Aprendendo a Exportar
RUMOS DO APOGEU DO IMPÉRIO, DESENVOLVIMENTO ESTIMULADO PELO CAFÉ (1851 a 1860)
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RUMOS DO APOGEU DO IMPÉRIO, DESENVOLVIMENTO ESTIMULADO PELO CAFÉ (1851 a 1860) O mundo ocidental conhece, de 1851 a 1857, um espetacular crescimento da produção e expansão do comércio internacional. O ano de 1857 registra, entrementes, uma depressão econômica que é superada na década seguinte. No Brasil, associa-se à estabilidade financeira, momento de paz e desenvolvimento. O período é marcado pelo fim do tráfico negreiro internacional, pela melhora das finanças públicas, pela maior estabilidade política, pelas iniciativas empreendedoras de Mauá e pelo desenvolvimento de indústrias e manufaturas. É o período que deslancha a modernização da chamada Era Mauá. A primeira locomotiva brasileira, a Baronesa, desliza em 1854 nos trilhos da via férrea entre Porto Estrada e o sopé da serra em Petrópolis, perfazendo 18 km. Em 1860, a Tarifa Silva Ferraz substitui a Tarifa Alves Branco e, em decorrência das pressões inglesas, reduz as alíquotas de importação para máquinas, ferramentas e ferragens. Foi introduzida, também, uma política deflacionária com subtração dos créditos – o que estilhaça as iniciativas modernizadoras da Era Mauá. O Brasil conseguiu diversificar um pouco o destino de suas exportações, mas as importações continuam concentradas na Grã-Bretanha. O governo procura administrar a política alfandegária e não ocasionar reduções significativas na arrecadação, assim, as tarifas em geral são mantidas em patamares elevados. O primeiro saldo positivo da balança comercial desde a independência é obtido em 1860, graças ao café, que no período compreendido entre 1851 e 1860 corresponde a 48,8% das exportações do País, seguido pelo açúcar com 21,2%, algodão com 6,2%, fumo com 2,6% e cacau com 1%. Esses produtos, no total, perfazem 80,8% da pauta de exportação brasileira. Os anos 50 são marcados pelo fim do tráfico negreiro. Em 1849 entraram no Brasil cerca de 54.000 escravos, em 1850 este número cai para 23.000, em 1851 para cerca de 3.000 e, em 1853, para cerca de 700. Em 1854 a Lei Nabuco de Araújo ratifica a proibição do tráfico negreiro e estabelece maior rigor na fiscalização do trafico de escravos para o Brasil. Depois disso, cessa completamente o tráfico, exceto por dois pequenos desembarques clandestinos realizados em Pernambuco e no Espírito Santo, que foram surpreendidos e os responsáveis punidos. Nos primeiros anos da década de cinqüenta, o governo dá continuidade aos esforços para consolidar uma situação favorável aos interesses brasileiros na região do Prata. Em Montevidéu, estabeleceu-se entre o Brasil, o Uruguai e as províncias argentinas de Entre Rios e Corrientes uma aliança contra Rosas (29/5/1851). Fica pactuada, também, a livre navegação pelo rio Paraná e seus afluentes. Em setembro de 1851 termina o cerco a Montevidéu e Manuel Oribe é derrotado por tropas uruguaias coloradas e argentinas de Urquiza, apoiadas pelo Brasil. O ministro uruguaio, no Rio de Janeiro, negocia com o Brasil cinco tratados, relativos à aliança, limites, comércio e navegação, troca de criminosos, desertores e escravos fugidos. Além disso, o Brasil empresta ao Uruguai 138 mil patacões e, também, fica acertado que poderá prestar ajuda militar ao Uruguai, se requisitada. Torna-se cada vez mais fácil e rápida a troca de correspondências e as viagens para a Europa. Em 9 de janeiro de 1851 é inaugurado o serviço postal a vapor entre o Brasil e a Inglaterra, na primeira linha de vapores entre a América do Sul e a Europa. Em Londres, a Primeira Exposição Universal é inaugurada em 01 de maio de 1851 no Crystal Palace. Participam 13.937 expositores e cerca de seis milhões de visitantes. O Brasil não participa desta exposição e, também, não participará em 1853 da Exposição Internacional de Nova York, nem da Exposição Universal, que será realizada em Paris em 1855 e que se destaca devido ao lançamento de um sistema legal uniforme para a classificação de moedas e dos pesos e medidas. A década de 50 associa-se à estabilidade financeira, paz e desenvolvimento no país. O fim do tráfico de escravos, do conflito contra Rosas, a melhora das finanças públicas, a maior estabilidade política, as iniciativas empreendedoras de Mauá. O desenvolvimento de indústrias e manufaturas, a expansão da lavoura cafeeira e a utilização de inovações tecnológicas