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Violações de direitos ameaçam povos Guarani e Kaiowá, diz especialista do Consea
Mirlane Guimarães: Comitiva do Consea constatou violações de vários direitos dos Guaranis e Kaiowás, sobretudo do direito à demarcação de suas terras tradicionais, sem a qual não é possível garantir o direito humano à alimentação adequada. Imagem: Consea
Representantes do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) e convidados de outros órgãos governamentais e lideranças indígenas visitaram a região do Cone Sul do Mato Grosso do Sul no ano passado para ver e ouvir os povos Guarani e Kaiowá. A comitiva constatou “a ocorrência de fome e desnutrição, a precariedade do acesso a saúde, a água e a educação, a ausência de documentação civil, um constante sentimento de medo de ataques violentos por ordem dos fazendeiros da região e uma forte criminalização das lideranças indígenas que resistem e reagem aos abusos de poder dos órgãos de polícia”, diz o relatório.
A assessora técnica do Consea, Mirlane Guimarães, participou da missão e descreve a situação dos Guarani e Kaiowá como uma “tragédia humana com violações de vários direitos”.
Ao visitar às aldeias dos povos Guarani e Kaiowá do Cone Sul, qual o cenário que a missão organizada pelo Consea encontrou?
Mirlane Guimarães: A comitiva constatou um quadro de tragédia humana com violações de vários direitos, sobretudo do direito à demarcação de suas terras tradicionais, sem a qual não é possível garantir o direito humano à alimentação adequada. Sem território não há segurança alimentar e nutricional para os povos indígenas, especialmente os Guarani e Kaiowá que possuem a tradição de plantar, caçar e pescar.
Percebemos também a existência de forte preconceito contra indígenas disseminado entre a população do Mato Grosso do Sul, inclusive entre servidores(as) públicos(as) dos órgãos estaduais e municipais. As famílias Guarani e Kaiowá residentes em áreas de retomada enfrentam a pior situação de violação de direitos, pois muitas políticas públicas federais e estaduais possuem em suas normativas a exigência de regularidade fundiária para serem acessadas. Tal quadro denota uma dupla omissão do Estado Brasileiro há décadas: o governo não demarca as terras indígenas e deixa de implementar políticas públicas porque as terras não estão demarcadas.
Ao não reconhecer os direitos territoriais dos povos indígenas Guarani e Kaiowá, essas populações passam a lutar pela sobrevivência sem o acesso aos direitos fundamentais garantidos na Constituição Federal. Vivem em situação de fome, desnutrição e sem água potável. Além disso, o cenário fica agravado com a ocorrência de atos de violência contra os Guarani e Kaiowá executados por milícias armadas privadas anti-indígenas, resultando em diversos assassinatos de indígenas.
Em função da complexidade da situação, a comitiva percebeu que ocorre um conflito de competências entre diversos setores e esferas de governo, no qual a Funai e a Sesai ficam sobrecarregadas em função de outros setores estaduais e municipais de governo se recusarem a atender indígenas.
Quais medidas são mais urgentes para atender às necessidades dessas comunidades?
Mirlane Guimarães: O Consea aprovou em plenária do dia 14 de setembro de 2016 um conjunto de Recomendações destinadas ao Conselho Nacional de Justiça, à Fundação Nacional do Índio, ao Governo Estadual do Mato Grosso do Sul, aos Ministérios do Desenvolvimento Social e Agrário, da Educação, da Justiça, da Saúde, à Secretaria Especial de Agricultura Familiar e Desenvolvimento Agrário, à Secretaria Especial de Saúde Indígena e ao Supremo Tribunal Federal.
Resumidamente, as principais medidas são: urgente conclusão das demarcações de terras indígenas; mobilização de força-tarefa para sensibilização do Poder Judiciário no julgamento de recursos judiciais que atrasam as demarcações; fornecimento de documentação civil aos povos indígenas; garantia de matrícula e transporte escolar para crianças residentes em áreas de retomada; recomposição orçamentária da Funai; regularidade de entregas de cestas de alimentos no âmbito dos programas federal e estadual; fornecimento de sementes e equipamentos agrícolas; inclusão de famílias ainda não atendidas pelo Programa Bolsa Família; prioridade para indígenas Guarani e Kaiowá no Programa de Aquisição de Alimentos; urgente garantia de acesso à água potável, especialmente para as áreas de retomada; acesso à saúde prioritariamente para crianças de baixo peso ao nascer e prematuros de alto risco; garantia de segurança e integridade física dos povos indígenas.
O Plansan 2016-2019 traz um conjunto de ações para garantir a segurança alimentar e nutricional dos povos indígenas. De que forma essas ações podem ajudar esses povos?
Mirlane Guimarães: A priorização dos povos Guarani e Kaiowá é a primeira medida fundamental para garantir que as ações previstas no Plansan possam alcançar essas comunidades, bem como a fiscalização e o monitoramento de sua implantação nos municípios.
Fonte: Ascom/Consea