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Entrevista da Ministra Sonia Guajajara para o Canal Gov - 29/10/2023
Foto: Divulgação/Canal Gov
Caroline Blaudt: Olá, o Brasil em Pauta começa agora. Dados do Censo 2022 revelaram que o Brasil tem 1.700.000 indígenas. Para dar voz aos povos originários, em janeiro de 2023, o presidente Lula criou pela primeira vez o ministério dos Povos Indígenas no país. À frente da missão está Sonia Guajajara, primeira deputada federal indígena do Estado de São Paulo e a primeira indígena a ocupar um ministério. Nascida na terra de Arariboia, no Maranhão, ela faz parte do povo Guajajara-Tenetehara. Por sua luta pelo reconhecimento dos direitos dos povos indígenas, foi eleita pela revista Time como uma das 100 pessoas mais influentes no mundo. Obrigada pela presença aqui no Brasil em Pauta, ministra.
Sonia Guajajara: Obrigada pelo convite, Carol.
Caroline Blaudt: Bom, ministra, como falamos, criado em janeiro de 2023, estamos com quase um ano desse inédito ministério. Já dá pra fazer um balanço dele?
Sonia Guajajara: Sim, é um balanço muito positivo, né? São dez meses praticamente, que a gente considera já ações que superam os últimos seis anos. Podemos até dizer, sei lá, os últimos dez anos, né? Porque a gente conseguiu, primeiro, retomar algumas políticas que foram paralisadas nos últimos seis anos, como o Conselho Nacional de Política Indigenista, que é o CNPI. Como a retomada do Comitê Gestor da PNGATI e a reinstalação da PNGATI, que é a Política Nacional de Gestão Ambiental e Territorial das Terras Indígenas, que foi criado em 2012 ainda pela presidenta Dilma. E a gente trabalhou plano integrado com outros ministérios. A gente trabalhou... Foi um processo muito participativo. E aí, nos últimos anos, essa política foi totalmente paralisada. E agora já reinstalamos o Comitê Gestor e estamos trabalhando a elaboração de alguns PGTAs, que são os Planos de Gestão Territorial e Ambiental e a implementação dos daqueles que já estão prontos. Nós conseguimos, em oito meses, assinar oito demarcações de terras indígenas. Então, em oito meses supera oito anos, porque em dez anos foram 11 territórios indígenas demarcados. E agora, em oito meses, nós já demarcamos oito terras indígenas. Então, isso para nós, por si só, já vale todo esse tempo de existência do ministério dos Povos Indígenas.
Caroline Blaudt: E aí, com já tantos avanços em tão pouco tempo, podemos dizer que é um ministério que veio para ficar, tá consolidado.
Sonia Guajajara: Veio pra ficar. Totalmente. Estamos trabalhando ainda para conseguir uma finalização da estruturação desse ministério, porque a gente tem ali servidores que são de livre nomeação, mas também, como todo órgão, tem os servidores que já é de carreira pública e de serviço público. E aí esses tá mais difícil de a gente conseguir fechar, porque há uma deficiência muito grande de servidor público para muitos órgãos. Então, nesse momento está todo mundo querendo.
Caroline Blaudt: Mas é algo também que o governo está consertando, né?
Sonia Guajajara: Tá resolvendo. Já conseguimos aprovar concurso público, inclusive nós vamos ter agora, já foi assinado um concurso público para a Funai e 30 analistas para o ministério. Então nós estamos conseguindo essa estruturação já com requisição até também de servidores. Temos o nosso planejamento, nossas diretrizes, a nossa inserção já no PPA para o próximo ano. Vamos deixar de ser um ministério só articulador para ser também um ministério finalístico, que pode executar suas ações próprias. Estamos trabalhando agora as emendas parlamentares, temos a nossa cartilha própria. Estamos apresentando ao Congresso Nacional, aos parlamentares individuais, às bancadas, às comissões, para apoiar também com emendas as ações do nosso ministério.
Caroline Blaudt: E como a senhora mesmo disse, foram oito demarcações, duas recentes agora em setembro, se não me engano. Desde o início do ano já foram oito e a meta é chegar a 14 até o final desse ano. É isso?
Sonia Guajajara: É, porque ainda na transição, nós identificamos que tinham 14 processos demarcatórios em estágios já concluídos, prontos para homologação. Então nós atualizamos esses processos todos, esses 14, conseguimos assinaturas já de oito com o presidente Lula. E temos ainda seis processos que estão na Casa Civil para serem assinados. E estamos trabalhando para que isso seja assinado ainda esse ano. Assim como estamos atualizando outros processos que estão na etapa da portaria declaratória, agora de volta para o Ministério da Justiça. Mas a gente está trabalhando ali conjuntamente, para a gente avançar também com esses outros processos que estão na etapa anterior.
