Entrevista do presidente Lula ao programa Bom dia, Presidente
Karine Melo: Olá, um excelente dia pra você. Hoje é terça-feira, dia 7 de maio de 2024. Você que nos vê aqui sempre no “Bom Dia, Ministro” já viu pela vinheta que hoje nós fomos promovidos. Nós estamos, ao vivo, direto dos estúdios da EBC, em Brasília e, como sempre, acompanhados de colegas de emissoras de rádio convidadas de Norte a Sul do país.
Eu sou Karine Melo e, não, você não se confundiu: Este é o “Bom Dia, Presidente”. Eu lembro a você que essa é mais uma produção da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República em parceria com a empresa Brasil de Comunicação. Estamos em rede facultativa de rádio para todo o país e, se você que nos ouve quiser nos ver por aqui, fique à vontade.
Estamos ao vivo na sua TV pelo canal GOV, e-mails para nos acompanhar a partir de agora não faltam. Essa entrevista também está sendo transmitida pelo nosso canal no YouTube, que é @canal GOV. Também temos o link ao vivo no streaming, que você pode acessar pela nossa agência GOV. Se você não conhece ainda, te convido a acessar agenciagov.ebc.com.br. Lá, você pode ler, ouvir e assistir a todas as notícias do governo federal que impactam a sua vida. E a última dica é baixar no seu celular, seja Android ou IOS, o aplicativo do canal GOV e ter toda a nossa programação na palma da sua mão.
E eu falei que nós tínhamos sido promovidos do “Bom Dia, Ministro”, e é verdade. Hoje, pela primeira vez, quem está aqui, pessoalmente, nos estúdios da EBC é o presidente Lula. A quem eu dou boas-vindas e agradeço demais a presença, Presidente. Bom dia, Presidente.
Presidente Lula: Bom dia, Karine.
Karine Melo: Bom demais ter o senhor aqui, Presidente, e diante da tragédia do drama que vive o Rio Grande do Sul, não tem como a gente começar essa entrevista sem, de novo, prestar toda a nossa solidariedade aí ao povo gaúcho, solidariedade da EBC, do canal GOV, e, é claro, que a gente precisa comentar o presidente esteve duas vezes, já recentemente, no Rio Grande do Sul, na quinta-feira e no domingo.
Pelo menos 11 ministros estiveram por lá. Dois deles estão aqui com a gente. O ministro Rui Costa e o ministro Paulo Pimenta também acompanharam essa entrevista, aqui nos estúdios com a gente, e estiveram com o senhor lá no Rio Grande do Sul. Muitos desafios, Presidente. Questões logísticas, questões de todo tipo. Uma tragédia que a gente, ninguém imaginou que o Brasil pudesse viver isso. Então, já chamo aqui para a nossa conversa, presidente, o Mateus Schuch, da Rádio Gaúcha. Um abraço, Mateus. Obrigada pela presença e vamos começar com você.
Mateus Schuch (Rádio Gaúcha): Muito obrigado pelo convite. Bom dia, Presidente Lula e a todos vocês que estão aí. Presidente, ontem à noite a Câmara dos Deputados já aprovou o decreto que o senhor assinou, reconhecendo a calamidade do Rio Grande do Sul. A tendência é que o Senado aprove hoje. Tenho um questionamento: o governo já tem pronto uma medida provisória para abrir um crédito extraordinário do Rio Grande do Sul, já hoje, ou ainda nesta semana? Eu gostaria de saber qual é o valor inicial desta medida.
O senhor mencionou ontem que eram várias medidas. Qual é o valor inicial desta primeira? E o seu dinheiro vai ser emitido diretamente ao governo do estado, às prefeituras, ou, em um primeiro momento, vai ser administrado pelos ministérios, pelo Governo Federal?
Presidente Lula: Olha, o Mateus, primeiro bom dia, eu quero começar também, Karine, dando a minha solidariedade ao povo gaúcho, porque se não se esperava tanto sofrimento em tão pouco tempo para o povo gaúcho. Você está lembrado que nós fizemos, no começo do ano passado, uma seca imensa que envolveu quase 300 municípios, em que o Governo Federal, junto com o governo estadual, atuaram para minimizar o sofrimento da seca.
Em setembro, tivemos a questão do Vale do Taquari, em que foi uma coisa também jamais vista por qualquer pessoa que nasceu no Vale do Taquari, e o Governo Federal esteve presente. E agora, que é uma tragédia climática que eu penso que ninguém imaginava a dimensão dela, e que, pelo que todo mundo fala, ainda não acabou, porque a água está descendo, a água vai chegar em outros municípios, ou seja, e isso é muito grave.
Então, o Governo Federal, eu estive lá duas vezes para dizer ao governador (Eduardo Leite, governador do Rio Grande do Sul), dizer ao povo gaúcho, ao povo brasileiro, que nós estamos 100% comprometidos com a ajuda ao estado do Rio Grande do Sul. Aliás, eu disse, na minha fala no Rio Grande do Sul, que o Brasil deve muito ao Rio Grande do Sul.
O Rio Grande do Sul é um estado muito importante para o Brasil do ponto de vista artístico, do ponto de vista cultural, do ponto de vista do trabalho, do ponto de vista da nossa cultura. Ou seja, então, o que nós vamos fazer é devolver ao Rio Grande do Sul aquilo que ele merece que seja devolvido, para ele poder tocar vida.
Então, não haverá falta de recurso. Eu disse e vou repetir pela quarta vez: não haverá falta de recurso para atender a necessidade do Rio Grande do Sul. Veja, ontem, nós tomamos a primeira iniciativa, e eu fiz questão de convidar o presidente da Câmara, o presidente do Senado, o Tribunal de Contas e a Suprema Corte para fazer com que a gente trabalhe de forma unitária, em todos os Poderes, para que a gente não fique permitindo que a burocracia crie entraves, para a gente facilitar o dinheiro.
Qual é a dificuldade inicial? A dificuldade inicial é que nenhum prefeito, e o governador disse com todas as letras no último domingo, ainda não tem noção, sabe, do estrago que foi feito. Por enquanto, as pessoas imaginam. Por enquanto, as pessoas pensam, mas a gente só vai ter o estado real quando a água baixar, que a gente verá o que aconteceu de fato no Rio Grande do Sul.
O que nós fizemos ontem, eu fiz uma mensagem ao Congresso Nacional, fazendo um decreto legislativo para que a gente possa começar a facilitar a liberação de recursos através dos ministérios. O ministério da Saúde pode liberar recursos, o ministério da Integração Nacional pode liberar recursos, e vários ministérios podem ir liberando. O Ministério da Educação... Vai liberando recursos de acordo com as necessidades fundamentais, que é colocar crianças na escola, colocar as pessoas no hospital. A compra de remédio, a compra de combustível, a compra d'água, a compra de comida. Esse dinheiro vai saindo normalmente pelo ministério, sem muita burocracia.
Agora, eu espero que essa semana o governador do Rio Grande do Sul, ontem eu conversei com o Haddad (Fernando Haddad, ministro da Fazenda), e o Haddad ficou de ligar para o governador para eu convidar o governador para vir à Brasília, para que a gente possa saber se ele já tem os números grandes, os números que são, se não o total, pelo menos uma coisa muito próxima do total, para a gente começar a discutir no Congresso Nacional.
O que eu posso te garantir, Mateus, o que eu posso te garantir é que há 100% de vontade da Câmara, 100% de vontade do Senado, 100% de vontade do Tribunal de Contas e do Poder Judiciário, para que a gente facilite ao máximo possível os recursos.
Eu, sinceramente, essa pergunta que você fez, quem vai administrar o dinheiro, eu acho que quem vai administrar o dinheiro é quem vai saber utilizar o dinheiro quando ele chegar no Rio Grande do Sul. Os ministérios têm estrutura nos estados, mas também nós queremos trabalhar junto com a Secretaria de Saúde do estado, com a Secretaria de Educação do estado, Secretaria de Transportes. O ministro Renan (Renan Filho, ministro dos Transportes) está 100% comprometido em recuperar o mais rápido possível as estradas federais que estão aí, e eu disse para o governador que a gente tem intenção de ajudar também nas estradas estaduais.
Então, por enquanto, Mateus, nós estamos naquela fase que é o seguinte: o emergencial vai ser liberado a partir de hoje. Vários ministérios já têm autorização para começar a liberar os recursos iniciais para os primeiros socorros. E depois a gente vai trabalhar junto com o governador o projeto.
Nós já fizemos reuniões, o Rui Costa (ministro da Casa Civil), o Pimenta (Paulo Pimenta, ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República) e outros ministros já fizeram reuniões com muitos prefeitos no próprio domingo à noite. E a gente quer ouvir. Montamos uma sala de situação no estado do Rio Grande do Sul para que o governo federal possa atender a suas necessidades e fazer com que a conversa com o governador e com as secretarias estaduais seja uma coisa que flua com muita rapidez.
Eu queria aproveitar a tua pergunta, Mateus, para dizer para o povo do Rio Grande do Sul. Eu sei que é muito triste, eu sei que vocês estão sofrendo, eu sei o que é perder tudo como vocês perderam, eu só quero que vocês tenham certeza: o governo federal vai fazer tudo, tudo, tudo para recuperar o estado do Rio Grande do Sul, porque não é só o povo do Rio Grande do Sul que precisa do estado recuperado. O Brasil precisa do Rio Grande do Sul recuperado. Por isso, Mateus, tenha certeza que não faltará empenho da nossa parte.
Karine Melo: Hoje a gente recebe nos estúdios da EBC, aqui em Brasília, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Presidente, aliás, falando em liberação, foram liberados aí R$538 milhões em emendas parlamentares também, o que é muito importante nesse momento, né, presidente?
Presidente Lula: Eu até não falei das emendas parlamentares, porque como é uma coisa do Congresso Nacional, eu acho que eles têm vontade de falar. Mas uma coisa, que é importante, é o seguinte... Veja, eu lembro que quando teve a cheia em Salvador, na Bahia, em 2022, eu lembro que o presidente da República estava passeando um jet ski em Fernando de Noronha e não se preocupou. Então, eu queria chamar a atenção. Eu lembrei desse caso para chamar a atenção o seguinte: ainda tem muita fake news contando mentiras sobre o Rio Grande do Sul, desmerecendo as pessoas que estão trabalhando. Porque a quantidade de pessoas que estão trabalhando, não apenas das Forças Armadas, da Polícia Militar, da Polícia Civil, da Polícia Federal, sabe, da Força Nacional, não apenas as pessoas que ganham salário para trabalhar, mas os voluntários.
