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POVOS INDÍGENAS
Fiocruz examina amostras de água em território Yanomami a fim de reduzir casos de diarreia e mortalidade infantil
Estudo visa reduzir a incidência de doença diarreica aguda (DDA) e a mortalidade infantil - Foto: Divulgação (Forças Armadas)
Pesquisadores coordenados pela Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp) – instituição vinculada à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) – estão em São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas, para examinar amostras de água usada para consumo humano no Terra Indígena (TI) Yanomami Maturacá. O objetivo do trabalho é reduzir a incidência de doença diarreica aguda (DDA) e a mortalidade infantil relacionadas à desidratação e desnutrição entre crianças de 0 a 5 anos.
O trabalho de campo, iniciado em janeiro, tem previsão de conclusão neste mês de fevereiro de 2023. Os pesquisadores estão desenvolvendo análises da qualidade das águas dos rios, dos poços e de torneiras usadas para abastecimento humano. A intenção é desenvolver um mapa com os potenciais fatores de risco de contaminação e pontos seguros disponíveis na aldeia para fornecimento de água, considerando o uso doméstico (água para ingestão, para preparo de alimentos e para higiene pessoal).
A iniciativa é um desdobramento de outra pesquisa, realizada em 2019, em parceria com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef). O estudo original analisou 304 crianças Yanomami menores de cinco anos. Os dados mostraram que 81,2% delas tinham baixa estatura para a idade (desnutrição crônica); 48,5% tinham baixo peso (indicação de desnutrição aguda) e 67,8% estavam anêmicas.
"Com base nos dados da pesquisa de 2019, desenvolvemos um modelo teórico que pudesse explicar os determinantes sociais da desnutrição, na perspectiva das aldeias estudadas, e a ausência de água potável foi um fator agravante. O projeto que estamos desenvolvendo agora, em 2023 – intitulado 'Nos caminhos das águas, a retomada da saúde Yanomami' – busca o desenvolvimento de adequações sociotécnicas (tecnologias sociais) que garantam o acesso à água em quantidade e qualidade adequadas para as comunidades selecionadas na Terra Indígena Yanomami", explicou o pesquisador Paulo Basta, que também coordenou a pesquisa de 2019.
Paulo Basta ainda explica que a equipe vai avaliar o manejo dos rios, das águas da chuva, dos dejetos humanos e dos resíduos sólidos na região, além de fazer diagnóstico das possíveis causas para o elevado número de casos de diarreia na TI Yanomami. O projeto também possibilitará, por intermédio da parceria com o Serviço Geológico do Brasil (SGB/CPRM), que a TI Yanomami passe a integrar o Atlas Hidrogeológico do Brasil ao Milionésimo, que reúne estudos e pesquisas realizados no Brasil sobre águas subterrâneas.
Integram o grupo de pesquisa Gina Boemer, Alexandre Pessoa e Pedro Basta, da Fiocruz; Salete Almeida, do Instituto Leônidas; Maria Deane, da Fiocruz Amazônia; Valdemilton Gusmão e José Luiz Marmos (SGB/CPRM). A equipe também conta com a participação do Instituto Socioambiental (ISA) e da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro.
RIOS CONTAMINADOS EM RORAIMA – Outro estudo de pesquisadores da Fiocruz, ISA, Instituto Evandro Chagas e Universidade Federal de Roraima (UFRR), iniciado em 2021, foi fundamental para constatar que os pescados coletados em três de quatro pontos na Bacia do Rio Branco – principal recurso hídrico do estado de Roraima – apresentaram concentrações de mercúrio maiores ou iguais ao limite estabelecido pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) e a Organização Mundial da Saúde (OMS).
Baseada em metodologia proposta pela OMS, a análise de avaliação de risco à saúde coletou amostras de pescado e revelou índices altos de contaminação em trecho do Rio Branco na cidade de Boa Vista (25,5%), Baixo Rio Branco (45%), Rio Mucajaí (53%) e Rio Uraricoera (57%). Para algumas espécies de peixes carnívoros (como o filhote), o estudo apontou que a contaminação já é tão alta que praticamente não existe mais um nível seguro para o seu consumo, seja qual for a quantidade ingerida. No Uraricoera, ponto mais próximo à TI Yanomami, a cada 10 peixes coletados, seis apresentaram níveis de mercúrio acima dos limites estipulados pela OMS.
GARIMPO ILEGAL – O médico e pesquisador Paulo Basta estuda a população Yanomami há 25 anos e faz alertas sobre os efeitos nocivos do garimpo à saúde dos povos indígenas. Basta é um dos responsáveis pelo relatório “Yanomami Sob Ataque: Garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami e propostas para combatê-lo". O documento aponta que o garimpo na TI é causa de violações sistemáticas de direitos humanos e está diretamente associado à explosão nos casos de malária e outras doenças infectocontagiosas.
Ainda segundo o levantamento, o número de comunidades afetadas pelo garimpo ilegal soma 273, abrangendo mais de 16.000 pessoas – o que corresponde a 56% da população total. Existem mais de 350 comunidades indígenas na TI, com uma população pouco acima de 30 mil pessoas. Paulo Basta destaca que a crise sanitária, nos últimos quatros anos, foi agravada drasticamente pela completa falta de assistência do governo passado e pelo aumento descontrolado do garimpo na região.
outras informações sobre o estudo em São Gabriel da Cachoeira
outras informações sobre o estudo na Bacia do Rio Branco