Caroline Blaudt: Ter a sua terra homologada, garantida, é uma realização muitíssimo importante para os povos indígenas?
Sonia Guajajara: Muito. A mais, podemos dizer. Porque a bandeira de luta maior dos povos indígenas sempre foi a demarcação dos territórios indígenas. Nós temos a Constituição Federal que garante esse direito territorial, temos os artigos que garantem esse direito constitucional. Mas a gente também defende o direito originário que antecede a Constituição. Então conseguir demarcar, homologar a sua terra, é a maior prioridade de todos os povos.
Caroline Blaudt: Aí, agora, na contramão desse trabalho de demarcação, nós temos o marco temporal. O Congresso aprovou o ministério da senhora. Recomenda, recomendou ao presidente o veto total e a tese, inclusive, já foi também rejeitada pelo STF. A senhora defende que ele afronta os direitos indígenas assim como afronta à Constituição. Como ele pode afetar novas demarcações?
Sonia Guajajara: Então, o marco temporal é apresentado como uma das medidas que pode trazer segurança jurídica no campo, segurança jurídica para a propriedade privada, para os produtores, pecuaristas, e também para os indígenas. Nós entendemos que a instalação do marco temporal por si só, ele não vai garantir essa segurança jurídica. O Supremo Tribunal Federal apontou agora um caminho que é o caminho de pagamento das indenizações. A indenização que é o pagamento da terra nua, o pagamento das benfeitorias e a terra ser avaliada no valor de mercado. E até agora, constitucionalmente, o que se pagava eram as benfeitorias dos ocupantes aos ocupantes de boa fé desses territórios que são requeridos como território tradicional. E agora tem essa novidade apresentada como resultado do julgamento do marco temporal no Supremo Tribunal Federal. Isso não foi o suficiente para o Congresso Nacional. Agora, é claro, é preciso trabalhar todo esse detalhamento da conclusão, do julgamento do relatório. A instalação do marco temporal não só resolve a questão jurídica, como eles estão falando, como ainda vai trazer até outros conflitos, porque o indígena também não vai querer abrir mão de um território tradicional e ele vai continuar lutando por ele. Então a gente entende que acaba também prejudicando, inclusive territórios já demarcados, aqueles que foram demarcados 88 para cá. Se não estiverem dentro de todos esses critérios que eles estão apresentando, que é a comprovação da presença física e já mostrar um território em disputa no dia 5 de outubro 88. Então ele pode ainda também rever processos...
Caroline Blaudt: Que já estavam resolvidos.
Sonia Guajajara: Exato.
Caroline Blaudt: Certo. Mas seja qual for o tema ou o ministério tem trazido para o centro, tem trazido para conversa de forma efetiva os povos indígenas. Eles têm participado ativamente da construção das políticas e dos temas todos?
Sonia Guajajara: Nós estamos numa parceria muito boa com o movimento indígena, de fazer as coisas dialogadas, de agora também obedecer esses processos de escuta e de construção da política. Esse ano foi para organizar, para elaborar, para estruturar. E estamos agora já com planejamento para começar esse processo de escuta nos territórios, inclusive com as caravanas "Escuta Parente", que vai começar agora em novembro pela região Sul, para a gente fazer o processo de escolha dos representantes que vão compor o Conselho Nacional de Política Indigenista.
Caroline Blaudt: Bacana. Assim como em todo governo, a participação social tem sido bastante ativa, né?
Sonia Guajajara: Sim, muito.
Caroline Blaudt: Ministra, tem um outro assunto que é bem importante, que é a desintrusão, mas a gente vai precisar deixar ele para o próximo bloco. Pode ser?
Sonia Guajajara: Tranquilo.
Caroline Blaudt: Então vamos fazer um rápido intervalo e voltamos em instantes com o Brasil em Pauta.
Caroline Blaudt: O Brasil em Pauta já está de volta e a conversa hoje é com a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara. Bom, ministra, como falamos no final do último bloco, desintrusão é o tema agora. Esse processo começou no início do ano com o Alto Rio Guamá. Foi um processo bem concluído, bem sucedido, pacificamente, e foi até elogiado pela ONU como um modelo a ser seguido. Esse resultado obtido lá foi tão satisfatório que já encorajou o governo a seguir com outros dois processos. Fala um pouco para a gente.
