Entrevista do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, à TV SBT
Repórter: Olá, a gente começa agora uma entrevista exclusiva com o presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva. Obrigada presidente por nos receber aqui no Palácio do Planalto.
Presidente Lula: O prazer é meu Débora em fazer esta entrevista com você.
Repórter: E a primeira pergunta é: agora em julho, o senhor vai lançar um novo PAC. O senhor havia pedido para os governadores apontarem as principais prioridades de obras pra, realmente, estartar esse programa. O que que veio?
Presidente Lula: Débora, apenas uma explicação. Quando nós fizemos a transição, no final do ano, coordenada pelo Alckmin, nós descobrimos que o Brasil tinha 14 mil obras paradas, dentre essas obras, 4 mil obras eram obras de escolas, dentre essas 4 mil escolas, 1,7 mil eram creches. Então, nós estamos num processo, primeiro, de retomar todas as obras que estavam paradas, que estão em condições de serem retomadas, e ao mesmo tempo nós convidamos os governadores por duas razões:
Primeiro para restabelecer a relação entre os entes federados. O governo anterior não conversava com o governador, ele brigava com o governador. Eu acho que não é possível a gente governar o brasil sem conversar com os governadores e sem conversar com os prefeitos.
Então, o que nós fizemos no mês de janeiro. Nós convidamos os 27 governadores e pedimos pra eles que nos apresentassem os projetos de obras de infraestrutura, na área da saúde, na área da educação, na área da rodovia, ferrovia, aquilo que entendia que era o principal para o seu estado, para que a gente construísse um programa de desenvolvimento e com isso a gente construir PPP, a gente atrair investimento externo direto pro Brasil. E a gente discutir, tanto o dinheiro do orçamento quanto financiamento via bancos públicos. Isso tá pronto. Nós pretendemos lançar, agora, na segunda quinzena de julho esse PAC e junto com ele vamos lançar o Minha Casa, Minha Vida, número 2, que serão mais de 2 milhões de casas novas entregues ao povo trabalhador e mais 186 mil casas que estavam paradas, que a gente vai voltar a construir essas casas. Já entregamos 10 mil, e nós vamos entregar todas elas porque todas que tiverem condições a gente vai entregar.
Você sabe que o PAC que nós lançamos em fevereiro de 2007, ele foi o maior programa de infraestrutura que esse país conheceu, e nós, agora, vamos fazer outra vez um grande programa de infraestrutura para ver se a gente tira o atraso do Brasil, sabe, na questão do transitar das nossas riquezas, dos nosso produtos agrícolas, da nossa indústria, e fazer com que o custo Brasil diminui e facilite com que as pessoas possam ganhar um pouco mais, chegando mais rápido os nossos produtos nos países de origem. Esse PAC, eu acho que será uma coisa extremamente importante, porque, com ele, nós vamos, inclusive, poder colocar a questão da transição energética, nós queremos fazer um grande programa de investimento em eólica, em biomassa, em solar, ahh, em hidrelétrica, e mais ainda no hidrogênio verde, que é uma coisa que está ficando na moda agora, agora, e nós estamos construindo parcerias com vários países do mundo na produção de hidrogênio verde. Então, o PAC é isso, o PAC é o seguinte, o PAC é dizer : O Brasil está de volta, o crescimento econômico está de volta, o salário está de volta, a melhoria da qualidade de vida do povo está de volta. É isso.
Repórter: Já sabe o tanto de dinheiro disponível pelo menos pra esses próximos quatros anos, enfim, esse ano, pro ano que vem vai ter para o PAC agora?
Presidente Lula: Ainda, como o programa ainda não me foi apresentado, ainda não tenho os números. Serão bilhões e bilhões de reais. Débora, você tem noção do que está acontecendo no Brasil? Durante 4 anos, o Governo anterior investiu em obras de infraestrutura R$ 21 bilhões, em 4 anos. Só este ano, nós vamos investir R$ 23 bilhões. Ou seja, em seis meses nós fizemos mais investimentos do que fizeram em todo o ano passado. O que isso faz acontecer? Na medida que o dinheiro começa a circular, na medida que o dinheiro começa a rodar na mão das pessoas, a gente começa a perceber que a economia vai crescendo, as pessoas vão ficando mais felizes, as pessoas vão tendo emprego, as pessoas vão tendo um salário, e é esse o Brasil que eu quero entregar em 2027 para o povo brasileiro. Um país mais desenvolvido. Você está lembrado quando eu deixei em 2010, o Brasil crescia 7,5% ao ano. Então, nós vamos fazer esse país voltar a crescer
Repórter: Só a meta é 7,5% ano nos próximos quatro anos?
