Aprendendo a Exportar
O PERFIL ECONÔMICO DOS ANOS 1970
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CRISES, CHOQUES & MILAGRES – O PERFIL ECONÔMICO DOS ANOS 1970 1971-1980 Os anos 1970 conhecem o fim do Sistema de Bretton Woods. O dólar, a partir de 1973, passa a flutuar em relação às moedas fortes. Verbete que também simboliza essa década é o “milagre econômico japonês”. Mas, sobretudo, ela é marcada por uma forte recessão que caracteriza o esgotamento do modelo de crescimento econômico do pós-guerra, o Welfare State. Um longo ciclo, para alguns especialistas o maior ciclo, de prosperidade do sistema capitalista se encerra. Essa crise já mostrara seus indicadores desde o ano de 1968, levando o presidente norte-americano de então, Richard Nixon, a quebrar, em 1971, a paridade do ouro com o dólar estabelecida nas rodadas de negociações de Bretton Woods. Entrementes, a alta do preço do petróleo vem a ser um fator crucial de seu agravamento. O dólar entra em uma fase de desvalorização que gera alta da inflação em toda área do sistema capitalista. Em 1979, é criado o Sistema Monetário Europeu. Nesse mesmo ano o Federal Reserve (FED), o banco central norte-americano, sobe o juro para a estratosférica taxa de 20%. Diplomaticamente, a década registra muitos acontecimentos que aprofundam a distensão da Guerra Fria. Os Estados Unidos são obrigados a sentar à mesa de negociação com o Vietnã para acertar o fim da guerra, que ocorre oficialmente em 1975. A diplomacia internacional também, praticamente, põe fim à corrida armamentista com a assinatura dos acordos SALT (Strategic Arms Limitation) I (1972) e SALT II (1979), que previam o congelamento de arsenais nucleares soviéticos e norte-americanos. Henry Kissinger promove a Diplomacia Triangular ao fazer a ponte entre Pequim e Moscou, que tinham se afastado um do outro desde o início dos anos 60. O aumento vertiginoso do preço do petróleo implementado pela OPEC (Organização Petroleira de Países Exportadores) tem um efeito deflatório sobre a produção dos países industrializados e promove uma transferência de renda para os países produtores, que por sua vez investem parte considerável desse capital nos próprios países industrializados. Após o primeiro choque do aumento do preço do petróleo em 1973, a chamada crise do petróleo, ou crise da energia, deslancha um aumento dos preços internacionais das matérias-primas a partir de 1974. Tendo como pano de fundo esse cenário a economia brasileira consegue crescer de forma considerável. O milagre econômico, iniciado em 1967, chega a seu auge com taxas de crescimento anual acima de 11%. Mas, o 1º choque do petróleo, em 1973, interrompe essa trajetória de sucesso. Para cobrir a conta de importação de petróleo, cujo preço quadruplica, o Brasil tem que restringir ainda mais suas importações. Do lado da exportação, a participação dos manufaturados aumenta em 47% de 1974 a 1979 e o Brasil conquista novos mercados no Oriente Médio e na África. Esse esforço, entretanto, apenas adia, no Brasil, a recessão que já havia tomado conta no mundo. Em 1979, um novo choque do petróleo e a explosão das taxas de juros americanas colocam um ponto final na fase de prosperidade. No início da década de 70, o “milagre econômico” está a pleno vapor com taxas de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 11,4% (1971), 11,9% (1972) e 13,9% (1973). Emílio Garrastazu Médici assume a Presidência em 30 de outubro de 1969, com um projeto Brasil Grande Potência, visando trazer à luz, até o ano 2000, o destino nacional de grandeza. Delfim Netto continua Ministro da Fazenda, cargo que ocupa desde 1967, convidado pelo então presidente Costa e Silva para domar a inflação e manter taxas de crescimento estáveis. A economia no triênio 1964/66 havia sido caracterizada por um perfil stop and go, em parte devido às políticas de combate à inflação. Os governos militares estavam desde 1964 tentando controlar o processo inflacionário que estava instalado em 1963. De acordo com Delfim, a inflação brasileira às vezes era de demanda outras de custo, por isso, as políticas ortodoxas utilizadas a partir de 1964 não davam certo. A partir de 1967, o objetivo prioritário da nova administração passa a ser estabilização do crescimento industrial a longo prazo, evitando o combate da inflação no curto prazo, que acabava provocando oscilações conjunturais. Era a “fuga para frente” com expansão monetária, fiscal e, principalmente, de crédito, além de uma política mais ativa de incentivo às exportações. O perfil de nossas exportações havia se modificado gradualmente a partir da segunda metade dos anos 60. A deterioração dos meios de troca das commodities agrícolas exportadas pelo Brasil, café e algodão, fez com que o governo brasileiro decidisse que era hora de exportar produtos com maior valor adicionado. Graças ao intenso processo de industrialização iniciado na segunda metade dos anos 50, o parque industrial brasileiro já estava maduro o suficiente para se lançar no mercado internacional. O comércio exterior passa a ser visto como um mecanismo vital para o processo de desenvolvimento brasileiro. A nova estratégia