Entrevista do presidente Lula durante café da manhã com jornalistas
Presidente Lula: Só para o Cururu olhar e ver como eu estou mais elegante que ele, ficar morrendo de inveja.
Olha, primeiro queria contar um pequeno caso para vocês. Há muito tempo atrás, eu andava muito incomodado com as manchetes de jornais, normalmente criticando o PT. Eu lembro que nós fizemos uma reunião no Instituto Cidadania, na época, e convidamos os principais jornalistas dos principais órgãos de jornais, Jornal do Brasil, na época; da Folha de S. Paulo, do Estadão, do jornal O Globo. E foram lá aqueles jornalistas mais importantes. Eu só lembro da Folha, que foi o Clóvis Rossi. E foi uma coisa organizada pelo Ricardo Kotscho, que a gente queria saber porquê tanta manchete negativa contra o PT. E a lição que nós aprendemos é que, se a gente não quiser a manchete negativa, a gente não tem que dar pretexto para que as pessoas façam as manchetes. Então, é preciso que a gente pense o que vai falar, porque tudo que você falar pode virar uma manchete. E eu sei que, nem sempre, ou normalmente, não é o jornalista que faz a manchete. O jornalista faz o artigo, a manchete tem um cara que faz o que o Pimenta [Paulo Pimenta, ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República] faz para o governo: tenta vender, da melhor forma possível, o seu jornal.
E a manchete é um atrativo e eu disse para o Pimenta que, ontem, nós anunciamos, sem dúvida nenhuma, o mais importante programa de crédito e microcrédito que já foi lançado neste país, em 500 anos de história. É a primeira oportunidade em que a gente está tornando real aquele famoso discurso que eu faço sempre: muito dinheiro na mão de poucos é concentração de riqueza e pouco dinheiro na mão de muitos é distribuição de riqueza. O que nós fizemos foi uma quantidade de crédito, de proposta de crédito, que vai começar a funcionar a partir de agora. Muitos vão entrar em vigor a partir de julho, a partir de agosto, mais porque os bancos têm que se preparar. Mas é a tese do governo de que ou o dinheiro circula ou a economia não cresce. É preciso fazer com que o dinheiro circule na mão de muita gente para que um pequeno empreendedor vire um pequeno empregador. Para que esse empregado que foi contratado vire um consumidor. Esse consumidor, se ele consumir, ele vai gerar mais a possibilidade de mais um emprego ser gerado, seja na indústria, seja no comércio, seja na agricultura. E o que nós fizemos ontem foi fazer com que a roda gigante possa funcionar envolvendo a grande maioria do povo brasileiro.
É, sem dúvida nenhuma, com o Desenrola que a gente já tinha lançado, no começo do ano, os mais importantes programas de fazer com que o crédito chegue na mão das pessoas, porque o Desenrola é uma coisa que vai abater dívidas de pessoas em até 90%. Não sei se vocês precisaram do Desenrola, mas, se precisar, vocês podem ir ao banco e vocês vão perceber que vocês podem negociar a dívida de você para pagar 10%, 5%, da dívida, que é um programa que nós assumimos durante a campanha, dizendo que 72% da população brasileira estava endividada e que era preciso zerar essa dívida, para que as pessoas voltassem a ser consumidores outra vez, porque senão a economia não crescia.
E, ontem, com o anúncio que nós fizemos, foi, na final, possivelmente a última proposta que a gente anunciou, porque, agora, todo mundo aqui que plantou vai ter que colher. Agora a nossa tarefa é esperar para saber o tamanho da safra que nós vamos colher. Nós não temos uma Conab política para fazer uma avaliação da produção até o final do ano, mas eu estou altamente convencido de que nós vamos colher um sucesso extraordinário no Brasil. Ontem, eu contei também uma história que, em maio de 2004, eu fui para São Bernardo [do Campo], fazer um ato na Ford, e eu tinha dito que as pessoas iam começar a assistir o espetáculo do crescimento. Vocês se lembram, algum de vocês estavam na imprensa naquele tempo, e se lembram quanta crítica eu recebi pelo meu excesso de otimismo. O dado concreto é que, naquele ano, a economia cresceu 5,8%. E ninguém que me criticou sequer pediu desculpas pelas críticas que tinham feito.
Eu vou dizer para vocês que, em janeiro, eu encontrei com a presidenta do FMI, a diretora-geral, em Hiroshima. E ela, muito simpática, me procurou para dizer: “Presidente, eu estou torcendo pelo senhor, mas eu queria dizer que a economia do Brasil está muito fraca. O Brasil vai crescer, possivelmente, no máximo, até 0,8% ou um pouco menos”. E eu falei para ela com muita gentileza: “Olha, eu acho que a senhora não conhece o Brasil. A senhora não conhece o povo brasileiro. A senhora não conhece o jeito que a gente faz política. Portanto, eu quero lhe dizer que a senhora está cometendo um erro. Eu vou lhe provar no final do ano”.
Quando foi no final do ano, ela veio aqui. Muito simpática, ela está precisando ser reconduzida ao cargo e o Brasil tem voto. Ela veio aqui e conversei bastante com ela. E ela fez outra avaliação negativa para 2024. Eu falei: “Outra vez, você vai errar, porque a economia brasileira vai crescer mais do que todos os chamados especialistas falaram até agora”. Eu estou dizendo isso no dia 23 de abril, dia de São Jorge, dia do santo padroeiro do meu Corinthians. E vocês guardem que eu falei isso: a economia em 2024 vai crescer mais do que todos os analistas econômicos falaram até agora, todos, sem distinção.
E por que vai crescer? Porque as coisas estão acontecendo no Brasil. Eu posso desafiar vocês a estudarem o que aconteceu no Brasil, nesses últimos 14 meses, e vocês vão constatar de que nunca antes na história do Brasil houve uma quantidade de políticas de inclusão social colocadas em prática, algumas que nós já tínhamos feito e que tinham desaparecido e que estão voltando agora. E outras que começam a voltar, porque vocês sabem, não sei se vocês já alugaram apartamento para alguém ou se vocês já pagaram aluguel, vocês sabem que, quando a gente entra em uma casa para arrumar, a gente não consegue arrumar no primeiro dia. E nós encontramos esse país muito desarrumado. Até hoje, nós ainda temos ministérios que vão precisar fazer concurso para repor parte da quantidade de funcionários que nós tínhamos em 2010.
Ou seja, nós estamos, hoje, tentando fazer concurso em algumas áreas para repor a quantidade de pessoas que a gente tinha em 2010. E isso é uma situação que leva um tempo para fazer. Mas eu disse outro dia para vocês: nós semeamos a terra, nós aramos — a palavra arar não é mais, porque não tem mais arado, arado é coisa do passado —, nós semeamos a terra, plantamos a semente, adubamos, cobrimos a terra, estamos aguando e, agora, é para colher. E vou dizer para vocês de que vocês ficarão surpresos com o que vai acontecer nesse Brasil nesse tempo.
Eu vou dar um dado para vocês refrescarem a memória. Quando eu deixei a Presidência da República, em 2010, a indústria automobilística brasileira vendia, aproximadamente, 3,8 milhões de carros. Em dezembro de 2010. Eu volto, 15 anos depois, a indústria automobilística estava vendendo 1,8 milhão de carros. Ela estava vendendo menos da metade do que vendia em 2010. Agora, em abril, ela já recuperou e está produzindo 2,3 milhões de carros. Já está vendendo 2,3 milhões de carros o ano passado e continua crescendo agora, mensalmente. E o que é mais importante: é que, em menos de um mês, a gente recebeu anúncios de investimentos de R$ 129 bilhões no setor automobilístico, coisa que, há muitas décadas, a gente não ouvia falar nesse país.
