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Eleições 2024: voto indígena mobiliza servidores públicos e MPI participa de entrega de urnas no Javari
- Foto: MPI ASCOM
Faltando poucos dias para as eleições municipais do 1º turno de 2024, uma intensa mobilização de servidores públicos se organizou para assegurar o direito ao voto dos moradores da segunda maior Terra Indígena do país, no Vale do Javari. O Ministério dos Povos Indígenas, através da Secretaria Nacional de Direitos Territoriais Indígenas, participou do esforço que contou com apoio logístico do Exército Brasileiro e foi coordenado pelo Tribunal Regional Eleitoral do Amazonas.
Nas primeiras horas de 1º de outubro, a votação ocorreu no dia 6 em todo o território nacional, helicópteros decolaram de Tabatinga, no extremo oeste do estado, levando uma carga preciosa: as urnas eletrônicas que garantem que as eleições brasileiras estejam entre as mais bem organizadas do mundo.
“Esse esforço do Estado tem um valor simbólico significativo, pois abraça e respeita a cidadania indígena e sua diversidade cultural, já reconhecida após a Constituição de 1988, em seu artigo 231, promovendo então um valor concreto ao permitir que os indígenas influenciem diretamente nas políticas públicas que impactam suas vidas e terras, e consequentemente realizando a efetivação da cidadania plena e participativa desses povos no Brasil”, refletiu a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara.
De acordo com Guajajara, a instalação da seção eleitoral 37 na Terra Indígena Vale do Javari foi um passo importante na promoção da cidadania indígena plena, refletindo na necessidade de uma abordagem inclusiva e respeitosa que valorize a diversidade cultural do Brasil. “A construção de uma democracia efetivamente inclusiva requer a continuidade da luta pela igualdade de direitos e a superação das barreiras que ainda persistem, garantindo que até mesmo os povos isolados e de recente contato tenham a oportunidade de participar ativamente na formação do futuro político do país.”
As aeronaves percorreram toda a Terra Indígena durante dois dias, sobrevoando milhares de quilômetros da floresta que é manejada e preservada pelos indígenas, entregando as urnas em sete aldeias que funcionam como locais de votação para os sete povos contatados do Javari: Matis, Korubo, Matsés, Marubo, Kanamari,Tsohom-Dyapa e Kulina Pano.
Processo democrático
O coordenador geral de povos indígenas isolados do MPI, Rodolfo Silva, acompanhou o primeiro dia de distribuição das urnas e destacou a experiência de chegar nas aldeias e encontrar muitos indígenas aguardando ansiosos pelas urnas e pela possibilidade de participar do processo democrático brasileiro.
“A possibilidade de participar da democracia, de votar, exercer a cidadania plena, trouxe resultados concretos porque depois que foram abertas as seções eleitorais na terra indígena o poder público municipal passou a atender melhor às demandas das comunidades, como construção de escolas e serviços que são de competência da prefeitura”, explicou.
O trabalho de abertura de seções eleitorais dentro do Vale do Javari foi liderado pelo indigenista Bruno Pereira quando era coordenador local da Fundação Nacional dos Povos Indígenas na região. Em reconhecimento ao papel dele, o TRE do Amazonas batizou o cartório eleitoral de Atalaia do Norte em sua homenagem.
Antes da instalação das seções dentro da TI, a cada período eleitoral era grande o afluxo de indígenas para as sedes municipais de Atalaia do Norte e Benjamin Constant para cobrar políticas públicas dos gestores municipais. Sem acesso ao voto, tinham pouco poder de pressão e acabavam ficando por longos períodos, em condições insalubres, nas beiras de rio das cidades.
Sem acesso à água e alimentação suficientes, sem saneamento, a situação se agravava a cada ida dos indígenas para a cidade, o que culminou, em 2012, na morte de quatro crianças indígenas, devido a um surto de diarreia e de vômito causado pelas condições insalubres nas quais os indígenas permaneciam durante o período eleitoral.
Democracia e proteção territorial
A diretora de povos indígenas isolados e de recente contato do MPI, Beatriz Matos, é viúva do indigenista Bruno Pereira e destaca a importância de seguir cultivando o legado deixado por ele em defesa dos povos do Javari. “Prosseguir a luta do Bruno significa continuar garantindo o voto indígena, mas também avançar na proteção da região, impedindo a continuidade das organizações criminosas que atacam o Javari”, lembra.
O MPI coordena desde 2023 o Plano de Proteção Territorial do Vale do Javari, com a participação da Funai, do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) e do Ministério da Justiça. Entre 2023 e 2024, através do plano, foram executadas 36 operações de fiscalização da Funai, com apoio da Polícia Militar e quatro grandes operações do Ibama com apoio da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária Federal.
No total, foram destruídas 98 dragas de garimpo, 17 rebocadores e 53 motores estacionários utilizados por criminosos ambientais; apreendidos mais de 6 mil kg de peixes e animais abatidos ilegalmente, 67 armas de fogo, 35 motosserras, 70 embarcações e 47 motores de popa, 2.400 metros de redes e malhadeiras, 114 mil litros de diesel e 7.665 litros de gasolina, 11 celulares e 29 antenas starlink, 322 toras de madeira, 14 kg de mercúrio e 33 g de ouro.