Presidente Lula: Ah, veja o que eu prometo é o seguinte: é que nós vamos estabelecer uma parceria com os governos dos estados, com os prefeitos, com a iniciativa privada, porque nós queremos construir muitas PPPs e ao mesmo tempo nós vamos colocar nossos ministros para viajar no mundo e apresentar um pacote de projetos.
Os Emirados Árabes querem fazer investimentos no Brasil, eles vão conhecer o projeto. Arabia Saudita quer investir no Brasil, vão conhecer o projeto. A China quer investir no Brasil, vão conhecer os nossos projetos.
Aliás, você tá vendo que indústria automobilística está sendo retomada. A Volkswagen, que estava fechando, anunciou novos investimentos no Brasil. Ah, uma empresa chinesa anunciou, na terça-feira, a construção de carros elétricos em Salvador e o mais importante ainda é que nós estamos percebendo que o BNDES, que antes não tinha gente procurando para apresentar projeto de investimento. Agora, nós já temos só esse ano, R$ 41 bilhões de procura por novos projetos, numa demonstração de que as pessoas voltaram a acreditar no Brasil.
E é isso que nós precisamos. As pessoas acreditarem no Brasil porque tem três palavras que eu digo sempre: Primeiro, o governo tem que ter credibilidade. Segundo: o governo tem que garantir estabilidade econômica, estabilidade política, estabilidade social e estabilidade jurídica. E terceiro: tem que ter previsibilidade pra pessoa saber o que fazer nesse país. E é isso que eu tô prometendo pra você. Nós vamos garantir ao povo brasileiro de que esse país vai voltar a ser um país feliz
Repórter: Um pilar importante também pro desenvolvimento do Brasil, segundo especialistas, até o seu ministro da fazenda, dizem, é a reforma tributária. Gostaria de saber se o senhor acha que esse texto que está sendo analisado pela Câmara, nesse momento, ele é um bom texto, presidente?
Presidente Lula: Olha, certamente não é um texto perfeito que quer o Haddad, e certamente não é um texto que quer a Câmara. É um texto que vai ser possível construir porque uma reforma tributária envolve 203 milhões de interesses. Quando todo mundo fala em reforma tributária, todo mundo fala em diminuir a carga tributária, todo mundo fala da criação do IVA. Sabe? O que acontece é que quando você coloca o papel na mesa, aparece 203 milhões de ideias. E, aí, você tem que ter habilidade, conversar, discutir para construir um texto que possa dar ao Brasil, da mesma forma que a gente pode tentar diminuir a carga tributária, a gente consiga fazer uma política tributária tão séria que diminua a sonegação. Isso significa que: mesmo a pessoa pagando menos, mas muito mais gente pagando, o Estado vai arrecadar mais. É com essa ideia fixa que nós trabalhamos.
Repórter : O senhor entra nesse no corpo a corpo para aprovação da reforma tributária?
Presidente Lula: Não, por enquanto não foi preciso. O Haddad está jogando bem. Se Haddad fosse jogador de futebol e tivesse a convocação de seleção agora, certamente ele seria convocado para a seleção, porque está jogando de uma forma extraordinária, tendo muita paciência, conversando com as pessoas, fazendo as negociações que têm que ser feita. Porque na verdade nós fizemos uma negociação com a Câmara pra aprovar, aprovar a PEC antes da gestão da posse, é um fato inédito no mundo. Um governo começar a governar antes de tomar posse. E nós começamos fazendo uma PEC pra poder mexer no orçamento de déficit, pra gente trabalhar esse ano, porque não tinha orçamento. E o Haddad tá fazendo um papel extraordinário, eu acho e o Haddad vai ser uma extraordinária surpresa nesse país na área econômica.
