Entrevista do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, à Rádio Metrópoles (BA)
Mário Kertész — Presidente Lula, bom dia. Que bom te ver.
Presidente Lula — Bom dia, Mário. Bom dia ao povo baiano. Bom dia a todos os companheiros e companheiras que trabalham com você na rádio Metrópole. É muito prazeroso para mim falar com a Bahia. Estou a sua disposição, Mário.
Mário Kertész — (trecho sem áudio) fundamental, aeroespacial, aqui no Cimatec. Um ano de governo. Tinha gente que falava que, com sua vitória, em seis meses, o Brasil viraria a Argentina. Em doze meses, viraria a Venezuela. Não foi isso que aconteceu. Nós vimos crescimento econômico, queda na inflação, aumento dos empregos com carteira e, mais do que tudo, e também complementando, um reaparecimento internacional de um Brasil digno, independente, que não abaixa a cabeça, nem fica envergonhado ao falar com os grandes mandatários deste país. Então, presidente Lula, começando por aí, depois a gente vai ver as coisas que faltam, que ainda precisam ser feitas, mas esse primeiro ano apresentou isso para o seu trabalho, a sua volta à Presidência da República, Lula.
Presidente Lula — Olha, Mário, primeiro, muito obrigado pela pergunta e pela oportunidade de fazer essa entrevista. Ô, Mário, quando nós chegamos na Presidência, no dia 1º de janeiro, a gente tinha uma noção de como estava o Brasil, porque nós fizemos um extraordinário trabalho coordenado pelo vice-presidente Alckmin, pelo Aloizio Mercadante, presidente do BNDES, pela própria presidenta Gleisi, sobre a transição. E, aí, nós fizemos um estudo profundo sobre como estava a situação do Brasil e muita coisa tinha deixado de existir, a começar pela cultura. Ou seja, faltava coisa, não tinha sido aplicado dinheiro em coisas importantes e, aí, nós resolvemos, então, tomar a decisão de reconstruir o país. E, para reconstruir o país, a gente precisava colocar o país de pé. E, nesse primeiro ano, a gente já recuperou, praticamente, 80 políticas que existiam nesse país, sobretudo as de inclusão social, para que a gente pudesse colocar o povo mais necessitado na ordem do dia, tentando ajudá-los a se transformar em cidadãos de primeira classe, tendo o direito a trabalhar e de comer. E nós conseguimos fazer isso. Nós ainda temos muito para fazer, porque nós apenas começamos a reconstruir o país.
Eu digo que o ano de 2023, Mário, foi um ano que a gente arou a terra, que a gente jogou o adubo, que a gente jogou semente, que a gente cobriu a semente e, agora neste ano de 2024, é o ano que a gente quer colher. É o ano da colheita daquilo que a gente plantou em 2023. E eu estou na expectativa de colher mais desenvolvimento, de colher mais emprego, de colher melhor saúde, de colher mais educação, de colher mais investimento em cultura, mais investimento em tudo que pode significar melhoria do povo brasileiro. E é isso que vai acontecer, Mário. Os pessimistas que a vida inteira acreditaram que as coisas não iam dar certo no Brasil estão muito sem ter o que falar. Primeiro porque a economia cresceu mais do que eles esperavam. Segundo porque o emprego aconteceu mais do que eles esperavam. Terceiro, porque a massa salarial que antes era reajustada abaixo da inflação, mais de 85% foi reajustada acima da inflação.
A gente voltou a aumentar o salário mínimo de acordo com o crescimento do PIB e o crescimento da inflação. A gente resolveu desonerar as pessoas que ganhavam até R$ 2.640. Com o reajuste do salário mínimo, as pessoas que ganham no mínimo parecem que vão voltar a pagar imposto de renda, mas não vão, porque nós vamos fazer as mudanças agora para que quem ganha até dois mínimos não pague imposto de renda. E você sabe que eu tenho um compromisso de chegar no final do meu mandato isentando todas as pessoas que ganham até R$ 5 mil. É um compromisso de campanha mas, sobretudo, um compromisso de muita sinceridade.
Nesse país, quem vive de dividendo não paga imposto de renda e quem vive de salário paga imposto de renda. O Haddad sabe que nós temos que fazer esses ajustes. Eles são difíceis, porque nós precisamos saber, na hora que a gente abrir mão de um dinheiro, a gente precisa saber de onde vai pegar outro dinheiro. E nós vamos fazer tudo que nós prometemos, porque é bom para o Brasil. É bom para o povo brasileiro. E é muito bom para o meu querido Nordeste. Por isso, Mário, é um ano glorioso para mim. Eu te digo que 2023 foi um ano glorioso, porque nós pegamos esse país quebrado. Você não tem noção. Só casas que estavam para ser concluídas, e que não foram concluídas, são quase 187 mil casas. São, praticamente, 10 mil obras em escolas que estavam paralisadas. Creche é quase 6 mil creches que estavam paralisadas. Ou seja, houve, efetivamente, um desmonte, porque a gente teve, durante quatro anos, um presidente que não se preocupava em fazer nada.