O que se ouvia dizer é que a indústria automobilística iria seguir o caminho da Ford e iria embora do Brasil. O que aconteceu é que todas as empresas, todas, sem distinção, anunciaram muito investimento. A última anunciou, essa semana, um investimento de R$ 4,2 bilhões. Ou seja, numa demonstração de que o Brasil goza hoje de uma credibilidade externa que a gente não tinha nem nos meus primeiros dois mandatos. A gente não tinha, porque a nossa volta e a garantia do processo democrático nesse país gerou uma expectativa extraordinária.
Ontem, eu recebi uma pessoa que vocês conhecem bem, que é o Slim [Carlos Slim Helú, empresário mexicano]. Vocês sabem que, durante muito tempo, foi um dos empresários mais ricos do mundo. Pois o Slim veio dizer aqui que ele está disposto a investir, nos próximos anos, R$ 40 bilhões no sistema de telecomunicações do Brasil. E, de pronto, vai começar a investir R$ 17 bilhões. Ontem, eu recebi o pessoal de uma empresa de transporte marítimo, que trabalha com porto, que veio anunciar também um investimento de R$ 17 bilhões no Brasil, R$ 8 bi ou R$ 7 bi até 2026 e, depois, o restante, mais cinco anos pra frente, para investir nos portos brasileiros. E assim está acontecendo na agricultura. Esses dias eu fui inaugurar um frigorífico, em Campo Grande, que estava autorizado para vender carne para a China desde 2018.
E precisou eu voltar a presidir esse país para exportar o primeiro contêiner de carne para a China, de um frigorífico que estava autorizado desde 2018. Eu tive o prazer de inaugurar a fábrica de hemoderivados em Pernambuco, em Goiana. Essa fábrica começou quando eu era presidente, em 2003. Pois não aconteceu nada até eu voltar à presidência e, portanto, eu tive o prazer de inaugurar uma fábrica que começou a ser construída quando Humberto Costa era ministro da Educação. Ou melhor, ministro da Saúde. Da mesma forma que eu vou a Nova Lima inaugurar uma fábrica, do companheiro Walfrido Mares Dias, que vai produzir hemoglobina, uma fábrica que também, desde 2004, está sendo construída.
Pois eu tenho o prazer, como eu tenho muita sorte, eu vou inaugurar essa fábrica na próxima sexta-feira. Eu estou contando essas coisas para vocês porque eu acho que o Brasil vive um novo tempo. O Brasil vive um momento de expectativas, o Brasil vive um momento em que eu, como presidente da República, estou extremamente satisfeito e quero corroborar o que o Pimenta disse no começo. Nunca antes na história do país houve um programa de investimento de crédito como nós anunciamos ontem. Crédito para todo mundo. Crédito para todo mundo, ou seja, na certeza de que não existe outra possibilidade do país crescer. Tem duas coisas que fazem um país se desenvolver. É um país fazer investimento em educação e ter altamente mão-de-obra qualificada, uma forte engenharia, e a outra é ter crédito. Sem crédito, ninguém vai a lugar nenhum.
O problema é que, aqui no Brasil, tudo é tratado como se fosse gasto. Emprestar dinheiro para pobre é gasto, colocar dinheiro na saúde é gasto, colocar dinheiro na educação é gasto, colocar dinheiro em qualquer coisa é gasto. A única coisa que parece investimento é superávit primário. Essa é a única coisa que se trata como investimento é isso. Então eu tenho dito que ainda é preciso contratar os sinólogos do mundo inteiro para eles darem uma definição do que é gasto e o que é investimento. O que é gasto? Quando os jornais que vocês trabalham investem no salário de vocês é gasto? Ou é investimento? Obviamente que ele está fazendo um investimento, porque ele quer colher de vocês mais potencial de trabalho que vocês têm para oferecer.
Se eles fossem aumentar o salário para desmotivar vocês a trabalhar, aí não iria dar aumento para vocês. Aí seria gasto. Mas se eles derem aumento e vocês ficarem mais motivados e fazer meia hora a mais de trabalho, fazer um artigo a mais, uma linha a mais, é um investimento que tem retorno. Eu sempre brigo com isso porque, no Brasil, às vezes, a gente discute assuntos que é uma coisa muito secundária. O PT tem um filósofo chamado Vicentinho, que é deputado federal, foi presidente da CUT, que ele inventou uma máxima extraordinária: o importante é o principal, o resto é secundário.
Então, partindo desse pressuposto, vamos discutir, nesse bate-papo aqui, o importante é o principal, o resto é secundário. Vocês estão livres para fazerem as perguntas que vocês quiserem, do jeito que vocês quiserem, para a gente poder responder. Quem vai controlar as perguntas aqui é o nosso Crispiniano [José Crispiniano, secretário de Imprensa da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República], que não é um cara tão alegre como eu, não é tão festivo como eu. Ele tem mais dificuldade. Só espero que ninguém faça uma manchete que eu dei bronca nele agora. Só espero. Então, gente, é o seguinte: vamos conversar com a franqueza que vocês esperam que um presidente da República possa conversar com a imprensa, tá?.
Eu quero terminar dizendo para vocês que, se vocês conhecerem algum homem ou alguma mulher neste país, otimista, pode saber que eu sou mais otimista do que eles. Eu tenho tanta certeza do que vai acontecer nesse país que eu quero, quem sabe, quando chegar perto do final do meu mandato, fazer um café desses, tão pomposo como esse, para a gente poder discutir o que aconteceu no terceiro mandato do presidente Lula na República deste país.
Dito isso, eu largo o microfone e passo o microfone para vocês.
Ranielly Rodrigues Veloso (TV MEIO): Bom dia, bom dia a todos. Bom dia, presidente. Ranielly Veloso, da TV Meio. Presidente, a gente recebeu aqui, antes do café, uma série de números positivos do governo, que é isso que o senhor realmente destaca. E diante dessa série de números positivos, a gente vem acompanhando as avaliações negativas, né?
Então, eu quero saber do senhor, que a gente sempre escuta dos interlocutores, mas do senhor, por que que essa avaliação está desse jeito? Se preocupa o senhor?
E eu quero aproveitar, porque estou muito curiosa, que o senhor fez uma reunião com o Lira no domingo, e a gente estava esperando a reunião para essa semana. O que que o presidente da Câmara pediu ao senhor, e o que o senhor pediu ao presidente da Câmara?
Presidente Lula: Na verdade, você fez duas perguntas. A primeira coisa que é importante dizer para vocês, um político qualquer que tiver preocupação com pesquisa no começo do seu mandato, efetivamente ele não está preparado para ser político. Ou seja, você sai de uma campanha e eu tenho clareza de todas as coisas que eu prometi para o povo brasileiro, de todas as coisas que eu disse que ia fazer e de todas as coisas que eu vou fazer certamente. Ou então, quando sai uma pesquisa no primeiro ano de mandato, é normal que a expectativa, que não foi atendida, gere um mau humor na sociedade. Eu, antes de ser presidente, eu fui eleitor.
Eu sei como é que funciona essas coisas. Então, a mim não me incomoda porque eu sei o que estamos fazendo, sei o que estamos plantando, e o que a gente está plantando, se a gente colocou a semente certa, a gente sabe o que vai colher. Se você planta milho você vai colher milho, você não vai colher soja. Se você plantar soja, você vai colher soja e não vai colher milho.
E eu sei que nós estamos plantando desenvolvimento, geração de emprego, melhoria das condições salariais, melhoria do salário mínimo. E tudo isso está acontecendo. Tudo isso está acontecendo. Você pensa que eu esqueci da cervejinha e da picanha? Eu não esqueci, eu ainda falo até hoje de que o preço da carne já baixou e muito. E tem que baixar mais. Tem que baixar muito mais. Nós sabemos que tem que baixar mais.