Sonia Guajajara: Nós começamos com o Alto Rio Guamá, uma terra indígena que foi demarcada há 30 anos e os povos indígenas ainda não tinham ali a liberdade, a posse plena dessa terra. E houve o envolvimento ali de mais de 20 órgãos, que trabalhou conjuntamente para que pudesse de fato dar certo. E tinha que dar certo. E nós estamos agora com um planejamento de outras terras que vão ser desintrusadas. No momento estamos com Apyterewa e Trincheira/Bacajá, que na verdade é uma decisão judicial. É também um cumprimento legal que o governo está fazendo, que não é somente retirar as pessoas que estão dentro do território, mas é você garantir também a proteção do meio ambiente e a proteção desses territórios e fazer ali mesmo um trabalho de retirar todas as atividades ilícitas dentro desses territórios. Como ali na Apyterewa e Trincheira/Bacajá, é uma criação de gado ilegal, são as duas terras mais desmatadas dos últimos quatro anos, as campeãs de desmatamento. Nós estamos no momento de discutir como zerar o desmatamento no Brasil até 2030. Então nós temos que acabar com essas atividades ilegais, que provém do desmatamento, que vem da criação de gado ilegal, que provém dessas monoculturas em áreas da União, em terras indígenas, que é onde é proibido esse tipo de atividade. Para além só de seguir o modelo da Terra Indígena Alto Rio Guamá, é a gente também cumprir com a nossa missão enquanto ministério, enquanto governo, de acabar com essas atividades ilícitas e acabar com o desmatamento e garantir a proteção desses territórios, do meio ambiente, da biodiversidade, além de proteger as culturas e os modos de vida dos povos indígenas.
Caroline Blaudt: É importante também deixar claro que, além de ser uma operação feita por vários órgãos do governo de forma prioritariamente pacífica, mas não é simplesmente chegar e tirar o invasor, que muitas vezes é um invasor, mas tem gente de boa fé que foi também enganado. O governo não está tirando e jogando as pessoas na rua. Existem políticas também para essas pessoas. Está sendo feito todo um trabalho voltado para todos os envolvidos.
Sonia Guajajara: Por isso que envolve tantos órgãos, porque é exatamente para cada um agir conforme a sua competência, a sua atribuição. Por exemplo, o Incra vem junto para reassentar aquelas famílias ou assentar aquelas famílias que estão ali, de boa fé e que vão ser removidos. Então ele precisa ter essa segurança também de ter um lugar para ele morar, para ele conseguir fazer suas plantações, seu alimento. O MDS entra também desse apoio para garantir essas condições. O próprio MDA também entra junto aí, como esse órgão que fortalece apoio à agricultura familiar. Então a gente entra tanto com órgãos do governo federal interministerial, como também o governo estadual e os municípios. Então é tudo feito de forma muito conversada, de maneira que integra e que articula os diferentes entes federados: município, estado e governo federal.
Caroline Blaudt: Agora, como a senhora disse, é o cumprimento de decisões judiciais. Então já foi o Alto Rio Guamá, agora estão aí esses outros dois territórios. Quantas situações semelhantes nós temos hoje no Brasil? E depois dessas devem continuar esses processos de intrusão em outras áreas?
Sonia Guajajara: Olha, a ideia é a gente cumprir esse princípio legal que é de desocupar esses territórios, retirando os invasores. E aí seja invasor para exploração de madeira, seja um invasor para a exploração mineral, seja o grileiro de terra, seja esses que até receberam o título de posse dado pelo Estado em algum momento, que estão lá de forma equivocada. Um equívoco por parte do Estado, que nem é às vezes da pessoa. Mas a ideia é a gente agora organizar. Organizar isso. E onde é território indígena, constitucionalmente é usufruto exclusivo e a gente precisa entregar esse território. Então nós temos 32 áreas que estão nesse planejamento de desintrusão. Então, a ideia é terminando uma, terminando duas, a gente segue pra outra, porque também a gente não tem as condições estruturais suficientes para fazer mais de uma de uma vez só. Então a gente faz de forma mesmo assim sequencial.
Caroline Blaudt: E agora que já se tem esse know-how, como fazer ali, fica mais... Um pouco menos difícil de seguir com as próximas?
Sonia Guajajara: É. Eu sei que não é um processo fácil, né? Muita gente vai, fica lá, fica muito tempo. Houve um estímulo no governo passado para que essas pessoas até invadissem mesmo esses territórios. Houve ali também um estímulo de que ia ser regularizado esse processo para que eles pudessem permanecer ali. Então houve ali também uma motivação para aumentar essas invasões dentro dessas áreas. Então não é um processo simples, né? Não é. É preciso a gente ter muito cuidado, ter muita cautela, não incentivar ali ou estimular um conflito.
Caroline Blaudt: Porque é um momento tenso, né?
