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Marco Temporal
Comissão de Agricultura e Reforma Agrária aprova PL 2903
O Ministério dos Povos Indígenas (MPI) acompanha com preocupação a tramitação do PL 2.903 (PL 490 na Câmara dos Deputados), aprovado na Comissão de Reforma Agrária e Agricultura (CRA) do Senado Federal nesta quarta-feira, 23/08.
O texto segue, agora, para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e o MPI já atua junto aos senadores para que o projeto também passe por outras comissões pertinentes ao tema, como Meio Ambiente e Direitos Humanos e Legislação Participativa.
Na terça-feira (22/08), a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, esteve no Senado, onde encontrou lideranças políticas, debateu o tema com a relatora do projeto na CRA, senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS), e conversou com a presidente da Comissão de Meio Ambiente, senadora Leila Barros (PDT-DF), que declarou apoio à tramitação do projeto pela comissão.
A ministra também apresentou a nota técnica elaborada pela Assessoria Parlamentar do MPI para a senadora Eliziane Gama (PSD-MA) e para a deputada federal Célia Xakriabá (PSOL-MG). O documento debate ponto a ponto os artigos do projeto, recomendando sua rejeição.
Acesse aqui a nota técnica na íntegra
O MPI reitera sua posição contrária ao texto que representa um retrocesso para os direitos e para a proteção dos povos indígenas. O projeto é contaminado por inúmeras inconstitucionalidades, entre elas a tentativa de estabelecer em lei a tese jurídica e política do Marco Temporal, que considera a data de promulgação da Constituição (5 de outubro de 1988) como data limite para aferição do direito dos povos originários sobre sua terra.
A nota técnica elaborada pela Assessoria Parlamentar do MPI também aponta que acolhimento da tese do Marco Temporal poderá resultar em responsabilização internacional do Estado Brasileiro perante o Sistema Interamericano de Direitos Humanos que, em diversas oportunidades, já se manifestou sobre o tema. A própria Corte Interamericana de Direitos Humanos já assegurou, em julgamentos passados, que o reconhecimento dos direitos territoriais indígenas não está submetido à condição temporal.
Ainda segundo essa nota técnica, o PL busca transformar as terras indígenas em objetos de mercantilização, afeta a organização social dos povos indígenas e suas relações sagradas com o território, compromete a vida de todos nós diante da tragédia climática anunciada que anda de mãos dadas com o referido projeto, bem como contraria os compromissos assumidos pelo Brasil com o Acordo de Paris e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, o que poderá acarretar, inclusive, na perda de investimentos internacionais. O projeto também desrespeita tratados nacionais e internacionais sobre a necessidade de consulta livre, prévia e informada das comunidades sempre que ações do Estado ou de agentes externos venham a afetar seus territórios e modo de vida.
O PL avança sobre outros direitos indígenas ao abrir espaço para exploração de garimpo, projetos de energia, acesso a territórios de povos indígenas isolados e até mesmo a revisão de áreas já demarcadas. A aprovação do texto em sua redação atual seria um aval para que qualquer governo, seja ele a favor ou contra os povos indígenas, entre em seus territórios sem a sua devida autorização, ou mesmo um aviso, efetue mudanças bruscas em seu modo de vida e costumes, sem consulta prévia, o que inevitavelmente acarretaria impactos socioambientais desastrosos. Outro ponto que desrespeita a legislação atual e o direito dos povos é o dispositivo que prevê que as terras indígenas sejam retomadas pelo Estado quando for considerada uma suposta “perda de traços culturais”.
Também ficaria autorizado o cultivo de organismos geneticamente modificados em terras indígenas, algo que afronta o respeito aos usos, costumes e tradições dessas populações, além de representar risco biológico com a introdução de espécies alheias aos territórios.
O MPI espera que as inconstitucionalidades do PL sejam mais claramente apontadas durante a tramitação na CCJ, que tem por função, justamente, verificar se os projetos em tramitação não ferem a Constituição Federal.
O direto dos indígenas aos seus territórios é tido como um direito fundamental, algo já reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e que não é passível de mudança nem por emendas à Constituição, muito menos por projetos de lei.
Ascom | MPI