fazem com que o Brasil viva, nestes anos, um período de desenvolvimento e otimismo, no qual fundaram-se 62 empresas industriais, 14 bancos, 3 caixas econômicas, 20 companhias de navegação a vapor, 23 de seguros, 4 de colonização, 8 de mineração, 3 de transporte urbano, 2 de gás e 8 estradas de ferro. Nesta época, no Rio de Janeiro, sempre existem novidades que não são encontradas no restante do país. Bailes, festas, reuniões e concertos tornam-se moda. A Rua do Ouvidor no Rio de Janeiro concentra as lojas da moda e os sonhos de consumo das damas da corte. Quem gosta de ler pode adquirir bons livros nas livrarias Garnier e Irmãos Laemmert. O calor pode ser amenizado por um saboroso sorvete em forma de pirâmide, que custa em torno de 300 Réis. Por um bom almoço se paga o equivalente a mil e quinhentos Réis e, também, existem vários cafés onde se pode colocar a conversa em dia e tomar um cafezinho por sessenta Réis ou um copo de refresco por duzentos Réis. Os fazendeiros de café, que enriquecem com as lavouras e com a exportação do produto, passam a fazer belas casas nas fazendas e, também, nas cidades. Mas, mesmo assim, no interior a situação muda com velocidade bem menor, a maior parte do país continua erma e de difícil acesso. A corte está cercada pelo ambiente rural, totalmente dependente da mão de obra escrava. Em 1951, segundo o Almanak Laemmert , a corte reúne uma população de 266 mil habitantes, dentre os quais 110 mil escravos, a maior concentração urbana de escravos, desde o fim do império romano. Em 02 de março de 1851 é fundado o Banco de Comércio e Indústria do Brasil, que depois passou a denominar-se Banco do Brasil, com capital de dez mil contos de réis, consistindo na maior sociedade por Ações da América do Sul. Em 26 de junho de 1852 é emitido Decreto incentivando a organização de capitais para criação de estradas de ferro. Neste mesmo ano, Irineu Evangelista de Souza obtém do Governo da Província do Rio de Janeiro a concessão para construir a primeira ferrovia do país e introduz a navegação a vapor na Amazônia por intermédio da Companhia de Navegação e Comércio do Amazonas. A considerada última revolta política do segundo reinado chega ao fim com a anistia concedida aos condenados da revolta praieira e, na região do Prata, Rosas é derrotado por Urquiza, apoiado por tropas brasileiras. Fato estranho acontece nos Estados Unidos, um tenente da marinha norte-americana inicia campanha para convencer a opinião pública e enviar negros norte-americanos para colonizar o Amazonas e constituir uma república Amazônica. As inovações tecnológicas passam a ser utilizadas no Brasil pouco tempo após sua invenção. A primeira linha de telégrafos é inaugurada no Rio de Janeiro, conectando a Quinta da Bôa Vista ao Quartel do Campo. Em 1853, o Rio de Janeiro começa a receber calçamentos com paralelepípedos e, no ano seguinte, recebe iluminação a gás. Neste ano, Mauá concede empréstimo de oitenta e quatro mil pesos ao Uruguai. Em Niterói, o estaleiro e a fundição de Mauá produzem navios, peças para pontes, canos, armas e outros artigos correlacionados. Ali trabalham mais de mil pessoas sob direção de engenheiros ingleses. Em 1853, as exportações para os Estados Unidos atingem um total de 2.649.817 libras esterlinas, correspondentes a 32,4% das exportações brasileiras. Entretanto, se as coisas caminham bem no comércio exterior entre os dois países, no campo diplomático ocorre o prenúncio de dificuldades. Os Estados Unidos desejam abrir o Rio Amazonas às embarcações americanas e enviam representante ao Brasil com instruções para obter um tratado de comércio e navegação incluindo a abertura do Rio Amazonas, o que não é concedido pelo governo brasileiro, que admite esta possibilidade apenas para os países ribeirinhos. No plano interno o cenário político continua polarizado entre liberais e conservadores e, para amenizar as divergências existentes, em 1853 o Marquês do Paraná, Honório Hermeto Carneiro Leão constitui o denominado Ministério da Conciliação, que integra políticos das duas correntes. Na região do Prata, ainda existe fogo sob as cinzas e o Brasil, em 3 de maio de 1854, precisa interferir no Uruguai para garantir o cumprimento dos tratados de 1951 e apoiar o colorado Venâncio Flôres. No Paraguai, Carlos Antônio Lopez proíbe a passagem de navios estrangeiros pelo Rio Paraguai e expulsa o encarregado de negócios brasileiros. Em represália a estas medidas