O que mais me apaixona é a quantidade de gente no Brasil inteiro preocupada em ajudar o Rio Grande do Sul. Ou seja, eu digo todo santo dia, um país que tem os seres humanos com a bondade que tem o Brasil, não merecia essa indústria de fake news mentirosa, sabe, eu diria, e até canalha, que vive pregando mentiras, vive deturpando falas, vive pegando palavras e vive contando mentiras para a sociedade. Um país não pode ir para frente desse jeito, é preciso que as pessoas tenham bom senso, é preciso que as pessoas não sejam levianas.
A situação do Rio Grande do Sul é muito delicada e aí os parlamentares, sabe, liberaram as suas emendas, eu acho extraordinário isso, se tiver emenda de senador também libera, ou seja, todo mundo quer ajudar o Rio Grande do Sul. Todo mundo.
Agora, é preciso tomar cuidado, porque tem gente que não quer ajudar, porque tem gente que está apostando na desgraça, porque tem gente que quer que não dê certo e nós, nós sabemos, a importância do Rio Grande do Sul para a história desse país. Portanto, gaúchos e gaúchas, fiquem tranquilos, tenham fé em Deus que a gente vai consertar esse estado e vocês vão voltar a viver felizes, sabe, com as suas famílias.
Karine Melo: Presidente, o ministro Rui está aqui, me corrigindo aqui, falando que já foram liberados R$1 bilhão. É isso, ministro? Puxa o microfone aí, ministro Rui, por favor.
Rui Costa (Ministro da Casa Civil): Já foram autorizados, o processamento, já está sendo liberado, desde sexta-feira, R$ 538 milhões e R$ 522 milhões referentes a um conjunto de emendas que são batizadas de PIX. O Congresso muda a regra agora nessa quinta, mas nós já autorizamos, assim que for feita a votação na quinta, mais R$ 522 milhões. Ou seja, nós estamos falando de R$ 1 bilhão e R$ 60 milhões que, a partir de sexta, estarão liberados. R$ 1 bilhão e R$ 60 milhões do conjunto de senadores da presidência.
Karine Melo: Maravilha. Aliás, presidente, falando nisso, eu acho que... Ontem eu estava fazendo uma reflexão aqui para essa entrevista de hoje, e eu acho que já tem muito tempo que o Brasil, com toda essa polarização, a gente não tinha um momento em que as pessoas, assim, mostraram, demonstraram verdadeiramente tanta união, né? Então, são governos, Governo Federal, com governo dos estados, com igrejas, com pessoas da sociedade civil organizada, com pessoas físicas, com artistas, né? Todo mundo muito empenhado, e acho que pela primeira vez a gente sente o Brasil, de novo, assim, de mãos dadas pelo Rio Grande do Sul. O senhor tem esse sentimento, presidente?
Presidente Lula: Olha, eu tenho o sentimento de que o clima no Brasil melhorou muito, e tende a melhorar mais, porque, na medida em que as pessoas vão percebendo que o governo está trabalhando, e na medida em que as pessoas começam a perceber que as coisas estão melhorando para ele, na vida dele, na mesa que ele come, na casa que ele mora, as pessoas vão começar a deixar de lado essas pessoas raivosas, mentirosas, que pregam ódio.
Porque polarização sempre houve em qualquer lugar do mundo, nos Estados Unidos, na Alemanha, na França, no Brasil. Eu polarizei com o Fernando Henrique Cardoso três eleições, depois, eu polarizei com o Serra. Mas tinha um nível civilizatório de discussão. Você não ofendia a mulher da pessoa, você não ofendia o marido da pessoa, você não ofendia o filho da pessoa, você não xingava as pessoas, você não falava em matar, você não falava em arma.
Porque nós agora estamos fazendo o seguinte, nós estamos assumindo o compromisso que cada município desse país, que não tiver uma biblioteca, vai ter uma biblioteca. Porque é preciso a gente pensar em livros para as pessoas e não em armas. O que dá segurança para a pessoa é o grau de consciência que as pessoas têm. Então, nós vamos fazer isso, nós agora em cada conjunto habitacional que nós inaugurarmos, vai ter uma pequena biblioteca naquele conjunto habitacional para que as pessoas voltem a adquirir o hábito de ler, ler a sua história, ler a história do Brasil, ler a história da sua vida, da sua cidade.
Então esse país, Karine, nós estamos construindo, não é uma tarefa fácil, não. Porque o bicho está solto, tem muita gente ruim, tem muita gente falando mentira, tem muita gente pregando ódio, tem muita gente ofendendo. Eu vi vídeo ontem desacreditando as Forças Armadas, os caras trabalhando lá e os caras desacreditando. É uma coisa que não ajuda, não ajuda. Por isso, é que eu trabalho também com a vontade de que em algum momento o Congresso Nacional, a sociedade brasileira, os internautas do mundo vão se ter em conta que existem uma certa regulação para que a gente utilize a internet como uma melhoria civilizatória da humanidade e não como uma piora.
Karine Melo: É isso, presidente. Nós já estivemos em Porto Alegre. Vamos a Belo Horizonte? Vamos à Rádio Itatiaia. Quem está com a gente lá é a Kátia Pereira. Oi, Kátia. Bem-vinda. Bom dia para você.
Opa, a gente está com alguma interferência aí no áudio. Não sei se é o áudio da Itatiaia. A gente retoma com a Itatiaia daqui a pouco. A gente vai ajustar esse áudio. Então, vamos a Cuiabá. Vamos sair de Porto Alegre e vamos direto a Cuiabá. Rádio Centro América FM. Quem está lá com a gente é o Aldair Santos. Oi, Aldair. Bem-vindo. Bom dia.
Aldair Santos (Rádio Centro América FM): Olá. Bom dia a vocês. Bom dia a todos. Bom dia, presidente. Aqui em Mato Grosso, presidente, economia tem sido a principal pauta do momento, principalmente agora, diante dessa tragédia, desse desafio do Rio Grande do Sul. A produção, presidente, do Brasil, produção de grãos, de soja, arroz, alimentos, já estava com uma previsão de queda nesta safra por conta das questões climáticas. No caso de Mato Grosso, Centro-Oeste, por conta da seca.
Agora, Presidente, esse desafio do Rio Grande do Sul vai impactar ainda mais a produção, porque no nosso estado do Rio Grande do Sul, essas chuvas praticamente levaram grande parte da produção. Produção de grãos, produção de carne. E o setor do agro, presidente, já vem reclamando há algum tempo, pedindo mais apoio, renegociação de dívidas, mais financiamento. Setor econômico também, presidente, do comércio não tem aceitado o fim da desoneração da folha e reclamam também de impactos por conta disso. Como é que o senhor pretende tratar desses assuntos, presidente, a partir de agora, no seu governo, como enfrentar esses desafios? O que o senhor pode dizer para esses dois setores, presidente?
Presidente Lula: Bom dia, bom dia aos ouvintes da rede Centro-América, e bom dia a você, Aldair. Eu primeiro queria que a gente levasse em conta um pouco quem é que está reclamando do agronegócio. Porque, veja, qualquer cidadão honesto do agronegócio vai reconhecer que, nunca antes na história do Brasil, houve um Plano Safra como o que nós fizemos em 2023/2024, e o que estamos preparando para 2024 e 2025. E também eu acho que as pessoas podem se queixar de alguma coisa, mas o agronegócio sabe perfeitamente bem, que nunca eles foram tão bem atendidos, e, sabe mais ainda, sabe que de janeiro de 2023 a maio de 2024, nós já abrimos novos 106 mercados novos para a carne brasileira.
Ora, meu Deus do céu, quando a gente tem uma produção de exportação, a gente também tem que levar em conta que, às vezes, a gente vende mais, e a gente vende menos. Mas isso é próprio da cultura, da relação entre estados, da necessidade de compra e de venda.
Bom, com relação à questão do arroz e da produção gaúcha, eu já estou sentindo isso há algum tempo. Fui numa reunião com o ministro Paulo Teixeira (ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar) e com o ministro Fávaro (ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento) sobre a questão do preço do arroz e do feijão, porque estavam caros, e eu disse que não era possível a gente continuar com o preço caro. Me alegaram que a área plantada estava diminuindo e que tinha o problema do atraso da colheita no Rio Grande do Sul.
Agora, com a chuva, eu acho que nós atrasamos de vez a colheita do Rio Grande do Sul. Portanto, se for caro para equilibrar a produção, a gente vai ter que importar arroz, a gente vai ter que importar feijão, para que a gente coloque na mesa do povo brasileiro um preço compatível com aquilo que ele ganha.
Mas é uma coisa que eu vou te dizer, Aldair, pode ter certeza do seguinte: veja quem reclama, veja quem reclama, porque o pessoal do agronegócio nunca, nunca teve tanta facilidade de recurso como tem agora, nunca. Até dinheiro em dólar pelo BNDES, nós emprestamos. Da mesma forma o pequeno e médio produtor, através do Plano Safra, do Pronaf, o maior programa, sabe, também já realizado nesse país, e as coisas só tendem a melhorar. Só tendem a melhorar porque o agronegócio, a agricultura familiar, a média de agricultura, têm muito a ver.
Nós, agora, tivemos abertura de importação de suínos que estava com problema. Nós, agora, passamos a ser um país livre de febre aftosa, o que aumenta 100% a qualidade da carne brasileira do mundo. Eu tive essa semana, na sexta-feira, com o primeiro-ministro japonês (Fumio Kishida), e eu tive que falar pra ele: “vocês estão comprando uma carne de outros países 20% mais cara do que a nossa, e não é melhor do que a nossa, basta comprar a nossa carne, rapaz.” Aí pedi pro Alckmin levar ele num restaurante em São Paulo, numa bela churrascaria, pra ele saber o sabor da carne brasileira pra comprar. E aí, velho, nós somos imbatíveis.
Você sabe que eu sou muito agradecido à competência do pessoal que trabalha no campo, no Brasil, porque, tanto o pequeno proprietário, a agricultura familiar, como o agronegócio, tem sido motivo de orgulho pro Brasil. A gente tem produzido muito, tem batido recorde atrás de recorde. A gente tem exportado muito, só que as pessoas que exportam têm que saber que nós não controlamos o preço da exportação. Às vezes cai, às vezes aumenta, quando aumenta é bom, quando cai é ruim, mas isso vale pra todo mundo. De qualquer forma, eu vou lhe dizer uma coisa, ninguém, ninguém tem o direito de reclamar, sinceramente. Ninguém pode reclamar por falta de recurso do governo federal, porque não falta recurso, inclusive das negociações das dívidas. O Fávaro tem conversado comigo, tem conversado com o ministro Haddad, e a gente vai fazendo tudo no tempo certo.
