Entrevista do presidente Lula a jornalistas na chegada à Bolívia para visita oficial ao país
Pergunta: Como é que o Brasil pode ajudar a Bolívia?
Presidente Lula: Deixa eu falar uma coisa para vocês, eu não posso dar duas entrevistas no mesmo dia. Acabei de falar lá em Assunção. Amanhã, depois da reunião, eu converso com vocês, tá?
Pergunta: Como é que o Brasil pode ajudar a Bolívia?
Presidente Lula: Veja, eu acho que o Brasil pode ajudar como vem ajudando. O Brasil é um país que tem interesse em fazer com que os países exitem o progresso. O Brasil pode ajudar a Bolívia em muita coisa. A gente pode ajudar a Bolívia transferindo tecnologia, transferindo suprimentos e máquinas agrícolas a preços mais compatíveis, a gente pode fazer com que haja exploração de minerais na Bolívia em benefício da própria Bolívia. A gente pode fazer com que a Petrobras volte a prospectar gás para melhorar a situação da Bolívia. Além disso, nós temos interesse em fazer hidrovias junto com a Bolívia, fazer a ponte com a Bolívia. Temos interesse de fazer uma hidrelétrica junto com a Bolívia. É esse o papel de um país do tamanho do Brasil que tem 3.600 quilômetros de fronteira com a Bolívia. Ou seja, cuidar da Bolívia, cuidar do Brasil, é cuidar de dois países irmãos e acho que esse é um papel que está reservado. Mas hoje, na verdade, eu estou feliz com a vitória da esquerda na França.
Pergunta: Faz quinze anos que o senhor não vem aqui.
Presidente Lula: Veja, eu às vezes fico triste porque faz quinze anos que eu não venho aqui. Imagina que as coisas tivessem evoluído, tivessem tido mais investimento, que o Brasil tivesse cuidado melhor dos seus parceiros, porque eu acredito muito na questão da integração, eu acredito que não há saída individual para nenhum país da América do Sul. Ou nós aprendemos a agir como bloco e saímos da mesmice e nos transformamos numa região desenvolvida, competitiva, ou a gente vai continuar pobre. Esse é o dilema que nós estamos vivendo. Então, eu acho que a Bolívia de hoje, pelo que eu conheço de dados econômicos, a situação está mais difícil do que estava há dez anos atrás.
Do ponto de vista das divisas da Bolívia, ou seja, não há mais a reserva que havia, o PIB não cresceu como estava crescendo. Tudo isso eu acho que pode mudar, porque o Brasil também piorou. E o Brasil, nós passamos um ano consertando o Brasil. E agora o Brasil vai fazer as coisas acontecerem da forma mais positiva possível. Eu tenho dito o seguinte: nós precisamos de crescimento econômico, distribuição de riqueza, geração de renda, aumento de salário para as pessoas e fazer com que as pessoas possam viver mais tranquilamente no Brasil, e na Bolívia, e no Uruguai, e no Paraguai, e na Argentina.
Pergunta: Isso é uma democracia, presidente. O país sofreu uma tentativa de golpe na semana passada. O senhor também veio demonstrar apoio à democracia?
Presidente Lula: É imperdoável, é imperdoável a tentativa de golpe. Ou seja, graças a Deus, eu acho que o povo boliviano garantiu a democracia e acho que a solidariedade internacional foi muito importante. É inimaginável você pensar que na metade do primeiro quarto do século 21, você achar que vai resolver o problema dando golpe, que os militares podem ser a solução. Para que? A solução está no fortalecimento da democracia, está na participação da sociedade civil, está no voto do eleitor boliviano, brasileiro e assim por diante. Não existe milagre. O que existe é respeito à democracia, que é o sistema que pode permitir alternância de poder. O povo elege um hoje, amanhã ele não gosta, não elege ele, elege o outro e assim vai.
Pergunta: Para intermediar a discussão entre Evo Morales [ex-presidente da Bolívia] e o presidente Arce [presidente da Bolívia], como é que se resolve isso?
Presidente Lula: Olha, veja, como se resolve qualquer conflito entre dois seres humanos. Ou seja, eu não conversei ainda com o presidente Arce. Encontrei com ele em Assunção mas não conversei. Eu, amanhã, eu vou me dar conta por inteiro de como está a situação política na Bolívia. Como está a divergência entre eles, quem são os candidatos de oposição. Ou seja, naquilo que a gente puder ajudar para construir a unidade e fortalecer a democracia, esse eu acho que é o papel do Brasil.
A Bolívia no Mercosul é importante. É um passo muito importante para a Bolívia, um passo importante para o Mercosul, porque o Mercosul tem que ser o caminho natural daqueles que acreditam que juntos nós poderemos formar um bloco econômico forte, que a gente possa ter uma indústria forte. Ou seja, é só acreditar. Agora, com esse momento da transição energética que o mundo está precisando e aqui na América do Sul o nosso potencial é extraordinário. Ou seja, nós temos mais florestas, temos mais possibilidade de produzir energia verde, temos mais possibilidade de produzir hidrogênio verde, temos mais possibilidade de produzir alimento. Então, eu acho que chegou a vez da gente mostrar que a gente tem valor e que a gente quer deixar de ser pequeno. A gente quer ser grande. Isso passa pela unidade dos países, passa pela integração, e é isso que eu vou brigar.