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Saúde Indígena
Ação leva cirurgias e atendimento especializado a indígenas que vivem no Amazonas
Quinze toneladas de equipamentos e outras sete de gêneros alimentícios. Cerca de 150 profissionais envolvidos e quatro meses de preparação. Doze geradores de alta potência funcionando ininterruptamente, abastecidos por 54 mil litros de combustível que garantem também o ir e vir de aeronaves e embarcações. Expectativa de atender mais de 2.000 indígenas e realizar aproximadamente 250 cirurgias, tudo em plena floresta amazônica.
Os números expressivos refletem parte dos desafios para levar cirurgias e assistência médica especializada a indígenas que ainda vivem geograficamente isolados na região Norte do Brasil. A ação resulta do esforço coletivo de governos, da organização sem fins lucrativos Expedicionários da Saúde (EDS), da própria comunidade indígena e de outros parceiros importantes, como laboratórios farmacêuticos.
Os investimentos e a participação efetiva de órgãos do Governo Federal, como a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), do Ministério da Saúde, e o Ministério da Defesa, por meio do Exército e da Força Aérea Brasileira (FAB), são decisivos para o êxito da expedição. "Nossos parceiros são a grande riqueza desse projeto que traz cidadania e qualidade de vida a esses povos", afirma Márcia Abdalah, coordenadora-geral de logística do EDS.
Segundo ela, só mesmo o empenho e a dedicação de todos os envolvidos permitem atingir o propósito maior da expedição. "Cuidando dessas populações, garantimos a preservação delas e da floresta. É uma forma de mantê-los em seu território, sem que haja necessidade de buscarem tratamento em centros urbanos. Assim, mantêm-se afastados de nossa sociedade e de tudo aquilo que ela oferece de não-benefícios para eles", comenta Márcia.
O ortopedista Ricardo Afonso Ferreira, um dos idealizadores do projeto, destaca a evolução gradativa do Expedicionários da Saúde. "Desde a primeira edição, realizada em abril de 2004, o escopo e os desafios têm aumentado a cada vez. O Governo Federal é um importante parceiro, pois os custos de uma operação como esta são bastante elevados. Porém, os bens imateriais que deixamos para as comunidades nos dão a certeza de que estamos no caminho certo", pontua.
"É uma população escassa e que vive dispersa numa região muito vasta. Como já recebem atenção básica, por meio das ações da Sesai, unimos esforços para promover cirurgias e atendimento especializado. Para isso, contamos com um grande grupo de médicos, enfermeiros e logísticos, todos voluntários. São profissionais que deixam suas rotinas de trabalho nas grandes cidades e embarcam conosco nessa experiência antropológica", acrescenta Ricardo Ferreira.
VOLUNTARIADO
Carlos Scapari é enfermeiro e atua no Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) de Limeira, em São Paulo, distante 60 quilômetros de Campinas. Nos últimos dois meses acumulou todas as suas folgas para, durante esta semana, dedicar-se ao cuidado de pacientes em território yanomami. "Nunca estive na Amazônia e este é o meu primeiro contato com povos indígenas. Uma experiência única e que pretendo repetir", assegura.
O trabalho de profissionais como Carlos, que nunca se depararam com as especificidades de cuidar da saúde de indígenas, ganha sentido com o reforço das equipes da Sesai. Setenta e cinco trabalhadores do Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) Yanomami, com sede em Boa Vista, estão empenhados desde a fase inicial de preparativos e triagem de pacientes. São equipes de enfermagem, infraestrutura e logística, farmácia, nutrição e epidemiologia, além de intérpretes e barqueiros.
"Os trabalhadores mobilizados são justamente das regiões de origem dos pacientes. É na companhia deles que os indígenas sentem mais confiança para os procedimentos, pois são as pessoas que estão no dia a dia da assistência", explica o enfermeiro Bruno Tomaz, gerente técnico de Saúde do DSEI Yanomami. Ele destaca, ainda, que a maioria está como voluntária na expedição, em períodos de folga nas escalas de trabalho.
Denisson Morais é da área de Epidemiologia do Distrito Yanomami e trabalha há 14 anos com povos indígenas. Em Maturacá, está como voluntário na equipe de acolhimento aos pacientes que chegam de dezenas de comunidades da região. "Participei também da expedição em Surucucu, no Norte de Roraima, e é sempre gratificante. A troca de experiências entre as equipes da Sesai e do EDS é outro bônus do trabalho. Aprendemos muito uns com os outros", garante.
LOGÍSTICA
A infraestrutura para montar um centro cirúrgico móvel em meio à floresta é, sem dúvida, o maior dos desafios para a expedição. "Estamos numa região banhada por pequenas bacias hidrográficas. Por isso, toda a carga pesada de equipamentos e alimentação precisou ser transportada em aeronaves que vieram de Boa Vista - em quase três horas de voo - e de São Gabriel da Cachoeira, distante 40 minutos num avião de pequeno porte. Dezenas de idas e vindas", explica Luis Macedo, militar de reserva e voluntário do EDS.
Aproximadamente dois terços dos pacientes também estão sendo deslocados até Maturacá em aviões e helicópteros do Exército, da FAB e alugados pelo DSEI Yanomami. As aeronaves partem de 17 localidades. Muitos indígenas, porém, fazem longos trajetos fluviais de até um dia e meio para chegar ao local de decolagem, sempre acompanhados por um profissional da Sesai. Na maioria dos casos é o agente indígena de saúde da própria comunidade quem desempenha esse papel.
"Complexidade é palavra-chave desse trabalho. A todo instante nos deparamos com situações desafiadoras, desde a fase inicial de preparativos até o dia a dia de cirurgias e atendimentos. Felizmente o desejo de fazer mais e melhor também é proporcional ao volume de desafios, em todas as frentes. A dedicação dos profissionais é integral e faz tudo valer a pena", afirma a enfermeira Soane Santos, da equipe de Atenção à Saúde Indígena, do Ministério da Saúde.
Por Bruno Monteiro
Fotos: Alejandro Zambrana / Sesai-MS