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Presidente Bolsonaro sanciona lei que mitiga efeitos econômicos da pandemia de Covid-19 sobre o setor elétrico
Marcello Casal jr/Agência Brasil
O Presidente da República, Jair Bolsonaro, sancionou a lei que modifica o arcabouço legal do setor elétrico, incluindo a introdução de mecanismos de remanejamento de recursos para fins de redução do valor das tarifas. A medida ainda trata da realização de reformas estruturais no setor de energia elétrica e da adoção de medidas para viabilizar a organização do segmento de energia nuclear e a conclusão do projeto de Angra 3.
De acordo com o projeto aprovado pelo Parlamento, o principal objetivo seria mitigar os efeitos econômicos da pandemia no setor, a fim de desonerar em boa medida as tarifas de consumidores de energia elétrica de todo o Brasil, mantendo atenção àqueles da região Norte do País, atendidos por distribuidoras que eram da Eletrobrás e que foram privatizadas.
Os consumidores dos Estados do Norte, por exemplo, conforme a lei, não precisarão mais pagar pelos empréstimos fornecidos às distribuidoras na época em que elas estavam sob controle temporário da União, que precedeu a privatização.
A norma também destina recursos não comprometidos de projetos de pesquisa e desenvolvimento e eficiência energética para a Conta de Desenvolvimento Energético. Tais recursos serão remanejados de projetos não iniciados, reprovados ou cuja execução não tenha sido comprovada, em favor da redução tarifária, até o ano de 2025.
Quanto às reformas setoriais, a lei ora sancionada modifica o mecanismo de gestão de bens da União sob administração da Eletrobrás a fim de racionalizar a gestão dos bens da União. O texto também determina a transferência para a União de todas as ações da “Indústrias Nucleares do Brasil” e da “Nuclebrás Equipamentos Pesados”, inclusive as que estão nas mãos da iniciativa privada. As duas estatais, que hoje atuam como sociedades de economia mista, serão transformadas em empresas públicas vinculadas ao Ministério de Minas e Energia.
Visando a adequação ao interesse público da propositura, após a manifestação técnica dos ministérios competentes, o Presidente da República decidiu vetar o parágrafo que estabelecia que o agente titular de outorga de autorização para geração de energia elétrica com prazo de 30 anos teria seu prazo de autorização contado a partir da declaração da operação comercial da primeira unidade geradora, com ajuste, quando necessário, do respectivo termo de outorga, após o reconhecimento pela ANEEL do atendimento ao critério estabelecido neste parágrafo. A determinação seria aplicada apenas aos agentes cuja usina estivesse em operação em 1º de setembro de 2020 e que não tivesse sido objeto de qualquer espécie de penalidade pela ANEEL quanto ao cumprimento do cronograma de sua implantação.
Conforme as razões expostas, em que pese o mérito da proposta, ao vincular a contagem do prazo de outorga à entrada em operação comercial e não à emissão de licenciamento ambiental ou assinatura de ato de outorga, o dispositivo contraria o interesse público, haja vista que retira um incentivo central para aceleração da conclusão da obra e da entrada em operação do empreendimento por parte do agente titular da outorga.
Ademais, constitui-se, na prática, em uma extensão da outorga de autorização e manutenção de subsídios associados, por contabilidade diferenciada da data de início de contagem do tempo, vez que altera o marco inicial de contagem das outorgas ali abarcadas, desrespeitando situações jurídicas consolidadas, como as obrigações de pagamento de Compensação Financeiras pela utilização de Recursos Hídricos (CFURH) aos municípios afetados, bem como deslocando o pagamento pela utilização de bem público para o final das outorgas, ocasionando outros impactos operacionais.
Por fim, cria uma diferenciação injustificada para projetos submetidos à outorga de autorização frente a outros atos de outorga, o que pode abrir margem a diversos pedidos judiciais de postergação da vigência de outros atos de outorga por parte de outros agentes não contemplados por esta regra específica, de modo a ensejar o pleito por isonomia de tratamento.
Outro dispositivo objeto de veto foi o que estabelecia que a avaliação completa da Base de Remuneração Regulatória terá efeitos a partir da data de processamento do primeiro processo tarifário subsequente ao pedido de revisão pelo interessado e será aplicada até o terceiro processo tarifário após a assinatura do contrato de concessão.
Entretanto, embora se reconheça a boa intenção do legislador, a norma contraria o interesse público, pois apesar de haver previsão contratual de revisão tarifária extraordinária (RTE), para isso devem ser observadas as regras contratuais e regulatórias. Embora as concessionárias desestatizadas em 2018 tenham apresentado pedidos de RTE, a ANEEL concluiu que as informações prestadas eram insuficientes para que o pedido fosse acolhido. Desse modo, a proposta acaba por inovar nas condições editalícias estabelecidas na época da desestatização de que tratam os §§ 1º-A e 1º-C do art. 8º da Lei nº 12.783, de 2013, em prejuízo à segurança jurídica. Além disso, a norma teria impacto significativo nas tarifas relativas a determinados contratos de concessão sem que tenham sido prestadas as informações necessárias para a adequada avaliação por parte do ente regulador.
Quanto à viabilização do projeto Angra 3 proporcionada pela lei, destaca-se o importante papel desse empreendimento para assegurar energia firme para o Sistema Interligado Nacional, o que é ainda mais importante no cenário contemporâneo, considerando o crescimento da participação das fontes intermitentes adicionadas ao sistema nos últimos anos. Para se consolidar como líder mundial em geração de energia limpa, o Brasil não pode prescindir da segurança energética que o projeto conferirá a todo o sistema.
A sanção do projeto é conveniente e oportuna considerando a necessidade de implementar medidas que resultem na redução do custo da energia para o consumidor final, no aperfeiçoamento do arcabouço legal do setor elétrico e na viabilidade do projeto da usina termelétrica nuclear Angra 3, possibilitando a mitigação de efeitos econômicos da pandemia de covid-19 sobre as tarifas de energia elétrica, bem como a melhor organização do setor nuclear, permitindo que fique mais dinâmico e gerenciável.
Cabe destacar que os vetos presidenciais não representam um ato de confronto do Poder Executivo ao Poder Legislativo. A Constituição Federal de 1988 prevê esse poder-dever do presidente da República no seu art. 66, o qual declara que caso um projeto seja considerado, no todo ou em parte, inconstitucional, deverá ser vetado (o chamado veto jurídico). Se o chefe do Poder Executivo assim não proceder, em tese poderia ser alegada uma omissão suscetível de uma eventual acusação de crime de responsabilidade.
Por outro lado, caso o presidente da República considere a proposta, ou parte dela, contrária ao interesse público, poderá aplicar o veto político. Entretanto, a decisão final sobre os vetos caberá ao Parlamento, que tem a prerrogativa constitucional de apreciá-los.
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