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COP28
Ministra aponta pauta anti-indígena e projetos que violam direitos como riscos para o protagonismo ambiental do Brasil
- Foto: Leo Otero | Ascom MPI
Durante o painel "Transição no Sul Global: Construindo uma Economia Net Zero", promovido pelo Pacto Global, a ministra Sonia Guajajara falou sobre a importância do comprometimento do setor privado com as medidas de compensação das emissões de CO2, e sobre os desafios da articulação de toda a sociedade para uma transição justa no Sul Global.
Adotado em 2005 pelo então secretário das Nações Unidas Kofi Annan, o Pacto Global é hoje a maior iniciativa de sustentabilidade corporativa do mundo, com a participação de mais de 16 mil empresas e organizações de 160 países em torno dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU.
Como exemplo dos desafios do Brasil para envolver todos os setores na causa ambiental e social, a ministra citou a possibilidade de derrubada pelo Congresso Nacional dos vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao PL 2903, que reverteria o bloqueio ao marco temporal e a outras regras inconstitucionais que ferem os direitos dos povos indígenas, que têm sido cada vez mais reconhecidos como atores fundamentais para a contenção das mudanças climáticas.
A ministra afirmou que o marco temporal comprometeria os avanços do Brasil em seus compromissos globais em relação ao clima, pois a não demarcação de terras indígenas permitiria a expansão de atividades predatórias como a mineração e o desmatamento, assim como a expansão da fronteira agrícola que deteriora as condições ambientais. “Como o presidente Lula diz, nosso agronegócio, setor que sim é importante para a economia brasileira e precisa também colaborar com o esforço da transição justa, não precisa de mais terras no Brasil. É possível fazer mais e melhor sem expansão da fronteira”, disse a ministra.
Outro desafio apontado pela ministra é a execução e exploração empresarial de projetos de energia renovável, como a eólica, e do mercado de carbono dentro de regras justas para todos, sem que ocorram violações de direitos das comunidades, sejam indígenas, quilombolas, ou camponesas, como tem acontecido no Brasil e vem sendo revelado pela imprensa. “Estes casos mostram que os futuros compromissos brasileiros para mitigação e adaptação, no Brasil e em todo o mundo, precisarão vir com uma grande dose de direitos humanos”, disse a ministra, reforçando que, nessa transição, “ninguém deve ser deixado para trás”. “Esse é um dos lemas mais fortes aqui em Dubai e precisa aparecer nos documentos”, disse.
Para a ministra, a gestão territorial, a garantia de direitos, e os conhecimentos das populações tradicionais significam uma oportunidade de reposicionamento do Brasil e das empresas em novos setores e projetos de desenvolvimento sustentáveis. “O setor privado precisa entender que se engajar neste processo é se engajar num jogo onde todos ganham. Também por isto me assusta tanto este interesse tão forte em questionar direitos indígenas”, disse, ponderando que os riscos de se insistir em contratos e práticas abusivas é expor o Brasil a denúncias e condenações por violação de direitos e à perda de protagonismo nas negociações internacionais.
Alinhada à fala da ministra, a secretária de Direitos Ambientais e Territoriais Indígenas do MPI, Eunice Kerexu, afirmou, durante o painel “Povos indígenas e comunidades locais como líderes de ações para deter e reverter a perda florestal”, a responsabilidade de todos na preservação ambiental. “Nós temos que paralisar o desmatamento e começar a fazer a recuperação dos espaços, porque não existe outro planeta a não ser esse em que a gente vive hoje. Nós vivemos em uma casa, em um só planeta, então a responsabilidade é todos nós, é de cada um de nós”, disse a secretária, que participou também do evento “Encontro com as Juventudes”, juntamente com a ministra do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas, Marina Silva, que retornou a Dubai e reassumiu a chefia da Delegação do Brasil na COP 28.
COP 30
A ministra Sonia Guajajara teve ainda em sua programação uma reunião com o governador do Pará, Elder Barbalho, para discutir o processo de construção da COP 30, que vai ocorrer na capital do estado, Belém, em 2025. O foco da conversa foram as condições da participação indígena no evento. Além das demandas sobre a programação e infraestrutura para receber uma grande delegação indígena do mundo todo, a ministra enfatizou a importância de se garantir uma real incidência indígena nos debates e nas decisões da COP. Para isso, disse a ministra, há planos para a formação de um grupo técnico indígena sobre os temas do clima e que irá propor uma reunião com o secretariado da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima, (UNFCCC, na sigla em inglês) para discutir uma credencial especial para os povos indígenas terem acesso às discussões do evento, visto que seus representantes muitas vezes não se encaixam nem como governo e nem como ongs.
O governador Elder Barbalho apoiou a ideia da participação indígena. Disse que a gestão dos espaços da COP é das Nações Unidas, mas que se não forem suficientes para receber a todos, o estado do Pará irá planejar formas de organizar e contratar outras estruturas para a hospedagem das delegações indígenas.
Outra pauta da reunião foi a aproximação do MPI com o governo do Pará para que se possa mapear áreas no estado para avançar nos processos de demarcação de Terras Indígenas, a exemplo do termo de cooperação técnica que foi assinado no Ceará que vai possibilitar a demarcação física de nove TIs. Barbalho se interessou em conhecer o modelo do Ceará. A secretária dos Povos Indígenas do Pará, Puyr Tembé, também concordou em fazer o alinhamento com o MPI para promover a formação dos indígenas do estado na pauta climática.