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Segundo dia do “Seminário Aldeando o Estado Brasileiro” apresenta balanços de 2023 e planos da SEART, FUNAI e SESAI para 2024
- Foto: Washington Costa
Na quinta-feira (21), durante o segundo dia do “Seminário Aldeando o Estado Brasileiro: Desafios para a Construção da Política Indigenista”, a Secretaria de Articulação e Promoção de Direitos Indígenas (SEART), a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI) e a Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI) divulgaram relatórios das ações implementadas durante o ano de estreia do Ministério dos Povos Indígenas, 2023, e apresentaram os respectivos planejamentos a serem desenvolvidos em 2024. O secretário executivo do MPI, Eloy Terena, fez uma série de considerações e anúncios aos representantes dos povos indígenas presentes.
O secretário reforçou o propósito do Seminário como um espaço para as lideranças avaliarem e transmitirem um retorno sobre o trabalho feito pelo MPI e como oportunidade para organizar os próximos passos da pasta, mediante apontamentos feitos pelas lideranças indígenas com o objetivo de consolidar as informações para difundi-las durante o Abril Indígena.
Também anunciou que a ministra Sonia Guajajara e ele se reuniram com a Casa Civil na quarta-feira (20) para avançar no entendimento de que as demarcações das oito Terras Indígenas homologadas em 2023 não serão afetadas juridicamente pelo marco temporal. “Há mais de dez anos nenhuma Terra Indígena era demarcada. Houve uma retomada desses processos. A FUNAI assinou a criação de 31 Grupos de Trabalho para a identificação e delimitação de novas áreas. O MPI está focado no suporte político para que o trabalho da FUNAI não sofra interferência política”, disse o secretário.
As Terras Indígenas homologadas em 2023 foram Avá-Canoeiro (GO), Rio dos Índios (RS), Tremembé da Barra do Mundaú (CE), Arara do Rio Amônia (AC), Uneiuxi (AM), Kariri-Xocó (AL), Rio Gregório (AC) e Acapuri de Cima (AM).
Eloy Terena acrescentou que o Comitê de Desintrusão Interministerial, criado no ano passado, conta com um plano de trabalho para fazer a desintrusão de 32 Terras Indígenas ao longo dos próximos anos para combater invasores e garimpeiros. Ele ainda informou que, entre os dias 17 e 18 de abril, os 30 representantes do Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI) escolhidos por meio da Caravana Participa Parente, realizada em 2023 em todos os biomas do país, tomarão posse em Brasília com cotas de 30% de participação feminina e 20% composta por jovens.
Articulação em prol da cidadania indígena
A SEART participa de 46 representações institucionais em diversas pautas: educação, saúde, direitos sociais, infância e juventude, mulheres, LGBTQIA+, segurança alimentar e nutricional, entre outros temas. A Secretaria possui dois departamentos internos: o Departamento de Línguas e Memórias Indígenas (DELING) e o Departamento de Promoção da Política Indigenista (DEPIN), responsável pelas coordenações de Direitos Sociais Indígenas e de Promoção à Cidadania.
A SEART apresentou as articulações que conduzirá em prol de políticas educacionais e culturais para apoiar a criação da Universidade Indígena; implementar de modo efetivo a Lei 11.645/2008 para instituir o ensino sobre histórias e culturas indígenas para não indígenas; diagnosticar a educação escolar indígena em locais de difícil acesso e a promover diversos editais de fomento cultural, caravanas de escutas, estimulo às artes visuais e audiovisual indígena, festivais e definição de políticas de patrimônio cultural, material e imaterial.
Eliel Benites, secretário do DELING, explicou que a SEART tem como princípio articular as políticas públicas que já estão estabelecidas nos Ministérios, porém com a visão indígena aplicada a elas, levando em conta a cosmovisão e o direito do bem viver dos indígenas conforme sua diversidade cultural.
