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NEOINDUSTRIALIZAÇÃO
Governo lança estratégia para desenvolver Complexo Econômico-Industrial da Saúde com investimento de R$ 42 bilhões até 2026
O governo federal avança na estratégia para a neoindustrialização do país com investimento de R$ 42 bilhões em um dos setores mais importantes para a política industrial brasileira: a saúde. Nesta terça-feira (26), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou decreto instituindo a Estratégia Nacional para o Desenvolvimento do Complexo Econômico-Industrial da Saúde.
Com seis programas estruturantes, o objetivo é expandir a produção nacional de itens prioritários para o SUS e reduzir a dependência do Brasil de insumos, medicamentos, vacinas e outros produtos de saúde estrangeiros. A maior autonomia do país é fundamental para reduzir a vulnerabilidade do setor e assegurar o acesso universal à saúde para todos.
A estratégia, coordenada pelo Ministério da Saúde e MDIC, com a participação de outros nove ministérios, está totalmente integrada ao esforço de implementação da nova política industrial em construção pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI). O colegiado tem como uma de suas missões o fortalecimento do complexo econômico-industrial da saúde para a maior autonomia do Brasil no setor e ampliar o acesso à saúde.
Durante o evento, o presidente Lula ressaltou que a iniciativa é mais que uma estratégia para ampliar e fortalecer a indústria ligada à saúde. “Nós estamos criando um país”, afirmou. Ele explicou que as demandas do SUS geram mercado para que a indústria invista no setor da saúde e ressaltou a possibilidade de parcerias internacionais. “Quem tem mercado não tem que ter problema. A gente vai consumir grande parte daquilo que a gente produz aqui mesmo. E Deus queira que a gente produza mais, porque a gente vai construir uma aliança forte na América do Sul, na América Latina, com o continente africano. E a gente pode repartir, vendendo isso a preço acessível a quem ajudar a gente produzir. É esse país que nós queremos construir”, avaliou o presidente.
O vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, destacou como prioridade reduzir a dependência externa de insumos e equipamentos da área da saúde, que representa atualmente o segundo maior déficit da balança comercial do país (US$ 9 bilhões de déficit por ano).
Alckmin listou um conjunto de fatores que contribuirão para esse objetivo: recursos para pesquisa e inovação, como as linhas de crédito disponibilizadas por BNDES e Finep tendo por juros a Taxa de Referência (TR); acelerar o registro de patentes, esforço que tem sido encampado pelo MDIC e pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), cuja meta é reduzir de 7 para 2 anos o prazo de registro; realizar parcerias com a iniciativa privada, como as Parcerias de Desenvolvimento Produtivo (PDPs) anunciadas no evento; utilizar o poder de compra do governo, afinal, "o governo também induz"; e, por fim, a isonomia tributária.
"Nós estamos fazendo um checklist para verificar os casos em que é mais barato importar do que fabricar no Brasil, em termos de carga tributária, para a gente reduzir esses tributos", informou o ministro, que ressaltou o trabalho conjunto do governo federal para fortalecer o complexo industrial da saúde.
Para a ministra da Saúde, Nísia Trindade, “reduzir a vulnerabilidade dos SUS e ampliar o acesso à saúde” resume o objetivo da estratégia. De acordo com ela, a neoindustrialização da saúde representa uma retomada com inovação, inclusive reposicionando o Brasil no cenário internacional, como um ator na defesa da redução das desigualdades e de uma cooperação solidária e positiva.
“É a reconstrução de uma nova forma de atuação integrada do Estado para atender desafios nacionais. É o uso das compras públicas para desenvolvimento, inovação, e para colocar o pobre no orçamento”, destacou a ministra.
Esforço conjunto — Onze ministérios, ao todo, estão envolvidos na ação. O lançamento da estratégia é resultado do trabalho do Grupo Executivo do Complexo Econômico-Industrial da Saúde (Geceis), recriado em abril de 2023.
Durante esse período, o grupo focou em eixos prioritários que estão entre as principais necessidades do sistema público de saúde, para garantir a sustentabilidade do SUS. Uma das prioridades é o reforço na produção de insumos que auxiliem na prevenção, diagnóstico e tratamento de doenças determinadas socialmente, como tuberculose, doença de Chagas, hepatites virais, HIV. Mas a iniciativa conta também com investimento no enfrentamento de agravos relevantes para a saúde pública, como doenças crônicas (câncer, cardiovasculares, diabetes e imunológicas), dengue, emergências sanitárias e traumas ortopédicos.
O presidente eleito da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Ricardo Alban, falou sobre setores da saúde que a indústria precisa focar, como química fina e biológicos. “Devemos aproveitar que temos o que no mundo não existe: o maior cliente individual da área da saúde, que é o SUS. Com ele, o que nós podemos alavancar de políticas públicas e juntar essa vontade e essa disposição do setor privado de investir na saúde e fazer com que nós possamos ter encadeamento produtivo aqui mais vigoroso”.
