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Expoentes indígenas da política pedem mais candidaturas para ampliar base no Congresso
. - Foto: Diogo Zacarias
No último dia da edição de 20 anos do Acampamento Terra Livre (ATL), na última sexta-feira (26), expoentes femininos da política indígena se pronunciaram na plenária que encerrou o evento. A ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara; a presidenta da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Joenia Wapichana; a deputada federal Célia Xakriabá (Psol-MG); e Samara Pataxó, funcionária do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), subiram ao palco alinhadas com a seguinte tônica em seus discursos: estimular mais candidaturas indígenas nas próximas eleições para aumentar a representatividade em diferentes esferas do poder nacional.
Responsável por reunir milhares de indígenas em Brasília ao longo da semana, o ATL é a maior assembleia dos povos indígenas do Brasil e uma referência mundial de mobilização indígena com participação de representantes de todas as regiões do país e várias partes do mundo. O tema da edição foi “Nosso marco é ancestral. Sempre estivemos aqui” em decorrência das demandas principais do movimento: a demarcação e homologação de Terras Indígenas, assim como a derrubada da vigência da lei do marco temporal, aprovada pelo Congresso em 2023.
A ministra celebrou a decisão unânime do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de 27 de fevereiro, quando os ministros aprovaram que candidaturas indígenas registradas por partidos e federações partidárias terão cotas proporcionais em relação aos recursos do Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos, conhecido como Fundo Partidário, e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).
A decisão foi tomada a partir de uma ação da deputada Xakriabá e se aplica também ao tempo de rádio e televisão no horário político. Atualmente, segundo dados do TSE de março de 2024, 102.439 mil indígenas estão aptos a votar. Em relação à série histórica iniciada em 2014, o número de candidaturas aumentou. Em 2016, as eleições municipais contaram com 1.546 autodeclarados indígenas como concorrentes. Em 2020, o número subiu para 1.721, um acréscimo correspondente a 11%.
“Nós precisamos avançar nas próximas eleições e a base para que a gente possa crescer mais em 2026 está neste ano de eleições municipais. Precisamos eleger vereadores, vereadoras. Precisamos de prefeitos e prefeitas. Precisamos fazer a nossa base eleitoral para 2026. Eleger deputados estaduais e aumentar a nossa bancada do cocar no Congresso Nacional”, disse Guajajara, que já participou de 10 edições do ATL.
Ao elencar entraves para as homologações de Terras Indígenas e desafios que enfrenta ao conduzir o MPI, a ministra se emocionou diante da plateia e a impulsionou a promover uma mudança de consciência para transformar o projeto de país.
“Temos que mudar o pensamento colonial impregnado, que ainda olha para a gente como empecilho. Entre gravatas e camisas brancas, nós chegamos com nossos cocares e os enfrentamos de igual para igual. Nosso cocar ainda incomoda muito gente ao combatermos a mineração, a extração de madeira e garimpo em nossos territórios. A gente enfrenta o próprio estado brasileiro, forças políticas e econômicas muito fortes”, relatou a ministra.
Apropriação política
Joenia Wapichana lembrou que, no passado, mulheres indígenas não eram chamadas para discutir política fora das comunidades ou em nível regional e nacional porque eram vistas estritamente pela ótica do papel doméstico. Ela citou ainda que havia um estímulo para que indígenas não se envolvessem com política.
A presidenta da Funai defendeu a quebra de barreiras diante da importância da apropriação indígena da política para a formulação de políticas públicas e para que os povos assumam a responsabilidade pelas próprias escolhas ao terem autonomia.
“Da mesma forma, colocaram muitas dúvidas sobre nossa capacidade de gestão de órgãos públicos. Hoje vemos a realidade delas [mulheres indígenas] se posicionando na base como professoras, agentes de saúde e demais profissionais. Com o tempo, vimos a necessidade de ampliar essa participação e ocupar espaços. Povos indígenas têm direitos civis e políticos. Temos direitos de escolher nossos representantes, mas também de receber votos”, disse.
Exemplos
A deputada federal Célia Xakriabá se tornou a terceira pessoa mais votada de Belo Horizonte. Dos 853 municípios que integram Minas Gerais, 804 a escolheram como representante no parlamento. De acordo com ela, o apoio dos povos Krenak, Pataxó, Xakriabá, entre outros, foram imprescindíveis para ser eleita.
Para o público do ATL, a deputada descreveu como mais de 400 mil votos a elegeram, assim como a deputada Juliana Cardoso (PT-SP) e Sonia Guajajara, que virou ministra. Célia especificou que a população indígena que habita a Amazônia, assim como os estados da Bahia e do Mato Grosso do Sul, regiões expressivas em termos de presença indígena, têm condições de levar novos políticos indígenas às esferas de decisão e citou um exemplo de conquista.
“Essa semana tivemos uma vitória importante. Na última quarta-feira [24] foi votada [na Câmara dos Deputados] a urgência do projeto de lei que combate à violência contra às mulheres indígenas [PL 4381/23]. O projeto de lei que regulamenta a categoria dos agentes de saúde e de saneamento básico [3514/19, de autoria de Joenia Wapichana] é o próximo.
Em 2022, Samara Pataxó recebeu um convite para trabalhar no TSE e implementar a Assessoria de Inclusão e Diversidade dentro da instituição, presidida pelo ministro Alexandre de Moraes, para dar voz aos grupos subrepresentados. Ela destacou a consulta promovida junto ao TSE pela deputada Célia Xakriabá para incluir cotas indígenas nas eleições como uma conquista.
“O TSE foi favorável, porém ficou pendente ainda a verificação se [as cotas] serão aplicadas para 2024, para as eleições municipais, ou se ficará para 2026. Ainda está em análise técnica porque é preciso configurar o sistema e realizar uma série de adaptações para que os povos indígenas sejam beneficiados. É necessário que os parentes se posicionem dentro de seus partidos, que vão distribuir recursos, mas fiquem atentos para não comporem partidos que só querem sair bem na foto por terem indígenas como candidatos”, recomendou Samara.