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Vitória quilombola: STF rejeita ação que questionava decreto
Vista das casas do Quilombo Kalunga, na comunidade Engenho II, no interior de Goiás. Segundo documento do Consea enviado à Corte, “A soberania e segurança alimentar e nutricional das comunidades quilombolas é indissociável de seu direito territorial e patrimonial”. Imagem: Agência Brasil
Nesta quinta-feira (8), o Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou, por 10 votos a 1, uma ação que questionava a constitucionalidade do decreto presidencial 4887/2004, que regulamentou o processo de demarcação e titulação de terras quilombolas no país.
A ação direta de inconstitucionalidade (ADI) nº 3239 foi iniciada em 2004 pelo então Partido da Frente Liberal (PFL), hoje Partido Democratas (DEM), que pleiteava a anulação do decreto.
Para se entender a questão, é preciso ir à Constituição Federal, que no artigo 68 das disposições transitórias, prevê o seguinte: “Aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos”.
Dezesseis anos após a Constituição, o Decreto 4887, de 20.11.2004, assinado pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, regulamentou o referido artigo, indicando os procedimentos a serem adotados pelos órgãos públicos em todo o processo, da identificação até a conclusão.
Logo após a publicação do decreto, o então Partido da Frente Liberal (PFL) acionou o STF alegando que dois itens seriam inconstitucionais. Um deles seria a previsão de autodeclaração da condição de remanescente quilombola. O outro item questionado era a demarcação das terras por indicação dos interessados.
O julgamento começou em 18 de abril de 2012 e o relator, ministro Cezar Peluso (hoje aposentado), votou a favor da ação. Já a ministra Rosa Weber pediu vistas do processo e em 25 de março de 2015 votou contra, empatando o julgamento em 1 a 1. A sessão foi interrompida por pedido de vista do ministro Dias Toffoli. Agora, com a votação definitiva da matéria (10 a 1), a ação é arquivada.
Posição do Consea
Quando do início do julgamento, em 2012, o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) enviou recomendação ao Supremo Tribunal Federal pedindo que a suprema corte indeferisse a ação. “A soberania e segurança alimentar e nutricional das comunidades quilombolas é indissociável de seu direito territorial e patrimonial”, dizia o documento enviado ao STF.
Para o Consea, “o desenvolvimento sustentável do país passa pelo reconhecimento e preservação dos territórios das comunidades quilombolas, povos indígenas e comunidades tradicionais”. Com a retomada do julgamento o conselho reenviou a recomendação ao STF, que inclui o documento nos autos do processo, como subsídio aos votos dos ministros.
Em artigo assinado no jornal O Globo em 24.08.2017, o líder da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), Denildo Rodrigues de Moraes, disse que a ação do Partido Democratas ameaçava o acesso do seu povo a políticas públicas. “Minha terra e minha identidade estão seriamente ameaçadas pela Adin 3239/2004, que questiona o direito de propriedade das comunidades quilombolas, bem como o seu acesso a políticas públicas”, escreveu ele, que é o representante da Conaq no Consea.
Para Xifronese Santos, conselheira do Consea e também integrante da Conaq, a decisão foi importante, já que as comunidades de povos tradicionais temiam que vigorasse a tese do chamado “marco temporal”, que estabelece uma data para a comprovação da ocupação das terras – o que poderia inviabilizar a titulação de algumas comunidades que sofreram esbulho, isto é, foram expulsas à força de seus territórios originais.
Fonte: Ascom/Consea