Hoje, eu sou daquele presidente, Aldair... Antigamente você tinha um presidente que era o defensor da reindustrialização do Brasil e que não gostava da agricultura, porque o Brasil só investe, sabe, exporta commodities. Não! Hoje a gente não fala mais isso, porque a gente sabe o valor da genética que tem, sabe, na criação do nosso boi, do nosso frango, do nosso carneiro, do nosso porco. A gente sabe quanto de tecnologia tem num grão de soja. Então a gente valoriza isso, sabe, muito. Então não é trocar a agricultura pela indústria, é fazer os dois crescerem, que o Brasil precisa dos dois.
O Brasil precisa continuar sendo um grande produtor agrícola, exportar, porque o mundo precisa comer. Nós temos 735 milhões de seres humanos que vão dormir toda noite sem ter o que comer. E o Brasil produz comida, portanto o Brasil tem que produzir mais, exportar mais, e nós vamos garantir que isso aconteça. É isso. Eu acho, Aldair, que o Fávaro tá vendo essa entrevista nossa, e quando terminar aqui, certamente ele vai falar comigo. Eu vou pedir pra ele ligar pra você, pra você dizer qual é o setor que tá reclamando pra gente chamar pra uma conversa.
Karine Melo: Este é o Bom Dia, Presidente, que hoje recebe o presidente Luiz Inácio Lula da Silva aqui nos estúdios da EBC em Brasília. Presidente, a gente está em rede facultativa de rádio, pelo canal GOV, pelo YouTube. Eu também quero agradecer aos colegas da CNN, do UOL e do Poder 360 que transmitem essa nossa entrevista ao vivo. Então vamos, sem demora, Presidente, a Curitiba, vamos à Rádio Banda B. Quem está com a gente lá é a Denise Melo. Oi, Denise, bom dia.
Denise Melo (Rádio Banda B): Bom dia, Karine. Bom dia, presidente. Eu estava ouvindo aqui essa questão da polarização. Infelizmente, aqui no Paraná é um estado extremamente polarizado. E a gente espera, do fundo do coração, presidente, que uma tragédia como essa, em que todos nós somos solidários no Rio Grande do Sul, faça com que o país volte a ser, de fato, um país único, com uma bandeira única, presidente.
Eu gostaria de lhe perguntar aqui, com relação... O que o senhor pode adiantar em relação ao pacote que vem aí pela frente sobre as medidas de economia para estimular a economia? Tem aí, talvez, uma possibilidade de um crédito para quem tem cadastro único, para pessoas que possam empreender, obras em favelas. O que vem pela frente que o senhor pode adiantar para a gente com relação a estimular a economia, presidente?
Presidente Lula: Denise, bom dia. Bom dia ouvintes da rádio Banda B de Curitiba, bom dia povo do estado do Paraná. Olha, Denise, primeiro, nós somos um país único e nós somos um país de uma bandeira só, representada por uma única bandeira. É importante não confundir a bandeira do Brasil com a bandeira de partido.
Quem não tem partido usa a bandeira do Brasil. Quem tem partido usa a bandeira do Brasil quando quer falar da nação e usa a bandeira do partido quando quer falar do partido. Essa polarização não é por conta de disputa eleitoral. Essa polarização é porque você tem de um lado uma parte da sociedade, sabe, que age de forma civilizatória, respeitando o direito dos outros, respeitando o direito de cada um, desde que não haja interferência na vida do outro, e, do outro lado, você tem um grupo de pessoas que vivem da fake news, vivem de mentira, vivem de leviandade. Então, esse tipo de gente é que nós temos que derrotar.
Você, Denise, se lembra: eu disputei três eleições, perdi três eleições para presidente da República. Você nunca viu depois de perder as eleições a gente ficar chorando, lamentando e xingando. Não! Perdeu, vai para casa e se vire, e tem que esperar. Eu esperei 12 anos para ganhar uma eleição e você não me viu xingando ninguém. Quando eu ganhei do Serra, do Alckmin, também eles não ficaram xingando. Perderam e foram para casa. É assim que se faz política no mundo.
Acontece que surgiu uma coisa nova. Surgiu o implante do ódio em qualquer palavra. Sabe uma coisa que está faltando no Brasil hoje, Denise? Está faltando, eu diria, argumento. Por falta de argumento, as pessoas falam bobagem. Por falta de argumento, as pessoas xingam. Por falta de argumento, as pessoas falam mentiras. Então, é preciso que a gente recupere a capacidade do debate com argumento. Sabe, que as pessoas leiam mais, que as pessoas discutam mais os problemas do Brasil. Essa é a primeira coisa.
A segunda coisa, Denise, eu vou te dizer uma coisa. Você sabe como é que nós pegamos esse país? Esse país estava desmontado. Esse país estava desmontado. Era como se fosse uma dessas casas que caem quando dão um vendaval. Ou seja, nós precisamos recuperar esse país.
Esse país não tinha ministério da Cidade. Você sabe que fazia oito anos que não tinha dinheiro para encosta no orçamento do governo federal? Você sabe que fazia oito, sete anos que não aumentava a merenda escolar? Você sabe que fazia tanto tempo que não aumentava o salário mínimo? Ou seja, nós estamos recuperando. Recuperamos o Ministério da Cidade. Recuperamos o Ministério da Cultura. Recriamos o Ministério da Pesca. Recriamos o Ministério da Mulher. O Ministério dos Povos Indígenas. Porque o Brasil precisa estar representado na sua totalidade.
Não é meia dúzia de bem vestidos em Brasília que vão governar esse país. A gente tem que cuidar desse país. Dito isso, eu vou te dizer um negócio. A economia está indo bem. A inflação está controlada. A taxa de juros, espero, que continue caindo. Sabe? Os investimentos estão acontecendo. Fazia dezenas de anos, Denise, que a gente não ouvia o anúncio que foi feito na Anfavea pela indústria automobilística: 129 bilhões de reais de investimentos, a sua grande maioria até 2028. E uma parte dele até 2033. Ora, esse investimento a gente nunca tinha visto.
O Slim (Carlos Slim, empresário dono da América Móvil) veio ao Brasil, que é o presidente da Claro, veio ao Brasil e anunciou a disposição de investir R$ 40 bilhões no Brasil. Dos quais, R$ 17 bilhões a começar de ontem. Ora, então as coisas estão acontecendo. O Brasil foi o segundo país do mundo a receber investimento direto ano passado. Então, as coisas estão acontecendo no Brasil.
Veja, a inflação tá caindo, a fome tá acabando, o salário mínimo tá aumentando, a renda da pessoa tá crescendo, o consumo voltou a crescer, e o emprego voltou a crescer. O emprego voltou a crescer, que isso é bom. É a melhor política de distribuição de renda do mundo. É o crescimento do emprego, o crescimento do salário.
E nós anunciamos, Denise, a maior política de crédito que esse país já ouviu. Eu vou repetir para as pessoas entenderem porque eu criei esse slogan. Nunca antes na história do Brasil foi anunciada uma política de crédito com a magnitude que nós anunciamos. Ou seja, é crédito até para um pequeno e médio catador de material reciclável na rua. É crédito que atinge a empregada doméstica. É crédito que vai atingir o pessoal da construção civil, porque nós estamos abrindo crédito para as pessoas de classe média, que não querem comprar um Minha Casa, Minha Vida, que não querem comprar uma casa pequena e querem comprar uma casa maior, pois nós vamos fazer crédito para a construção civil. Eu acho que vai ser uma coisa extraordinária. E nós abrimos crédito para os pequenos e médios empreendedores individuais nesse país.
Ou seja, e mais ainda, nós fizemos uma hedge cambial. Ou seja, para que as pessoas que queiram fazer investimento no Brasil não tenham medo por causa da oscilação cambial. Nós criamos um seguro para isso. Então, Denise, isso nunca foi feito na história do Brasil.
E mais ainda, nós conseguimos aprovar uma política tributária que há 40 anos o Brasil estava esperando. E veja o milagre: o meu partido só tem 70 deputados, o Congresso Nacional tem 513 deputados; o meu partido só tem 9 senadores, o Senado tem 81e nós conseguimos aprovar uma reforma tributária com deputados e senadores. Os contra e os a favor. Isso que é importante na democracia, Denise. Isso que é sagrado.
Então, Denise, é importante eu estar falando com o estado do Paraná para dizer o seguinte: eu vou muito ao Paraná neste meu mandato. Você pode ficar certa que eu vou muito no meu mandato. E eu vou tentar diminuir essa polarização, porque a gente não pode continuar polarizado dentro da mentira. A verdade tem que vencer, a mentira tem que ser destruída. As pessoas que mentem não merecem credibilidade, não merecem respeito.
O cara precisa aprender a falar olhando no olho das pessoas e dizendo aquilo que é verdade. As pessoas não podem contar mentiras sobre a desgraça dos outros. E o Paraná é um estado extremamente importante para o Brasil. Muito, mas muito importante. Possivelmente, quem mora no Paraná não tenha a dimensão da importância que o Brasil dá ao estado do Paraná. A gente não consegue perceber isso quando a gente tem presidente da República ou quando a gente está no governo federal. Porque a gente fica medindo o crescimento de cada estado, a renda de cada estado, a qualidade de vida de cada estado. Portanto, o povo do Paraná, Denise, pode ficar tranquilo que da nossa parte não tem polarização que prejudica o povo brasileiro. Porque o povo brasileiro é a razão pela qual a gente governa esse país.
Karine Melo: Presidente, o senhor tem dito com muita frequência que agora é tempo de colher, né? Que o senhor plantou e agora é tempo de colher. O senhor apresentou números aí agora. E eu queria saber como é que o senhor fica com essa colheita, porque essa colheita depende de muita coisa, né, presidente? Esse ano, por exemplo, a gente vai ter eleições, o Congresso entra em recesso branco, e algumas coisas dependem do Congresso, outras coisas dependem dos estados, né? O governo federal vai aí tomando as medidas, mas depende de muitas variáveis. Como é que o senhor fica com essa colheita, nessa ansiedade de colher logo, e esse tempo de espera da política?
Presidente Lula: Então, só um ponto de resposta a essa pergunta, Karine. Esse negócio da gente tentar trabalhar junto com a Câmara e com o Senado, por isso que eu convidei os dois presidentes para ir comigo para o Rio Grande do Sul, é porque a gente não pode permitir que, por conta do processo eleitoral deste ano, a gente possa prejudicar algum município. A política e as eleições de 2024 não podem ser um pretexto para a gente prejudicar o município que está precisando de ajuda no Rio Grande do Sul. E é por isso que a gente tem que estar com a Câmara e com o Senado junto, trabalhando junto, compartilhando as coisas, para que todo mundo faça de comum acordo o melhor para resolver o problema dessa crise e outras crises que, porventura, a gente tenha. É uma coisa. O problema da colheita, Denise, é o seguinte.
