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Previdência, transparência e liberdade: entenda os conceitos do projeto de lei que regulamenta o transporte de aplicativos
Projeto de Lei foi enviado ao Congresso após assinatura do presidente Lula na última segunda-feira, 4 de março. Foto: Ricardo Stuckert / PR
Idernani do Carmo, de 43 anos, não se esquece do peso que a quebra de um tornozelo em um acidente, em março de 2023, teve em sua rotina. Motorista de aplicativo desde 2016, ele se viu impedido de cumprir o cotidiano de horas de trabalho nas ruas de Brasília (DF) para garantir o sustento da família. Sem direitos previdenciários ou proteção extra, viu os boletos se acumularem e as dificuldades financeiras se ampliarem.
Tive de ficar sem trabalhar por mais de cinco meses por um acidente. Foi prejudicial demais porque não tinha realizado contribuições ao INSS. Fiquei todo esse período sem trabalhar, sem ajuda ou benefício. Passando necessidades, tendo apenas a ajuda de cesta básica, de amigos, vizinhos e parentes"
Idernani do Carmo, sobre uma das situações que o Projeto de Lei pretende solucionar
“Tive de ficar sem trabalhar por mais de cinco meses. Foi prejudicial demais porque não tinha realizado contribuições ao INSS. Fiquei todo esse período sem trabalhar, sem ajuda ou benefício. Passando necessidades, tendo apenas a ajuda de cesta básica, de amigos, vizinhos e parentes", recordou.
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O relato é similar ao de Douglas Santiago Machado, que se viu duplamente desamparado na pandemia da Covid-19. Primeiro, pela redução abrupta no número de corridas. Depois, por ter contraído o vírus, o que lhe tirou a possibilidade de rodar por semanas. “Você não poder trabalhar é complicado. A gente vive disso, a família depende, tem criança pequena, é escola, tudo”.
É a partir da escuta de questões como essa e em articulação com representantes da categoria e das empresas que o Governo Federal apresentou nesta semana um projeto de lei ao Congresso Nacional para regulamentar o Trabalho por Aplicativos de Transporte de Pessoas.
O texto se pauta numa autonomia com suporte de direitos básicos e na manutenção da liberdade e flexibilidade da categoria com garantias. Prevê uma série de benefícios para proporcionar condições mais justas aos profissionais. Reconhecendo a importância do trabalho e protege direitos fundamentais. “O que nasce aqui é uma organização de uma categoria diferenciada: autônoma com direitos, que é exatamente o que os trabalhadores pediram”, resumiu o ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho.
Confira detalhes e comentários:
PROTEÇÃO - A legislação prevê contribuição para a Previdência Social, para garantir aos motoristas benefícios como auxílio-doença, aposentadoria e licença maternidade. Os aplicativos vão contribuir com 20% para garantir benefícios e o motorista com 7,5% em cima dos rendimentos efetivos. Presidente do Sindicato dos Motoristas de Aplicativos do Distrito Federal, Marcelo Chaves explica que esses 7,5% não serão calculados sobre o ganho total do trabalhador. Na verdade, o texto entende que 75% da renda no trabalho com aplicativos é relativa a gastos relacionados ao veículo, como combustível e manutenção. Assim, apenas 25% equivaleria ao salário do motorista. “Desse modo, o desconto de 7,5% para contribuição ao INSS será apenas em cima desses 25% considerados o salário do trabalhador”, relata Marcelo Chaves.
RENDIMENTO MÍNIMO - Os motoristas terão garantido um rendimento mínimo por hora trabalhada, de R$32,09. A remuneração é proporcional ao salário mínimo. No valor, estão R$ 8,03 de retribuição pelos serviços prestados e R$ 24,07 de ressarcimento por custos na prestação do serviço. Os valores serão reajustados mediante valorização do salário-mínimo. “Um dos maiores desafios da categoria é receber como motorista autônomo, né? A principal mudança, eu acredito, que ainda vai ser o ganho real efetivo do trabalhador, porque aqui a gente vai estar garantindo um piso mínimo”, afirmou Carina Trindade, também motorista por aplicativo.
JORNADA - O período máximo de conexão do trabalhador a uma mesma plataforma não poderá ultrapassar 12 horas diárias. Para receber o piso nacional, o trabalhador deve cumprir carga mensal de 176 horas, ou uma jornada de 8 horas efetivamente trabalhadas.
TRANSPARÊNCIA – O motorista passa a ter critérios claros e acessíveis sobre viagens, pontuações, ofertas de viagem e penalidades, além de informação detalhada sobre como a remuneração é calculada. “Hoje em dia a gente tem zero de transparência, né? Ficamos desamparados de de todas as formas. Você ganha um valor x por uma corrida, daqui a cinco segundos ganha outro e não sabe quanto a plataforma está tirando”, apontou Douglas Santiago.
DEFESA - Qualquer medida disciplinar, como bloqueio, suspensão ou exclusão da plataforma, só pode ocorrer em casos de fraude, abusos ou mau uso da plataforma. Motoristas devem ter direito de se defender e contestar decisões tomadas pelas empresas.
NEGOCIAÇÃO COLETIVA - Com a regulamentação, as empresas passarão a negociar e fazer acordos coletivos com os motoristas. Assim, os trabalhadores terão a oportunidade de participar ativamente das decisões que afetam suas condições de trabalho.
LIBERDADE ASSEGURADA - Os motoristas continuam a ser “donos do próprio volante”, mantendo autonomia para organizar o tempo e horários de trabalho. Podem continuar conciliando atividades profissionais com outras responsabilidades, sem abrir mão de direitos e benefícios. “Muitos trabalhadores ainda não entenderam, mas é preciso entender que é muito importante ter o suporte, em especial da Previdência, porque hoje ele não tem nada e vai ter isso garantido com esse projeto de lei”, ponderou Carina Trindade.
OIT - Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), as plataformas digitais de trabalho quintuplicaram em todo o mundo na última década. Esse crescimento evidencia a necessidade urgente de diálogo político internacional e cooperação regulatória para garantir empregos decentes e promover o desenvolvimento sustentável dos negócios.