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A Doença de Creutzfeldt-Jakob (DCJ) é uma doença priônica humana rara, neurodegenerativa, progressiva e fatal, caracterizada por provocar um quadro clínico inicial de demência, desordem cerebral com perda de memória e tremores, associados a outros sinais e sintomas neurológicos e multifocais. É um tipo de Encefalopatia Espongiforme Transmissível (EET) que acomete os humanos. As EET são chamadas assim por causa do seu poder de transmissibilidade e suas características neuropatológicas que causam alterações espongiformes no cérebro das pessoas (aspectos esponjosos).
A causa e a transmissão desta doença estão ligadas a uma partícula proteinácea infectante denominada de “PRÍON” (do Inglês Proteinaceous Infections Particles). Os príons são agentes infecciosos de tamanho menor que os vírus, formados apenas por proteínas altamente estáveis e resistentes a diversos processos físico-químicos. Para a Organização Mundial de Saúde (OMS), a definição de um caso suspeito da doença se baseia nas análises dos exames, sinais e sintomas e história epidemiológica do paciente. Desta forma, o caso pode ser definido como possível, provável e definitivo, mas a confirmação final só pode ser feita por meio da necropsia com a análise neuropatológica de fragmentos do cérebro que envolvem a realização de testes histopatológicos e/ou imunohistoquímicos.
A partir do ano de 2005 até o ano de 2021, foram registradas no Brasil 1.576 notificações de casos suspeitos da DCJ, com registros mais frequentes em pessoas residentes nas Regiões Sul, Sudeste e Nordeste. Os estados com maior número de casos suspeitos notificados no período foram: São Paulo com 32,5% (512), Paraná com 12,0% (189) e Minas Gerais com 10% (158). A maior frequência de notificações foi registrada entre as idades de 55 a 74 anos, representando 60,2% (994) do total. Quanto ao sexo, foi observada pequena variação, sendo 53,6% (845) de casos suspeitos do sexo feminino e 46,3% (730) do sexo masculino.
Desde 2005 a DCJ integra a Lista Nacional de Doenças de Notificação Compulsória. A Vigilância Epidemiológica está sob a Coordenação-Geral de Vigilância de Zoonoses e Doenças de Transmissão Vetorial (CGZV), Departamento de Doenças Transmissíveis (DEDT), Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente (SVSA) do Ministério da Saúde (MS) e tem como principais objetivos detectar casos da doença, conhecer o seu perfil epidemiológico e definir medidas de biossegurança.
As principais formas clínicas da DCJ são as seguintes:
Esta forma é responsável por aproximadamente 85% dos casos confirmados da doença. Não apresenta causa e fonte infecciosa conhecida, assim como, não apresenta um padrão de transmissibilidade reconhecível, nem está correlacionada com a presença da doença na história familiar do paciente ou possível consumo de carne e/ou viagens internacionais realizados. Também não está relacionada a um padrão socioeconômico ou geográfico. Geralmente acomete pessoas com média de idade de 65 anos e já foram relatados casos em pessoas entre os 14 aos 92 anos de idade.
Causando entre 5% a 15% dos casos da DCJ, esta forma acontece por mutações hereditárias do gene (PRNP) que codifica a produção da proteína priônica. Nessa apresentação clínica não é possível diferenciar a DCJ hereditária da DCJ esporádica, apenas um teste genético para detecção da mutação poderá orientar o diagnóstico, complementando avaliação de vínculo familiar consanguíneo. Frequentemente, a DCJ hereditária é diagnosticada em idade mais precoce (cerca de 50 anos) com demência tardia e curso mais longo da doença do que é observado na DCJ esporádica. Ressalta-se que nem todas as pessoas que apresentam mutações no gene vão desenvolver DCJ no futuro.
A doença de Creutzfeldt-Jakob forma iatrogênica pode ser adquirida pela exposição à proteína priônica anormal (PrPSc). Esta forma é responsável por menos de 1% dos casos conhecidos da doença e pode ser transmitida por procedimentos invasivos (transmissão acidental) via instrumentos e equipamentos cirúrgicos contaminados (ex. instrumentos neurocirúrgicos ou eletrodos intracerebrais contaminados), transplantes de córnea ou meníngeos (enxertos de dura-máter) ou pela administração de hormônios de crescimento extraídos de hipófise de cadáveres e gonadotrofinas cadavéricas. Os sinais e sintomas são semelhantes com os da DCJ esporádica. A transmissão pode ser evitada pela implementação de práticas adequadas de biossegurança, utilizando de forma adequada os Equipamentos de Proteção Individual (EPI) e Equipamentos de Proteção Coletiva (EPC), e procedimentos de desinfeção.