Todo mundo que faz política sabe o seguinte: quando você ganha uma eleição, você tem um compromisso, tá? Você tem um compromisso programado, eu tenho um compromisso programado. Eu tenho um compromisso programado de reduzir, de zerar o pagamento de imposto de renda para as pessoas que ganham até 5 mil reais e vai acontecer, antes do final do meu mandato, de aumentar o salário mínimo todo ano, e está acontecendo, de melhorar o Bolsa Família, que está acontecendo, de acabar com a fome que está acontecendo.
Mas veja, quando você encontra uma casa desarrumada, o que as pessoas não contam, quando o Haddad vier aqui, você pergunta pro Haddad, o que ele encontrou na contabilidade brasileira. O governo passado utilizou R$ 300 bilhões na perspectiva de ganhar as eleições, fazendo isenção, desoneração, distribuindo dinheiro na perspectiva de ganhar as eleições. É por isso que quando perdeu, entrou em crise, tá?
Então, esse país que nós nos encontramos destroçados, nós tivemos que preparar a terra, preparar direitinho, adubar a terra, fazer as covinhas e plantar as coisas. E nós plantamos. E agora, por que eu digo que é a época da colheita? É porque no primeiro ano, o povo não te cobra nada. Você acabou de ganhar as eleições, o povo sabe que você está arrumando a casa. Porque todo mundo que muda de casa sabe que é assim. Quando a gente chega na casa, tem que arrumar. Agora o povo começa a falar: “e o meu?” E eu tenho dito pra ele: “você tem o direito de cobrar, porque eu prometi”. Eu não esqueço uma palavra que eu falei durante a campanha do que eu quero fazer para o povo brasileiro.
Primeiro disse que eu não queria governar, eu queria cuidar do povo. Cuidar. Cuidar de cada mulher, de cada homem, de cada negro, de cada branco, de cada indígena, de cada criança. Cuidar. Porque se você utilizar a palavra cuidar, você está falando diretamente para as pessoas. Se você fala governar, você está falando de uma forma tão ampla que as pessoas mais humildes não se sentem contempladas. Porque normalmente, no governo desse país, historicamente, o povo pobre não entrava no orçamento. Quando vai discutir o total de dinheiro, no que tem que gastar, o povo pobre não entrava, e agora entra. Agora nós queremos saber a parte do povo pobre, é por isso que tem muitos programas sociais, muito programa para a juventude.
Ô, Karine, eu vou lhe contar a coisa que nós vamos colher. Nós acabamos de anunciar um programa chamado Pé-de-Meia. Nós descobrimos que, segundo os dados do IBGE, quase 500 mil pessoas, entre adolescentes de 14 ou mais anos, desistiram do ensino médio porque tinham que trabalhar em casa para ajudar a família.
Aí nós ficamos pensando, se uma criança de 14 ou 15 anos é obrigada a parar de estudar para trabalhar em casa, o que será do futuro dessa criança? E o que nós fizemos, Karine? O que nós fizemos? Nós temos um programa chamado Pé-de-Meia. Nós vamos dar uma bolsa que no total é o seguinte: a pessoa vai receber no primeiro ano 200 reais por mês durante 10 meses, e no final, se ele tiver 80% de comparecimento nas aulas e se ele passou de ano, ele vai receber mais mil. Então, dez de 200 são 2 mil, mais uma de 1.000 são 3 mil no primeiro ano. No segundo ano, a mesma coisa. Nós vamos dar mais 10 parcelas de 2 mil e mais uma de 1.000. Se ele tiver comparecido 80% e passar de ano. E no terceiro ano, a mesma coisa. Quando chegar no final do ano, ele pode ter 9 mil na poupança.
Por que nós estamos fazendo isso? Para evitar que esse jovem deixe de estudar. Para levar esse jovem a ter perspectiva de um futuro, a ter uma esperança. Porque se a gente não fizer investimento na educação agora, a gente vai ter que gastar dinheiro fazendo cadeia o ano que vem, arrumando mais policiais, fazendo mais cadeia, mais prisão. Então, nós queremos investir na educação.
A educação é a única coisa que significa o desenvolvimento do país, diferente de governo que achava que tinha que fazer casa de tiro, tinha que fazer a compra de arma, que o cara podia ter dez fuzis, dez revólver, dez pistolas, dez metralhadoras, que o importante era todo mundo andar armado, como se todo mundo fosse aqueles personagens americanos, o Rambo, todo mundo, sabe? Não, a gente quer é uma pessoa com mentalidade pacífica, ordeira, trabalhadora, e por isso nós fizemos um programa como esse. É uma colheita extraordinária. Aprovamos mais 100 institutos federais nesse país, só aqui em Brasília vamos ter dois. Então é esse mundo que está me permitindo colher aquilo que nós plantamos. Só começando a colheita. Só, só espere que vai ter muito mais. Não é que a gente já fez tudo, não.
E o povo não pode parar de cobrar, pode continuar cobrando, que a gente sabe o que a gente prometeu, e eu quero entregar esse país pro povo brasileiro com crescimento robusto, com uma renda melhor, o povo voltando a poder comprar aquilo que ele produz. Eu vou dar um dado pra você do que é colher, gente. Em dezembro de 2010, quando eu deixei a presidência da República do Brasil, o Brasil vendia por ano três milhões e oitocentos mil carros. Eu vou repetir: três milhões e oitocentos mil carros eram vendidos por ano quando eu deixei a presidência em 2010. Eu voltei em 2023 e esse país estava vendendo um milhão e oitocentos mil carros. Menos da metade. Menos da metade. Já voltamos a vender dois milhões e trezentos.
Estamos conversando com a indústria automobilística. Eles têm banco, eles têm que baixar a taxa de juros, aumentar o tempo de pagamento. Porque o pobre, ele compra carro. Todo mundo gosta de carro. Quem é que não gosta de carro? Agora é preciso que seja excessivo. Tem que ter mais carro popular para ele poder comprar. Então é essa colheita que eu quero entregar para o povo. Quando eu deixei a presidência da outra vez, o varejo estava crescendo quase 13%. O PIB estava crescendo 7,5% e as pessoas estavam vivendo, sabe, na maior felicidade. O Brasil era tido pelas pesquisas, o país mais alegre do mundo, e o país com mais esperança do mundo.
Aí tivemos um momento de escuridão nesse país em que o país, ninguém respeitava o Brasil, ninguém vinha ao Brasil e ninguém recebia o Brasil. Nós voltamos, nós voltamos, e eu já tive reuniões com todos os países importantes do mundo. Eu já estive participando da reunião da União Africana com 54 presidentes. Eu já estive na União Europeia, na América Latina, com 66 presidentes. Eu já estive no G20, eu já estive nos BRICS, eu já estive na CELAC com 33 presidentes e no CARICOM com 15 presidentes. Por que isso? Porque é preciso. Eu tenho dito uma frase que é a seguinte: ninguém ama quem não conhece. Ninguém ama quem não conhece.
Quando eu levei o Lira (Arthur Lira, presidente da Câmara dos Deputados) e o Pacheco (Rodrigo Pacheco, presidente do Senado Federal) comigo, eu disse o seguinte, eu aprendi com a minha mãe que dizia o seguinte: “meu filho, o coração não sente, o que os olhos não veem. É preciso que os olhos vejam”. Então eu quis levar eles para que a gente visse. Uma coisa é eu contar a desgraça, outra coisa é você ver a desgraça, para sensibilizar as pessoas.
Então, é essa a colheita que eu quero entregar, um Brasil mais harmonioso, um Brasil mais carinhoso, um Brasil mais fraterno, mais solidário, que as pessoas se abraçam e não se esmurrem, que as pessoas se beijem e não esfaqueiam outros. Que as pessoas comprem livros e não armas. É esse país que eu quero. E aí nós temos que fazer muita coisa pra isso acontecer. E vamos fazer. Eu tenho certeza, Karine, que nós vamos entregar o país. Aliás, vocês podem assumir um compromisso comigo já que, na semana que eu for anteceder a saída da presidência, terminar meu mandato, você vem aqui me entrevistar para prestar contas para vocês do que nós fizemos.
Aliás, eu vou dizer uma coisa para vocês que é importante vocês saberem. Nunca antes na história do Brasil, um presidente da República registrou em cartório tudo o que ele fez. Quando eu saí em 2010, a companheira Miriam Belchior (ex-ministra do Planejamento, Orçamento e Gestão), que é o braço esquerdo e direito do Rui Costa na Casa Civil, mais o pessoal dela, Maurício (Maurício Muniz, secretário especial de Articulação e Monitoramento da Casa Civil) e companhia bela, trabalharam e apresentaram um relatório que eu fui registrar em cartório, pois é o único presidente do mundo que registrou em cartório aquilo que fez. E vamos fazer outra vez, porque ao invés de ficar só fazendo discurso, vamos provar. Quem quiser saber o que eu fiz em 2013, 2010, vá procurar que você encontre isso registrado em cartório.
Karine Melo: Para você que chegou agora aqui no canal GOV, este é o “Bom Dia, Presidente” e você pode baixar o áudio deste e de outras entrevistas a qualquer momento, basta acessar redenacionalderadio.ebc.com.br. Também pode assistir essa entrevista ao vivo pelo YouTube e, a qualquer momento.
O ministro Pimenta está aqui com a gente, trazendo atualizações sobre o número de mortos e desaparecidos no Rio Grande do Sul, presidente.
Presidente Lula: Nós vamos todo santo dia acordar com números ruins, sabe por quê? É o que eu estou dizendo, a gente só vai ter noção do que aconteceu quando a água baixar, o rio voltar ao leito normal e a gente poder saber das famílias quem apareceu, porque não é só os 90 mortos, são 130 desaparecidos.
Então, é muito triste, é muito triste. Mas além da solidariedade, que a gente tem que pregar todo dia, rezar todo dia, eu disse ontem uma coisa, Karine, que é o seguinte, eu sou de uma região, o Rui também, em que a gente nascia e morria fazendo procissão e rezando para chover. Então, quando a gente tiver uma quantidade de chuva como essa, para nós é algo inexplicável. Então, agora a gente está rezando para parar de chover no Rio Grande do Sul, pelo amor de Deus, para de chover para que o povo possa voltar à normalidade e a gente possa reconstruir, sabe?
E me parece que ainda vai chover quinta-feira. Bem, uma coisa que eu recebi, um recado agora, é o seguinte: a partir de hoje os prefeitos e os governos estaduais podem cadastrar pedidos para escolas, creches, unidades de saúde, hospitais, recuperação de equipamentos. É só cadastrar que vai começar a acontecer imediatamente para atendimento do povo.
