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Bolsista do CNPq é primeira brasileira a ganhar prêmio ligado à Universidade de Oxford
Ana Maria Moura da Silva é a primeira cientista do Brasil e a segunda cientista mulher a ser homenageada com o Venoms and Toxins 2021 Awards. - Foto: CNPQ
A pesquisadora do Instituto Butantan e bolsista PQ do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Ana Maria Moura da Silva é a primeira pessoa do Brasil e a segunda cientista mulher a ser homenageada com o Venoms and Toxins 2021 Awards, prêmio máximo da conferência sobre o assunto, realizada anualmente pelo grupo Toxinology at Oxford, ligado à Universidade de Oxford, na Inglaterra. O reconhecimento foi entregue na quinta-feira (26), durante o Oitavo Encontro Internacional de Toxinologia de Oxford, pelo conjunto da obra.
“Fiquei feliz em ter esse reconhecimento. E muito surpresa. Mas o prêmio não é só meu, é dos colegas que me ajudaram também”, comemora a pesquisadora, que atua na área de toxinologia desde 1987. Por conta da pandemia do SARS-CoV-2, a conferência foi realizada virtualmente.
Ana Maria tem uma lista extensa de trabalhos ao longo dos quase 40 anos de carreira. Graduada em farmácia em 1981, com mestrado em imunologia pela Universidade de São Paulo (USP) em 1988 e doutorado em microbiologia e imunologia pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) em 1991, Ana Maria conta que a curiosidade pelo mundo a levou para a ciência. “Brinco que cientista é uma criança que não saiu da idade dos porquês. Sempre fui chata de querer saber, de querer conhecer, sempre fui estudiosa. Não é uma coisa que cai do céu, tem que ir atrás, tem que gostar muito”, explica.
Foi graças a esse mundo científico que a pesquisadora conheceu outras línguas e culturas. Em 1985, participou de um treinamento no Japão por um ano, na Universidade de Osaka, e depois ficou quatro anos em Liverpool, até 1995. Lá, fez pós-doutorado em biologia molecular de toxinas na Universidade de Liverpool. “Uma coisa você aprende nos livros, outra coisa você aprende no mundo”, disse ela.
As serpentes e a Amazônia
Ana Maria dedica toda sua formação pessoal ao conhecimento que teve da realidade de muitos colegas de outros países, alguns emergentes. Mas foi no Brasil que uma grande paixão apareceu: a cientista viu na Amazônia, a maior floresta tropical do mundo e região onde mais ocorre acidente ofídico no país, a chance de se aprofundar ainda mais nos estudos de venenos e toxinas.
“Tem várias vertentes para estudar veneno. Uma é estudar veneno para procurar novas drogas, outra, para entender a ecologia da serpente e outra, com que eu mais me identifiquei, era para ajudar no tratamento dos pacientes que sofrem acidentes ofídicos”, diz ela. A pesquisadora partiu para o norte brasileiro e começou a estudar a Bothrops Atrox, nome científico da jararaca-do-norte, responsável por 90% dos acidentes ofídicos na região.
Por anos, Ana Maria estudou os venenos das jararacas de diferentes cidades para avaliar se o soro do Butantan era eficiente. Nessa jornada, passou por municípios como Manaus (AM), Santarém (PA) e Cruzeiro do Sul (AC). “Tem veneno que mata e tem veneno que aleija, depende da quantidade de veneno que a serpente injeta, do local onde ela pica, do tempo que a pessoa demora para chegar ao hospital. O município de Santarém, por exemplo, é gigante e tem soro em apenas dois lugares. Se uma pessoa da comunidade ribeirinha em Tapajós é picada, ela tem que pegar o barco e subir o rio. Em até três horas é possível cuidar da pessoa. Passando disso, começa a complicar a situação”, explica.
Em 2020, a pesquisadora se tornou professora visitante da Universidade Estadual do Amazonas, Fundação de Medicina Tropical Doutor Heitor Vieira Dourado (FMT) e passou a colaborar com grupos internacionais e da Amazônia para abordar aspectos ecológicos e evolutivos das serpentes, eficácia da soroterapia e tratamentos alternativos. “São estudos de evolução da serpente, de como o veneno dela evolui, o que diferencia uma venenosa de uma não venenosa, qual a vantagem de ter adquirido o veneno, as vantagens da mutação. Estudo do veneno é realmente fascinante.” Ana Maria fez uma parceria com hospitais de Manaus para trabalhar com ensaios clínicos, mas com a pandemia os projetos desaceleraram. Ana segue esperançosa de, em breve, retornar ao trabalho de campo.
Ciência para ser compartilhada
A ex-aluna e também pesquisadora do Butantan Maisa Splendore Della Casa elogia a antiga mestra e relembra algumas histórias. “Ela sempre incentivou os alunos que quiseram sair do Brasil. Sempre lutou e proporcionou que isso fosse possível. Eles foram para os Estados Unidos, Austrália, Inglaterra. Ana cria para o mundo, ela dá asas aos alunos.”
Para a pesquisadora, a ciência não tem fronteira, nem muro. “E nesses projetos da Amazônia, tenho como premissa que os alunos sejam de lá. É uma forma de eu devolver o conhecimento”. E o intercâmbio cultural não parou por aí: a professora trouxe muitos alunos do Pará para se formarem em São Paulo.
Ana Maria está no Butantan desde 1981 e foi duas vezes diretora da divisão científica. Com mais de 100 trabalhos publicados e mais de três mil citações em pesquisa, o que realmente deixa a pesquisadora orgulhosa é a formação de pessoas. “Tudo o que fiz foi ótimo, mas formar alunos para continuar fazendo este trabalho é muito mais importante. É o legado que a gente deixa. Aí dá para aposentar com tranquilidade”, brinca.
Amante da natureza desde jovem, Ana Maria já até decidiu o que vai fazer quando chegar a hora desta aposentadoria. “Estou me preparando para fazer fotografia. Ir para o mato sem preocupação de encontrar veneno e sim preocupada com o cenário. Gosto tanto que se alguém me oferecer uma viagem, sem custo, para qualquer lugar do mundo, eu não escolheria Paris. Escolheria a Chapada dos Veadeiros.”
Com informações do CNPQ