Ou você abaixa o preço da comida ou aumenta o salário do povo. É a forma de você permitir que ele tenha acesso às coisas. E tudo isso está no nosso programa. Nós já fizemos a desoneração do imposto de renda até dois salários mínimos. Está lembrado que eu tenho o compromisso de fazer até R$ 5 mil até terminar o meu mandato. E vou fazer. Tudo isso vai acontecer. Então, eu acho que no momento que as coisas começarem a acontecer, o povo vai fazer a avaliação correta do que está acontecendo no Brasil. As pessoas podem não gostar de um presidente, mas as pessoas podem gostar da política que está sendo colocada em prática nesse país.
Isso também já aconteceu no Brasil, de forma que eu, sinceramente, não tenho nesse instante preocupação. O único dia em que me preocupei com pesquisa, que eu quase não dormi à noite, foi em 1989. Eu estava disputando as eleições, e eu fui visitar a hidrelétrica de Balbina, no Amazonas, que eu queria fazer uma denúncia de que a hidrelétrica de Balbina era um monumento à insanidade, porque fizeram um lago enorme para produzir pouca energia. Então, eu queria fazer uma denúncia. E quando chegou no aeroporto de Manaus, o meu amigo Ricardo Kotscho foi comprar o jornal e trouxe uma pesquisa que dizia o seguinte: “Lula cai de 3% para 2,75%”.
Eu, sinceramente, se eu pudesse jogava o Ricardo Kotscho para fora do avião, porque eu estava tão bem-humorado com o comício que eu fiz no Piauí e em Belém, eu perdi o humor. Você acredita que eu voltei para São Paulo pensando em desistir de ser candidato? Eu pensei em desistir, eu falei: “Eu vou pedir para o PT indicar outro, porque se eu continuar caindo, isso era junho, eu já estou com 2,75%, vai terminar a campanha, eu vou estar devendo 10 pontos para o Ibope, e eu não sei como é que a gente paga os pontos”. Então, isso não me preocupa nesse instante, querida.
A segunda coisa com relação ao Lira. Olha, se eu fizesse uma reunião com o Lira, e eu quisesse que a imprensa soubesse, eu falaria pra imprensa. Não seria simples assim? Eu comunicaria à imprensa: “Eu vou ter uma reunião com Lira”. E quando eu fizer reunião com Lira, eu converso com vocês o assunto, o resultado da nossa conversa, tá? Quando eu conversar, você faz a pergunta que eu vou dizer o resultado da conversa que eu fiz com Lira. Eu não tive reunião com Lira, eu tive uma conversa com o Lira. É diferente de uma reunião, é diferente de uma reunião, tá? Porque se eu tivesse uma reunião, eu teria trazido o meu líder na Câmara, teria trazido o meu líder no Congresso Nacional para poder fazer uma reunião sobre as coisas da Câmara, tá? Como foi uma conversa entre dois seres humanos, eu peço pra vocês que eu não sou obrigado a dizer a conversa que eu tive com Lira.
Vera Rosa (Estadão): Bom dia, presidente. Presidente, eu vou insistir na pergunta da colega, embora o senhor tenha dito que não vai dizer detalhes da reunião com o presidente Arthur Lira, mas eu gostaria de saber como que o senhor pretende resolver o problema da articulação política do governo com o Congresso? Porque na Câmara e no Senado prometem derrubar vários vetos presidenciais que o senhor fez a propostas do Legislativo.
E aproveitando, eu gostaria de saber se o senhor pretende fazer uma reforma ministerial, que muito se diz que o senhor vai fazer essa reforma, mas não se sabe se é agora, se é depois das eleições, o senhor já disse que não mexe na articulação política, mas como o senhor pretende resolver esse problema, presidente?
Presidente Lula: Vera, primeiro, eu, sinceramente, não acho que a gente tenha problema no Congresso. A gente tem as situações que são as coisas normais da política. Vamos só lembrar o número, Vera: nós temos 513 deputados, o meu partido só tem 70. Nós temos 81 senadores, o meu partido só tem 9. Se a gente somar os nossos aliados ideológicos, a gente vai para 12 ou 13. E a gente não chega sequer a 140 deputados. Então, você percebe o milagre que aconteceu nesse país. Você acredita em milagre? Como é que se explica a gente aprovar uma PEC da Transição antes de assumir a Presidência da República. Vocês se deram conta da anomalia, que eu comecei a governar antes de tomar posse?
Que nós tivemos que negociar PEC da Transição, que foi o que permitiu que a gente tivesse dinheiro para governar 2023. Isso deveria ter sido feito no Orçamento do cidadão. Mas foi no meu que nós fizemos. Então, veja que coisa interessante. Em um país que o presidente só tem 70 deputados de seu partido, a gente conseguiu aprovar a PEC da Transição, apenas com alguns votos contra de alguns poucos deputados, porque muita gente, muita gente, inclusive de partido do outro lado, votou a favor da PEC da Transição. Como é que se explica a gente ter feito e aprovado a Reforma Tributária? Vocês já se deram conta de que, nunca antes na história do Brasil, tinha sido aprovada uma Reforma Tributária em um regime democrático, sem que houvesse um momento de exceção? E a gente conseguiu aprovar a Reforma Tributária. Ou seja, de todos os processos que o governo mandou para o Congresso Nacional, todos foram aprovados. Todos. Então, qual é a briga com o Congresso? Ou seja, a briga é o normal da divergência política no Congresso Nacional, que tem vários partidos políticos, que têm programas diferentes. É a coisa mais normal que quando você dê entrada em um projeto de lei, uma medida provisória, tenha gente que queira incluir alguma coisa ou tirar alguma coisa. Mas isso é normal, se você não gostar de fazer isso, não faça política. Então, eu estou convencido de que nós estamos em uma situação, eu diria, de muita tranquilidade com o Congresso Nacional.
Eu convido vocês a ficarem atentos para ver o que que vai acontecer nas coisas que nós temos que votar daqui pra frente. Todas as coisas vão ser aprovadas e todas as coisas vão ser acordadas, na medida do possível, com a presença do líder do governo na Câmara, com o líder do governo no Senado, no Congresso. Com os ministros que são os ministros responsáveis pela matéria. Com a participação, obviamente, da Casa Civil e do ministro da organização política. Isso vai acontecer, Vera, portanto, não tem nenhuma divergência que não possa ser superada. Se não tivesse divergência, não haveria necessidade de a gente dizer que são Três Poderes distintos e autônomos, cada um é dono de seu nariz. Eu digo sempre para todo mundo ouvir: não é o presidente do Senado que precisa de mim. Não é o presidente da Câmara que precisa de mim. Quem precisa deles é o presidente da República, é o Poder Executivo. Porque cada um tem uma função e nós temos a nossa função. E quem aprova o Orçamento da União são eles. Quem aprova os projetos de lei são eles. Então é o governo que precisa ter o cuidado de manter a relação mais civilizada possível, tanto com a Câmara como o Senado. Eu sei que tem gente que gostaria que a gente vivesse em uma eterna briga, mas a gente não vai viver numa eterna briga, porque, se você optar pela velha briga, você não governa. Você não aprova nada. E o país é prejudicado. E eu não quero isso. Portanto, nós vamos conversar com todo mundo e posso te dizer, Vera, que nunca antes na história… Vou dizer mais para você: o Sarney, que foi presidente da República, quando o PMDB tinha 23 governadores de estado, quando o PMDB tinha 306 constituintes, eu fui constituinte, o Ulysses Guimarães certamente tinha mais problema quando o partido dele tinha maioria do que eu tenho hoje.
E depois é o seguinte: vocês sabem que eu gosto muito de citar futebol. Eu não conheço um técnico que ele anuncia, quando o time entra em campo, quem que ele vai tirar. Você não vê. Nem o técnico do Palmeiras, nem o Tite, anunciam. Escala o time do Flamengo e fala: “Mas eu vou tirar fulano e beltrano”. Não. O time entra para jogar e o time está jogando e está jogando do jeito que deve jogar, portanto, não existe nenhuma previsão de reforma ministerial na minha cabeça, nesse instante. A única coisa que existe na minha cabeça é que esse país tem que dar certo, porque o povo brasileiro precisa disso. É isso que eu quero e é isso que eu vou fazer. É isso que vai acontecer.
