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Líder indígena fala da luta dos povos Guarani e Kaiowá
“A demarcação de terras é essencial para nós. Sem isso não dá para sobreviver e garantir nossos alimentos.” A afirmação é do líder indígena Silvio Ortiz, ex-integrante do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) e membro do Conselho Indígena da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), do Ministério da Saúde. Na semana em que se celebra o Dia do Índio, 19 de abril, Ortiz destaca o quadro alarmante enfrentado pelos povos Guarani e Kaiowá, no estado do Mato Grosso do Sul.
Como é a produção de alimentos dos povos Guarani e Kaiowá?
Silvio Ortiz: Os indígenas não somente plantam. Há um ritual completo em nossa cultura. Exaltamos a lua, o tempo e realizamos danças. Tudo isso conta para o plantio. Plantamos milho, mandioca, batata doce e outros alimentos. Sobre os prejuízos às nossas plantações, além do boicote dos fazendeiros, nossa produção está bastante fragilizada em função de influências externas, como o corte de cana, por exemplo. Estamos sendo prejudicados também na plantação devido à acidez do solo, que é uma consequência do uso de agrotóxicos, e da produção de transgênicos. Isso compromete a nossa roça tradicional.
Quais as consequências que a falta de demarcação das terras traz para a segurança alimentar e nutricional dos povos Guarani e Kaiwoá?
Silvio Ortiz: A não demarcação das nossas terras prejudicou nossa segurança alimentar e nutricional. Muitos colonizadores tomaram o espaço dos indígenas, e estes, como povos retraídos, aguardaram uma decisão final. O problema é que já se passaram 40 anos e nada aconteceu. Com a falta de demarcação de terras, não conseguimos plantar e colher. Não há espaço para todos. Muitos já morreram lutando pelas suas terras. Em Dourados somos 16 mil moradores em 3,4 mil hectares. Há conflito até mesmo interno, disputa de poder e espaço.
O relatório do Consea sobre a visita aos Guarani e Kaiowá retrata dependência química e alcoolismo em uma pequena parcela desses povos. O que tem levado a isso?
Silvio Ortiz: Existem áreas sob comando de traficantes que levam coisas ilícitas para o nosso povo. O cacique tem denunciado isso, mas na prática não temos fiscalização nesse sentido. Estamos em região de fronteira. Por aqui há muita vulnerabilidade na segurança. A Polícia Militar alega que o problema não é de sua competência. Já a Polícia Federal afirma não possuir tempo para agir nesse caso.
Qual a mensagem que você gostaria de deixar em alusão ao Dia do Índio?
Silvio Ortiz: Queremos urgentemente a demarcação de terras. É essencial para nós. Sem isso não dá para sobreviver e garantir nossos alimentos. A ação emergencial de distribuir cestas de alimentação já dura 10 anos e não nos atende. A 6ª Câmara Federal [do Ministério Público Federal] precisa tomar posse do relatório do Consea. Também nos organizamos para ir à Organização dos Estados Americanos para denunciar a não regulamentação das terras indígenas. O Supremo Tribunal Federal tem decidido a favor dos indígenas em algumas situações, mas no nosso caso não. No Dia do Índio, nós fazemos danças lamentando aos deuses a situação que vivemos. Queremos um futuro melhor para nossas crianças.