Repórter: Presidente, pra essas aprovações e tantos outros projetos de interesse do governo e, consequentemente do país do país, precisa do apoio do Congresso, obviamente, e há uma demonstração de interesse de partidos que a gente chama de centrão, mas, de participar mais, de ajudar o governo a governar. Participar dessa governança. Mudanças pontuais em ministérios, até pra acomodar os interesses políticos, virão?
Presidente: Veja, ô, Débora, na política você tem que ter habilidade de lidar de acordo com a correlação de força que está estabelecida no Congresso Nacional, que é resultado da manifestação da sociedade brasileira nas últimas eleições. Não adianta você gostar ou não gostar do Congresso Nacional. O que você tem que lembrar é que no dia da eleição, o povo votou nas pessoas que estão aí. O povo votou no Lula, o povo votou no senador, o povo votou no deputado. Então, é com essa gente que você tem que negociar, não é com quem ficou de suplente ou com quem não se elegeu. Então, você tem que negociar,
Eu acho que nós não teremos problema algum, você, sabe, Débora, eu não costuma usar centrão, eu não costumo utilizar a palavra centrão. Centrão é o apelido que se deu no momento histórico que eu estava como deputado na constituinte, quando foi criado o centrão, que era pra evitar que a gente tivesse muitos avanços na área social. Mas, eu costumo lidar com partidos. Eu costumo conversar com o partido. Então, a orientação que os líderes do governo têm no Congresso Nacional é conversar com todos os partidos, independentemente das direções ideológicas do partido. Se ele é posição, se ele não é oposição, a gente vai conversar com todo mundo que tem voto no Congresso Nacional porque para aprovar as coisas que nós queremos, nós precisamos de votos e o PT sozinho não tem os votos. O PT e a esquerda não têm o voto. Então você conversa com quem tem voto.
Repórter: O Progressistas quer conversar, quer participar mais do governo e falou, se eventualmente, deles participarem, por exemplo, no desenvolvimento social. O Senhor acha que é uma possibilidade?
Presidente Lula: Ô Débora. Não é pessoa que quer vir para o Governo que escolhe o cargo. Quem escolhe o cargo é o Governo. Se eu tiver que fazer acordo com partido político eu vou dizer pra ele: “eu tenho tal cargo, tal ministério” e pergunto:”você quer qual participar ou não? Porque senão você não governa. O meu partido que é dono do ministério, o Governo que é dono ministério , a escolha é do Governo.
Eu sou favorável que a gente faça os acordos necessários para garantir a governabilidade do Governo. Porque você não pode em cada votação você ter uma briga, ter uma guerra. É melhor que você estabeleça uma certa tranquilidade. Eu estou feliz, porque eu estou percebendo que muita gente, que era comentado há seis meses atrás como oposição ao Governo , as pessoas querem conversar, porque eu não vou apresentar nenhum projeto do meu interesse.
Eu não tenho projeto do meu interesse. Os projetos que eu estou apresentando são projetos de interesses do povo brasileiro. E eu quero fazer um chamamento; eu tenho conversado com o presidente, com o presidente do Senado, com os líderes; o meu chamamento é pra que todos passem para a história como o Congresso Nacional, os deputados e senadores, que ajudaram a transformar esse país, que ajudaram a extirpar o ódio desse país e colocar mais sensibilidade, mais fraternidade, mais amor na mesa. É isso que o Brasil tá precisando, é isso que vamos construir.
Repórter: Certo. O senhor tem sido convidado pra fazer muitas visitas pelo mundo, faz muitas viagens dentro do Brasil, também, mas de vez em quando o Senhor mesmo teve a iniciativa de comentar uma dorzinha que sente na perna. O Senhor vai fazer cirurgia?