Zileide Silva (TV GLOBO): Bom dia, presidente. O senhor comemorou aqui, até nesse paper que nós recebemos e também quando o senhor falou da reforma tributária, a primeira vez que se aprova uma reforma tributária, mas agora começa uma parte extremamente difícil lá no Congresso.
Ontem, o senhor esteve com o ministro Haddad, segundo ele, os senhores definiram o texto que agora será encaminhado para o Congresso, para o presidente Lira, para o presidente Pacheco. O que o senhor pode adiantar?
Ontem, ele falava de algumas pendências que o senhor queria administrar com ele. Então, eu gostaria de saber, por exemplo, se é com relação à cesta básica, se é com relação à tarifa zero, o que o senhor pode adiantar?
E também, pegando carona, por exemplo, os relatores da reforma. Nós sabemos que o ministro Haddad, ontem ele falou isso para a gente, ele gostaria que continuasse os mesmos que fizeram essa primeira parte. Parece que o presidente Lira, com quem o senhor conversou no domingo, não quer repetir o mesmo relator. Como que está essa discussão? O que os senhores fecharam ontem, presidente?
Presidente Lula: Ontem nós fechamos a proposta final daquilo que vai para a regulamentação da Reforma Tributária. Foi muita coisa que nós discutimos ontem. Então nós vamos levar uma proposta que está de acordo com o governo. Obviamente que nós sabemos que, quando chegar na Câmara, ela pode ser mudada. As pessoas podem acrescentar, as pessoas podem tirar e as pessoas podem votar do jeito que nós mandamos. O que seria ideal, do ponto de vista dos interesses da Fazenda, que já trabalhou na aprovação do projeto principal, é que você tivesse o mesmo relator. Porque o cara já está familiarizado, o cara já participou de todas as discussões, você poderia ganhar tempo. Eu não sei se já está decidido pelo presidente da Câmara que não.
O que é importante, na minha opinião, é que se pudesse ser apenas um relator, e se o relator pudesse ser o mesmo, mas quem indica o relator é o presidente da Câmara, então longe de mim querer indicar um relator para cuidar da política tributária, longe de mim. É o papel do presidente da Câmara, é o papel dos deputados. Eu só gostaria que as pessoas levassem em conta isso. É que quem já foi relator do projeto principal, está muito familiarizado, já fez negociação, já conversou com os outros partidos políticos, já conversou com as lideranças, poderia facilitar a tramitação da regulamentação. Bom, mas isso é um problema do presidente Arthur Lira, não é um problema meu nesse instante. Eu sei que é um desejo, um desejo do governo de que seja o mesmo. Mas entre o desejo e acontecer depende muito do que acontecer no debate entre os partidos políticos no Congresso Nacional.
Zileide Silva (TV GLOBO): Cesta básica e alíquota, presidente, houve algum avanço?
Presidente Lula: Houve. Nós melhoramos tudo que a gente poderia melhorar. Eu não vou detalhar aqui o que que nós fizemos. Mas nós estamos muito, mas muito certos de que é possível facilitar a vida do povo. E facilitar a vida do povo é a gente cobrar nada da cesta básica.
Joaquim de Carvalho (TV Brasil 247): Olá, bom dia, presidente. Eu gostaria de mudar um pouco.
Presidente Lula: Porra, Joaquim, eu estava pensando, eu fiquei: “Quem é aquele velhinho que está ali, sentado?”
Joaquim de Carvalho (TV Brasil 247): Sou eu, presidente. É uma honra estar aqui entrevistando o senhor. Eu que cubro a sua trajetória há muito tempo e eu gostaria de trazer aqui para a pauta o tema da Lava Jato.
O senhor foi vítima talvez do que tenha sido o maior erro judicial da história, que foi a Lava Jato e que resultou em várias perseguições. E agora nós estamos vendo, de certa forma, hoje a correição do CNJ, você tem investigações em várias frentes e o processo que pode resultar na cassação do Sérgio Moro.
Eu pergunto ao senhor: como é que o senhor acompanha, como é que o senhor vê o que está ocorrendo agora em relação à Lava Jato, não como presidente, mas como quem foi vítima desse erro judicial?
Presidente Lula: Bom, Joaquim, eu queria só te pedir desculpas, porque eu não consigo me separar da figura do presidente e voltar a ser o cidadão Lula. Eu, o cidadão Lula, está exercendo o mandato de presidente da República, e eu, sinceramente, embora é um tema que eu gostaria de falar muito, eu prefiro não comentar uma coisa que está tramitando na Justiça. Sabe, o certo é que eu provei o que eu precisava provar. Estou de volta à Presidência da República para fazer o que eu acho que tem que ser feito nesse país.
Esse é um processo histórico, Joaquim, essa coisa não se resolve numa década. Essa coisa vai levar tempo. Porque a verdade é o seguinte, é que se você tem gente que tentou transformar os autores daquele episódio em heróis, as pessoas têm dificuldade de voltar atrás.
Então, leva um tempo de maturação para muita gente acordar do que aconteceu nesse país, descobrir o que foi feito nesse país. Discutir os benefícios e os malefícios desse país. Como está agora tramitando no Conselho Nacional de Justiça, eu prefiro não dar palpite para ninguém dizer que eu tô querendo fazer interferência.
Eu só espero que antes que a natureza, sabe, me dê um final de vida, a verdade venha à tona para o povo brasileiro nunca mais ser vítima de uma mentira, que talvez foi a maior mentira contada na história da República desse país. Então, eu acho que um dia o povo brasileiro vai saber a verdade. Você sabe que tem coisas que demoram muito para vir à tona, mas vêm, um dia vêm. Então eu só queria te pedir desculpa para não tecer mais comentários, porque o Conselho de Justiça está analisando.
Carolina Nogueira (UOL): Presidente, bom dia. Carolina Nogueira do UOL. É um prazer estar aqui.
Tenho duas perguntinhas para o senhor. Primeiro, eu queria insistir na questão da articulação com o Congresso, porque o senhor lembrou ainda há pouco que precisa dos presidentes do Senado e da Câmara. Precisa do Congresso para aprovar o orçamento. E aí eu queria entender como é que fica essa relação se não há uma falha aí na articulação?
Porque muitas matérias que são aprovadas no Congresso, quando chegam aqui no Palácio, elas são vetadas, como, por exemplo, o orçamento que teve o veto das emendas de comissão e também aquele projeto do PL das saidinhas.
E a minha outra pergunta é sobre a Petrobras. Queria saber se acabou a crise?
Presidente Lula: Aí é que está jornalista esperta, sabe? Ela fala dois assuntos, mas ela quer saber é do terceiro que ela não falou. Deixa eu te contar uma coisa. Quando a gente manda um projeto de lei para o Congresso Nacional, o Congresso tem o poder de melhorá-lo. De piorá-lo. Ou de não votar. Ao votar, o presidente da República tem o direito de vetar na íntegra ou de vetar em parte. E volta para o Congresso ter o direito de derrubar o meu veto. Tudo isso faz parte do jogo. Tudo isso faz parte do jogo político. Então eu acho isso muita normalidade. Eu nunca fico nervoso, eu nunca fico irritado. “Ah, porque o Senado derrubou tal coisa, porque a Câmara derrubou…” Não. É o papel deles. Eu não tenho do que reclamar. Eu, muitas vezes, fico chateado é com a minha incompetência de não ter convencido eles ao contrário.
