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Saúde Indígena
No Pará, parteiras compartilham saberes seculares com equipes de saúde indígena
O Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) Rio Tapajós está promovendo uma série de encontros com o objetivo de promover o vínculo entre as parteiras tradicionais e os profissionais das equipes multidisciplinares de saúde indígena. A segunda edição do evento, realizada na aldeia Kamaú, região do Polo Base Novo Progresso, no sudoeste do Pará, reuniu 23 parteiras da etnia Kaiapó. Outros dois encontros serão realizados nos próximos meses.
“A prática do partejar permite a perpetuação da cultura indígena. O compartilhamento de saberes entre parteiras e trabalhadores do DSEI estabelece vínculos e fortalece e otimiza o atendimento prestado nas aldeias, pois cada um percebe sua própria importância dentro do Sistema, sem interferir na cultura local”, garante a coordenadora distrital, Cleidiane Carvalho.
A enfermeira Patrícia Sousa, responsável técnica de Saúde da Mulher, diz que a intenção é conhecer melhor as experiências e, pela troca de saberes, melhorar os serviços de saúde, fortalecendo e aprimorando a tradição do partejar. “Não podemos desvalorizar essa tradição enraizada na cultura indígena”, disse.
Na metodologia, dinâmicas de escuta qualificada, observação e diálogo compartilhado. Além disso, a Cartilha da Parteira – uma cartilha ilustrada com situações corriqueiras relativas ao pré-natal, parto e puerpério – compõe o material entregue aos participantes.
“Por meio das ilustrações da cartilha, as parteiras identificam suas experiências e colorem as situações. Nesse ínterim, os profissionais de saúde relatam suas próprias experiências com a mesma situação. E assim se deu a troca”, conta a nutricionista Maria Eliane Gonçalves.
Ela pontua que os saberes de cada uma das práticas, seja tradicional indígena ou da medicina ocidental, devem atuar em parceria na medida em que se somam no atendimento à mulher.
INEDITISMO
Além de todos os resultados alcançados nos encontros, estão sendo catalogadas ervas medicinais utilizadas pelas parteiras, que também mostram como e quando utilizá-las.
“Essa foi a primeira vez que elas abriram sua cultura para outras pessoas, um marco para a saúde indígena Kaiapó. A confiança que construímos entre parteiras e equipe, e o seu comprometimento em colaborar com as equipes multidisciplinares, possibilitará a parceria entre comunidade e profissionais de saúde, qualificando o serviço”, ponderou a psicóloga Lílian Felix, facilitadora do evento.
Para a enfermeira Patrícia, conhecer mais profundamente a cultura das parteiras, de maneira tão próxima, foi surpreendente. “A cultura Kaiapó é riquíssima e bastante preservada. As parteiras esperam a natureza fazer a sua parte; esperam o tempo da mulher para realizar o parto e evitam, ao máximo, interferir nesse processo”.
“Foi uma mostra encantadora de respeito entre parteiras tradicionais e profissionais das equipes multidisciplinares”, recorda Thaís Magalhães, responsável pela Divisão de Atenção à Saúde Indígena (Diasi), do Distrito.
Ela lembra que os profissionais ficaram surpresos ao se deparar com práticas seculares que nunca haviam tido contato antes. “Essas mulheres trazem consigo saberes inestimáveis. Fortalecem sua cultura por meio da oralidade, passando o conhecimento através das gerações”, conta Thaís.
A coordenadora Cleidiane alega que convergir saberes tradicionais e da medicina ocidental promoverá partos humanizados e de acordo com a realidade Kaiapó. “É notória a ânsia e o interesse dessas sábias mulheres em transmitir seus conhecimentos para as novas gerações. Esses encontros tornam visível a prática do partejar. E conhecer as duas vertentes [tradicional e ocidental] permite que entendamos que o único objetivo de ambas é promover a saúde da mulher”, conclui.
Por Déborah Proença
Fotos: Acervo / DSEI Rio Tapajós