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Agenda Regulatória da Anvisa: especialista diz que “participação social é imprescindível”
Anvisa regula grande quantidade de temas extremamente importantes para a preservação da saúde dos brasileiros e toda a sociedadepode contribuir. Imagem: Anvisa
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) está com uma consulta pública na internet até o dia 10 de março referente à Agenda Regulatória para o período de 2017 a 2020. O objetivo é receber contribuições da sociedade em relação aos problemas regulatórios em normas de competência do órgão, além de sugestões sobre os temas em andamento na agência e que devem migrar com prioridade para a agenda dos próximos quatro anos.
Nesta entrevista, o advogado Igor Rodrigues Britto, consultor jurídico do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), fala sobre a importância da participação da sociedade na elaboração da agenda e comenta as iniciativas sobre o assunto no Brasil. Ele possui bacharelado, mestrado e especializações em Direito, com foco no Direito do Consumidor. É autor do livro "Infância e Publicidade: proteção dos direitos fundamentais da criança na sociedade de consumo".
Igor Rodrigues Britto foi diretor jurídico e presidente do Procon do Espírito Santo, professor na Faculdade de Direito de Vitória e coordenador de Estudos e Monitoramento de Mercado na Secretaria Nacional do Consumidor, do Ministério da Justiça. Atualmente é professor do Iesb Centro Universitário, em Brasília. Eis a entrevista:
Na sua opinião, vale a pena as pessoas participarem dessa consulta pública? Por quê?
Igor: A Anvisa é uma agência que regula uma grande quantidade de temas extremamente importantes para a preservação da saúde dos brasileiros. Por isso, toda a sociedade tem muito a contribuir. Para isso, a agência precisa ouvir todos os setores afetados por suas futuras normas, como os consumidores, os agentes de mercado e os órgãos estaduais e municipais de vigilância sanitária. Somente assim é possível garantir que suas decisões sejam razoáveis, eficientes e legítimas. Muitas de suas regras acabam sendo questionadas no Judiciário posteriormente, e é preciso garantir por meio de um processo aberto, transparente e previsível que as normas promulgadas pela Anvisa sejam posteriormente respeitadas. As consultas públicas representam o espaço democrático das agências reguladoras, e a participação social é imprescindível para que os técnicos e tomadores de decisão conheçam os problemas, preocupações e demandas reais da sociedade brasileira. Existe sempre o risco que apenas um setor afetado, como a indústria e demais agentes econômicos do mercado regulado, demande a agência, criando uma percepção distorcida dos problemas vividos pelos brasileiros. Por isso, todos devem participar desse processo, para garantir que os temas mais relevantes e urgentes da sociedade façam parte da Agenda Regulatória da Anvisa, evitando que só os interesses econômicos prevaleçam nas suas decisões. As entidades civis cobraram e a Anvisa acatou o pedido de prorrogação do prazo da consulta pública, permitindo a ampliação da participação de todos e do debate [o prazo, que era até 4 de fevereiro, passou para 10 de março].
Quais foram as principais iniciativas no Brasil relacionadas à regulação?
Igor: A qualidade da atividade regulatória no Brasil avançou nos últimos anos após a criação do Programa de Fortalecimento da Capacidade Institucional para Gestão em Regulação (PRO-REG) e do relatório da OCDE para o Brasil de Recomendação sobre Política Regulatória e Governança. Desde então, alguns pequenos processos de reforma das agências se desencadearam, inclusive com a institucionalização em algumas agências de processos e setores específicos de Análise de Impacto Regulatório, que exigiram ampla transparência e busca por dados empíricos e por métodos científicos na tomada de decisão. Não se pode ignorar que a Anvisa foi protagonista nestes avanços. Estabeleceu um manual de boas práticas regulatórias, criou um sistema avançado de AIR e uma Gerência Geral de regulação e Boas Práticas Regulatórias. Outros órgãos reguladores vêm seguindo essa tendência de aperfeiçoamento liderada pela Anvisa, mas precisamos melhorar no Brasil o grau de transparência e controle social das decisões e dos processos regulatórios.
Qual sua opinião sobre a regulação da publicidade de alimentos para crianças?
Igor: A comunidade científica internacional e todas as entidades sérias de profissionais da saúde do Brasil e do Mundo já concluíram em consenso irreversível: a publicidade de alimentos para crianças vem desrespeitando sua condição vulnerável e contribui para hábitos alimentares ruins. A indústria luta por negar essa realidade notória e cientificamente comprovada, mas esta é uma certeza das ciências sociais e da saúde. A exposição das crianças à publicidade de alimentos tem contribuído para obesidade infantil e doenças crônicas. As discussões no Brasil em benefício da proteção das crianças avançam lentamente, quando comparada a países da América Latina e da Europa, em razão da forte pressão da indústria. Eu acredito que a restrição da publicidade infantil de alimentos é inevitável e vai acontecer. Mas a demanda social por isso é muito urgente, e o Congresso Nacional e o Poder Executivo Federal precisam avançar mais rapidamente, seguindo inclusive a tendência atual do STJ que consolidou o entendimento sobre a abusividade das estratégias mercadológicas de oferta de alimentos para o público infantil. É preciso superar de vez essa falácia que educação alimentar e hábitos alimentares das crianças são assuntos de responsabilidade exclusiva da família. A indústria alimentícia tem responsabilidade nesse tema também, e diante de sua omissão e falta de interesse, cabe ao Estado intervir em defesa da saúde pública estabelecendo os limites e as restrições necessárias.
Fonte: Ascom/Consea