Presidente Lula: Não. Veja, esse é o tipo da cirurgia que é o paciente que escolhe, não é o médico que decide. Eu fui orientado o seguinte. O fêmur, quando ele tá desgastado, ele vai doendo, você vai se virando, você vai encontrando um jeito. Por enquanto, eu, eu não penso em fazer cirurgia. Mas eu já conversei com pessoas que fizeram cirurgia, a senadora Leila, sabe, ela mesma já fez essa cirurgia. Ela é umas das que dá conselho: “Faça, porque quando você fizer, você vai ir pro céu. Não vai doer e você não vai sentir mais nada.” Ah, esses dias fui cortar o cabelo e conversei com um jovem que corta meu cabelo e ele fez a operação do quadril, sabe, e falou: “senhor presidente eu fui pro céu. Eu não conseguia mais andar, e eu agora posso até correr, fazer ginástica.”
Repórter: Por que você está resistindo?
Presidente Lula: Por enquanto não tô nessa fase, sabe, por enquanto eu ainda tenho que andar, eu ainda tenho, Débora, que... eu vou, no próximo dia 15 tenho que ir pra Bruxelas, porque vai ter a reunião da União Europeia com a Celac; depois tenho que ir na África do Sul, na reunião dos Brics, em setembro; depois eu tenho que ir para a Índia, na reunião do G-20, sabe. Então, são muitas, e depois ainda tenho que ir, em fevereiro ou janeiro, na reunião da União Africana.
Então, são reuniões, imprescindíveis, para um país do tamanho do Brasil que quer ficar inserido na comunidade estrangeira. O Brasil é um país extraordinário porque a gente não tem contencioso com nenhum país do mundo, todo mundo gosta do Brasil, todo mundo quer ficar bem com o Brasil. E eu tenho que aproveitar a relação de amizade que eu fiz nos dois primeiros governos, a respeitabilidade que nós conquistamos nos outros governos, sobretudo, agora, na questão da discussão do clima, o Brasil tem muita credibilidade, quando eu vou numa reunião, Débora, eu falo o seguinte: olha, Brasil, energia elétrica, 87% da energia elétrica brasileira é limpa, o restante do mundo é só 27. Sabe, do combustível como um todo, mais energia elétrica, o Brasil tem 50% de energia renovável, o mundo inteiro só tem 15. Então, o Brasil tem autoridade moral de nessas reuniões mostrar o Brasil se tratando da questão do clima, o Brasil vai longe. Nós temos uma reunião em agosto com todos os países da América do Sul, em Belém, pra discutir a questão da preservação de nossas florestas, nós vamos trazer a Indonésia pra participar, vamos trazer os dois Congos pra participar, que são os países que têm as maior quantidade de florestas em pé. E o que que nós queremos discutir. Nós queremos chegar nos Emirados Árabes, na COP 28, com um projeto único dos países que têm florestas pra dizer ao mundo:
Nós temos que preservar, agora para preservar isso é preciso que vocês contribuam, porque nas nossas florestas moram 50 milhões de pessoas, e essas pessoas comem, essas pessoas querem trabalhar, essas pessoas querem ter acesso a bens materiais e nós precisamos garantir que eles sejam tratados com muita dignidade. Daí o mundo rico tem que cumprir aquilo que promete. Desde, desde 2009 que mundo rico prometeu R$ 100 bilhões de dólares por ano e até hoje não cumpriu.
Repórter : O senhor tá cobrando, né?
Presidente Lula: Tô cobrando
Repórter: Cada reunião o senhor cobra, mesmo?
Presidente Lula: Eu tô cobrando, senão a coisa não funciona. Primeiro, nenhum país rico cumpre aquilo que acerta. O protocolo de Kioto, não foi cumprido por ninguém. O Acordo de Paris não foi cumprido por ninguém. Então, eu, inclusive, estou defendendo uma governança mundial, que pode ser a ONU, com mais representatividade, que ao tomar uma decisão do clima seja obrigatório os países colocarem em prática. Porque se depender da discussão interna do Congresso Nacional, a gente muitas vezes não consegue aprovar.
Repórter: Então, com esse tanto de viagens agendadas, ficar uma, duas semanas de molho atrapalha um pouco essa rotina, né presidente? É interessante porque essa postura do Brasil, desde que assumiu esse terceiro mandado, em relação ao mundo acho que é consenso, né?. O trabalho que o senhor está fazendo, a recepção que o senhor tem, a gente, o SBT, viaja todas as viagens atrás do senhor. O senhor sabe que tem um assunto que acabou, nos últimos anos aí, entrando em mesa de bar, almoço de família, que até que ninguém falava de política externa, que é o negócio de Venezuela. Eu queria saber o seguinte. O senhor falou, e deu uma confusão danada, o senhor falou: “ah, democracia, às vezes, é relativa”. O que o senhor quis dizer com isso?