A questão da saidinha, veja: eu tenho, no Ministério da Justiça, uma das figuras de maior competência jurídica que já nasceu nesse país, que é o meu querido Lewandowski [Ricardo Lewandowski, ministro da Justiça]. E o que que nós vetamos? Nós vetamos a proibição de o cidadão ou o cidadã, que não tenha cometido crime hediondo, que não tenha cometido estupro, que não tenha cometido crime de pedofilia, possa visitar os parentes. É uma coisa de família, família é uma coisa sagrada. A família é a base principal de organização de uma sociedade. Como é que você vai proibir um cidadão que está cumprindo pena e, se ele está cumprindo pena, é porque o Estado pensa que é possível recuperá-lo, e ele não cometeu esses crimes que eu falei, considerados hediondos, pode deixar de visitar os parentes? Então, foi uma coisa feita, eu tenho certeza que muita gente adoraria receber os seus parentes. E tenho certeza que mesmo aqueles que são contra, quando o parente sair, ele vai querer recebê-lo. Porque a questão da família é uma coisa muito sagrada e é normal que o cara que está preso queira ver a família. E é normal que a família queira ver o cara que está preso. Então, eu segui a orientação do Ministério da Justiça e vetei. Vamos ver o que que vai acontecer. Se o Congresso derrubar, é um problema do Congresso. Eu posso lamentar, mas eu tenho que acatar.
Com relação à Petrobras, o que você quer saber da Petrobras? Diga de verdade. O que que você quer saber da Petrobras?
Carolina Nogueira (UOL): Acabou a crise?
Presidente Lula: Deixa eu lhe falar. A Petrobras nunca teve crise. A crise da Petrobras é o fato dela ser uma empresa muito grande. Vocês estão lembrados que, nos outros mandatos, eu, várias vezes, brinquei com o Sergio Gabrielli [ex-presidente da Petrobras] dizendo que a Petrobras era tão importante que, um dia, esse país iria eleger o presidente da Petrobras pelo voto direto e ele iria indicar o presidente da República. Por que que eu dizia isso? Porque a capacidade de investimento da Petrobras é maior do que a capacidade de investimento do país. É só você ver os projetos de investimento da Petrobras e ver do Brasil. Ou seja, a Petrobras tem essa crise, uma crise de crescimento, uma crise de descobrir novos poços de petróleo, uma crise de se transformar não apenas em uma empresa de óleo e gás, mas numa empresa de energia. Porque ela tem que cuidar do que é eólico, tem que cuidar do que é solar, tem que cuidar do que é, sabe, as nossas plataformas offshore para produzir energia solar e energia eólica. De forma que eu não vejo problema na Petrobras. O fato de você ter um desentendimento, uma divergência, uma colocação equivocada, faz parte da existência do ser humano. Quando Deus nos fez, que deu boca, já estava previsto isso. Nem sempre a boca fala somente as coisas que são boas. Às vezes, uma palavra mal colocada cria uma semana de especulação. Mas eu posso dizer que a Petrobras está tranquila. E, se ela está tranquila, o Brasil está tranquilo.
Heloísa Vilela (ICL Notícias): Bom dia, presidente. Heloísa Vilela, do ICL Notícias. É um prazer estar aqui com o senhor.
Eu queria saber se o senhor considera que o Brasil está sendo alvo de um ataque coordenado da extrema-direita internacional, que aquela barulheira que a gente viu na semana passada, que no final das contas me parece que não deu em muita coisa, me parece que nem tanta gente assim acompanha o Twitter no Brasil ou o X ou seja lá o que for.
Mas se isso é um peso? E se o Brasil de alguma maneira está sendo exemplo de enfrentamento de forma democrática a essas forças?
Presidente Lula: Olha, uma coisa que nós temos que aprender é que havia muitas décadas que você não tinha o surgimento do extremismo como surgiu na última década. Isso vem desde, na verdade, desde a manifestação de 2013 em São Paulo, que isso vem acontecendo, a gente vem vendo o crescimento do extremismo. E isso é uma coisa internacional, não é uma coisa do Brasil. E pelo que eu vejo de informação, eu sou considerado persona non grata pela extrema direita no mundo inteiro. Há quem diga, em reuniões deles, que eu sou a figura mais visada por eles, que o Lula precisa ser destruído. E por que isso? É porque é a nossa volta à Presidência do Brasil. Eu não sei se vocês já viajaram depois que eu voltei a ser presidente, se vocês já tiveram contato com outros países. A minha volta à Presidência do Brasil gerou uma expectativa de otimismo nas relações diplomáticas internacionais que eu até então não conhecia. Eu até então não conhecia.
Só para vocês terem uma ideia, em 14 meses eu participei de uma reunião com 60 países da União Europeia e da América Latina. Depois eu participei de uma outra reunião com 54 presidentes da União Africana. Depois eu participei de uma reunião do G20. Depois eu participei de uma reunião dos BRICS. Depois eu participei de uma reunião na Guiana, uma reunião do CARICOM, com 15 países do Caribe. E depois eu participei da CELAC em São Vicente e Granadinas, com 33 países. Se você somar essa quantidade de países, eu já me reuni com mais dirigentes partidários nesses 14 meses do que em todos os oito anos passados. E por quê? Há uma expectativa muito grande com relação ao Brasil e uma expectativa muito grande com relação ao simbolismo da volta da democracia nesse país. Vocês sabem que o Brasil tinha se transformado num país importante, num país que era levado em conta na geopolítica.
Vocês sabem a importância que o Brasil passou a ter no G20, que o Brasil passou a ter nos BRICS, vocês sabem a importância que o Brasil passou a ter na discussão com a União Europeia. Na medida em que a democracia se esvai, na medida que a democracia se enfraquece no Brasil, o Brasil ficou como se fosse pária diante do mundo. Ninguém vinha aqui e ninguém queria receber o Brasil. Quando nós voltamos parece que houve uma alegria internacional com a volta da democracia no Brasil. E eu acho que isso é extremamente importante porque isso está permitindo que a gente faça uma discussão política. Uma discussão política de fundo. Se você pegar a América Latina, você imagina o que era a América Latina com Lagos ou Michelle Bachelet, com Cristina ou com Kirchner, com Lugo no Paraguai, com Tabaré ou com Pepe Mujica no Uruguai, com o Chávez na Venezuela, com o Evo Morales na Bolívia.
Era uma América do Sul com 80% dos governos de compromisso com a esquerda, de compromisso com a tese de um Estado socialmente justo. Eu não vou dizer social democrata porque tem gente que não quer ser. Mas era uma América do Sul progressista. Se você pegar a América do Sul hoje você percebe que houve um retrocesso, exatamente pelo crescimento da extrema-direita, pelo crescimento da xenofobia, pelo crescimento do racismo, da perseguição às minorias. A pauta de costumes, muitas vezes, com assuntos retrógrados. Isso ganhou corpo. E por isso o Brasil ganha destaque, porque no cenário mundial, se você pegar o mapa, o Brasil é um país que é o polo de resistência disso tudo. E eu tenho a honra de ser o presidente do Brasil nesse momento. A União Europeia, vocês sabem como é que ela está. A União Europeia também está crescendo a extrema-direita. Vocês sabem o que aconteceu.
O único país que está mais ou menos tranquilo é o México, que está mais ou menos tranquilo. Eu não sei nas próximas eleições, o López Obrador vai fazer com muita tranquilidade a sua sucessora. Mas, veja os Estados Unidos. Gente, vocês que são mais jovens não têm noção do que era o simbolismo da democracia americana. Vocês não têm noção do que significava o Capitólio, do que significava o Partido Republicano e o Partido Democrata. Aos olhos do mundo, era o espelho mais fantástico da democracia, do país exemplo do mundo, do país da oportunidade. Hoje, o que que é os Estados Unidos? A imprensa não fala. Mas vocês sabem que tem nos Estados Unidos 750 pessoas processadas e já tem 450 pessoas presas por causa do Capitólio. Isso não é muito divulgado aqui no Brasil, mas já tem 450 pessoas presas nos Estados Unidos. Porque o que aconteceu foi uma afronta à democracia e você não pode permitir que a negação das instituições prevaleça.