se baseia na tese de Raul Prebisch da CEPAL, que mostrou a deterioração histórica das relações de troca dos países produtores de matérias primas, ressaltando a necessidade de diversificar a pauta de exportações dos países, com ênfase nos produtos de maior valor agregado. Os países mais avançados se especializariam na produção de bens mais complexos, exportando para os países em desenvolvimento a produção de bens de tecnologia média, através da instalação de empresas multinacionais em seu território. A exportação de bens manufaturados também vem resolver o problema de superprodução desses bens de tecnologia média. O parque industrial que começou a ser instalado por Juscelino Kubitschek produzia bens de consumo para a classe média, ou insumos industriais para esses bens, e o Brasil não tinha uma classe média grande o suficiente para absorvê-los. Parte desse problema foi resolvido no final dos anos 60, com a ampliação do crédito ao consumidor. Entretanto, ainda havia um excedente a ser exportado. Portanto, uma política de incentivo à exportação de manufaturados passou a ser essencial para se manter o ritmo de crescimento da economia brasileira. O Brasil amplia suas exportações de manufaturados, serviços e capitais para a América Latina, África e Oriente Médio, enquanto continua a vender café, soja, milho e minério de ferro para Estados Unidos, Europa Ocidental e Japão. Assim, a participação do Brasil no comércio mundial passa de 0,88% em 1967-68 para 1,2% em 1972-73. Como parte dessa política, o governo estende para o câmbio a indexação que havia sido adotada para o resto da economia: a taxa de câmbio é ajustada com frequência a fim de refletir quaisquer descompassos entre a inflação interna e a externa, de modo a manter a estabilidade da taxa de câmbio real. Também são reforçados ou implementados uma série de programas de incentivo às exportações tais como crédito-prêmio à exportação, também conhecido como crédito-prêmio IPI, que concedia, a título de estímulo fiscal, créditos tributários sobre exportações de produtos manufaturados, que podiam ser usados para compensar tributos pagos sobre operações domésticas, Programa de Financiamento à Produção para Exportação (Resolução BACEN nº 71/67), administrado pela Cacex e Programa de Financiamento às Exportações de Máquinas e Equipamentos (FINAMEX), pelo sistema BNDES/FINAME, além de isenções de tributos, como isenção de imposto de renda sobre o lucro da exportação e isenção de imposto de importação (II) e imposto sobre produtos industrializados (IPI) nas importações feitas por empresas exportadoras, de acordo com sua performance de exportação (programa BEFIEX). Em abril de 1979, pressionado pelos Estados Unidos, o Brasil assina o Código de Subsídios do GATT e tem que começar a interromper seus programas de estímulos às exportações. Em 1974, com o 1º choque do petróleo e a quadruplicação de seus preços, a trajetória de crescimento do PIB acima de 10% é interrompida. O Brasil produz apenas 20% do petróleo que consome e o valor das importações brasileiras dobra em 1974. Entretanto, apostando que a recessão mundial seria breve e que as taxas de juros internacionais seriam mantidas baixas, o Brasil tenta sustentar as taxas de crescimento da economia e os níveis de investimento industrial por meio do endividamento externo. Adicionalmente, intensifica sua política de estímulo e promoção das exportações e aumenta as restrições às importações. O Brasil consegue, assim, manter taxas de crescimento entre 10 e 5% até 1980. Nos anos 70, o perfil das exportações brasileiras se modifica não só com o aumento da participação dos produtos industrializados, mas também com aparecimento da soja e seus derivados entre os nossos principais produtos de exportação. O aumento do preço da soja e seus derivados no mercado mundial, em meados de 1970, desperta o interesse dos agricultores e do governo. Inicialmente, a produção de soja se concentrava no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e São Paulo. Com o aumento da demanda mundial por soja em grão e seus derivados, como farelo e óleo, o governo brasileiro resolve incentivar a expansão da cultura agrícola, principalmente de soja, para a região centro-oeste, através da disponibilização de linhas de crédito favorecidas e novas técnicas agrícolas. Entre 1970 e 1980, a área cultivada com soja passa de um pouco mais de 1,3 milhões de hectares para cerca de oito milhões e meio de hectares, enquanto a produção brasileira passa de cerca de um milhão e meio de toneladas para 15 milhões de toneladas. Em 1980, o Brasil já havia se consolidado como segundo maior produtor mundial, ultrapassando a China. A produção brasileira representa naquele ano 18,73% da produção mundial de soja, ficando atrás apenas dos Estados Unidos, que foi responsável por mais de 60% de toda a soja produzida no mundo. Em 15 de março de 1974, General Geisel, ex-presidente da Petrobrás, assume a presidência com a promessa de uma “distensão política lenta, segura e gradual”, no plano interno. Na política exterior, o presidente define a posição do Brasil como de “pragmatismo responsável”, isto é, fidelidade