Presidente Lula: Porque a democracia é única em cada país. Ou seja, a democracia no mundo... Por que que o Assange (Julian Assange – ativista) tá preso? Você poderia me explicar por que que a imprensa que reclama tanto da falta de liberdade de imprensa, que clama tanto por liberdade, alguém pode me explicar por que que o Assange tá preso? Ele deveria ter recebido o Prêmio Nobel de decência jornalística, porque ele fez uma denúncia dos Estados Unidos investigando os outros países, inclusive a presidenta Dilma Rousseff foi investigada, inclusive Angela Merkel, presidente da Alemanha, primeira Ministra da Alemanha. O Assange denunciou.
Ao invés deles punirem o jornal, puniram o jornalista. Ou seja, então o que que eu acho? Cada um de nós compreenda a democracia do jeito que a gente quer. Aqui no Brasil eu vejo a democracia de um jeito, e eu a exerço porque eu duvido que alguém exerça a democracia com mais plenitude do que eu. Nós vamos fazer conferências nacionais, todas que for necessária, eu já tinha feito 74 conferências nacionais para que o povo decida. Estou fazendo um PPA popular, ou seja, a Simone Tebet e o Márcio estão viajando o Brasil inteiro. São 27 assembleias populares para aprovar uma proposta de Plano Plurianual. Uma demonstração de que a gente não tem medo de democracia. O que eu acho é que cada país tem que decidir o seu destino.
A democracia americana é uma. Né? A gente se esquece que a Hillary Clinton teve mais votos do que o Trump, mas ela perdeu a eleição. A gente se esquece que o Al Gore teve mais votos do que o Bush, e perdeu as eleições. Isso ninguém questiona. Ou seja, então o que eu acho é o seguinte: eu tenho o Brasil com 203 milhões de habitantes pra me preocupar, eu tenho 33 milhões de pessoas passando fome, eu tenho milhões de pessoas desempregadas. Então, eu não quero priorizar a Venezuela, quero priorizar o Brasil. A Venezuela é um problema dos venezuelanos. A Cuba é um problema dos cubanos. Os americanos é um problema dos americanos. E o Brasil é um problema de nós, brasileiros, isso que eu quero cuidar com muito carinho.
Repórter: Desenrola Brasil, presidente. Acho que ficou bem explicadinho quando vocês lançaram, né? Essa questão do faixa um do Desenrola: dívidas de até 5 mil reais, taxa até 1,99% mês de juros, e renda até dois salários mínimos. Tem uma outra faixa que é a faixa dois que vocês vão detalhar ainda mais, queria saber se o senhor consegue detalhar uma coisa pra gente?
Presidente Lula: Olha, na verdade esse programa atrasou por conta de um aplicativo que tem que ser feito para a gente colocar ele em andamento. Me parece que foi a Bolsa de Valores que ficou de fazer o aplicativo, porque, eu não sei, internamente acho que não houve condições de fazer. O que é grave, Débora, é que nós temos 72 milhões, sabe, de brasileiros devendo. E não são dívidas grandes. São dívidas pequenas. São pessoas que muitas vezes compraram alimento no cartão de crédito. São pessoas que devem a conta de água. São pessoas que devem a conta de luz. Então, o que nós estamos tentando fazer é tentar encontrar a melhor fórmula possível pra gente legalizar outra vez a vida dessas pessoas e elas voltarem a ser cidadãos e cidadãs de primeira categoria, poder comprar outra vez uma coisinha fiado, pra pagar em cinco meses, pra pagar em quatro meses, que é o que todo mundo faz. Então, eu acho, veja, que nós estamos só chegando um ponto de fazer a apresentação do programa, estamos só aguardando o aplicativo que vai permitir a gente colocar em funcionamento o programa.
Repórter – Mas essa faixa 2, ela é pra dívidas ou renda, eu não entendi direito lá na portaria, de até R$ 20 mil ? É dívidas ou é faixa ?
