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A Receita Federal reuniu autoridades e especialistas nesta quinta-feira (20/03) para discutir o equilíbrio necessário entre transparência pública e sigilo fiscal, tema crucial diante das recentes transformações no sistema tributário nacional. Durante o evento, chamado "Sigilo Fiscal: entre os limites da transparência e o dever de cooperação", foram abordados tanto os avanços já alcançados, como a divulgação dos gastos tributários pelo Brasil, quanto os desafios ainda enfrentados, especialmente na América Latina. Os participantes ressaltaram a importância de ampliar o acesso da sociedade às informações fiscais, sem comprometer o direito à privacidade dos contribuintes, e apontaram caminhos para uma governança fiscal mais clara, eficiente e responsável.
Na abertura do encontro, o secretário especial da Receita Federal, Robinson Barreirinhas, destacou que a recente reforma tributária trouxe exigências para ampliar o acesso a dados fiscais, mas ressaltou que é fundamental garantir equilíbrio para proteger direitos individuais. "Transparência irrestrita e sigilo absoluto são cenários insustentáveis na governança pública", afirmou Barreirinhas durante a live organizada em parceria com a Universidade de São Paulo (USP) e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).
Em um momento marcado por mudanças no sistema tributário e pela crescente importância da cooperação internacional, os participantes elogiaram a atuação do Fisco brasileiro, especialmente pela decisão de tornar públicos os chamados gastos tributários. Os especialistas ressaltaram que essa iniciativa representa um avanço significativo rumo à transparência e uma medida que facilita o entendimento da sociedade sobre como são utilizados os recursos públicos.
Marcus Abraham, desembargador federal e vice-presidente do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) foi o primeiro a participar da live. Ele destacou a importância do equilíbrio entre a proteção da privacidade do contribuinte e a necessidade de transparência nas relações tributárias. Com mais de três décadas de experiência na área tributária, Abraham alertou sobre mudanças no perfil da judicialização tributária ao longo das últimas décadas.
Segundo ele, houve uma queda significativa nas execuções fiscais, principalmente pela adoção de políticas alternativas pela Fazenda Pública. Em contrapartida, cresceram os casos em que empresas buscam benefícios normativos que nem sempre lhes são aplicáveis. "Hoje, os excessos cometidos pela administração são excepcionais, enquanto abusos por parte dos contribuintes têm se tornado mais comuns, como planejamentos tributários abusivos e postergações injustificadas de obrigações fiscais", ressaltou.
A subsecretária de Fiscalização da Receita Federal, Andrea Costa Chaves, também participou do evento online. Durante sua palestra, ela ressaltou que a transparência fiscal é agora um princípio constitucional. “A transparência, como princípio constitucional foi introduzido pela reforma tributária do consumo no fim de 2023. [...] uma nova fronteira do que se espera de um sistema tributário nacional que tenha transparência. Segundo Andrea, a reforma ampliou a necessidade de cooperação e o compartilhamento de informações entre administrações tributárias. Isso vai buscando otimizar e trazer mais clareza nas relações entre o setor público, o privado e a sociedade.
“Espera-se uma maior transparência na cooperação entre as administrações tributárias, algo que já existe atualmente, mas que pode ser ampliado. Essa transparência reflete diretamente na eficiência administrativa, promovendo redução de custos tanto para o setor privado, ao fornecer informações às autoridades fiscais, quanto para o próprio setor público, ao realizar suas atividades. Além disso, é essencial que as administrações tributárias também sejam transparentes com a sociedade sobre suas ações e processos internos, contribuindo para uma governança mais clara e responsável”, disse a subsecretária.
O professor de Direito Financeiro da USP, Heleno Torres, segue a mesma linha dizendo que a reforma tributária abriu um novo panorama de integração e a cooperação entre administrações tributárias. Isso, segundo ele, é reflexo de um histórico de intensos debates sobre sigilo e transparência, no Brasil e no mundo. O professor explica, que nos últimos anos, tanto no Brasil quanto internacionalmente, ocorreram mudanças significativas nas regras fazendo com que as autoridades tributárias passassem a adotar novas interpretações e medidas visando maior transparência e cooperação.
“Internacionalmente, houve transformações importantes relacionadas à quebra de sigilos bancário e fiscal, especialmente após as reuniões do G20 realizadas a partir de 2009. Esses eventos impulsionaram mudanças globais, destacando-se a convenção multilateral sobre troca de informações fiscais, da qual o Brasil é signatário, e o fortalecimento do Fórum Global, atualmente composto por mais de 170 países”, afirmou o professor que ainda pontuou que este debate deve ocorrer sem paixões políticas, considerando a importância da publicidade e do combate ao crime organizado.
Entretanto, Cristina Mac Dowell, especialista do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), ressaltou que apesar dos avanços os desafios persistem, especialmente em regiões onde questões estruturais, tecnológicas e regulatórias ainda dificultam a plena implementação das práticas recomendadas internacionalmente. "O Fórum Global é essencial para padronizar o intercâmbio e monitorar o nível de transparência fiscal entre os países", afirmou Mac Dowell. Ela também ressaltou que, desde a criação do Fórum, foram identificados cerca de 130 bilhões de euros adicionais em receitas tributárias por meio de programas de divulgação voluntária.
Apesar dos avanços, a especialista do BID alertou para desafios específicos enfrentados pela América Latina. "Dos 17 países signatários da Declaração de Punta del Este, apenas dez utilizam o intercâmbio automático de informações. Muitos países ainda enfrentam limitações tecnológicas e regulatórias que impedem o uso estratégico dessas informações", explicou. Mac Dowell também destacou o pioneirismo do Brasil em divulgar os chamados gastos tributários, algo ainda pouco adotado na região. "O Brasil é atualmente o único país latino-americano que disponibiliza publicamente essas informações", concluiu.
O evento foi encerrado pela secretária especial adjunta da Receita Federal, Adriana Rêgo, que destacou que o Brasil atualmente é o Presidente da Iniciativa da Declaração de Punta del Leste. Ela pontuou os cuidados que a Receita Federal mantém em relação ao compartilhamento e divulgação de informações, em momentos, por exemplo, de implementação da Reforma Tributária e no bojo de Programas de Conformidade, havendo ao final conclamado a todos para uma produção acadêmica em torno dos subtemas que podem advir da live.