Investimentos
Do total de investimentos até 2026, serão R$ 9 bilhões previstos pelo Novo PAC. Já o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) deve participar com R$ 6 bilhões e a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), com outros R$ 4 bilhões — ambos incluídos nos R$ 106 bilhões que o CNDI anunciou para a política industrial brasileira.
O governo federal prevê ainda aporte de cerca de R$ 23 bilhões da iniciativa privada, em parcerias como as Parcerias para o Desenvolvimento Produtivo (leia abaixo). Assim, o governo visa suprir o SUS com a produção e tecnologia locais, além de frear o crescimento do déficit comercial da Saúde, de 80% em 10 anos. Em 2013, o déficit era de US$ 11 bilhões. Hoje chega a US$ 20 bilhões.
Nessa ação pela expansão do CEIS, há recursos previstos também para unidades de produção e pesquisa da Empresa Brasileira e Hemoderivados e Biotecnologia (Hemobrás) e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), ambas do governo federal. Também estão previstos programas para desenvolvimento nacional de vacinas, soros, além de modernização e inovação na assistência prestada por entidades filantrópicas.
Saúde é estratégica para autonomia do Brasil
Atualmente, o setor da saúde representa 10% do Produto Interno Bruto (PIB), garante a geração de 20 milhões de empregos diretos e indiretos e responde por um terço das pesquisas científicas no país. A posição estratégica do Brasil como um grande mercado interno mostra a capacidade de crescimento e ampliação desse setor na economia brasileira.
No entanto, a dependência do Brasil para insumos de saúde torna o SUS vulnerável ao mercado externo, dificultando a aquisição de insumos essenciais. Essa fragilidade ficou ainda mais evidente durante a pandemia da Covid-19.
No caso do IFA, por exemplo, mais de 90% da matéria-prima usada no Brasil para produção de insumos como vacinas e medicamentos, é importada. Já na área de equipamentos médicos, a produção nacional atende 50%. Em medicamentos prontos, o percentual é de cerca de 60% e, em vacinas, um pouco acima. A meta é atingir média de 70% de produção local no setor.
Conheça os 6 programas estruturantes da Estratégia Nacional para o Desenvolvimento do Complexo Econômico-Industrial da Saúde:
1 - O Programa de Parceria para o Desenvolvimento Produtivo envolve a articulação do governo com o setor privado para a transferência de tecnologia, nas conhecidas PDPs, mas agora é orientado ainda mais à redução de vulnerabilidades do SUS e à ampliação do acesso da população à saúde. A estimativa é que o poder público atraia até 2026 em torno de R$ 23 bilhões do setor privado.
2 - O Programa de Desenvolvimento e Inovação Local prevê a retomada dos investimentos em iniciativas locais com foco tecnológico e inovador, como na inteligência artificial para a detecção precoce de doenças, por exemplo. É voltado igualmente aos principais desafios do SUS, levando em conta a necessidade de redução das vulnerabilidades produtivas e tecnológicas, de promoção da sustentabilidade e do acesso à saúde.
3 - O Programa para Preparação em Vacinas, Soros e Hemoderivados visa a autossuficiência em produtos essenciais para a vida dos brasileiros e reúne esforços do poder público e da iniciativa privada. Estimula a produção nacional de tecnologias, a ampliação do acesso e a garantia do abastecimento de vacinas, soros e hemoderivados. A ideia é que as iniciativas sejam monitoradas e envolvam inovação local, além de transferência de tecnologia.
4 - O Programa para Populações e Doenças Negligenciadas é uma retomada da estratégia inicial para a produção pública no país, com foco em doenças como a tuberculose, a dengue, esquistossomose, hanseníase. Este é um dos pontos de maior destaque da nova estratégia do CEIS, que visa a equidade. Engloba o estímulo à produção de tecnologias para melhorar a prevenção, diagnóstico e tratamento da população afetada por doenças negligenciadas, e inclui cooperação entre os setores público e privado.
5 - O Programa de Modernização e Inovação na Assistência abrange em especial as entidades filantrópicas. A proposta é que a expansão do CEIS seja articulada à modernização e inovação na assistência por estas instituições prestadoras de serviços aos SUS. Há previsão de que sejam estabelecidos mecanismos de incentivo e, também, compromissos para adesão a este programa. Os hospitais filantrópicos são responsáveis por 60% de todo o atendimento de alta complexidade na rede pública de saúde.
6 - O Programa para Ampliação e Modernização da Infraestrutura do CEIS articula investimentos públicos e privados para a expansão produtiva e da infraestrutura do próprio Complexo. O objetivo é viabilizar a capacidade de produção, tecnológica e de inovação do CEIS, algo necessário para a execução dos demais cinco programas listados.
Fotos: Cadu Gomes/VPR