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Eu quero ter peso saudável
Por que prevenir e cuidar da obesidade?
Do ponto de vista conceitual, a obesidade é caracterizada pelo acúmulo anormal ou excessivo de gordura corporal, que leva ao aumento de peso e provoca prejuízo à saúde. Essa condição pode trazer prejuízos à saúde justamente pela sobrecarga que gera ao organismo. Outros fatores de risco podem estar associados às doenças crônicas, como é o caso da hipertensão, do diabetes mellitus, das doenças cardiovasculares. E uma série de problemas na coluna, nos joelhos, cansaço, dificuldades de locomoção, respiração, para dormir, pedra na vesícula, refluxo esofágico e alguns tipos de câncer.
Sem dúvida alguma, todos esses são fatores podem afetar a qualidade de vida de qualquer pessoa. Ainda mais quando entramos no outro lado dessa moeda: a maneira como a obesidade pode levar a estereótipos e discriminação. E é justamente neste ponto que percebemos como aspectos sociais e psicológicos do indivíduo podem ser afetados, para além da questão física.
Segundo Poliana Cardoso Martins, Professora de Nutrição e do Mestrado em Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia, um dos debates atuais no cuidado da pessoa com sobrepeso e obesidade tem relação direta com os múltiplos fatores associados à sua determinação. Nesse sentindo, os pesquisadores que defendem a obesidade enquanto doença que pode ser determinada por aspectos internos do indivíduo, como a genética, por exemplo e por influências ambientais, privações socioeconômicas, disponibilidade imediata de alimentos saudáveis e ultraprocessados. Este último se refere ao chamado ambiente alimentar. Entender esses dois lados ajuda a reconhecer o problema como algo multifatorial. Ou seja: as causas podem ser várias.
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Entendendo o modelo da obesidade cíclica
Mesmo diante da ideia de que o acúmulo de peso é influenciado por diversos fatores, pessoas com obesidade são frequentemente percebidas como responsáveis pelo corpo que possuem. Segundo Poliana, atualmente o corpo gordo é visto como fracassado, guloso, sem esforço, preguiçoso. Enquanto o corpo magro é associado a sucesso, felicidade, disciplina e controle.
Esse conceito pré-definido é preconizado socialmente e pode variar de acordo com os contextos sociais, culturais e históricos que estão presentes. Mas em geral, se resume à patologização excessiva do corpo gordo, colocando-o como doente. Então a culpabilização da pessoa com obesidade é a base do estigma social do peso, quando ele é visto como uma falha pessoal, reforça a professora.
É nesse ponto que começamos a falar das consequências à saúde que vão muito além das doenças crônicas citadas acima. Tratar a questão do peso elevado com tamanho estigma não diz apenas sobre a pessoa que o possui. Fala também sobre uma sociedade que constantemente fomenta certa aversão ao ganho de peso, temendo-o de maneira assustadora. Tornando a situação ainda mais difícil para quem convive com ela.
A questão é que esse comportamento social faz girar uma espécie de roda invisível, sendo esse o modelo da obesidade cíclica. Para entender melhor essa engrenagem, é preciso lembrar que as pessoas com obesidade são mais suscetíveis ao desenvolvimento de transtornos de saúde mental, especialmente ansiedade e depressão. O que por si só já impacta no estado emocional e na autoestima.
“Quando pensamos nesse modelo de obesidade cíclica, fundamentada principalmente no estigma do peso, temos a situação de uma pessoa que sofre com ele, tem uma redução da sua saúde mental e, consequentemente, todo esse sofrimento a leva a uma maior tendência do comer emocional. O que resulta em um maior ganho de peso. Funcionando como um ciclo que se repete”, explica a especialista.
Essas situações estigmatizantes podem ser percebidas em diversos ambientes, como no trabalho, nas instituições de ensino, saúde e até mesmo dentro das famílias ou ciclos de amizade. No caso das crianças e adolescentes, eles são frequentemente alvos de bullying, além de estarem mais propensos a vivenciar o isolamento social. Para esse grupo, o reflexo pode ser sentido até na vida adulta.
Um outro espaço que não só traz o preconceito, mas também o reforça, é a mídia. Sobre isso, a nutricionista destaca a maneira como a obesidade tem sido retratada nos principais veículos de comunicação. “Quantos e quantos memes a gente encontra diariamente nas redes sociais onde o indivíduo que vive com obesidade é sempre retratado como aquele que não tem ‘foco, força e fé’ Toda a vulnerabilidade que esse indivíduo experimenta traz grandes consequências para sua saúde física e emocional”, finaliza.
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Interrompendo o ciclo
Cuidar do ganho excessivo de peso e encontrar oportunidades para uma alimentação saudável e incentivo à prática de atividade física é de fato importante para a prevenção e o controle de tantas doenças já mencionadas até aqui. Mas a maneira de colocar isso em prática pode estar precisando de uma revisão pois o peso não pode ser o foco único e principal do cuidado. Segundo Poliana, o discurso do peso saudável e de responsabilização do indivíduo pela sua história muitas vezes distancia essa pessoa do cuidado ao invés de aproximar.
“Primeiro ponto importante a se pensar é que só a conscientização sobre as consequências negativas do estigma do peso não vai ser suficiente para resolver esse problema. É preciso desafiar e mudar crenças que estão profundamente enraizadas. É necessário pensar em uma nova narrativa para discutir a obesidade, o estigma do peso e a gordofobia”, explica a profissional.
O desafio é utilizar uma abordagem baseada na ideia de enxergar a pessoa para além do seu peso e do seu corpo. A professora lembra ainda que, dentro dessa lógica, é importante aumentar a autorreflexão dos profissionais de saúde e da população como um todo em relação a atitudes verbais e não verbais sobre o peso e o corpo do outro. É importante identificar a necessidade dos cuidados, mas também entender as características de vida de cada pessoa que têm relação intrínseca com o ambiente em que vivem.
Sendo a obesidade uma doença crônica e multifatorial, os cuidados e estratégias são de longo prazo. E durante essa jornada é essencial que a pessoa em tratamento se mantenha motivada para cuidar de si mesma. Independente de resultados aparentes em relação ao peso, mudanças no estilo de vida devem ser valorizadas ainda que possam parecer pequenas. Como uma melhoria discreta na alimentação, porém gradativa. Ou ainda o início de uma atividade física, mesmo que não seja na intensidade ideal ainda.
“Manter um peso estável é uma grande conquista. A história natural é que nosso peso aumente ao longo dos anos. Por isso, é fundamental reconhecer ações positivas mesmo que elas não tenham resultados específicos na perda de peso. É importante que a gente evite o uso de uma linguagem combativa para que a pessoa se mobilize a estar junto no cuidado à saúde”, finaliza a nutricionista.
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