Presidente Lula: Depende, depende da dívida e depende porque que as pessoas fizeram a dívida.
Repórter: Sim, sim, crédito imobiliário, por exemplo, não entra, né?
Presidente Lula – No primeiro momento, a gente vai pegar as pessoas menores, que são a grande maioria são dívidas pequenas, de até R$ 2 mil, até R$ 5 mil. É o tipo de pessoa que a dívida tem mais penduricalho do que dívida. É uma pessoa que gastou R$ 2 mil, mas que entra juros, entra não sei das quantas, e vai para R$ 5 mil. Essa pessoa não pode pagar. E não vai pagar se a gente não ajudar. Então, nós estamos inclusive criando um fundo garantidor, para que a gente possa ser avalista dessas pessoas e a gente cobrir isso. É um papel. Eu acho que a gente ainda vai ter que discutir um pouco mais, mas eu tenho fé em Deus que a gente possa apresentar isso no mais tardar, no mais tardar, no mês de setembro pra a gente poder, sabe, apaziguar a mente do povo brasileiro que tá vivendo.
Repórter: O senhor lançou agora recentemente o Plano Safra, o empresarial que é mais voltado ao agronegócio; e também o outro Plano Safra, no outro dia, pra Agricultura Familiar, pros pequenos produtores. O senhor acha que depois, com essas condições especiais de juros, os tipos de financiamentos, também. A postura do agronegócio melhorou em relação ao senhor?
Presidente Lula – Eu não me preocupo com isso, Débora. Sinceramente eu não me preocupo. O agronegócio nunca votou em mim. Nunca votou em 2002, nunca votou em 2006, nunca votou em 2010. Eu não tô preocupado com isso. Eu tô preocupado é que fizemos um plano agrícola, o Plano Safra, para atender aos interesses soberanos do país, sabe, que atinge o agronegócio. Foram R$ 364 bilhões, 27% maior do que o último, sabe, e eu nunca vou perguntar se o cara votou em mim, se o cara vai gostar de mim ou se não vai gostar. O Plano Safra tá aí pra atender a agricultura brasileira. Da mesma forma, nós fizemos um plano de R$ 71 bilhões para a pequena e média agricultura, a agricultura familiar, que são responsáveis pela produção de parte dos alimentos que vai na mesa nossa, na sua, na minha e na mesa do agronegócio. O cidadão que tem 20 mil alqueires de soja, ele não cria uma galinha caipira pra ele comer, ele tem que comprar do pequeno. Ele não cria um porquinho, ele vai comprar do pequeno. Então, o que nós queremos é que a agricultura esteja tranquila, produzindo, feliz, para que o Brasil possa continuar crescendo.
Mais ainda que eu vou fazer. Eu anunciei que esse negócio de invasão de terra vai acabar, porque nós vamos apresentar um projeto de propriedades improdutivas. Tá, então esse projeto de propriedades improdutivas, levantado pelo Incra, levantado pelo instituto de terra de cada estado, vai permitir que o governo tenha uma prateleira de projetos, sabe. Se alguém quiser trabalhar no campo, nós vamos dizer tá aqui: tem terra em tal estado, tem terra em tal cidade, sabe, vamos trabalhar?
Repórter: A partir de quando? A partir de quando o senhor acha que esta prateleira de projetos estará..?
Presidente Lula: É porque tem que ser feito, é porque tem que ser feito um levantamento pelo instituto. Ainda, vai... cada, cada, o Incra tem que preparar uma estrutura, conversar com os estados. Não tem importância que demore mais uns meses. Mas o que é importante é que quando a gente anunciar, ele seja um projeto forte. E, mais ainda, nós estamos fazendo um levantamento também, sabe, no patrimônio nacional, pra toda e qualquer propriedade, sabe. Ou seja, prédio público que esteja sendo utilizado, que esteja invadido, que esteja com barraco, nós vamos distribuir isso pro povo, dar escritura definitiva pro povo. É preciso que o governo não fique guardando imóvel para juntar barata, rato. Nas grandes cidades, se tiver prédio em condições de recuperar para fazer habitação a gente vai fazer habitação popular, porque nós queremos, de uma vez por todas, acabar com o déficit habitacional desse país.