Karine Melo: É isso. Este é o “Bom dia, Presidente”. Hoje a gente recebe o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Presidente, vamos a São Paulo. Vamos aos estúdios da Nova Brasil FM. Quem tá lá com a gente é a Michelle Trombelli. Oi, Michelle. Bom dia pra você.
Michelle Trombelli (Nova Brasil FM): Bom dia, Karine. Bom dia, presidente. A gente tá ao vivo transmitindo também aqui na rede Nova Brasil. Prazer representar o nosso jornalismo nessa entrevista, presidente. Eu gostaria de voltar um assunto que foi levantado pelo nosso colega de Cuiabá, o Aldair. É um assunto cheio de idas e vindas que é a reoneração da folha de pagamento, existe uma pressão muito grande de empresários, prefeitos, parlamentares para que o governo encontre uma solução o quanto antes para esse impasse da reoneração da folha de pagamento de 17 setores importantíssimos da economia. Qual seria, na sua visão, essa solução por parte da sua equipe econômica para que não afete tanto os empregos no país? E quais são os planos do governo, presidente, para reduzir despesas e se empenhar para cumprir as metas fiscais, não apenas pelo aumento da arrecadação?
Presidente Lula: Michelle, bom dia. Bom dia, ouvintes da Rádio Nova Brasil. Obrigado por retomar a pergunta feita, que eu esqueci de falar, a questão da desoneração. Olha, Michelle, eu conduzi a crise de 2008, 2009, eu fiz R$ 49 bilhões de desoneração para vários setores, mas quando a gente fazia a desoneração, a gente chamava o movimento sindical e a gente fazia um jogo de muito interesse. Um empresário quer reduzir o que ele paga, ele vai transformar isso em empregos novos, ele vai transformar isso em aumento de salário, ele vai transformar isso em estabilidade? Porque só a desoneração do jeito que eles querem é só para aumentar o lucro.
É isso que eles querem. E nós queremos que tenha contrapartida. Eu falei essa semana com o presidente do Senado, é importante que tenha uma contrapartida. Eu quero desoneração para quê? Só para aumentar meu lucro ou eu quero desoneração para aumentar o salário dos trabalhadores, eu quero desoneração para manter a estabilidade dos trabalhadores? Então, quando nós entramos na Suprema Corte para que a gente suspendesse a desoneração, o objetivo é acertar na mesa e negociar. E cada empresário me diz o que que vai fazer. Sabe, diga o que vai fazer, porque esse negócio de dizer que é para manter emprego, ninguém garante que vai manter emprego, qual é o contrato que diz que ele vai garantir emprego?
Quem é que diz que, na primeira crise, ele não manda gente embora? Não tem nada escrito. Então, o que nós queremos é apenas seriedade dos empresários. Eu estou dizendo isso porque eu fiz R$ 49 bilhões de desonerações sem empresário pedir. Decisão minha e do Guido Mantega (ex-ministro da Fazenda). Vamos tentar fazer a desoneração nos setores mais importantes da economia e fizemos. Aí depois, no governo da Dilma de 2011 a 2015, foi feito R$ 540 bilhões de desonerações. Aí já era o Eduardo Cunha, o presidente da Câmara. Aí a Dilma mandava desonerar esse copo.
Ele desonerava o copo, a xícara, o pires, a mesa, desonerava até a água que não tinha dentro do copo. Ou seja, aí levou a um desastre. Porque toda vez que o Estado toma uma decisão de não arrecadar um determinado tributo, ele tem que saber o que é que vai compensar aquele tributo. Então é por isso que nós não queremos deixar de negociar. É importante lembrar que a suspensão, a liminar que nós conseguimos é para chamar os empresários numa mesa de negociação. E essa é a responsabilidade do nosso ministro Haddad, que tem que fazer isso, tá? Isso também eu conversei com o presidente do Senado.
Outra coisa é a questão do crescimento econômico. Veja, eu às vezes fico um pouco irritado com esse negócio de déficit fiscal, se vai ser zero, se não vai ser zero. Isso é uma discussão que em nenhum país do mundo se faz. Em nenhum país do mundo a dívida pública bruta dos Estados Unidos é 112% do PIB. A dívida do Japão é 235% do PIB. A dívida da Itália é quase 200%. Ou seja, esse não é o problema. Não é problema ficar só olhando que você não pode gastar tanto, não pode gastar tanto. Você tem que saber se você está gastando ou se você está investindo.
Eu sempre faço uma pergunta para provocar os meus companheiros da imprensa. Se a EBC deu aumento de salário para os trabalhadores dela, ela está gastando ou está investindo? Na minha opinião, ela está investindo para ter profissionais mais qualificados, mais motivados, com mais vontade. Isso vale para você, isso vale para a Rádio Nova Brasil, isso vale para todas as rádios que estão transmitindo, isso vale para Globo, para Record, para o SBT, para Bandeirantes, para toda televisão.
Quando você melhora a vida da pessoa, você está distribuindo riqueza. Isso significa, na minha opinião, investimento. Então, a gente não pode colocar isso como ponto básico. A gente tem responsabilidade fiscal, Michelle, porque eu aprendi com a minha mãe ser economista. Minha mãe era analfabeta. Ela tinha oito filhos que trabalhavam e a gente chegava no final do mês. Naquele tempo a gente recebia o envelope amarelo com o dinheirinho lá dentro. Todos os oito filhos chegavam e entregavam o envelope fechado para a minha mãe. Ela não sabia ler nem escrever, mas sabia contar dinheiro. Então ela contava o dinheiro e ela falava: “esse aqui é para pagar a padaria. Esse aqui é para pagar o bar. Esse aqui é para pagar não sei das contas. Esse aqui é para pagar a conta da luz. Esse aqui é para pagar a conta do gás. Sobrou isso aqui. Sobrou isso aqui”. Ela falava: “isso aqui é para você, pro seu transporte mensal”.
Distribuía para cada um. Se sobrasse algum, para os mais velhos ela dava dinheiro: “Esse aqui é para você ir namorar hoje”. Como eu era um caçula, nunca sobrou dinheiro para eu namorar. Eu ficava sem o meu dividendo. Então, eu estou dizendo isso para mostrar responsabilidade. Eu desde que assumi a presidência da República em 2003, eu tenho dado lições de responsabilidade. Eu peguei esse país quebrado devendo US$ 30 bilhões para o FMI. O companheiro Fernando Henrique Cardoso (ex-presidente da República do Brasil), o ministro da Fazenda dele, o Malan (Pedro Malan, ex-ministro da Fazenda), tinha que receber todo ano dois economistas do FMI para ver a contabilidade do Brasil. O Brasil ficava chorando por dinheiro pra fechar a conta.
Eu tomei posse devendo US$ 30 bilhões, não tinha dinheiro pra comprar, pra pagar as nossas importações. Eu paguei US$ 30 bilhões pro FMI, depois emprestei US$ 15 bilhões pro FMI e depois fizemos uma reserva de US$ 370 bilhões. Então, ninguém me fale em responsabilidade porque essa eu tenho demais. Ninguém me fala, eu tenho responsabilidade porque foi assim que eu fui criado, assim eu criei meus filhos e assim eu quero governar o Brasil, quero cuidar desse país tendo a responsabilidade. Eu não vou gastar nunca mais do que o que eu preciso gastar.
Mas se eu tiver que gastar pra construir um ativo novo, eu estou fazendo que nem um empresário que tem um mercado mais promissor. O empregado quando tem um mercado mais promissor, ele vai no banco, ele faz uma dívida, faz a fábrica crescer, aumenta a produção e vai vender o seu produto e paga sua dívida. Ora, se o governo tiver que gastar dinheiro pra fazer um ativo novo, alguma coisa nova que aumenta o patrimônio do país, qual é o problema? Nenhum. E o que eu não posso é ficar com o sistema financeiro todo santo dia, todo santo dia, só olhando o déficit fiscal e não olha o déficit social. Olha as pessoas que estão desempregadas, que estão dormindo na rua, que estão passando fome, pare de olhar só pro seu cofre, pare de olhar só pra sua conta bancária, olha pro povo. Então é isso que às vezes eu fico irritado quando eu vejo muita notícia. “Defícit fiscal, déficit fiscal”. É uma discussão inócua para um país sério como um país governado por mim e governado pela Dilma.
A seriedade fiscal eu tenho e já provei. Eu peguei esse país falido em 2003 e entreguei esse país a sexta economia do mundo. Pegamos ele a 12ª. Se Deus quiser, vamos devolvê-lo para a sétima ou sexta economia do mundo. As coisas estão acontecendo. A nossa companheira Karine perguntou agora como é que está a colheita. Eu, na verdade, quero convidar vocês para participar dessa colheita. Eu quero que vocês acompanhem mensalmente ou a cada três meses. O Pimenta pode vir aqui com o ministro para prestar conta de cada coisa. O Rui Costa prestar conta do PAC.
Porque o PAC tem um trilhão e setecentos bilhões de investimentos. Um trilhão e setecentos bilhões de investimentos entre o Governo Federal, iniciativa privada e financiamento. Então, nós vamos fazer esse país acontecer. Pode estar certa que você vai ver um país melhor, mais bem cuidado, mais bem tratado e mais feliz. Aonde, como diz a música gaúcha, eu gosto muito, que é chamada “Céu, Sol, Sul”, onde tudo que se planta, dá, e só o amor floresce. É esse país que eu quero construir. Essa música é de Leonardo, do Rio Grande do Sul, chamada “Céu, Sol, Sul”.
Karine Melo: Tá aí, este é o “Bom Dia, Presidente”. Hoje com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao vivo aqui nos estúdios da EBC em Brasília. Presidente, vamos tentar retomar o contato com Belo Horizonte? Vamos à rádio Itatiaia. Quem está com a gente lá é a Kátia Pereira. Oi, Kátia. Ótimo dia para você.
Kátia Pereira (Rádio Itatiaia): Para você também, Karine. Bom dia, presidente Lula. Presidente, a ministra Marina Silva, ainda voltando a falar do contexto das chuvas no Rio Grande do Sul, ela disse que na Eco-92 foi estabelecida uma série de medidas para minimizar os efeitos das mudanças climáticas. Só que, em 32 anos, praticamente nada foi feito. Por que o Brasil não fez o papel dele, não fez a parte dele?
Presidente Lula: Não é o Brasil que não fez, o mundo não fez. É importante, Kátia, ter claro o seguinte. Eu vou lhe dar um dado. Eu participei da COP15 em Copenhague em 2009. Naquela COP15, ficou acertado que os países ricos iriam dar US$ 100 bilhões por ano para que os países que têm floresta em pé, para que o país que tem muita floresta pudesse conservar e para que a gente pudesse descarbonizar a economia. Se você pegar isso como modelo, você vai perceber o seguinte: o dinheiro não saiu.
