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Entidades pedem retirada da urgência do PL 2/2015
Movimentos sociais em favor dos direitos dos povos indígenas e comunidades tradicionais participaram, nesta quarta-feira (18), da segunda audiência pública conjunta, realizada no Senado Federal, para debater o novo marco da biodiversidade. O Projeto de Lei Complementar (PLC) 2/2015 tramita em regime de urgência no Congresso.
Maira Smith, representante da Fundação Nacional do Índio (Funai), destacou a importância dos povos indígenas na “domesticação das plantas e espécies da agrobiodiversidade brasileira que hoje são usadas na alimentação e na agricultura” e disse que “a Funai repudiou todo o processo em que o novo marco legal foi elaborado sem qualquer participação dos povos indígenas”.
A representante da Comissão Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais, Cláudia Pinho, leu uma carta de entidades que representam indígenas, agricultores familiares e comunidades tradicionais apontando dezessete pontos que precisam de alteração e exigem a correção “de forma a assegurar o respeito e a efetivação dos seus direitos legal e constitucionalmente garantidos”.
O diretor do Museu Emílio Goeldi, Nilson Gabas Júnior, disse que o projeto traz tranquilidade para a comunidade científica mas, ainda assim, sugeriu a retirada do regime de urgência. “Nós identificamos alguns pontos que, se não forem corrigidos e bem analisados, podem não só pôr em risco a integridade da soberania nacional mas, ao mesmo tempo, negar às populações tradicionais uma melhor condição de vida e uma efetiva possibilidade de desenvolvimento”, disse ele. Para Gabas Júnior, falta vincular empresa estrangeira e centro de pesquisa brasileiro no acesso ao patrimônio genético e explicitar o direito de decisão dos povos indígenas e quilombolas.
Marciano Toledo, da Via Campesina, também criticou a não-participação dos agricultores familiares durante a elaboração do PL e disse que o projeto atende aos interesses das indústrias. “Não há nenhuma garantia e nós somos os afetados”, disse ele. Marciano também chamou atenção para o ponto do texto que fazreferência à lei de sementes e cultivares, deixando a cargo do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) a definição das sementes crioulas. Marciano Toledo afirmou que é “inadmissível que apenas um ministério tenha autonomia para definir quem é agricultor e o que é semente crioula”
A presidenta do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), Maria Emília Pacheco, defendeu a retirada do pedido de urgência do projeto e a ampliação do debate. “O Consea, ciente da sua missão e do significado profundo desse debate, fez a sua manifestação diante do Executivo, no ano passado e renovou recentemente que fosse retirado o regime de urgência dessa matéria por entender que nós não podemos violar o direito desses povos”, afirmou Maria Emília Pacheco.
Maurício Guetta, do Instituto Socioambiental (ISA), afirmou que a nova lei busca regularizar as irregularidades e viola os direitos dos povos indígenas, comunidades tradicionais e agricultores familiares. De acordo com Guetta, a implantação do cadastro autodeclaratório sem a exigência de aval do órgão de fiscalização é inconstitucional e o projeto pode ser objeto de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn).
Para Sônia Guajajara, representante da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), a aprovação do PL sofre pressão do setor empresarial e prejudica os povos mais afetados pela legislação. “Como transformar conhecimento tradicional em moeda?”, disse ela ao se referir a repartição de lucros, prevista no projeto.
Denildo Rodrigues, representante dos quilombolas, disse que as comunidades tradicionais saem perdendo com o novo projeto. “Tirar conhecimento desses povos é mais uma vez saquear o direito desses povos como vem sem feito ao longo da história”, disse ele. Assim como os movimentos dos povos indígenas e agricultores familiares, Denildo criticou a falta de diálogo durante a elaboração do projeto.
A vice-presidente do Conselho Nacional das Populações Extrativistas, Edel Tenório, refirmou que não são entraves para o desenvolvimento e destacou a importância dos povos e comunidades tradicionais na conservação dos conhecimentos tradicionais. “Muitos recursos ainda existem porque nós resistimos”, disse ela.
Durante o debate, representantes da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Confederação Nacional de Indústria (CNI), Grupo Farma Brasil (GFB), Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) chegaram a um consenso de que o projeto precisa ser aprovado para dar tranquilidade à comunidade científica, avançar nas pesquisas e desburocratizar o acesso ao patrimônio genético.
Em repúdio ao discurso unificado da indústria, entidades da sociedade civil assinaram uma carta conjunta dirigia às empresas.
A audiência foi convocada pelas Comissões de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle (CMA), Agricultura e Reforma Agrária (CRA) e Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática (CCT).
Fonte: Ascom/Consea