“Historicamente, a política para os povos indígenas no Brasil foi pensada pelos não indígenas de forma vertical, com o objetivo de tutelá-los. Toda a articulação da Secretaria se preocupa em fazer com que as políticas sejam mais adequadas aos indígenas através da escuta e da inserção do olhar de quem é afetado por essas medidas”, avaliou Benites.
Os desafios para 2024, conforme mencionados pelo DEPIN no Seminário, são a necessidade de instituir ações estratégicas para dar continuidade e consolidação ao MPI; criar uma cultura institucional própria do MPI com o estabelecimento de rotinas administrativas; aprimorar a articulação com os demais ministérios; aumentar as equipes do MPI e ampliar a captação de recursos para a pasta.
André Baniwa, coordenador-geral de Promoção de Cidadania, fez uma detalhada explanação ao público sobre os avanços necessários no combate ao racismo, sobre os direitos da mulher indígena e a demanda de aprofundamento na questão dos indígenas em contexto urbano. “Fomos invisibilizados, porém, desde a Constituição de 1988 é a primeira vez que temos a chance de colocar ao Estado como os indígenas devem ser tratados e respeitados. É um trabalho difícil, mas estamos no caminho certo”, avaliou Baniwa.
FUNAI
A presidenta substituta da FUNAI, Lúcia Alberta Andrade de Oliveira, classificou o ano de 2023 como a retomada do órgão criado há 55 anos, tendo como maior conquista no período a garantia de um concurso público diferenciado e a homologação de Terras Indígenas após anos de paralisação dos processos.
Nos últimos 20 anos, a FUNAI vem perdendo servidores, uma vez que 1700 estão aposentados. Atualmente, a Fundação conta com 1674 servidores em atividade, incluindo comissionados e temporários. Conforme Lúcia, diante da dimensão e abrangência que o órgão possui, o quadro de funcionários está abaixo da capacidade ao atuar com cerca de 30% da força de trabalho.
O Concurso Público Nacional Unificado (CPNU) será aplicado em maio e oferecerá 502 vagas para incrementar o quadro da FUNAI com cota de 30% para indígenas. Para o MPI há 30 vagas abertas.
“Trouxemos ações concretas que foram feitas na nossa gestão a comando da presidenta Joenia Wapichana para avançar na conquista de direitos. Temos números, dados, desafios e nossas perspectivas para 2024 sempre têm como norte a demanda de demarcação de terras, avanço na gestão ambiental e territorial, e progresso em direitos sociais, educação e outras questões pertinentes”, citou a presidenta substituta.
As principais ações previstas para 2024 são: promover a reestruturação para aprimorar a atuação da Funai junto aos povos indígenas por meio de Grupo de Trabalho participativo que começa em abril de 2024; continuar com os processos de demarcação de terra; concluir o Plano Estratégico Institucional para os próximos quatro anos com previsão de entrega em abril de 2024; regulamentar o poder de polícia da FUNAI; estabelecer a estratégia de enfrentamento jurídico aos dispositivos da Lei 14.701 do marco temporal, que alterou a garantia de direitos dos povos indígenas, e ampliação e parcerias como Fundo Amazônia, KfW, UK-PACT e outros.
Para Mislene Tikuna, diretora de administração e gestão da FUNAI, o intuito de fortalecer o órgão através de uma reestruturação da missão da FUNAI em todo território nacional é uma das prioridades. “Uma portaria constituída por 56 membros e um GT irão pensar novas unidades, mais cargos e funções. A população indígena é expressiva e precisa de um órgão atuante para que essas especificidades culturais, territoriais e sociais sejam incluídas dentro das políticas públicas”, defendeu Mislene.