Mesmo assim, nós estamos, esse ano, nesse primeiro quadrimestre, já diminuímos o desmatamento na Amazônia, mais 42%. Mesmo assim, nós estamos recuperando 40 milhões de terras degradadas nesse país, com a iniciativa privada. Foi assinado um acordo com uma instituição financeira do Japão, a JICA, para começar a fazer investimento e plantar florestas, ou florestamento, ou plantar outra coisa qualquer que quiserem plantar, mas vamos recuperar. Numa demonstração de que o Brasil está sendo o único país do mundo cumprindo com aquilo que a gente propõe. O Brasil é o país que tem a maior quantidade de energia renovável no mundo, 90% da nossa energia elétrica é renovável, seja hídrica, seja eólica, seja solar, seja biomassa.
E agora vai entrar o hidrogênio, que está sendo montado investimentos em vários estados, que eu espero que seja uma saída muito importante para isso. Então o Brasil está cuidando. Eu fiz uma reunião esses dias, nunca tinha acontecido no Brasil, com todos os biomas brasileiros, até o Pampa, a Caatinga, o Cerrado, a Mata Atlântica, o Pantanal e a Amazônia, para que a gente comece a discutir o envolvimento dos brasileiros com esses biomas. Eu até estive com o presidente da Embratur, o companheiro Freixo (Marcelo Freixo, presidente do Instituto Brasileiro de Turismo) e vou discutir com o nosso ministro do Turismo, nós precisamos começar a incentivar essa meninada, do centro-sul do país, das capitais, a visitar esses biomas.
Nós brasileiros passamos por cima para ir para Miami todo dia e não descemos para conhecer a Amazônia. Vamos conhecer o encontro das águas entre o Rio Negro e o Solimões quando formam o Amazonas, vamos conhecer a riqueza da biodiversidade da Amazônia? Então, nós precisamos fazer pacote de turismo para as pessoas irem fazer uma visita, para as pessoas conhecerem, porque eu volto a repetir: a gente não ama aquilo que a gente não conhece. Então, é preciso as pessoas conhecerem a Amazônia, as pessoas visitarem os estados da Amazônia, visitar não a capital, mas entrar nas reservas florestais, conhecer os nossos povos indígenas, conhecer os nossos quilombolas, para a gente poder fazer esse país dar um salto de qualidade.
A Marina tem razão, talvez o país que mais tenha cuidado do seu país somos nós. Talvez nenhum país esteja preocupado com a questão da transição climática e da transição energética como o Brasil. E nós temos um compromisso que está de pé, e não foi um compromisso de lei, foi um compromisso assumido por nós, que até 2030 a gente vai ter desmatamento zero na Amazônia. Agora, preste atenção. Ter desmatamento zero na Amazônia não é só manter árvores em pé, é cuidar do povo que está embaixo dela. É cuidar do povo ribeirinho, é cuidar dos indígenas, é cuidar dos pescadores, é cuidar dos extrativistas. Cuidar de 28 milhões que moram ali. Esse é o nosso compromisso. E, portanto, eu vou dizer uma coisa. Tem poucos países no mundo tratando a questão climática com a seriedade que o Brasil está tratando, porque nós compreendemos que essa transição energética vai permitir que o Brasil, no segundo quarto do século XXI, possa dar um salto de qualidade, não apenas na descarbonização da economia, mas também no desenvolvimento do nosso povo.
Karine Melo: E, já que o senhor falou em Amazônia, presidente, vamos à Rádio Nacional da Amazônia. Vamos falar com a Amazônia. Alto Solimões, Rádio Nacional de Brasília, todo mundo em rede e a gente tá com a craque da Amazônia, que é a Mara Régia. Oi, Mara, bom dia pra você, bem-vinda.
Mara Régia (Rádio Nacional da Amazônia): Muito bom dia, que prazer participar dessa entrevista coletiva. Bom dia, presidente, que honra vê-lo aí nos estúdios da nossa EBC, pilotando esses microfones que levam a nossa voz, até o Riozinho do Anfrísio aí (Reserva Extrativista Riozinho do Anfrisio, no Pará), o ministro Paulo Pimenta. O senhor que sempre se refere aquele povo, que batiza até a população com o nome das pessoas que aqui trabalham, ainda mais eu, que carrego o régia, né, a flor símbolo da Amazônia no nome, então é um prazer do tamanho dessa Amazônia. E eu aqui, enquanto aguardava a oportunidade de falar com o nosso presidente, eu me senti um pouco na pele de Chico Mendes. Porque, não sei se o presidente vai lembrar, mas nos anos 80 ele foi lhe procurar lá no sindicato pra falar da criação do Partido dos Trabalhadores no Acre e o senhor em plena ditadura ali vivendo aquele transe e aí mandou que ele esperasse e aí chegou a hora da gente lhe ver pilotando essas ondas sonoras da nossa Rádio Nacional.
Inclusive eu tenho certeza que o senhor não pode deixar de fazer uma visita aos nossos transmissores, o povo do rodeador que leva a nossa voz pro mundo. Aliás, as ondas curtas são, realmente, a nossa força e eu tenho aqui a prova disso junto ao povo justamente do Rio Grande do Sul. Aqui o Rafael Roto nos mandou um recado dizendo: “aqui do Rio Grande do Sul, região central do estado, num momento terrível que nós estamos vivendo devido às enchentes, sem luz, sem água, sem internet, com meu bom e velho companheiro, sintonizo a rádio Nacional em ondas curtas bem no momento em que o comunicador falava justamente de força para o nosso povo e da previsão do tempo, porque nós estamos vivendo assim uma pane, né?”. Agora eu gostaria muito de também registrar aqui essa potência que nos leva a falar simultaneamente para os nove estados da Amazônia Legal, dizer que um grande amigo seu, como uma flecha, acaba de mandar um WhatsApp aqui com uma pergunta, presidente.
Eu estou falando de um amigo que compartilha a imortalidade, só que ele na academia e o senhor no panteão da humanidade, pelo conjunto da obra. Então diz Ailton Krenak: “Eu quero saber, presidente, se o senhor acredita na possibilidade de uma governança plurinacional para a Bacia Amazônica, além do Tratado de Cooperação Amazônica. Eu fiquei muito impressionado quando o senhor visitou o presidente da Colômbia, Gustavo Petro, e eu vi seu entusiasmo em convocar os países da Bacia Amazônica a uma nova responsabilidade sobre esse bioma. Como é que o senhor acredita que o seu governo vai poder dar concretude a essa proposta, presidente?”.
Presidente Lula: Mara. Deixa eu tirar a Katia daqui para colocar a Mara. Mara, primeiro, um prazer imenso estar falando com você e falando com os ouvintes da Rádio Nacional da Amazônia. Eu tenho pedido para o Pimenta me levar na rádio, mas ele nunca leva, nunca leva. Deixa eu te falar uma coisa, Mara, primeiro, eu queria dizer que é uma coisa maravilhosa ver o Krenak fazendo uma pergunta para mim através de você. Você sabe que o Krenak é o primeiro indígena brasileiro a fazer parte da Academia Brasileira de Letras. E depois que eu li o livro do Ailton Krenak, eu estou tentando, trabalhando muito, para tentar adiar o fim do planeta. Ver se a gente consegue protelar o fim do planeta. É isso que nos leva a cuidar da Amazônia com carinho especial. Eu estou convencido que a gente não pode ficar brigando com o restante do mundo como se a Amazônia fosse um santuário da humanidade, não.
A Amazônia brasileira é a maior, mas você tem Amazônia em toda a América do Sul. Você tem quase todos os países fronteiriços com o Brasil, a Amazônia. E nós fizemos uma reunião em Belém do Pará, para a gente discutir a questão da Amazônia e a gente precisa preparar uma discussão a nível mundial, porque tem três regiões que tem floresta em pé, tem a nossa Amazônia, tem a da Bacia do Congo e tem a da Indonésia, que são três grandes reservas florestais que existe no planeta. Então, nós precisamos estar juntos para tentar trabalhar como é que os países ricos vão pagar para que a gente possa se desenvolver mantendo a nossa floresta em pé. Esse é um desafio, é um desafio meu, não apenas com o Brasil, é um desafio meu com o futuro da humanidade.
A humanidade depende. O que está acontecendo hoje no mundo inteiro, essas mudanças, essas crises climáticas, essa violência que a gente está vendo da natureza, é uma resposta de algum erro que foi cometido em algum momento histórico. As pessoas precisam perceber. Eu fico imaginando o sofrimento do povo gaúcho, eu fico imaginando. Porque tanta água, naquela região. Um negócio que eu não consigo entender. Agora, eu queria que o Ailton Krenak soubesse que nós vamos levar muito a sério, mas muito a sério essa questão da preservação do nosso planeta, fazer as coisas com mais cuidado, produzir sem destruir, recuperar, que o que for possível recuperar, nós vamos fazer com muito carinho, com muito carinho, com muito carinho, porque é uma coisa para o futuro do nosso planeta. O que é importante é que as pessoas precisam conhecer. Quando nós tomamos a decisão de fazer a COP30 em Belém, é porque todo mundo dá palpite sobre a Amazônia.
Se você for na Noruega, as pessoas falam da Amazônia, se você for na Suécia, falam da Amazônia, se você for na Finlândia, falam da Amazônia, se você for na Austrália, falam da Amazônia, ou seja, as pessoas falam sem conhecer. Então, quando nós convocamos a COP30 em Belém, é para trazer o mundo para ouvir a Amazônia. Vai ser a primeira vez que a Amazônia vai ter o microfone na mão e ela vai poder falar para todo o planeta. Vai ser a primeira vez. E eu tenho certeza que você estará lá, Mara, tenho certeza.
Mara Régia: Assim esperamos e queremos, como o Krenak, cantar para o Rio, o Rio Doce, lá nas minas onde ele se encontra, mas o Rio que ele chama de avô, se a gente tivesse esse pertencimento, como o presidente acaba de dar provas dessa integração, inclusive eu que faço o programa Viva Maria, voltado para as questões de gênero, raça e etnia, eu queria dar um viva a Dona Lindu, que reconhece com sua atitude que as mulheres são as grandes economistas. Então, viva Maria, viva a resistência e viva a esperança, porque essas cadelas que nesse momento estão adotadas por Janja e que participaram da sua posse são a prova de que nós precisamos realmente ter uma natureza cada vez mais viva e a gente não pode se privar da nossa responsabilidade, presidente. Que honra estarmos aqui. Estou muito feliz com a sua liderança, com o seu compromisso em nome do carinho, porque nós mulheres somos carinhos, somos cuidados também.
Presidente Lula: Obrigado, Mara. Obrigado, querida.