Repórter – Presidente, inelegibilidade do Bolsonaro. Como o senhor avalia essa decisão Judicial?
Presidente Lula – Olha, eu não discuto decisão do judiciário. O ex-presidente ele vai ter muitos processos. Ele sabe que ele vai ter muitos processos, porque ele sabe que ele provocou muitos processos. Esse país, desde a proclamação da República, nunca teve alguém tão insano exercendo o cargo de presidente. Nunca teve alguém tão insano. Alguém de muita irresponsabilidade. Então, os processos vão aparecendo agora, sabe, eu não julgo, porque tomou uma decisão, ele tem que recorrer, sabe.,
Repórter: Mas distensiona o Governo, a maneira de governar?
Presidente Lula: Não, não, a mim não me preocupa. A mim não me preocupa. Isso é um problema da Justiça com o ex-presidente. Ele que contrate os seus advogados, ele que se defenda, e vamos seguir. A minha preocupação não é com os processos do Bolsonaro, a minha preocupação é com os meus compromissos com o povo brasileiro, prometidos durante a campanha. Eu quero cumprir cada um deles. Porque eu aprendi com a minha mãe que a gente tem que falar olhando no olho da pessoa, porque a verdade não está na boca, a verdade tá nos olhos. Eu quero que as pessoas saibam que nós vamos tirar esse país do miserê em que nós encontramos eles e fazer este país voltar a ser feliz.
Repórter – O senhor assumiu há seis meses, e não sei se o senhor já sabe: Muita gente fica questionando se o senhor não vai mesmo concorrer à reeleição como o senhor disse, que poderia ser uma possibilidade? O senhor disse que vai viver 120 anos, ainda daria tempo
Presidente Lula – Débora, se eu discutisse isso seria irresponsabilidade. Esses dias eu fui a Hiroshima e encontrei com o presidente Biden e eu perguntei pro Biden se era verdade que ele ia concorrer. Ele falou: “eu vou”. Eu falei: “Ora, isso é um estímulo, isso é um estímulo”. Eu sou mais novo do que ele.
Mas veja só, se a gente fosse discutir isso agora seria irresponsabilidade. Eu tô no começo do mandato. Eu tenho três anos e meio pela frente, então eu tenho que trabalhar. A única coisa que eu posso prometer ao povo brasileiro, Débora, é que eu tenho muita vontade, muita disposição, muita saúde e eu quero dedicar toda essa vontade minha pra a gente reconstruir esse país. Fazer as pessoas voltarem a sorrir na rua, fazer as famílias voltarem a se cumprimentarem, fazer as famílias voltarem a se reunir em época do Natal. Ninguém precisa brigar por causa de candidato. Ninguém precisa brigar por causa de partido. Ninguém precisa brigar por causa de futebol. Ninguém precisa brigar por causa de religião. A gente tem que simbolizar o humanismo fraterno, a gente tem que aprender a gostar das pessoas como elas são e não querer que as pessoas sejam aquilo que a gente quer que elas sejam. Se a gente tiver abertura suficiente para compreender o mundo do outro e tentar conviver com isso, o Brasil vai ficar em paz.
Repórter – Por que quando o senhor disse olha não vou ser candidato, a fila automaticamente já se forma?
Presidente Lula: Não, deixa... Aí é até um conselho. Até um conselho. Quem acha que pode ser candidato com muita antecedência, termina não sendo candidato. As pessoas que trabalham comigo sabem o seguinte: todo mundo que tem acima de 35 anos no Brasil pode ser candidato a presidente da República, todo mundo pode ser. Agora, as pessoas têm que saber o seguinte: se der um passo além das pernas, sabe, se der um passo fora de hora, as pessoas que queriam ser candidatos à presidente, às vezes serão candidatos a nada. Então, é importante que a gente tenha muita paciência, muito cuidado. Eu não vou permitir que ministro meu faça política antes do tempo. Fazer política depois que chegar março ou abril de 2026, que ele tiver convenção partidária, que ele quiser ser candidato e se afastar do governo, ele pode ser candidato. Todo mundo pode ser candidato. Agora, um dado concreto é que eu trabalho muito para que o governo tenha um candidato. Por que que eu trabalho para que o governo tenha um candidato? Porque eu acho que um presidente da República que tem um mínimo de competência, ele não perde a eleição se ele tiver um mandato.