paraguaias, que na prática impedem o acesso à província de Mato Grosso, o Brasil envia uma força naval para o Paraguai. Esta medida força o governo de Carlos Lopés a negociações e resulta em um tratado bilateral relativo a direitos de navegação. A substituição da mão-de-obra escrava é um assunto preocupante e difícil para o governo, produtores rurais e políticos brasileiros. O fim do tráfico e a crescente expansão da lavoura cafeeira, muito dependente de mão-de-obra, fazem com que se busquem alternativas. Uma das soluções é o tráfico interno de escravos, por intermédio do qual se transfere mão-de-obra dos outros estados para as regiões cafeeiras. Em 1855 é fundada no Rio de Janeiro a Companhia Central de Colonização, que será responsável pela vinda de cerca de vinte mil imigrantes para o Brasil. Em 14 de junho de 1855 José Maria da Silva Paranhos assume pela primeira vez o Ministério dos Negócios Estrangeiros. No que se refere à Amazônia, os Estados Unidos continuam incomodando. Em 24 de julho de 1855, o governo daquele país informa ao governo brasileiro, por intermédio de nota, a determinação dos Estados Unidos em obter o “livre uso do Amazonas para fins comerciais”. A Grã-Bretanha continua sendo o principal destino das exportações brasileiras. Em 1855, do valor total exportado pelo Brasil, 32,9% destinam-se à Grã-Bretanha. Para os Estados Unidos seguem 28,1%, para França 7,8%, Alemanha, representada pelas cidades Hanseáticas, 6,0%, Portugal 5,9%, Bélgica 1,8%, Espanha 0,9%, Países Escandinavos 3,7%, Estados Austríacos 1,6%, Itália 1,4% e outros países 9,9%. Se o Brasil conseguiu diversificar um pouco o destino de suas exportações, as importações continuam concentradas na Grã-Bretanha. Em 1855, em termos de percentual sobre o valor total importado pelo Brasil, da Grã-Bretanha provêm 54,8%, dos Estados Unidos 7,0%, da França 12,7%, da Alemanha, representada pelas cidades Hanseáticas, 5,9%, de Portugal 6,3%, da Bélgica 2,0%, da Espanha 1,1%, dos Países Escandinavos 0,7%, dos Estados Austríacos 0,4%, da Itália 0,7% e de outros países 8,8%. No Prata, o Brasil continua seus esforços para criar uma situação favorável ao país e, em 07 de março de 1856, estabelece uma Tratado de Amizade, Comércio e Navegação entre o Brasil e a Argentina e, em 06 de abril, um Tratado de Amizade, Comércio e Navegação entre o Brasil e o Paraguai. O que parecia ser uma alternativa interessante para a produção agrícola, não-dependente de braços escravos, resulta em fracasso. Alguns grupos de imigrantes, que estavam produzindo em sistema de parceira em fazendas localizadas principalmente em São Paulo, revoltam-se contra as condições vigentes. A situação encontrada pelos imigrantes pode ser ilustrada pelo relato do suíço Thomaz Davatz, que liderou uma revolta na fazenda Ibiacaba, do senador Vergueiro, “Os colonos que emigram, recebendo dinheiro adiantado tornam-se (…), desde o começo, uma simples propriedade de Vergueiro & Cia. E em virtude do espírito de ganância, para não dizer mais, que anima numerosos senhores de escravos, e também da ausência de direitos em que costumam viver estes colonos na província de São Paulo, só lhes resta conformarem-se com a idéia de que são tratados como simples mercadorias, ou como escravos. ….”. Os fatos repercutem no exterior e, na Europa, a imigração para o Brasil passa a ser desaconselhada. A Prússia chega a proibir a imigração de seus cidadãos para o Brasil. Em 18 de março de 1857, o Brasil adere à declaração de Paris, que regula princípios relativos ao direito marítimo em tempo de guerra e estabelece a abolição do corso. O governo procura administrar a política alfandegária e introduzir as mudanças que julga necessárias mediante tarifas que geralmente ficam conhecidas pelos nomes de seus autores ou proponentes. Procura-se tomar cuidado para não ocasionar reduções significativas na arrecadação. A pauta geral de direitos é mantida em patamares elevados, o que é compreensível considerando-se que as tarifas de importação representam cerca de 65% da renda do estado e as tarifas de exportação cerca de 13%. Dentro deste espírito, é realizada em março de 1857 a reforma que ficou conhecida por Reforma Souza Franco. Introduz a tributação específica por categorias de produtos, diminui alguns privilégios concedidos a indústrias nacionais e reduz a tarifação de algumas categorias, para não prejudicar o comércio importador. Um dos objetivos da reforma é favorecer a compra