As instituições que foram criadas para manter a democracia, por mais defeitos que elas tenham, são extremamente importantes e precisam ser fortes. Então, os Estados Unidos, que eram o espelho da democracia, da coisa em ordem, do respeito às instituições, está do jeito que está. Então, eu acho que nós estamos vivendo um novo período, os setores de esquerda, os setores progressistas, os setores democráticos, têm que se organizar, se preparar. Eu estou tentando, falei com o Pedro Sánchez, falei com o Macron, eu estou tentando ver se a gente consegue fazer uma reunião com os chamados presidentes democratas, por ocasião da reunião da Assembleia Geral das Nações Unidas para a gente definir uma estratégia de como nós vamos, a nível internacional, enfrentar o crescimento da extrema-direita e suas matizes.
Eu acho que é um problema novo na política, novo. A geração de vocês na imprensa não estavam, não viveram esse momento e é um momento novo, em que vale qualquer coisa menos a verdade. Quanto maior for a mentira, quanto mais. Você pega a cena de um cara em Curitiba esses dias que estava trabalhando, limpando o vidro, o outro vai e corta a corda. Aí você pega, um cara vai reclamar de uma casa que estava alugada, que a casa ficou buraco. O cara era médico, vai o médico e a mãe dele na casa do cara, um com rifle, outro com a pistola e mata o cara. Isso não existia neste país. E agora virou uma coisa corriqueira. Está estabelecido um ódio na sociedade que nós temos que tentar criar um mundo civilizado, uma coisa de paz, uma coisa mais harmoniosa. É difícil, é. Mas nós temos que tentar. Por isso que de vez em quando alguém vai me perguntar, já vou responder logo: “Presidente, o que o senhor acha do ato em Copacabana?”.
Eu não vi o ato porque eu estava fotografando o Minha Casa, Minha Vida do João de Barro. Eu descobri no Palácio do Alvorada quatro casas de João de Barro no alumínio e descobri mais três numa árvore e resolvi fazer um filme e publicar na internet. Por isso que eu não vi. Então, não me preocupa os atos dos fascistas, não. O que me importa é o seguinte: eu vou fazer esse país dar certo.
Nathália Fruet (TV SBT): Oi, presidente, obrigada pelo convite. Presidente, bom dia. O senhor falava das relações internacionais e da extrema direita. Na semana passada, a chanceler Argentina teve um encontro com o ministro Mauro Vieira e, segundo os jornais argentinos, teria formalizado um pedido de Javier Milei para um encontro com o senhor, uma aproximação aqui com o Palácio do Planalto. Queria saber se o senhor vai receber Javier Milei?
E também, na semana passada, o senhor esteve na Colômbia. Se um dos objetivos do Brasil é diversificar esse comércio aqui na América Latina para não depender dessas relações com a Argentina?
E, por último, a questão da Venezuela. O Gustavo Petro, para nós lá na Colômbia, disse que vocês discutiram um plebiscito para garantir que o perdedor da eleição não seja perseguido. A gente queria saber como é que foi essa conversa com o Gustavo Petro?
Presidente Lula: Olha, primeiro, eu sei que o meu chanceler recebeu uma carta do presidente Milei, mas acontece que o meu chanceler viajou e eu ainda não vi a carta. Quando ele regressar, agora, eu devo receber a carta. Não sei o que que o Milei está dizendo na carta, portanto, eu não posso responder.
A única coisa que eu posso adiantar é que depois que eu ler, eu tenho interesse de que a imprensa saiba o que o presidente da Argentina quer conversar com o Brasil.
A segunda coisa: a questão da Venezuela. Está acontecendo uma coisa extraordinária. A oposição toda se reuniu, a oposição está lançando um candidato único. Vai ter eleições, eu acho que vai ter acompanhamento internacional sobre as eleições. É interesse de muita gente de querer acompanhar.
E se o Brasil for convidado, o Brasil participará do acompanhamento dessas eleições na perspectiva de que quando terminar essas eleições, as pessoas voltem à normalidade. Ou seja, quem ganhou toma posse e governa; quem perdeu se prepara para outras eleições, como eu me preparei depois de três derrotas aqui no Brasil.
Eu fico torcendo para que a Venezuela volte à normalidade, para que os Estados Unidos tirem as sanções e a Venezuela possa receber de volta o povo que está deixando a Venezuela devido à situação econômica.
Com relação à reunião na Colômbia, veja, eu sei da responsabilidade que o Brasil tem na América do Sul por ser o país mais importante da América do Sul, o maior, o mais rico, o mais industrializado. Então, eu sempre dizia que o Brasil não pode crescer e ser uma ilha de prosperidade cercada de miseráveis por todos os lados.
O Brasil sempre estabelece, como discurso, no meu caso, de que a gente possa crescer junto. Eu acho que é muito pouco o comércio entre o Brasil e a Colômbia. Ou seja, chega a só 7 bilhões de dólares, o fluxo de compra e venda, só 7 bilhões de dólares para um país que tem 55 milhões de habitantes, e o Brasil tem 213, ou seja, vai para 258 milhões de habitantes.
Eu gostei que nós levamos mais de 200 empresários à Colômbia, e eu fiz um discurso apelando para que os empresários conversem, façam parcerias. Porque é preciso que a gente tenha 20 ou 30 bilhões de comércio para crescer a economia da Colômbia, para crescer a economia.
Nós estamos trabalhando em um processo de integração que está sendo coordenado pela Simone Tebet [ministra do Planejamento e Orçamento], que a gente está concluindo, sabe, ferrovias e pontes e também via marítima. Ou seja, de Manaus a Manta, no Equador, antes de chegar a Manta, você tem uma entrada no rio que vai para Colômbia. Você está discutindo estrada e ferrovia para o Chile, para a Colômbia e para o Peru.
Ou seja, se a gente fizer esse sistema de integração, a gente vai diminuir o tempo de viagem dos produtos do norte do país para o sul, para a China, em 10 mil quilômetros. Ou seja, é uma coisa extraordinária e significa, de concreto, o Brasil tendo mais acesso, sabe, aos países asiáticos.
Então, nós estamos trabalhando com afinco nisso, e eu fui mostrar para o companheiro Petro de que a Colômbia não pode ser um país distante do Brasil e nem o país ser um país distante da Colômbia. Nós temos 1.644 quilômetros de fronteira.
Nós agora estamos colocando fibra ótica em Tabatinga, que é o Brasil, e vamos levar também para Letícia, na Colômbia, para ajudar, sabe, para que a Leticia possa ter mais informação, possa ter o processo de desenvolvimento digital mais rápido.
Então, eu estou... Nós vamos ter no Chile, eu vou para o Chile dia, em maio, eu vou pro Chile e, no Chile, eu espero que o Boric esteja convidando para reunião as pessoas que participaram do consenso de Brasília, aquela primeira reunião que eu fiz aqui depois que eu fui reeleito, para que a gente possa discutir o que a gente vai fazer de integração na América do Sul e também de integração política.
Porque nós temos que descobrir, ou nós agimos enquanto bloco, afinamos a nossa viola e entramos no picadeiro das negociações internacionais. Ou se a gente achar que individualmente a gente vai ter chance: “Ah, eu sou mais amigo dos Estados Unidos, ele vai me privilegiar”. Isso é bobagem, bobagem.
Cada país tem interesse prioritário em ganhar. Então, quem tem que gostar do Brasil é o Brasil; quem tem que gostar da Colômbia são os colombianos. Se a gente fizer uma política de aliança, a gente vai respeitar as diferenças, mas a gente vai fazer a nossa economia crescer. O Brasil precisa fazer isso com todos os países, apesar da dificuldade política que nós temos hoje. Está muito difícil, mas nós temos que tentar. Esse é o papel do Brasil.
Cynara Menezes (Revista Fórum): Bom dia, presidente. Bom dia a todos e todas. Presidente, o senhor falou que as relações do governo com o Congresso estão normalizadas. Mas, até como cidadã, eu me preocupo de ver uma figura como Eduardo Cunha, que foi o algoz da presidenta Dilma, se movimentando com tanta desenvoltura no Congresso, atendendo no gabinete da filha e sendo apontado como conselheiro do atual presidente da Câmara.