O outro cidadão que foi presidente, ele gastou, entre desoneração, entre um monte de coisa que ele fez, o equivalente a quase US$ 60 bilhões. Ele jogou dinheiro pelo ralo. Ele jogou dinheiro. Ele distribuiu dinheiro para motorista de táxi, para motorista de caminhão, para quem não tinha direito, sabe, ele fez a farra do boi, crédito para quem não pode pagar. Então, nós não vamos fazer isso. Nós, o nosso símbolo é seriedade, é seriedade. Nós queremos fazer com que esse país reconquiste a credibilidade internacional, a credibilidade nacional, e na hora que as coisas estiverem andando bem, como eu acho que já começaram a andar, a inflação tá caindo, o preço do alimento tá caindo, a carne tá caindo, a picanha, daqui a pouco, já vai ter, sabe, na mesa do trabalhador, a verdura tá caindo, as coisas estão acontecendo aos poucos e a gente não precisa ter pressa, sabe. A democracia e a governança é como uma planta: você plantou, ela tem o tempo de crescer. Você tem que irrigar pra ela poder crescer forte. Esse é o meu papel nesse instante. É fazer o Brasil voltar a ficar forte, é fazer o Brasil gerar emprego, é fazer o Brasil pagar salário, é fazer o Brasil respeitar a dignidade do ser humano.
Repórter – Presidente, eu preciso encerrar, que foi o combinado com sua assessoria. Mas, eu não posso sair sem te perguntar o que o senhor achou do Diniz na seleção?.
Presidente Lula – Olha, você sabe que eu sou fã do Diniz...
Repórter: Gosta desse futebol diferente?
Presidente Lula – Olha, sabe o que que eu gosto? Eu gosto da criatividade do Diniz, eu gosto da personalidade do Diniz. Eu acho que é uma chance boa e eu acho que ele vai aproveitar bem. O problema não é o Diniz. O problema é que a gente não tem hoje a qualidade de jogadores que a gente já teve em outras épocas. Nós estamos numa entressafra não muito boa, né? A molecada sai do Brasil com 16 anos, 17 anos, 18 anos, e só volta com 36, 37, 38, ou seja, nós apresentamos um trabalhador no ápice e o contratamos aposentado. Eu, eu não sei se o Diniz vai conseguir montar uma boa seleção. Ele tem personalidade, ele tem criatividade e ele tem comando no vestiário. Em futebol, o técnico tem que comandar o vestiário. Porque é no vestiário que acontecem as brigas, as discussões, as desavenças. Eu acho que o Diniz terá competência pra isso.
Repórter – E o Ancelotti, depois, treinando a Seleção pra a Copa?
Presidente Lula – Eu gosto do Ancelotti. Mas é o seguinte, ele nunca foi técnico da Itália. Eu acho que se ele fosse resolver o problema do Brasil ele não resolve o problema da Itália que não foi nem disputar a última Copa do Mundo? É muito fácil...
Repórter: O Real Madrid não é seleção
Presidente Lula: Porque é muito fácil dirigir um time na Europa com um monte de jogador de seleção. Duro é chegar aqui e pegar o Corinthians, dirigir o Corinthians. Eu quero ver se o Ancelotti daria um jeito no Corinthians aqui, hoje. Meu Corinthians tá muito sofrido.
Repórter: O Luan deveria rescindir?
Presidente Lula: Eu acho que faz tempo que esse moleque parou de jogar bola, ele não quer jogar, ele deixou de ser profissional. O Corinthians não pode continuar pagando R$ 900 mil pra ele ou até mais do que isso, pra ele, sabe, eu acho que era melhor que ele tomasse uma decisão na vida dele e saísse, e fosse procurar outro caminho.
Repórter: Presidente, muito obrigada por essa entrevista e espero o senhor numa próxima oportunidade
Presidente Lula: Obrigado Débora e até outra oportunidade
Repórter: Obrigada, você. Até mais