de matérias-primas e de instrumentos destinados à lavoura. Logo em seguida, no mês de agosto, um novo ajuste nas tarifas, desta vez, por intermédio de um decreto, que ficou conhecido por Decreto Maurício Wanderley, tem como objetivo beneficiar a agricultura e isentar o carvão mineral para beneficiar o desenvolvimento das indústrias e comunicações. O carvão mineral passa a ser, cada vez mais, o principal componente da matriz energética mundial. Somente muitas décadas depois, começará a ser substituído por outras fontes de energia. Em 05 de fevereiro de 1858, o Brasil estabelece um Tratado de Amizade, Comércio e Navegação com o Império Otomano e, em 12 de fevereiro, a missão chefiada por José Maria da Silva Paranhos reafirma, em Assunção, compromissos relativos ao tratado de 1856 entre o Brasil e o Paraguai. O primeiro trecho da Estrada de Ferro D. Pedro II é inaugurado em 29 de setembro de 1858. O progresso continua, em 1859 o Rio de Janeiro ganha bondes puxados por tração animal e no ano seguinte, em 21 de junho de 1860 é criada a Repartição Geral dos Telégrafos. O país completa 208 km de ferrovias inaugurados desde 1956. No final da década, o Brasil atinge um total acumulado de 114 patentes concedidas desde 1809, sendo 27 patentes concedidas desde 1855. As patentes até este período relacionam-se predominantemente a produtos agrícolas como café, açúcar e arroz, além de material de transporte. Em 9 de fevereiro de 1859 chegam ao Brasil trezentos chineses provenientes de Cingapura, trazidos pelo comerciante Manoel de Almeida Cardoso. Destinam-se ao trabalho agrícola. É mais uma tentativa de introduzir no país a mão-de-obra estrangeira por intermédio da imigração. Quase todas são mal sucedidas, a convivência da escravidão com a mão-de-obra assalariada e com a parceria agrícola é complicada. Os fazendeiros acostumados ao trato com os escravos têm dificuldade em lidar, motivar e possibilitar as circunstâncias favoráveis para que os imigrantes se estabeleçam, estruturem suas vidas e passem a produzir riquezas para as duas partes. No âmbito das relações diplomáticas, em 5 de maio de 1859, é assinado em Caracas o primeiro tratado entre Brasil e Venezuela – um tratado de Tratado de Limites e Navegação Fluvial. Por volta desta época, o Brasil possui treze legações na Europa e oito no continente americano. Devido às alterações na política alfandegária realizadas a partir de 1857, que diminuem o protecionismo, alguns setores da jovem indústria brasileira, que já encontravam dificuldades devido à falta de mão-de-obra qualificada, passam a disputar o mercado com importações mais baratas. Em 1858 são fechadas algumas fábricas de tecidos e, o estaleiro que Mauá havia criado em Niterói, depois de chegar a produzir 72 navios, com a diminuição os impostos para importação de navios a vapor a alguns tipos de veleiros, encontra dificuldades para concorrer e termina por fechar em 1861. O Imperador é a figura maior do cenário político, abaixo do qual vêm os senadores. O cargo de Senador é vitalício e, para concorrer, é necessário idade de no mínimo 40 anos e renda de oitocentos mil Réis anuais. Na estrutura política, abaixo dos senadores vêm os deputados. A idade mínima exigida é de vinte e cinco anos e a renda mínima anual de quatrocentos mil reis. A estrutura executiva do império recebe, em 20 de janeiro de 1860, o Ministério da Agricultura, Indústria, Comércio e Obras Públicas, criado nesta data. Em 03 de setembro de 1860, a Tarifa Silva Ferraz realiza nova classificação alfandegária, com objetivo de proteger a indústria nacional “sem prejudicar o consumidor”. Eleva a tarifa de alguns itens em até 50% e agrupa as mercadorias importadas em 1.500 artigos, subdivididos em 4.333 itens, sendo 3.968 sujeitos a taxas fixas, 236 sujeitos a taxas ad valorem, 25 livres de direitos e 7 proibidos. O primeiro superávit da balança comercial desde a independência é obtido em 1860, graças ao café, que foi o principal produto exportado no período compreendido entre 1851 e 1860. Corresponde a 48,8% das exportações do país, o açúcar a 21,2%, o algodão a 6,2%, couros e peles a 7,2%, fumo a 2,6%, cacau a 1,1%, borracha a 2,2%, mate a 1,5% e outros produtos correspondem a 9,2%. O total das exportações na década compreendida entre 1851 e 1860 é de 102 milhões de libras esterlinas e as importações de 113,5 milhões de libras, resultando em um saldo negativo de 11,5 milhões de libras esterlinas no período. |