ao Ocidente, mantendo o direito de escolher os próprios rumos de acordo com o interesse nacional. Na área econômica, o governo aumenta as alíquotas máximas do imposto de importação de 100% para 205% e estabelece que as importações de supérfluos têm que ser pagas à vista. Para manter o crescimento econômico, apesar da crise do petróleo de 1973, e completar o processo de substituição de importações dos setores de bens de capital e insumos básicos, é lançado, em setembro de 74, o II Plano Nacional de Desenvolvimento (1975/1979). É facilitada a captação de capital externo para investimento em áreas como energia, siderurgia e transporte. Além disso, são captados vultosos empréstimos externos, sendo que a maior parte deles é feita por governos e empresas públicas. A partir de 1975, a economia, cada vez mais dependente da entrada de recursos externos, perde fôlego industrial e ganha ânimo financeiro. Para atrair os petrodólares é preciso pagar taxas de juros superiores às do mercado internacional e sem eles é impossível crescer. Com isso, passa a ser preferível aplicar dinheiro no mercado financeiro do que investi-lo na produção. É o início da ciranda financeira. No final de 1975, a relação entre a dívida externa e as exportações chega a 47%. Em 1974 , ela era de 33%. É proibida a importação de bens de luxo e criada uma reserva de informática, que determina que o suprimento do mercado interno de computadores de pequeno porte deverá ser feito por produtores e tecnologias nacionais. Durante o período 1974-79, as exportações brasileiras aumentam ao mesmo ritmo de crescimento do mercado importador mundial, abaixo do que havia sido no período 1967-73, quando o Brasil teve um aumento de suas exportações bem acima do crescimento das importações mundiais. Na segunda metade da década de 70, aumenta a diversificação de mercados e produtos, resultado de uma política de promoção comercial e incentivos à exportação mais agressiva. A participação dos produtos manufaturados aumenta ainda mais, passando 23,1% para 44-45%, em 1979-80. Se considerarmos os produtos industrializados, conceito que inclui os produtos semimanufaturados, o aumento na participação é de 32,4% para 56%. Em 1979, a participação do café, incluindo café solúvel, havia caído para 27,2%. A participação de outros países latino-americanos nas exportações brasileiras também passa de 9%, em 1973, para 16%, em 1979. A partir de novembro de 1978, os preços do petróleo, que haviam ficado estáveis no período 1974-1978, dão um novo pulo. A situação política no Irã, um dos maiores exportadores mundiais, estava explosiva. Entre o final de 1978 e o início de 1979, uma série de protestos populares e greves, principalmente dos trabalhadores da indústria de petróleo, levam à queda do Xá e à revolução islâmica, provocando queda na produção de petróleo e disparada de seus preços. O preço do petróleo aumenta de US$ 12 o barril, em 1978, para US$ 30 no início de 1980. A guerra Irã-Iraque, no início de 1981, provoca novo aumento para US$ 35 o barril. Do lado financeiro, a aceleração da inflação nos Estados Unidos leva o governo daquele país a adotar políticas macroeconômicas rígidas, elevando a taxa de juros norte-americana e, como consequência, a do mercado financeiro internacional. A dívida externa brasileira, que, no final de 1973, era de US$ 13,8 bilhões, havia chegado a US$ 52,8 bilhões em 1978. Em 1974, o Brasil pagava US$ 500 milhões por ano de serviço da dívida. Em 1978, esse valor já era de US$ 2,8 bilhões e, com o aumento da taxa de juros internacional, os juros líquidos anuais pagos pelo país chegam a US$ 4,2 bilhões no final de 1979. Em 15 de março de 1979, o general João Figueiredo, ex-chefe do Serviço Nacional de Informações do governo Geisel, assume a presidência da República prometendo a “mão estendida em conciliação” e jurando fazer “deste país uma democracia”. Inicialmente, Mário Henrique Simonsen, ministro da Fazenda do governo Geisel, assume a Secretaria de Planejamento da Presidência da República e mantém o comando da política econômica. Entretanto, pede demissão 5 meses depois. Antônio Delfim Netto, prestigiado como homem do “milagre”, assume o cargo até o final do governo Figueiredo. Delfim Neto tenta repetir o sucesso econômico do período 1967-73, mas o quadro internacional é outro. A economia mundial está em recessão, o comércio internacional não cresce ao mesmo ritmo de antes e a oferta de empréstimos é escassa. O aumento do passivo externo dos países devedores em relação ao valor de suas exportações e reservas internacionais, leva a uma perda de confiança por parte dos credores privados. O serviço da dívida externa passa a sofrer restrições de refinanciamento, pois a comunidade financeira internacional não tem mais confiança na capacidade do Brasil de equilibrar seu balanço de pagamentos, cujo déficit em transações correntes é de U$12,8 bilhões no final de 1980. A despeito do caótico quadro econômico internacional, o ministro Delfim aplica doses heterodoxas na economia, que resultam no crescimento econômico de 9,2% em 1980, mas levam à recessão no período 1981-83, com queda média de -2,3% do PIB. |