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4ª Conferência de SAN + 2
“Quero contar uma coisa a vocês. Eu moro numa comunidade de franciscanos na Hulha Negra, região de Bagé, Rio Grande do Sul, fronteira com o Uruguai, onde tem vários assentamentos e milhares de famílias assentadas. Quero informar a vocês que desde 2006 só enterramos uma criança naqueles assentamentos todos. E não morreu de fome. Zero de mortalidade infantil. São onze anos de infância sem fome no Brasil. É uma conquista histórica. São onze anos de governos Lula e Dilma. Fosse só por este resultado, já teria valido a pena. Isso graças a programas como o Programa de Aquisição de Alimentos. O PAA é o protagonismo resgatado dos sempre esquecidos e dos jovens. E é um aprendizado mútuo entre Estado, governos e sociedade civil organizada. Obra de todos nós.”
As palavras são de Frei Sérgio Görgen, em nome do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), no Seminário ‘PAA + Aquisição de Alimentos - Ano da Agricultura Familiar, Camponesa e Indígena’, comemorativo aos dez anos de existência do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), Brasília, fevereiro de 2014.
A proposta do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) foi gestada no Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea). O Conselho estará realizando, de 18 a 20 de março, em Brasília, a 4ª Conferência de Segurança Alimentar e Nutricional + 2, título (quase) enigmático, ou sopa de letrinhas, deste artigo.
No intervalo entre uma Conferência Nacional e outra, realiza-se um encontro, com caráter de reunião ampliada, com os seguintes objetivos: “Mobilizar a sociedade civil e o governo para a consolidação do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan) e a efetivação da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PSAN); realizar balanço das proposições da 4ª Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, acontecida em Salvador, BA, em 2011; monitorar a implementação e apresentar propostas para revisão do Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Plansan).
Segundo a presidenta do Consea, Maria Emília Pacheco, a Conferência + 2 é uma experiência inédita. Não é uma Conferência, não está prevista a votação de novas propostas e os participantes, em torno de 350, não exercerão papel de delegados. Vai-se discutir o presente - o andamento das políticas e programas. Vai-se olhar o passado - o que foi feito nos últimos anos. Vai-se debruçar sobre o futuro – tendências, cenários e desafios.
Haverá ainda Atividades Integradoras – espaços de diálogo e de compartilhamento de informações, para que sociedade e governo apresentem experiências relacionadas à segurança alimentar e nutricional.
Já é uma longa história. Nos anos 1990, Lula apresentou um Plano de Segurança Alimentar ao presidente Itamar Franco, a Betinho e a D. Mauro Morelli. Fruto dessa iniciativa, em 1993, é criado o Consea e em 1994 é realizada a 1ª Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional em Brasília.
Durante oito anos esta história é interrompida: o Consea é extinto em 1995. Eleito presidente, Lula recria o Consea em 2003 e propõe o Fome Zero. A 2ª Conferência acontece em 2004, em Olinda, Pernambuco. Em 2006, é sancionada a Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (Losan), que institui o Sistema de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan). Em 2007, acontece a 3ª Conferência em Fortaleza e é criada a Frente Parlamentar de Segurança Alimentar e Nutricional. Em 2008, é instalada a Câmara Interministerial de Segurança Alimentar de Segurança Alimentar e Nutricional (Caisan), coordenada pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS). Em 2009 acontece a Campanha ‘Alimentação; Direito de todos’, proposta de Emenda Constitucional 047/2003, aprovada em 2010, que inclui a alimentação como direito fundamental no artigo 6º da Constituição Federal. Em 2011, é anunciado o Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Plansan) – 2012-2015 e realiza-se a 4ª Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, em Salvador, Bahia. E agora, 2014, acontece a 4ª Conferência + 2.
A construção das políticas e programas de segurança alimentar e nutricional é hoje exemplo, não só no Brasil, mas no mundo. Dezenas de delegações de todos os países e continentes querem conhecer como nestes últimos anos combateu-se a fome, a miséria, a desnutrição; como os povos e comunidades tradicionais, historicamente esquecidos, integram-se e ajudam a formular estas políticas e programas; como funcionam o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE); como a agricultura familiar, camponesa e indígena, que fornece 70% dos alimentos que chegam à mesa de brasileiras e brasileiros, é apoiada e incentivada; como a agroecologia e produção orgânica começam a integrar-se na consciência e no cultivo de agricultores e consumidores; como políticas de nutrição e alimentação adequada e saudável são fruto da construção coletiva e articulada entre governos, federal, estaduais e municipais, e sociedade civil.
Há muito por fazer? Há muito por fazer. A fome, a miséria e a desnutrição diminuíram muito no Brasil, mas ainda não acabaram. Há outro problema, crescente, a enfrentar, a obesidade, em especial de crianças e adolescentes. Há os agrotóxicos e transgênicos, que impedem uma alimentação adequada e saudável. É preciso enfrentar a ainda enorme desigualdade socioeconômica, para que os alimentos cheguem igualmente a todas as brasileiros e todos os brasileiros.
Frei Sérgio, todas e todos que construíram estas políticas e programas ao longo do tempo estão felizes e podem orgulhar-se. Fruto da luta, fruto da organização e da consciência, fruto da parceria entre governos e sociedade, o Brasil tem uma Política Nacional de Segurança Alimentar e Ntricional respeitada, inclusive internacionalmente. A 4ª Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional +2, de 18 a 20 de março, em Brasília, vai reafirmar a política, aprender com a história e as experiências, e pensar os desafios do futuro.
*Selvino Heck é assessor especial da Secretaria Geral da Presidência da República