As principais ações fundiárias da FUNAI em 2023
Etapas do processo | Ações | Quantidade |
Identificação / Delimitação | Publicação de Relatórios de Delimitação | 3 |
Atividades de campo para retomada de estudos | 26 | |
Portarias de constituição / composição de GTs | 39 | |
Atividades de qualificação da reivindicação | 19 | |
Demarcação Física | Georreferenciamento / Demarcação / Aviventação | 5 |
Análises de geoprocessamento / peças cartográficas | 18 | |
Regularização Fundiária | Constituição de GT para levantamento de benfeitorias | 3 |
Imóveis que tiveram pagamento de indenizações | 28 | |
Homologação e Registro | Terras encaminhadas para homologação | 14 |
Terras homologadas | 8 | |
Terras registradas no SPU | 5 |
SESAI
A Secretaria de Saúde Indígena (SESAI) procurou evidenciar no Seminário o estado de sucateamento e precariedade em que se encontrava no início da gestão. O panorama geral da Secretaria em 2023 demandou a recomposição do orçamento com base no de 2022 porque a previsão de corte era de 59%. Houve ainda uma suplementação de mais de 500 milhões, ou seja, o orçamento da SESAI foi ampliado em 32,6% no ano passado.
A estrutura da SESAI estava contaminada pela ocupação de cargos estratégicos por militares e outros setores com orientação para que a SESAI não aportasse recurso orçamentário para a área de investimento em territórios indígenas não homologados. Havia falta de contratos regulares ou emergenciais e contratos próximos do encerramento da vigência e sem instrução processual de contratos novos.
Além disso, a leniência da última gestão provocou o estado de emergência em saúde pública dos Yanomami e as estruturas dos Distritos Sanitários Espaciais Indígenas (DSEI) viviam uma situação de limitação de recursos humanos, especialmente no tocante aos servidores de carreira.
“Desse modo, os nossos esforços foram concentrados para reverter esse cenário. Todos esses aspectos que estamos mostrando servem para elaborarmos novas políticas e sistemas de regulação para a estruturação das nossas unidades de saúde com enfoque também em saneamento básico”, relatou o secretário de Saúde, Weibe Tapeba.
Contudo, o secretário se dedicou a apresentar, como contraponto, os avanços da SESAI ao ampliar as coberturas vacinais por meio de campanhas de intensificação e com instituição do Novo Sistema de Informações de Saúde Indígena para a assegurar a produção de dados confiáveis conectados aos demais sistemas. Ele ainda citou o aumento do número de vagas no Programa Mais Médicos para o Brasil de 372 para 654.
“Não poderia deixar de mencionar a criação e ampliação do Centro de Operações Emergencial por desassistência à Saúde do Povo Yanomami, a constituição do Comitê de Respostas a Eventos Extremos na Saúde Indígena, a estruturação da área técnica de medicinas indígenas e a criação da Coordenação de Indígenas Isolados e de Recente Contato como marcos da política indigenista”, elencou Tapeba.
Encerramento da ministra
Após dois dias de Seminário, a ministra Sonia Guajajara encerrou o evento recapitulando os esforços do MPI ao compartilhar a estrutura que compõem a pasta, a apresentação do planejamento estratégico, os avanços, os desafios e ao se propor a escutar e dialogar com as lideranças, visando construir a política indigenista ideal para os 1,7 milhão de indígenas que habitam o país, segundo o Censo 2022.
A ministra enfatizou que o MPI vem trabalhando de forma muito próxima com seus departamentos, SESAI, FUNAI e, principalmente, com os próprios indígenas. “Estamos elaborando juntos uma transição de política indigenista para uma política indígena que de fato seja implementada com a consulta e a participação dos povos que vivem no Brasil”, disse.
Sonia Guajajara aproveitou a ocasião para fazer um apelo às lideranças para que sigam juntas com o MPI ao reconhecerem o que foi feito para que isso seja informado aos demais indígenas do país, mirando o apontamento de melhorias e a possibilidade de fazer críticas fundamentadas.
“Levem o conteúdo do Seminário e informem as pessoas. Tragam orientações para que possamos construir unidos nosso futuro. Em breve, realizaremos novos encontros e seminários para seguir difundindo nossas entregas e para evoluirmos ao lado um do outro.”