Karine Melo: Presidente, vamos então, qual é a próxima rádio? Rádio Verdinha, vamos a Fortaleza, presidente. Vamos à Rádio Verdinha, quem tá lá com a gente é a Jéssica Welma. Oi, Jéssica, bom dia pra você, obrigada pela presença aqui hoje.
Jéssica Welma (Rádio Verdinha): Olá, muito bom dia, muito bom dia, presidente. Bom dia a todos que nos acompanham, é uma alegria estar aqui nessa conversa também. E olha, daqui do Ceará, eu acho que eu não podia fugir um pouco de falar de educação, é um assunto que pra gente tá sempre em destaque, há muitas pautas, porque educação é muito ampla. Mas, presidente, dessa vez o meu recorte vai ser sobre educação superior. As duas primeiras gestões do senhor têm marcos históricos na educação, através do Prouni, do FIES, da expansão das escolas técnicas, e assim, são várias, né?
E agora a gente tá no momento em que há servidores das universidades federais e professores em greve. Há um prejuízo imenso no desenvolvimento do nosso ensino superior, da ciência em relação a isso. Então, gostaria de saber se o senhor tem dialogado com o Ministro da Educação, Camilo Santana, se já há indicativos de saída para solucionar esse impasse com as categorias.
Presidente Lula: Querida Jessica, eu talvez seja o único presidente do mundo que não possa me queixar de greve, porque eu nasci na greve, eu sou filho, pai, irmão, tio das greves, então sempre acho que os trabalhadores têm o direito de se manifestar. O que é importante é que a gente antes de chegar às vias de fato, que é a greve, que é o instrumento mais forte dos trabalhadores, é que a gente tente negociar o máximo possível. Eu posso te garantir que o Camilo (Camilo Santana, ministro da Educação) tá preocupado, ele quer negociação o mais rápido possível.
A nossa companheira Esther (Esther Dweck, ministra da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos), a companheira que tá cuidando da negociação, junto com o companheiro Feijóo (José Lopez Feijóo, secretário da Gestão de Pessoas e de Relações de Trabalho), que é um companheiro muito preparado, porque foi dirigente da CUT porque ele foi presidente do sindicato de São Bernardo do Campo, onde eu fui presidente também, tá todo mundo querendo negociar.
Mas negociação é sempre assim. Eu pedia 10 e me ofereciam dois. Eu não queria, mas entre 10 e 2 tem 3, tem 4, tem 5, tem 6, é sempre possível encontrar um número que você possa, se não satisfazer 100% das pessoas, mas atender, porque as pessoas sabem que também para atender é preciso que tenha recurso para fazer o atendimento, e o dinheiro, o Governo Federal não produz dinheiro, ele arrecada, arrecada de quem? Do povo, e a gente precisa devolver pro povo em forma de benefício, uma delas é o salário também. Eu considero o salário um benefício, é o pagamento justo pelo trabalho prestado. Então nós vamos fazer um acordo. A mim não me encanta ver parte da educação de greve. Eu tenho que inaugurar muitas escolas técnicas, eu tenho que visitar universidades. Eu quero que os professores, quero que os funcionários estejam tranquilos. Eu, ontem, tive uma conversa com a ministra Esther e ela me disse que hoje estava elaborando uma proposta para fazer aos sindicatos dos professores.
Eu espero que a gente faça um acordo o mais rápido possível porque a educação é imprescindível para o crescimento desse país. Mas eu queria aproveitar sua pergunta para dar os parabéns ao povo do Ceará. Ontem eu vi uma matéria, uma matéria não, primeiro é o consórcio do Nordeste que tomou uma atitude dos nove governadores do Nordeste para fazer arrecadação para o Rio Grande do Sul. E eu vi no Ceará um pequeno empresário fazendo arrecadação, lotando o caminhão. Eu, sinceramente, eu fico muito emocionado de ver a grandeza do povo brasileiro. Sem ter a parte medíocre, aquela parte nervosa, raivosa, que fala muita bobagem, mas você tem uma maioria de gente boa, do coração bom, solidária, pessoas que querem contribuir. Então, mais uma vez, o nosso querido Nordeste está de parabéns pelo esforço para ajudar o estado irmão do Rio Grande do Sul. Obrigado pela pergunta, Jéssica.
Karine Melo: Presidente, o senhor falou sobre a COP30, eu queria que o senhor falasse um pouco também sobre o G20. São eventos muito importantes que o Brasil vai sediar, que o Brasil vai comandar o Brasil agora na presidência do G20. Eu queria saber qual é o grande legado que essa presidência do G20 vai deixar, qual será essa grande marca que o Brasil vai deixar à frente da presidência do G20. E queria saber qual a notícia, a gente falou de tantas coisas aqui, notícia que o senhor queria ver estampada aí no Brasil?
Presidente Lula: Antes de falar do G20, deixa eu relembrar aqui o aviso que eu fiz, agora, a pouco para os prefeitos do governo do estado do Rio Grande do Sul, que a partir de hoje está aberta a possibilidade de se cadastrar para pedidos, escolas, creches, unidade de saúde, hospitais, recuperação e equipamentos, ou seja, tudo que for necessário para recuperar, para investimento em educação e creches, hospitais, está pronto, está aberto. O governo está preparado, os ministérios estão preparados para começar a atender a partir de hoje. Portanto, prefeitos, entrem no computador e comecem a fazer seus pedidos.
Bem, a questão do G20. O G20 é um momento extremamente importante na vida do mundo quando ele se reúne.
Eu tive a ocasião de ser um dos criadores do G20 junto com o presidente Bush (George W. Bush, ex-presidente dos Estados Unidos) e outros presidentes na época da crise de 2008. Ou seja, era preciso criar um fórum que pudesse representar as maiores economias do mundo e tentar encontrar uma solução para os problemas. Nós fizemos uma primeira reunião nos Estados Unidos, fizemos a segunda reunião em Londres, a última que eu participei, eu levei a companheira Dilma, já como presidente eleita, e o G20 vem se reunindo. Não é fácil tomar decisão, porque os interesses são muito contraditórios. Nesse G20 do Brasil, nós temos três coisas importantes para discutir. Uma é o combate à fome, à desigualdade e à pobreza. Essa é uma coisa fácil de resolver, se houver a disposição política dos nossos governantes, que queiram assumir a responsabilidade.
Porque o mundo já produz alimento suficiente. A tecnologia genética, os adubos, os fertilizantes, já permitem que a gente possa produzir alimento para toda a humanidade. O problema é que você tem uma parte que se perde entre a produção e o consumo, e você tem uma parte que se perde porque o povo não tem dinheiro para comprar. Se houver uma disposição política dos governantes, é uma coisa que a gente pode acabar. Então, esse é o primeiro item, combate à desigualdade, à pobreza e à fome. A segunda coisa é a gente tentar discutir a questão da representatividade das Nações Unidas, da ONU. Ou seja, a ONU foi criada em 1945, ou seja, depois da Segunda Guerra Mundial, como se fosse uma casa da paz, ou seja, a partir dali, ela tinha um Conselho de Segurança dos membros permanentes, composta pelos cinco maiores países de economia e também dos países que ganharam a guerra.
Lá está a Rússia, lá tá os Estados Unidos, lá tá a França, a Inglaterra e tá a China, tá? Então nós estamos reivindicando que a ONU tenha que ter, primeiro, representatividade geopolítica. Não tem nenhum país africano e a África tem três países com mais de 100 milhões de habitantes, tem a Nigéria com 226 milhões de habitantes, a Etiópia com 126 milhões de habitantes e o Egito com 106 milhões de habitantes, fora África do Sul, e não tem ninguém.
A América do Sul tem o Brasil, tem a Argentina, tem a Colômbia, a América Latina tem mais o México. Tem a Índia que não tá presente no Conselho de Segurança, tem a Alemanha que não tá presente, tem o Japão que não tá presente, ou seja. Então, o que nós queremos é melhorar a representatividade e a gente quer acabar com o direito de veto. Porque eu não sei se você viu nas outras votações sobre a questão da Faixa de Gaza, você teve doze votos a favor, dois votos neutros e um voto contra, e o voto contra vetou. Então, é preciso acabar com o direito de veto.
E por que nós queremos colocar essa discussão da ONU? É porque do jeito como o mundo está e quando a gente coloca a questão climática como a questão prioritária para a sobrevivência do planeta Terra, que a gente não quer que ele fique aquecido mais de um grau e meio de temperatura, é preciso que a gente tenha uma instância mundial, que possa, dando resposta à pergunta do Ailton Krenak, que possa governar o mundo. Uma uma governança global que tome uma decisão sobre a questão climática, que essa decisão seja obrigatória, não dependa do Estado Nacional, não dependa do Congresso Nacional. Isso que é importante ser discutido. Porque hoje acabaram de discutir uma paz lá na Faixa de Gaza e ontem Israel invadiu outra vez.
E o presidente de Israel diz todo dia: “eu não paro, não paro, não paro”. E vai matando mulher e criança. Então é preciso que a ONU tenha mais força, mais condições políticas de cuidar da paz. A terceira coisa é a mudança no sistema financeiro de Bretton Woods, que foi criado para a Segunda Guerra Mundial, que foi criado para incentivar o desenvolvimento dos países, o financiamento dos países, FMI, Banco Mundial e outras agências internacionais. Ela não contribui mais, porque ela não ajuda, elas sufocam. O continente africano está devendo US$ 860 bilhões. A taxa de juros que eles pagam é muito alta.
Não tem como, não sobra nem dinheiro pra pagar e sobra dinheiro pra investir. Então, qual é a minha tese? É que essas instituições transformem parte dessa dívida desses países que estão endividados em investimentos. Então, ao invés de eu pagar dez pra você, eu pago só cinco. E cinco eu faço investimento em obras de infraestrutura. Ou seja, eu vou melhorar a infraestrutura do país, eu vou gerar emprego e eu vou diminuir o que eu tenho que pagar pros outros. Eu vou investir internamente.
Essa é uma discussão também muito difícil. Muito difícil porque, sabe, todo mundo é muito generoso, mas na hora de colocar a mão no bolso, ninguém quer colocar mão no bolso. Então... Agora, nós temos um aliado forte, que é a presidenta Dilma, que é a presidenta do Banco dos Brics. Portanto, ela agora pode vir aqui e dizer pro FMI o que tem que mudar, dizer pro Banco Mundial. Vamos ver se ela vai melhorar ou se o banco captou ela. Essa vai ser a prova de fogo da Dilma.