Sonia Guajajara: É. A gente precisa realmente fazer de uma forma tranquila. Essa tranquilidade tem que vir também da gente, dos órgãos, para poder transmitir isso no momento da ação.
Caroline Blaudt: Agora, especificamente dessas duas regiões, Apyterewa e Trincheira/Bacajá. Quantos indígenas moram na região? Quantos vão ser beneficiados? E nessas regiões tem até indígenas isolados, de recente contato? Conta um pouco pra gente.
Sonia Guajajara: Eu acho que também é importante a gente falar um pouco sobre a forma e a vivência dos povos indígenas isolados e de recentes contato. Porque tanto na Trincheira/Bacajá quanto na Apyterewa, quanto na Cachoeira Seca, que é uma outra que está também na lista, quanto Yanomami, que foi a primeira de todas ali para retirar os garimpeiros. Todas têm povos de recente contato e povos isolados. Então, quando você fala de povos isolados ou mesmo de recente contato, você não avalia a área pela quantidade de pessoas, mas pelo modo de vida dessas pessoas, porque eles evitam esse contato com a sociedade, até mesmo com os indígenas que estão dentro do mesmo território, né? Então você tem que considerar a área de circulação deles, para ter a caça para eles comerem, pra ter a água, para eles beberem, né? Então eles vivem ainda dessa forma muito natural, são nômades, vão de um lado para o outro. Então você tem que considerar essa área, esse espaço, para que eles possam sobreviver e também tirar dali a sua subsistência. Então, considerando a Apyterewa e a Yanomami, a gente tem cerca de uma população de 32.000 indígenas em média. Agora, quando se fala de quantos indígenas serão beneficiados, eu acho que a gente precisa ampliar também essa visão de que não são somente os indígenas beneficiados com a proteção desses territórios. É o meio ambiente, as pessoas, a biodiversidade, a floresta em pé, o território protegido, ele beneficia todo mundo, beneficia todo mundo. Então é um trabalho ali, natural dos povos indígenas, mas que acaba beneficiando toda a humanidade, todo o planeta.
Caroline Blaudt: E existe esse momento também, o pós desintrusão, que é o que já está acontecendo lá no Alto Rio Guamá, que pra se garantir que os invasores não voltem e pra garantir que os indígenas consigam reestruturar de novo o seu ambiente. É isso que está sendo feito lá e também vai ser feito nas próximas?
Sonia Guajajara: Sim. Precisa ter muito cuidado também com essa continuidade da fiscalização, do apoio para as comunidades, tanto para evitar o retorno dos invasores como para garantir que os indígenas possam ter as condições ali suficientes para proteger o território, para ter segurança dentro desses territórios e para produzir também ali, exercer suas atividades produtivas. Então, lá no Alto Rio Guamá eu tive uma reunião com lideranças que vieram lá do Alto Rio Guamá para a gente avaliar agora todas aquelas recomendações que ficaram no ato da finalização da desintrusão. Então nós estamos ali agora com um planejamento de fazer as estradas que eles pediram, que interliga as aldeias e também o município, para que eles não fiquem ali isolados. Eles vieram também reforçar o pedido da construção de postos de fiscalização, que precisa ter a fiscalização ali no entorno da área para evitar que os invasores voltem, assim como também um apoio para que eles possam coletar os produtos que estão lá dentro do território e que eles precisam agora beneficiar. A mandioca, por exemplo, para fazer farinha. Enfim. Então a gente tem também esse acompanhamento final para garantir ali as condições para os indígenas e a proteção do território.
Caroline Blaudt: Ministra, agora, em 2025, temos a COP 30 em Belém. Tivemos um evento preparatório que foram os Diálogos Amazônicos, belíssimo, por sinal. Nós acompanhamos. Realizado em agosto. E os indígenas foram ali peça fundamental. Podemos dizer que sem os indígenas não é possível a gente combater essa emergência climática? Eles são peças fundamentais para salvar o nosso futuro?
Sonia Guajajara: Olha, fundamental, viu? Eu acho que ainda falta uma compreensão maior da sociedade não-indígena como um todo, dos governantes assim, de entender o papel dos povos e dos territórios indígenas como grandes contribuidores para combater essa crise climática. Nós, povos indígenas, somos 5% da população mundial, somente 5%. Mas 82% da biodiversidade protegida no mundo está dentro dos territórios indígenas. E por que a gente chama sempre a atenção das pessoas de entender a causa indígena como uma causa sua também? Porque se os direitos indígenas estão ameaçados, se o modo de vida dos povos indígenas de se relacionar com a natureza, de proteger, estão ameaçados, essa biodiversidade toda está ameaçada. E se essa biodiversidade toda tá ameaçada, é impossível pensar no ar, na água. Então não dá para pensar o futuro. Então, eu acho que esse é um dado muito importante para as pessoas entenderem o quanto os indígenas são fundamentais para a humanidade e para o planeta.