Como é que o senhor vê a volta de uma figura nefasta como Eduardo Cunha, até mesmo na imprensa, né? A imprensa dando um destaque a ele sendo entrevistado.
Como é que o senhor vê isso?
Presidente Lula: Eu acho, veja, eu acho normal do ponto de vista político. Eduardo Cunha está solto. Ele não está preso. Está livre. Ele tem uma filha deputada, portanto ele tem o direito de ir no gabinete da filha. Ele foi presidente da Câmara, foi líder do PMDB. Ele tem, portanto, como a gente diz: uma vez deputado, sempre deputado. Tem gente que deixou de ser deputado há 40 anos, mas usa aquele brochinho de deputado a vida inteira. Hoje, por exemplo, eu ganhei um, de presente do deputado Wolney [Queiroz, secretário-executivo da Previdência Social], que está na Previdência Social. Ele ganhou um, banhado a ouro, não sei de quem. Que ele chegou aqui: “Presidente, eu vou lhe dar isso aqui, se um dia o senhor quiser ir na Câmara, como o senhor foi deputado, você pode colocar o seu brochinho e entrar na Câmara”.
Então eu acho que, do ponto de vista político, é normal. O que eu acho anormal é se ele estiver tendo influência política nas decisões do Congresso Nacional, que eu não acredito, não acredito. Ele tentou ser candidato à reeleição, teve uma votação pífia, vergonhosa, então eu acho que ele tem que saber que o poder que ele tinha, ele jogou no lixo. Acho. E eu acho, sinceramente, que ele visitar o gabinete da filha é mais do que natural. Eu não vejo nisso, nada. Como eu diria, muitas vezes dá para entender, mas não dá para explicar. Sabe? Mas, paciência.
Cynara Menezes (Revista Fórum): Deixa eu só completar aqui, Chrispiniano. Já estão falando até de abrirem nove CPIs contra o governo por conta desse aconselhamento. A gente fica meio ressabiado.
Presidente Lula: Abrir CPI contra o conselho por quê?
Cynara Menezes (Revista Fórum): De abrir nove CPIs contra o governo, que já está se falando que seria sob influência dele.
Presidente Lula: Eu posso te dizer que não tem nenhum problema abrir CPI com o governo. Não tem problema nenhum. O que eu acho é que a CPI é um direito da Câmara de montar CPI. O que eu sei é que tem várias CPIs lá, nenhuma contra o governo. Tem várias CPIs sobre vários assuntos, o que eu acho legítimo. Se o Congresso não tiver uma CPI e um grupo de CPI a cada ano, todo ano, todos os deputados sabem: tem que apresentar pelo menos cinco CPIs para fechar a pauta de novas CPIs. Eu acho que já surgiu as cinco lá, vai ser votada, mas acho que não tem nada a ver com a influência de Eduardo Cunha ou quem quer que seja.
Renata Varandas (TV Record): Bom dia, presidente. Obrigada pelo convite. Posso fazer três perguntas? Já até sentou.
Presidente Lula: Se fizer três eu vou anotar.
Renata Varandas (TV Record): Presidente, queria primeiro falar sobre juros. A gente tinha aí uma previsão da Selic de 9,13, passou para 9,50. Tem jornal hoje dizendo que o mercado ainda vê a Selic como 9,75 até o fim de 2024. Ontem o senhor reclamou de juros, mas falou que não ia reclamar muito para poder não desviar o foco.
Eu queria saber como que o senhor tem visto isso e qual é a previsão? O que o senhor avalia com essa alta taxa de juros? Essa é a primeira.
Pode fazer as três? Falando ainda de mercado, queria saber se o senhor já tem um nome em mente para o Banco Central para poder acalmar aí o mercado financeiro?
E a terceira pergunta é se o senhor se reuniu, ou conversou, ou vai se reunir, ou vai conversar com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco. Obrigada!
Presidente Lula: Olhe, eu, na verdade, tentei falar com o Pacheco na sexta-feira. Ele me parece que tomou uma vacina contra a dengue e ele não estava bem. E aí, eu preferi não ligar no sábado e no domingo. Mas eu pretendo conversar com o Pacheco, junto com o Jaques Wagner, e junto com o líder, o Randolfe, para a gente discutir a pauta no Senado com o senador Rodrigo Pacheco. Isso é certo. E, possivelmente, aconteça essa semana.
Com relação ao Banco Central, eu tenho que indicar mais diretores e tenho que indicar o presidente do Banco Central até o final do ano. Eu só tenho que decidir se vou antecipar ou se deixo para indicar o mais próximo possível do vencimento do mandato do presidente Roberto Campos. Então, quem já conviveu com o Roberto Campos um ano e quatro meses, não tem nenhum problema viver mais seis meses. O que eu espero é que o Roberto Campos, ele leve em conta que o Brasil não corre nenhum risco. Ô, gente, esse país, quando eu cheguei na Presidência da República, era triste você ver esse país, todo ano, receber um casal de economistas do FMI para fiscalizar as contas do país. O ministro do país não era nenhum esquerdista, não era nenhum comunista, era simplesmente o Malan.
O presidente desse país não era nenhum comunista, era um homem culto, um social democrata, chamado Fernando Henrique Cardoso. Entretanto, todo ano, descia no Aeroporto de Brasília um casal de economistas para fiscalizar as contas desse país. E o mercado não falava nada. O mercado não se queixava. Ora, o que que nós fizemos? Nós demos cidadania a esse país. A palavra é essa: se alguém quiser dizer que eu estou arrogante, diga. É o seguinte: nós demos cidadania a esse país. Nós pagamos uma dívida externa de US$ 30 bilhões. Depois que nós pagamos, nós emprestamos 15 bilhões para o FMI e eles agora é que nos devem. E fizemos uma reserva internacional de US$ 370 bilhões, criando o mais importante colchão de proteção que esse país já teve em sua história. Então, qual é a preocupação do presidente do Banco Central com o descontrole da economia? Nenhuma. Existem pouquíssimos países mais seguros do que o Brasil. Muito poucos países têm a segurança que tem o Brasil.
Se vocês pegarem um pouco, gente, eu vou dar um exemplo para vocês, porque se fala muito em dívida pública, dívida pública, dívida pública. Uma coisa, muito bobagem. Eu vou dar um exemplo para vocês dos países modelos dos banqueiros brasileiros. Eu vou dar. A dívida pública do Brasil, bruta, é exatamente 74.3%. A dívida bruta da Espanha é 112%. A dívida pública da Itália é 137%. A dívida pública da França: 112%. Da Índia: 86%. Do Japão: 237%. Da China, 83%. E, dos Estados Unidos, 123%.
Esse país é um país muito seguro. O que nós precisamos é que as pessoas preocupadas com o mercado precisam ter responsabilidade com esse país. Esse país não pode ficar todo dia tomando susto de que o mercado não gostou disso ou não gostou daquilo. O mercado está ganhando é muito dinheiro com essa taxa de juros. Isso é que tem que ficar claro para a sociedade. E o presidente do Banco Central tem que saber que quem perde dinheiro com essa taxa de juros alta é o povo brasileiro. São os empresários brasileiros que não conseguem dinheiro para investir. É isso que está em jogo. Mesmo dizendo isso, eu tenho toda a paciência do mundo, porque eu tenho que esperar até dezembro para mudar o Banco Central. Então, veja como nós somos tranquilos.