A forma exata de transmissão da doença de Creutzfeldt-Jakob (DCJ) esporádica é desconhecida. Não existe evidência científica indicando que a doença possa ser transmitida pelo ar ou pelo contato diário social e casual com os pacientes, como vestimenta, uso comum de copos e utensílios de cozinha ou contato íntimo (abraço, beijos, relações sexuais etc.). Portanto, não apresenta risco diferencial para os familiares do paciente em relação ao cidadão comum. Além disso, não existem casos relatados associados à exposição ao agente etiológico da DCJ em superfícies como pisos, paredes ou bancadas.
No caso da DCJ, até o momento, não há evidências de que seja transmitida por contato casual com alguém que tenha a doença. As medidas de prevenção estão voltadas para o uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPI) e aplicação de medidas de biossegurança, limpeza, desinfecção e esterilização de instrumentos cirúrgicos para evitar a infecção iatrogênica.
As manifestações clínicas são variáveis e inespecíficas, mas a doença pode se apresentar através de um quadro clínico inicial de demência associada a outros sinais e sintomas neurológicos multifocais e psiquiátricos, como desordem cerebral, perda de memória, tremores, ataxia, afasia, falta de coordenação motora, distúrbios visuais, espasmos musculares (mioclonia) e alterações de comportamento. Também podem ser esperados: dor de cabeça, fadiga, sono, falta de apetite e distúrbios da linguagem. O paciente apresenta uma piora rápida e progressiva após o início dos sinais e sintomas. Conforme a progressão do quadro, pode ocorrer insônia, depressão, ataques epiléticos, paralisia facial, dentre outros. A degeneração progressiva das habilidades psicomotoras de pessoas acometidas pela DCJ é bem mais acelerada quando comparada com outras demências.
Destaca-se que as manifestações clínicas são semelhantes com outras classes de demências e transtornos neurológicos progressivos como Alzheimer ou a doença de Huntington. Além disso, a busca do diagnóstico deve descartar outras causas possíveis de demência tais como encefalites e meningites crônicas.
O diagnóstico preciso da DCJ é muito desafiador. Essencialmente inespecíficos, diversos exames ajudam no diagnóstico de um caso suspeito e caracterização das formas da doença: Eletroencefalograma (EEG), Ressonância Magnética (RM), Tomografia computadorizada (TC), sequenciamento completo e identificação do gene (PRNP) que codifica a produção da proteína priônica e análise de líquor para detecção da Proteína 14-3-3. No entanto, a confirmação definitiva só acontece através de análise de fragmentos do cérebro coletados a partir de biopsia ou necropsia para a realização de testes histopatológicos e/ou imunohistoquímicos para identificação da proteína do príon patogênico (PrPSc) e/ou presença de fibrilas positivas para PrPsc.
A Biologia Molecular é o método capaz de diferenciar as formas da doença. Através do sequenciamento, é possível identificar as mutações no gene que podem gerar a proteína alterada (PrPsc) e confirmar a forma esporádica ou hereditária. Além de alertar a família sobre a possibilidade de desenvolvimento da doença, é importante para entender a sua evolução e auxiliar em futuras formas de prevenção e de tratamento.
Apesar de várias propostas terapêuticas terem sido estudadas, nenhuma até o momento foi efetiva para alterar a evolução fatal da doença. Aproximadamente 90% das pessoas acometidas pela doença de Creutzfeldt-Jakob (DCJ) evoluem para óbito em um ano. Atualmente, é recomendado oferecer suporte terapêutico e realizar o controle das complicações. Desta forma, é essencial abordar os aspectos físicos, as necessidades nutricionais, psicológicas, educacionais e sociais do paciente, bem como, as necessidades emocionais dos familiares. É necessário realizar um planejamento coordenado para a transferência de cuidados da unidade de saúde para o acompanhamento em domicílio.