Caroline Blaudt: E como que está sendo tratada a questão da saúde indígena, da educação indígena? Pode até ter uma universidade indígena, uma primeira universidade, em breve por aí?
Sonia Guajajara: A saúde indígena a gente acompanha. Temos uma coordenação no ministério dos Povos Indígenas de saúde, mas é uma responsabilidade direta da Secretaria Especial de Saúde Indígena, que está fazendo um bom trabalho. Estamos com o secretário nacional Weibe Tapeba, lá do Ceará, que foi também ali colocado por uma decisão coletiva do movimento indígena e está fazendo um excelente trabalho, conforme a própria ministra Nísia tem falado. E estamos trabalhando com o orçamento ainda para esse ano muito insuficiente, porque trabalhamos com o orçamento que ficou da gestão passada e que já era insuficiente para os anos anteriores. E recebemos ainda com uma previsão de déficit orçamentário de 60% a menos. Então trabalhamos no início, ainda na PEC da transição, a recomposição desse valor, desse orçamento. Então a gente conseguiu manter o valor que tinha ano passado e agora estamos trabalhando para aumentar esse valor para o próximo ano. E assim a gente conseguir implementar uma saúde de qualidade, garantindo mais estrutura, garantindo mais equipes, garantindo mais medicamentos, mais estrutura para chegar nas aldeias. Então tem uma deficiência. Reconhecemos isso esse ano, mas estamos trabalhando para melhorar. Na educação, a mesma coisa. A educação é hoje responsabilidade dos estados. São os estados que assumem junto com os municípios, com o ensino, com a pré-escola. E estamos trabalhando também agora junto ao MEC, para a gente poder ter diretrizes mais robustas, que possam garantir uma educação de qualidade. E a universidade indígena, posso até dizer que está tendo um interesse - eu poderia dizer uma disputa, mas um interesse de vários estados para querer implantar a primeira universidade indígena. O Maranhão saiu na frente. Nós inauguramos uma universidade indígena, a primeira dentro de um território indígena que foi dentro do meu território, Araribóia. E nós estamos nessa parceria com o governo do estado para trabalhar ali e ajudar na construção e no funcionamento dessa universidade que pode beneficiar tantos indígenas ali do território Arariboia do Maranhão, mas será aberta também para outros, para outras regiões.
Caroline Blaudt: Tomara que tenham várias por aí. Só pra finalizar, ministra, estamos aqui no Memorial dos Povos Indígenas em Brasília, que tem peças belíssimas com essa cultura maravilhosa. E nós temos tesouros como esses que estão fora do país, como mantos Tupinambá, que inclusive a Dinamarca deve devolver um em breve. O ministério está trabalhando para conseguir reaver mais artefatos preciosos como esse? E tem uma ideia de quantos estão nessa situação e a importância de repatriá-los?
Sonia Guajajara: Olha, há um interesse e uma articulação muito grande do ministério para fazer a repatriação de muitos outros. Nós já conversamos com algumas pessoas na Áustria que querem, apresentaram o interesse de devolver alguns artefatos. O Japão, e agora Portugal. Conversei esses dias com o embaixador, aliás, com o ministro de Relações Exteriores de Portugal, e ele vem agora em dezembro. Nós vamos conversar para começar também o trâmite da devolução de alguns materiais nossos. E aqui nós criamos um grupo de trabalho no âmbito do ministério dos Povos Indígenas, para fazer toda essa identificação, a qualificação desses produtos, desses materiais, artefatos que já estão espalhados por aí. E aqui, internamente também, a gente organizar o espaço pra poder receber esses objetos. Porque não dá também só para a gente trazer de volta e chegar aqui e não ter como ter um lugar adequado para a gente cuidar, né? Então a gente precisa também ter todo esse cuidado, esse olhar, para poder apresentar e devolver para os povos, mas também apresentar para a sociedade.
Caroline Blaudt: Muito bacana. Estaremos aqui para mostrar quando chegarem. Muito obrigada, ministra, pela entrevista. Foi um prazer.
Sonia Guajajara: Muito obrigada!
Caroline Blaudt: Essa foi a minha conversa com a ministra Sonia Guajajara, dos povos indígenas. Se você quiser rever esta ou outras entrevistas, siga as nossas redes sociais. Obrigada pela companhia e o Brasil continua em pauta aqui no Canal Gov.