A outra pergunta que a nossa amiga faz é sobre a taxa de juros. Eu já falei. Mas é isso, gente. É por isso que a gente… Não sei se vocês estão lembrados, são muito jovens, não lembram. Mas, no meu outro mandato, nós tínhamos no BNDES uma coisa chamada TJLP. Era uma taxa de juros de longo prazo. Então, toda vez que o companheiro Meirelles falava: “Presidente, eu vou ter que aumentar o juro em zero não sei quanto porcento”. Eu nunca fui contra, porque eu disse para o Meirelles: “Você vai ser presidente do Banco Central, você faça o que tem que fazer. Eu só quero ser comunicado, porque tem coisa que a gente tem que discutir”. E foi assim por oito anos. O que que acontece? Eu dizia para o Meirelles: “Olha, você vai aumentar a taxa de juros e eu vou reduzir a TJLP”. Por quê? Porque a TJLP era a taxa de juros que os empresários pegavam para fazer investimento de longo prazo no BNDES. E fizemos isso. E qual foi o desastre que aconteceu com o Brasil? Quando veio a crise de 2008, todo mundo assustado, eu disse que a crise seria uma marolinha nesse país. Vocês sabem o quanto eu apanhei quando eu falei isso. Vocês sabem o quanto eu apanhei. E o que aconteceu: o Brasil foi o último país a entrar na crise e o primeiro a sair. E terminei o meu mandato com a economia crescendo 7,5%, quase que com pleno emprego nesse país. É isso que aconteceu. O mercado nunca me agradeceu. Nunca. Mas, se você pegar a gestão do ex-ministro da Fazenda desse país e vocês imaginarem o que foi gasto a nível de desoneração, de isenção fiscal, por conta do processo eleitoral. Vocês vão conversar com o Haddad [Fernando Haddad, ministro da Fazenda] e chega a R$ 300 bilhões. E vocês viram o mercado falar alguma coisa? Não falou.
Então, eu quero dizer para vocês o seguinte: com todo respeito ao mercado, eu gosto mais do Brasil do que o mercado. Eu quero mais bem ao futuro desse país do que o mercado. E o meu papel é fazer as coisas para que 203 milhões de brasileiros possam levantar todo dia de manhã, almoçar, tomar café, jantar, estudar. Aliás, não sei se vocês prestaram atenção, ontem, nós anunciamos mais uma coisinha no Pé-de-Meia: nós incluímos mais 1,2 milhão de meninos e meninas para receberem o Pé-de-Meia. Ou seja, é possivelmente, a coisa mais extraordinária que vai acontecer daqui a 4 ou 5 anos, quando essa meninada terminar o ensino médio e poder entrar na faculdade com uma poupancinha que nós criamos para eles. Isso tem que ser pensado, inclusive para outros, para os alunos do Instituto Federal. Eu sei, tenho a informação, que tem estudante que muitas vezes não tem o que almoçar. Nós precisamos pensar nos restaurantes universitários, cabe à gente não apenas criar a faculdade, mas dar o direito deles comerem. Então essa é uma preocupação. E é isso que martela minha cabeça, não é se o mercado financeiro está preocupado que vai cair 0,2 ou 0,3. Isso para mim não me refresca. Então, eu não sou movido a mercado. Eu sou movido a soluções do povo brasileiro. Eu sou movido ao povo pobre desse país, ao povo trabalhador, à classe média – que é quem paga imposto de renda.
Não sei se vocês viram que ontem, aquela medida de incentivo ao setor da construção civil, é exatamente para a gente criar financiamento para setores médios da sociedade, que não têm direito à faixa 1 do Minha Casa, Minha Vida, porque não querem uma casa de 33m², mas que gostariam de comprar uma casa de 80 m², de 100m², de 120m². Temos que criar financiamento para eles comprarem. É isso que nós anunciamos ontem. E vamos anunciar mais coisas. Eu estou trabalhando na minha cabeça, já falei com o Haddad, que a gente tenha uma política de financiamento de reforma de casa. Está cheio de cara que quer fazer um banheiro, está cheio de cara que quer fazer uma garagem, cheio de pessoal que quer fazer mais um quartinho para o filho. Então, nós temos que criar condições dessas pessoas terem acesso ao financiamento. Vinte mil reais, dez mil reais, quinze mil reais. Vamos colocar esse dinheiro para circular. Quanto mais o dinheiro estiver circulando na mão do povo, mais emprego a gente vai ter, mais salário a gente vai ter e mais crescimento vai acontecer no PIB brasileiro.
É isso, companheiros. É isso que nos preocupa e eu falei para o Pimenta: esse café meu está muito demorado. Nós precisamos fazer café, pelo menos, mensal. Eu só não vou fazer uma “mañanera”, porque vocês não gostam de acordar cedo. Mas não sei se vocês sabem, o presidente do México, ele tem uma coisa chamada “mañanera”. Toda segunda, terça, quarta, quinta, sexta, ele levanta 6h da manhã, com toda a imprensa – a imprensa grande já não vai mais —, mas vai os blogs. E ele, todo santo dia, fala com a imprensa. Eu não vou fazer isso porque, se não tiver assunto, tem fofoca. Então é melhor a gente fazer de tempos e tempos. Imagina, Zuleide, você tendo que levantar 5h30 da manhã. Vamos deixar vocês dormirem até as 7h, 8h. Eu levanto todo dia 5h30 da manhã, porque eu gosto de fazer um pouco de ginástica. Eu não sou que nem o Pimenta, que está engordando, eu gosto de fazer ginástica. Cinco e meia da manhã, o Lulinha está acordado, fazendo esteira. Não é como o Kennedy, que não anda, que fica paralisado, tão jovem, e não se cuida.
Então é isso, gente. De coração, obrigado pela gentileza.
É até bom você perguntar. Deixa eu falar uma coisa para vocês. Até as greves eu acho legal, seguinte: esse povo, ele estavam que nem eu estava em 1978, quando nós fizemos a primeira greve na Scania. A última greve tinha sido feito em 1968, em Contagem, Minas, e Osasco. Depois, nós ficamos dez anos sem fazer greve. Quando nós fizemos a primeira, na Scania, em maio de 1978, nós mudamos um pouco a história do sindicalismo brasileiro. O pessoal estava muito, muito, muito reprimido. Eles não faziam greve há muito tempo, não tinham aumento salarial há muito tempo. Nós estamos preparando aumento de salário para todas as carreiras e vão ter aumento. Nem sempre é tudo que a pessoa pede. Muitas vezes, é aquilo que a gente pode dar, mas eu queria que vocês soubessem que, desta vez, nós colocamos para ser o negociador do governo, nada mais, nada menos do que o companheiro chamado Feijóo [José Lopez Feijóo, secretário de Relações de Trabalho]. O Feijóo foi sindicalista, de São Bernardo do Campo, foi trabalhador da Ford, foi presidente da CUT. Pense em um galego porreta. Pense em um cara preparado. Possivelmente, é o dirigente sindical, do ponto de vista orgânico, mais preparado que a gente tem no Brasil. É ele que nós colocamos para negociar greve. Então, o pessoal fala assim: “O Feijóo é duro, o Feijóo é duro”. Eu falo: “É, pois é, ele é duro porque ele conhece, ele é duro porque ele já viveu o outro lado, ele é duro porque já fez muita greve, ele é duro porque já apanhou da polícia, ele é duro porque já perdeu o emprego”. Ele é duro, mas sempre com a disposição de negociar. E nós vamos negociar com todas as categorias. Eu quero até aproveitar para dizer que ninguém será punido nesse país por fazer uma greve. Eu nasci fazendo greve. Então, eu devo aos trabalhadores de São Bernardo o que eu sou hoje. Então, eu acho que é um direito legítimo, só que eles têm que compreender que eles pedem o quanto eles querem, a gente dá quanto a gente pode. E aí tudo volta ao normal. Eu espero que todos voltem a trabalhar. A gente está fazendo muito concurso, a gente quer fazer uma regulação das carreiras e as coisas, aos poucos, vão entrando nos eixos.
Gente, obrigado mais uma vez. Eu espero que a gente possa, Pimenta, se encontrar no menor espaço de tempo, poderia ser, quem sabe, uma vez por mês, uma vez a cada quarenta e cinco dias, a gente fazer uma rodada dessa, tá? Um abraço!