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Presidente veta Projeto de Lei que institui a Política Nacional Aldir Blanc
- Foto: Ministério do Turismo
O Presidente da República, Jair Bolsonaro, vetou o Projeto de Lei nº 1.518, de 2021, que instituiria a Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura, que repassaria o valor correspondente a R$ 3.000.000.000,00 (três bilhões de reais), da União aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, a cada ano, em parcela única, no primeiro exercício subsequente ao da entrada em vigor desta Lei e nos 4 (quatro) anos seguintes.
Dentre outras disposições apresentadas, para consecução das medidas poderiam ser utilizadas diversas fontes de recursos, dentre elas, dotações consignadas na lei orçamentária anual e nos seus créditos adicionais; o superávit do FNC apurado em 31 de dezembro do exercício anterior; 3% (três por cento) da arrecadação bruta dos concursos de prognósticos e de loterias federais e similares cuja realização esteja sujeita a autorização federal, deduzido esse valor dos montantes destinados aos prêmios; recursos provenientes da arrecadação da Loteria Federal da Cultura, a ser criada por lei específica; reembolso das operações de empréstimo realizadas por meio do FNC, a título de financiamento reembolsável, observados critérios de remuneração que, no mínimo, lhes preservem o valor real e que contribuam para gerar o superávit referido no inciso II do caput; o retorno dos resultados econômicos provenientes dos investimentos em empresas e em projetos culturais feitos com recursos do FNC.
Ouvidas as pastas ministeriais competentes, o Presidente da República decidiu vetar dispositivos da proposição, por vício de inconstitucionalidade e contrariedade ao interesse público, vez que não atendiam ao disposto nos art. 107, art. 109 e art. 113 do ADCT, no inciso I do caput do art. 167 e no § 5º do art. 195 da Constituição, violava o disposto na EC nº 95, de 2016, nos art. 16 e art. 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal, e nos art.124, art. 125 e art. 126 da Lei de Diretrizes Orçamentárias 2022, tendo em vista que haveria a ampliação da despesa primária obrigatória, de natureza corrente, com duração de cinco exercícios financeiros, sem a apresentação das medidas de compensação em relação a aumento permanente de receita ou diminuição permanente de despesa, cujas fontes de financiamento propostas não garantiriam impacto neutro. Ainda, a proposição não cumpriria o teto de gastos, nem o resultado primário, uma vez que não haveria espaço fiscal para novos aportes de recursos da União para os Estados, o Distrito Federal e os Municípios.
Nesse ponto, ressalta-se que, ao retirar a autonomia do Poder Executivo federal em relação à aplicação dos recursos, a medida engessaria as possibilidades quanto ao emprego desses recursos para políticas públicas culturais cuja operacionalização depende de fundos e verbas pertencentes ao próprio Poder Executivo. Além disso, enfraqueceria as regras de priorização, monitoramento, controle, eficiência, gestão e transparência elaboradas para auditar os recursos federais e a sua execução, de modo que haveria uma ingerência sobre a fiscalização e a gestão de prestação de contas de projetos culturais, ao estabelecer o que deveria ser observado, e ao criar a obrigatoriedade do repasse pelo Governo federal de recursos provenientes do Fundo Nacional de Cultura e de outros fundos aos entes federativos, permitindo que gerissem os recursos do Fundo Nacional de Cultura por meio de editais, chamadas públicas, entre outros instrumentos, o que impactaria no pacto federativo e causaria insegurança jurídica.
Sob essa perspectiva, é importante salientar que foram expressivos os repasses da União para os entes federativos em decorrência do enfrentamento à pandemia da covid-19, de maneira que o País encontra-se em situação fiscal delicada, na qual não há espaço para novas transferências financeiras da União. Ressalte-se a transferência realizada no âmbito do Programa Federativo de Enfrentamento ao covid-19, instituído pela LC nº 173, de 2020, no valor total de R$ 60.148.000.000,00 (sessenta bilhões e cento e quarenta e oito milhões de reais), nos meses de junho, julho, agosto e setembro de 2020, e a transferência realizada aos entes federativos pela Lei nº 14.041, de 2020, no total de R$ 15.098.000.000,00 (quinze bilhões e noventa e oito milhões de reais.
Sobre as fontes de recursos previstas pela proposição legislativa, também havia vício de inconstitucionalidade, pois implicaria na expansão de despesa obrigatória de caráter continuado, que geraria impacto orçamentário e financeiro para o Tesouro Nacional, além de contrariar o interesse público vez que poderia prejudicar a comercialização dos produtos lotéricos, em decorrência da diminuição dos valores dos prêmios oferecidos, o que desencadearia a redução da atratividade das loterias federais para o público apostador, reduzindo o valor disponível para premiação, e diminuiria a arrecadação dessas loterias. Consequentemente, isso implicaria na diminuição dos repasses legais para outros segmentos sociais beneficiados, tais como o esporte, a seguridade social, a saúde, a segurança e a educação. Acrescenta-se, ainda, que a loteria federal da cultura é modalidade lotérica não existente.
A proposição legislativa estabeleceria, dentre outros aspectos, que a aplicação dos recursos recebidos pelos entes federativos seria regida unicamente pelos princípios, objetivos e finalidades dessa Lei, e que os recursos poderiam ser utilizados de forma complementar para fomentar projetos culturais apoiados por leis de incentivo vigentes em qualquer âmbito da Federação. Além disso, definiria as ações e as atividades para a consecução dos objetivos previstos, detalharia o que seria compreendido por espaços, ambientes e iniciativas artístico-culturais, determinaria o que poderia ser utilizado como fonte de recursos, bem como disporia sobre a prestação de contas e outros.
Entretanto, tal medida contrariava o interesse público retirando a autonomia do Poder Executivo federal em relação à aplicação dos recursos, como já retromencionado, além de apresentar contradições em seus artigos, como o art. 3º, o qual apresentava princípios como eficiência e desburocratização, e, ao mesmo tempo, criava instâncias burocráticas e procedimentos que tornariam proibitivo o acesso ao fomento da cultura. Outrossim, ao autorizar que parte dos recursos do Fundo Nacional de Cultura fossem utilizados pelo Governo federal para cumprir o proposto, colocaria em risco a execução de projetos culturais, pelos entes federativos, uma vez que as medidas propostas não atenderiam requisitos tais como a necessidade de constarem do programa de trabalho anual do referido Fundo, de serem submetidos à análise técnica da área responsável e serem aprovados por Ministro de Estado, em conformidade com o disposto no art. 4º da Lei nº 8.313, de 23 de dezembro de 1991.
Ainda, ao limitar o poder de aplicação de sanções pelo Poder Executivo federal estabelecendo que, caso houvesse desídia ou omissão de gestor na prestação de contas, os proponentes ficariam isentos de aplicação de qualquer penalidade, também contrariaria o interesse público, pois os termos ‘desídia’ e ‘descaso’ são termos gerais, subjetivos e inexatos, e possibilitariam interpretações diversas sobre o prazo limite de análise conclusiva sobre a prestação de contas pelo Poder Executivo federal.
Nesse sentido, o veto presidencial intervém oportunamente para equilíbrio das contas públicas, ao passo que não deixa o setor cultural desassistido, haja vista terem sido repassados recursos ao logo de todo período decretado de situação de emergência em saúde pública em decorrência da pandemia da covid-19.
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