Você que é jornalista pode perguntar em cada estado do país se alguém sabe de alguma obra de infraestrutura que foi feita pelo governo passado. Eu tenho os dados, agora, mostrando que em quatro anos eles investiram 20 bilhões em transporte. Nós, só nesse ano de 2023, investimos R$ 23 bilhões em transporte, ou seja, em um ano, nós fizemos mais do que eles em quatro. Na Ciência e Tecnologia foi a mesma coisa. E isso vai acontecer porque nós sabemos trabalhar, temos uma extraordinária equipe e nós vamos tentar fazer com que o Brasil volte a ser uma das economias mais pujantes do mundo. Essa é uma das coisas que nós estamos preparados para fazer.
Outra coisa, Mário, foi recuperar a imagem internacional do Brasil. O Brasil é um país grande, um país que foi respeitado, que tem relação com todo mundo. O Brasil não tem contencioso. Então, o Brasil precisa, definitivamente, estar bem com todo mundo. O Brasil quer estar bem com a China, quer estar bem com os Estados Unidos, quer estar bem com o Uruguai, com o Paraguai, quer estar bem com a Rússia, quer estar bem com a Ucrânia, quer estar bem com todo mundo. O Brasil não quer confusão. Nós não temos contencioso. E, por outro lado, como entrou agora a questão da transição energética, da transição climática, da chamada energia verde, ninguém no mundo tem condições de competir com o Brasil, Mário. Ninguém. Ninguém tem condições de competir com o Brasil.
E essa é uma oportunidade extraordinária para nós, não só para fazer os investimentos necessários que nós temos que fazer aqui dentro, em parceria governo e empresários, mas também de atrair investidores estrangeiros para fazer os investimentos aqui. Quem quiser descarbonizar sua economia, o Brasil é um espaço extraordinário para que as pessoas venham produzir, aqui, os seus produtos com energia totalmente limpa, totalmente renovável. E isso é uma coisa importante, porque nós vamos investir muito dinheiro e vamos tentar investir muito na construção de parcerias para que o Brasil possa se transformar, definitivamente, em um país ecologicamente correto, energeticamente correto. Em um país que vai chegar à descarbonização zero. Você sabe dos nossos compromissos e nós vamos tentar cumprir cada coisa que nós falamos durante a campanha. Eu vou tentar cumprir, para que a gente possa recuperar a credibilidade que a política perdeu nos últimos anos e tem perdido em outros países do mundo.
Então, eu viajei bastante. Agora quero viajar bastante para o Brasil e vou viajar para todos os estados, da Bahia, do Oiapoque ao Chuí, porque eu quero reconstruir o país, quero incentivar investimento no Brasil. Só para você ter ideia, eu tenho que visitar quatro indústrias automobilísticas que vão anunciar investimento acima de R$ 5 bi, R$ 6 bi e R$ 7 bi, ainda este ano vão começar os investimentos. E eu quero provar pro povo brasileiro que é possível esse país crescer, se tiver um governo que crie oportunidade, que abra oportunidade para as pessoas investirem, e não um governo que só queira vender ativos, ativos da Petrobras, privatizar a Eletrobras. Ou seja, você desmonta o Estado Brasileiro para arrecadar dinheiro para gastar em coisas que não tem muita utilidade. É isso que vai acontecer no Brasil, Mário. E eu tenho certeza que o povo brasileiro, que o nosso querido povo baiano, que o nosso querido governador Jerônimo, sabe o que está acontecendo e ele será um parceiro nosso na construção desse novo país.
Mário Kertész — Presidente, até o governador acabou de mandar um recado aqui, que está assistindo, mandando um abraço, mas eu quero tratar agora do seguinte: o governo anterior seu foi tão fraco, tão fraco, politicamente, inclusive, fora as outras fraquezas que a gente sabe, mas politicamente. O que aconteceu? O Congresso Nacional, sobretudo a Câmara dos Deputados, cresceu, cresceu, cresceu. E aí tome-lhe emenda, tome-lhe mandato, tome-lhe... viramos um regime "semi-parlamentarista". Uma das grandes habilidades de Luiz Inácio Lula da Silva, desde o início da sua vida, como operário, foi o de saber negociar, de ouvir, de ter paciência, de enfrentar. Você chegou a ser preso. Foi preso, mas comandou aquele processo todo, comandou a criação do PT, liderou o PT. Quando foi eleito presidente da República, a primeira vez em 2002, que absurdo, como é que nós vamos ter um presidente que não é advogado, não é engenheiro, não é médico, não fala cinco línguas. Fernando Collor falava dez línguas e deu no que deu. Mas essa sua capacidade de negociação, presidente, eu queria que agora falássemos sobre a sua relação com o Congresso Nacional, que é fundamental para implantar suas propostas, e inclusive do veto que foi oposto agora a emendas apresentadas pelos congressistas. E aí, presidente, como é que é?
