativo de que a leguminosa se adaptaria bem naquela área.
Destemido, Matusbara transformou sua fazenda num descomunal canteiro experimental em busca de cultivares que se adaptassem à região. Para tanto buscou os mais renomados pesquisadores: o professor Hortêncio Paro e José Yorinori Tadashi foram alguns desses nomes. Sua pesquisa ganhou projeção nacional e a revista Veja lhe deu a capa de uma edição.
Matsubara desenvolveu pesquisas que lhe deram uma facada de US$ 1 milhão entre 1972 e a safra 77/78, quando cultivou a leguminosa em campos experimentais e em lavouras sendo a maior de 3.600 ha com a cultivar UFV-1 da qual colheu 15 sacas/ha. Ano após ano, cruzamento após cruzamento, o trabalho se desenvolvia e o sonhador Matsubara botava a mão na massa – e no bolso – amansando o solo para a chegada da soja, que hoje é o carro-chefe da economia mato-grossense.
O dinheiro que saiu do bolso de Matsubara não foi pouco: US$ 1 milhão e resultou na pesquisa que abriu a porteira para a soja no eixo de influência da rodovia BR-163 no Nortão.
Matsubara pertencia ao grupo das figuras que mais contribuíram com a cadeia agropecuária e agroindustrial mato-grossense, com cada um atuando em sua área, mas com o trabalho de todos se completando. Matsubara, Dario Hiromoto, Hortêncio Paro, Alzira Catunda, Ênio Arruda, André Maggi, Zeca D’Ávila, Antônio Luiz de Castro, João Petroni, Ângelo Maronezzi, Jonas Pinheiro, Clóves Vettorato, Olacyr de Moraes, Antonimar Marinho, Gilberto Goellner, João Osmar de Oliveira, Zelito Dorileo, Luiz Carlos Ticianel e outros. Alguns deles não mais entre nós.
Discreto, Matsubara não se preocupava em alardear seu feito e até desconversava sobre ele. Sua obra fala mais alto sobre a soja do que todas as vozes. Reconhecendo seu feito o então deputado Humberto Bosaipo propôs e por unanimidade a Assembleia Legislativa lhe concedeu o Título de Cidadão Mato-grossense. Em Sinop, a prefeita Rosana Martinelli decretou luto de três dias por sua morte. Nos campos abaixo do Paralelo 13, por onde se olha, a ousadia de Matsubara está presente e responde pelo nome de soja.