Ou seja, Dilminha que foi pro Banco Mundial e virou financista. Ou ela ainda continua tentando cuidar dos interesses do povo brasileiro. Eu acho que a Dilma vai ajudar nesse debate. Vai ajudar bem. E há uma certa sensibilidade. Há uma certa sensibilidade com relação à realidade mundial. O mundo não pode ficar assim. O mundo não pode. É muita guerra, é muita luta, é muita discórdia. É muita fome, sabe? São as pessoas tentando viajar para outro país. São os americanos proibindo os hispânicos de ir para lá. É a Europa proibindo os africanos de ir para lá. Ou seja, o mundo... Por que as pessoas viajam? As pessoas viajam, as pessoas trocam de país, porque as pessoas... Nós somos nômades. Nós nascemos para comer, sabe, todo dia almoçar, jantar. E nós ficamos procurando a raiz.
Aí a gente vai onde está.Nós éramos que nem os animais são hoje. Então o mundo... Na hora que o cara quer trabalhar, na hora que o cara quer comer, na hora que o cara quer ganhar dinheiro, o cara olha quem pode me oferecer essa oportunidade. É a Europa, eu quero ir para a Europa. E aí o cara vai de barco, morre no meio do mar, morre no meio do caminho, sai de El Salvador, sai de Honduras, sai da Guatemala, sai do México, sai do Brasil. Tem muita gente do Brasil que vai pro México pra poder atravessar aquela fronteira, e às vezes morre. Por que as pessoas vão?
Porque as pessoas querem uma chance. As pessoas querem trabalhar. As pessoas querem ganhar dinheiro, querem cuidar da sua família. Então a gente pode resolver isso, mantendo condições das pessoas sobrevivem no seu país, é isso. Por isso que nós temos que ajudar. E eu sou favorável que a gente crie um novo mecanismo de financiamento. Eu espero que nesse G20 a gente possa fazer essas três coisas. Cuidar da ONU, cuidar da fome e da desigualdade e a gente cuidar das instituições financeiras. Se isso acontecer, a gente pode acreditar que a gente vai ter daqui a alguns anos um mundo mais humanista, mais solidário, mais fraterno. Porque eu não sei se você sabe, Karine, nós estamos virando um pouco algoritmos. Tem muita gente que não fala mais, que é o celular que fala por ele, que é o algoritmo que fala por ele.
As pessoas ficam enraivecidas toda hora porque as pessoas querem ver notícias da manhã a três horas a hora que acordam, querem ver notícia meia noite a hora que vão dormir. Então, sinceramente, as pessoas que fazem assim não vivem muito tranquilo. Eu tenho uma lógica na minha vida. Na hora que eu saio do trabalho, oito horas da noite, que vou pra minha casa, eu não quero o telefonema, a não ser que tenha uma coisa extremamente grave, me ligue, porque eu não posso fazer nada. O que é que adianta me ligar dez horas de noite e falar: “presidente, vai sair uma matéria contra o senhor em tal jornal”. Pra que que eu quero saber? Eu não vou pedir pro jornal, eu não vou ligar, eu não vou evitar essa matéria, então deixa sair.
Eu fico com raiva quando ler. Então não precisa me dar raiva antes. O cara que fala isso é só pra você não dormir. Aí o cara liga pra fazer uma intriga. “Tal ministro fez tal coisa, tá o deputado falou tal coisa”. Deixa eu falar, eu não vou falar com ele. Eu não vou pedir pra ele pedir desculpa. Por que eu tenho que saber? Por que que eu tenho? Ô gente, eu quero deitar com a minha cabeça tranquila. Então quando eu levanto, eu levanto às 5h30 da manhã, eu vou fazer ginástica, eu não quero saber de notícia. Não quero saber de notícia, eu quero fazer minha ginástica. Quando der oito horas que o mundo começar a funcionar aqui no Brasil, eu falo com todo mundo, telefono pra todo mundo, discuto com todo mundo, mas eu tenho uma hora que é minha.
Tenho uma hora que é minha que eu quero me respeitar. Então eu não virei um seguidor dos algoritmos.
Karine Melo: Você acompanha a rede social?
Presidente Lula: Não. Tem muita gente que acompanha pra mim, mas eu não acompanho. Eu acho que as pessoas que acompanham sofrem demais. Sofrem, sofrem. Eu vejo a coitada da Janja, sabe, quando um cachorro morre, quando alguém atropela um cachorro, ela fica muito chateada e fica muito deprimida, Eu falo, “pelo amor de Deus, Janja. Não precisa fazer assim”. O Chrispiniano (José Chrispiniano, Secretário de Imprensa da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República) fica bravo porque fulano falou tal coisa, eles estão denunciando tal coisa.
Ou seja, se a gente vai ficar preocupado com a cretinice, com a cretinice, que predominou nas redes sociais. Que eu nem chamo de rede social, chamo de rede digital. Que tem muito mais de maldade do que de bondade. Então as pessoas gostam de ver nisso. O Rui está nisso aqui desde que nós chegamos aqui.
O Pimenta não larga do dele aqui. Fica todo mundo... Nós estamos falando daqui, só eu e você pra nós. Porque eles não estão nem prestando atenção. Outro dia eu fui pra reunião do diretório do PT. A Gleisi Hoffmann estava falando. Vinte e sete dirigentes com o celular na mão. Eu falei: “Gleisi, você está falando pra quem? O pessoal está no celular, é melhor você ficar em casa e fazer um Zap”. Então, eu, é um processo de educação que eu tenho, eu não vou virar dependente digital. Eu só quero saber das coisas que eu posso ajudar a resolver. Então, eu não quero saber de tudo. Até o meu cérebro não pode processar tudo e nenhum cérebro processa tudo.
Então, eu só quero saber o que é importante. Eu tenho a tese de um amigo meu, Vicentinho, que é o seguinte, o importante é o principal, o resto é o secundário. Então, me conte só o principal, o secundário fica para você, sabe? Quem governa não pode encher a cabeça de coisa que não tem importância. Não pode, sinceramente não pode. Eu só quero saber o seguinte, tem problema que eu posso resolver, eu coloco na mesa. Tem problema que eu não posso resolver, eu vou levar para o Papa, vamos levar para Deus, porque é assim que é o mundo.
Mas eu queria dizer para você que eu estou satisfeito do Pimenta ter me dado essa primeira oportunidade, depois de oito anos na presidência do governo passado, mais um e meio agora, primeira vez que eu tenho a chance de vir numa emissora. Mas eu acho extremamente importante, porque vocês sabe que eu sou, eu acho que o rádio ainda tem uma importância extraordinária, porque as companheiras que estão em casa, muitas vezes fazendo o trabalho doméstico, elas estão com o radinho ligado ouvindo alguma coisa. Elas não estão com o computador na frente.
Elas não estão com o celular. Elas estão vendo uma notícia de rádio. Por isso é importante falar. Eu quero dar os parabéns à EBC. Espero que vocês tenham todo o sucesso do mundo. E espero que um dia eu leia a notícia que a EBC é um instrumento de comunicação mais importante que foi criado nesse país, né? Por isso, simpatia você tem de muito.
Karine: Obrigada, presidente.
Presidente Lula: Competência também. Então, querida, eu fico desejando a todos vocês, toda sorte do mundo, gente. Vamo que vamo. Vamo botar fé que esse país vai pra frente. Não tem como. Todo dia eu falo pro Haddad. Falo: “Haddad, é o seguinte, bote na cabeça, mesmo que dê tudo errado, vai dar tudo certo”. A maré está tão favorável. A maré está tão favorável, que eu ligo pro Haddad: “Haddad, é o seguinte, mesmo que dê tudo errado, vai dar tudo certo”. Porque eu acredito nisso, eu olho, eu sou uma pessoa que eu presto muita atenção nas coisas. Não sei se você percebeu que eu tenho a orelha caída porque eu escuto mais do que falo. Diferente do Pimenta que fala mais do que ouve. Eu converso com muita gente. Veja, não faz muito tempo, eu recebi aqui no meu gabinete a diretora-geral do FMI, que nunca gostaram do Brasil, o Brasil era um país… Agora não, agora veio aqui tratando a gente muito bem, porque o Brasil tá ótimo, o Brasil precisa... Em janeiro do ano passado eu encontrei com ela na China, na China não, no Japão, em Hiroshima, e ela falou: “presidente, porque a economia do Brasil tá mal, mas que vai crescer 0,7”.
Eu falei: “queria dizer uma coisa, a senhora não conhece o Brasil. Nós vamos crescer mais do que isso”. E crescemos 3%. Agora outra vez eu falei pra ela: “não faça previsão equivocada, porque o Brasil vai te surpreender outra vez. Nós vamos crescer mais esse ano. E no ano que vem vamos crescer um pouco mais. Em 2025 vamos crescer um pouco mais. É isso que vai acontecer no Brasil. É isso que vai acontecer. O Brasil vai crescer esse ano, vai crescer ano que vem, vai crescer no outro ano, vai ter aumento de salário mínimo sempre, vai crescer a renda do pessoal. Nos governos passados 87% dos acordos salariais eram feitos abaixo da inflação.
Muito abaixo da inflação. No nosso governo, 90% foi feito acima da inflação. Então, as coisas estão acontecendo, as pessoas vão conseguir consumir mais, vão comprar o que comer. Eu agora estou numa briga para abaixar o preço do feijão e do arroz. Porque está caro e com essa chuva no Rio Grande do Sul possivelmente encareça mais. A Bahia precisa plantar arroz, precisamos financiar produção de arroz nos outros estados que não tenham hábito de plantar arroz. Porque, se tem uma coisa que não pode estar caro é o arroz e o feijão. E para quem gosta de carne, um pedacinho de carne. Nós nordestinos gostamos muito de carne. Não é só o gaúcho que gosta de carne. Nordestino tem hábito de comer salada, mas come carne. Bode, cabrito, preá, e vai por ai a fora. Muito obrigado, Karine. Obrigado aos companheiros da EBC pelo carinho. Espero que eu tenha dado as informações necessárias às respostas dos companheiros.
Karine Melo: Presidente, a gente que agradece. Boa sorte na sua missão. Quero agradecer a todos os colegas de rádio, a parceria da SECOM com o presidente Lula e da EBC vem de longa data. Então, presidente, a gente sabe o seu carinho por rádio, fique à vontade, venha mais conversar com a gente, com as rádios, eu tenho certeza que hoje os colegas ficaram muito felizes. É um luxo a gente ter aqui toda semana um ministro e agora um presidente da República à disposição das rádios para perguntarem o que quiserem, isso diz muito sobre o tempo que a gente está vivendo e ainda bem a gente, nós, jornalistas que fomos tão desacreditados, descredibilizados, a gente ter aqui toda semana um ministro do governo falando aqui com a gente, com as rádios, o que quiserem, agora o senhor pessoalmente aqui, é realmente uma grande oportunidade, eu agradeço muito e espero já, já fica aqui o convite para se eu tiver um tempinho passar aqui. Obrigada.