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Publicada Lei que autoriza o Executivo federal a aderir ao Covax Facility
Foto: Rodrigo Nunes/MS
O Presidente da República, Jair Bolsonaro, sancionou lei que autoriza o Poder Executivo federal a aderir ao Instrumento de Acesso Global de Vacinas Covid-19 , o Covax Facility, e estabelece diretrizes para a imunização da população. A medida é fruto da conversão da MP nº 1.003, de 2020.
Conforme a Exposição de Motivos que embasou a edição da MP, a medida se justifica ante a situação de crise sanitária mundial decorrente da Covid-19, para atender a necessidade da realização de ações que assegurem a imunização da população mediante a adesão do Brasil ao Covax Facility e aquisição de vacinas por meio desse instrumento.
A Covax Facility é uma aliança internacional da Organização Mundial de Saúde (OMS), Gavi Alliance e da Coalition for Epidemic Preparedeness Innovations (CEPI), que tem como principal objetivo acelerar o desenvolvimento e a fabricação de vacinas contra a Covid-19 a partir da alocação global de recursos para que todos os países aderentes à iniciativa tenham acesso igualitário à imunização. Trata-se de uma plataforma colaborativa, subsidiada pelos países-membros, que também visa possibilitar a negociação de preços dos imunizantes.
Visando à adequação à constitucionalidade e ao interesse público da propositura, o Presidente da República, após a manifestação técnica dos ministérios competentes, decidiu vetar alguns dispositivos. O primeiro deles tratava sobre o dever da Anvisa de conceder autorização temporária de uso emergencial para a importação, a distribuição e o uso de qualquer vacina contra a Covid-19 pela União, pelos estados, pelo Distrito Federal e pelos municípios, em até cinco dias após a submissão do pedido, dispensada a autorização de qualquer outro órgão da administração pública direta ou indireta, e desde que pelo menos uma das autoridades sanitárias estrangeiras elencadas no dispositivo tenha aprovado a vacina e autorizado sua utilização em seus respectivos países.
Entretanto, e embora se reconheça a boa intenção do legislador, a proposição ao versar, por intermédio de emenda parlamentar, sobre criação ou definição de competências de órgãos e entidades do Poder Executivo federal, acabava por violar o princípio constitucional da separação dos poderes ao usurpar a competência privativa do Presidente da República estabelecida no art. 61, § 1º, inciso II, alínea “e” da Constituição da República.
Além disso, a medida incorria em ofensa ao art. 196 da Constituição da República e contrariava o interesse público ao tornar compulsória a autorização temporária de uso emergencial para a importação, de forma a dispensar a prévia análise técnica por parte da Anvisa acerca da segurança, qualidade e eficácia em cada caso, em prejuízo das competências legais da Agência para garantir o acesso a vacinas com qualidade, segurança e eficácia em território nacional, por meio de avaliação eventual risco de doença ou agravo à saúde da população.
Na mesma esteira, o dispositivo, ao dispor sobre autorização temporária de uso emergencial para a importação, a distribuição e o uso de qualquer vacina contra a Covid-19, gerava insegurança jurídica por dispor sobre matéria análoga em diplomas legais diferentes, conforme se observa no disposto do art. 3º da Lei nº 13.979/2020 e do art. 16 da MP nº 1.026/2021, e em ofensa ao inciso IV do art. 7º da Lei Complementar nº 95, de 1998, que dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis, em razão do inadequado tratamento do mesmo assunto em mais de um diploma legislativo.
Ainda, também contrariava o interesse público, tendo em vista que o prazo exíguo de até cinco dias, após a submissão do pedido, acabava por inviabilizar a operacionalização da medida, a qual requer diligências e apresentação de documentos, ocasionando, inclusive, a supressão da autonomia decisória da Anvisa com base em critérios estritamente técnicos, o que compromete uma das balizas estruturantes das agências reguladoras, disposta na Lei nº 13.848, de 2019.
Outro ponto objeto de veto foi o que previa que, no caso de omissão ou de coordenação inadequada das ações de imunização de competência do Ministério da Saúde referidas neste artigo, ficam os estados, os municípios e o Distrito Federal autorizados, no âmbito de suas competências, a adotar as medidas necessárias com vistas à imunização de suas respectivas populações, cabendo à União a responsabilidade por todas as despesas incorridas para essa finalidade.
Todavia, nota-se que a proposição ao dispor, por iniciativa parlamentar, sobre criação ou definição de competências de órgãos e entidades do Poder Executivo federal, acabava por violar a competência privativa do Presidente da República estabelecida no art. 61, § 1º, inciso II, alínea “e” e art. 63, I, da Constituição da República. Além disso, ao imputar à União a responsabilidade por despesas realizadas unilateralmente por outros entes da federação, ofendia o pacto federativo, disposto nos arts. 1º, 3º, 4º, 18 e 60, § 4º, da Constituição da República.
Igualmente, contrariava o interesse público ao ensejar potencial risco de judicialização no tocante à incidência da regra em caso de omissão ou de coordenação inadequada das ações de imunização de competência do Ministério da Saúde, o que poderia, inclusive, comprometer a necessária celeridade da vacinação da população brasileira.
Ainda, a medida encontrava óbice jurídico ao não prever parâmetros para se aferir existência ou não de eventual omissão ou coordenação inadequada do Ministério da Saúde, responsabilizando a União pelo custo de todas as aquisições, em desacordo com a responsabilidade na gestão fiscal, que pressupõe a ação planejada e transparente, conforme dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), sem apresentar a estimativa do respectivo impacto orçamentário e financeiro, em violação às regras orçamentárias.
A sanção presidencial representa uma importante medida para assegurar o acesso da população às doses das vacinas, bem como para possibilitar mecanismos de negociação coletiva de preços, o que possivelmente os tornará mais vantajosos para os países aderentes.
Cabe destacar que os vetos presidenciais não representam um ato de confronto do Poder Executivo ao Poder Legislativo. A Constituição Federal de 1988 prevê esse poder-dever do Presidente da República no seu art. 66, o qual declara que caso um projeto seja considerado, no todo ou em parte, inconstitucional, deverá ser vetado (o chamado veto jurídico). Se o chefe do Poder Executivo assim não proceder, em tese poderia ser alegada uma omissão suscetível de uma eventual acusação de crime de responsabilidade.
Por outro lado, caso o Presidente da República considere a proposta, ou parte dela, contrária ao interesse público, poderá aplicar o veto político. Entretanto, a decisão final sobre os vetos caberá ao Parlamento, que tem a prerrogativa constitucional de apreciá-los.
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