Presidente Lula — Ô, Mário, você conhece bem a política e sabe de uma coisa: não adianta a gente ficar reclamando que o político pensa diferente de você. O político é o resultado daquilo que era a cabeça do povo no dia da eleição. Então nós temos que respeitar a escolha do povo brasileiro no dia da eleição, que escolheu os deputados que estão aí, os senadores que estão aí, e você tem que estabelecer negociação com quem está, sabe, cumprindo a sua legislatura conquistada na urna. Então é um processo democrático. Veja, e você tem que ligar para a seguinte atenção. O Congresso tem 513 deputados, o PT só tem 70. O Congresso tem 81 senadores e o PT só tem 9. Então você percebe que aumenta a nossa necessidade de conversar com as pessoas.
Quando eu mando um projeto de lei para o Congresso Nacional, eu não quero que os deputados aceitem com muita tranquilidade aquilo que eu mandei e aprovem. Eu mando um projeto de lei na expectativa de que eles vão fazer emenda, que eles vão ser contra, que eles vão ser a favor, e que nessa discussão a gente encontre o caminho do meio e aprove uma coisa que seja plausível para o benefício do povo brasileiro. E tem sido assim. É importante lembrar que nós conseguimos aprovar a PEC da Transição antes de eu tomar posse. É a primeira vez na história do Brasil que um presidente começa a governar antes de tomar posse. Porque o... não vou falar o nome dele... porque o ex-presidente era tão incompetente que ele não tinha deixado dinheiro nem para cumprir as próprias dívidas dele, o próprio compromisso dele. Então o Congresso teve a compreensão, houve muita negociação, aqui nós temos o trabalho muito corto do nosso líder Padilha, do nosso líder Guimarães, do nosso guerreiro Jaques Wagner, que é o líder do Senado, do nosso companheiro Fernando Haddad e do Rui Costa, que negociaram arduamente com o Congresso para a gente aprovar uma transição que dê condições para a gente trabalhar o ano de 2023.
É importante lembrar que esse orçamento de agora é o primeiro orçamento que eu estou fazendo. O outro orçamento eu herdei. Nós estamos fazendo com as condições que é possível fazer. Nós aumentamos o dinheiro para a educação, aumentamos o dinheiro para a saúde, muito, muito dinheiro para a saúde. Foi 18% de aumento na verba da saúde, foram, sabe muito na área da educação e nós estamos cientes de que os programas que são mais interessantes ao povo brasileiro, todos estão assegurados, todos estão assegurados. São 21 mil famílias que recebem o Bolsa Família e nós estamos mantendo com muita tranquilidade essas pessoas porque é necessário a gente fazer com que essas pessoas estejam cuidadas. Então, negociar com a Câmara é sempre um prazer, é sempre difícil.
Ô, Mário, eu não sei quantos filhos você tem, mas imagina que você tem, como eu, cinco filhos, chega na hora da janta e todo mundo senta em volta da mesa e briga para pegar um bife a mais, briga para pegar um pouco de feijão a mais, briga para pegar uma costela a mais que está dentro da feijoada. E você sabe que você tem que contemporizar, não pode bater em nenhum, não pode negar a nenhum. Então nós temos que conversar. E eu, sinceramente, acho que o Congresso, até agora, fez o que tinha que fazer. Votou tudo que a gente queria que fosse votado. Nós aprovamos, Mário — é importante, isso é histórico, Mário — aprovamos, pela primeira vez em um regime democrático, uma reforma tributária. Isso não é uma coisa simples, Mário. Uma reforma tributária votada em um Congresso majoritariamente de deputados que foram eleitos contra o governo. E as pessoas, depois que tomaram posse, votaram de acordo com aquilo que era necessário votar. Não era 100% o que a gente queria, mas não era 100% daquilo que eles não queriam. Foi a negociação do possível, daquilo que interessa ao povo brasileiro e nós estamos criando, aos poucos, a ideia de implementação de que o rico vai entrar no imposto de renda e o pobre vai entrar no orçamento. Essa lógica que vai prevalecer.
Agora tem que fazer muita coisa ainda porque tem que regulamentar. Então eu negocio com o Congresso sempre. Ontem eu tive que vetar o orçamento, vetei R$ 5,6 bilhões e tenho o maior prazer de juntar lideranças e conversar com as lideranças, explicar o porquê de ser vetado. Na questão das emendas, é importante a gente lembrar, Mário, que o ex-presidente não tinha governança desse país. Eu vou repetir: ele não tinha governança desse país, Mário. Ele não tinha. Quem governava era o Congresso Nacional. Quem indicava agência era o Senado. Ou seja, ele não tinha. Ele não tinha sequer capacidade de discutir o orçamento. Porque não queria ou porque não fazia parte da lógica dele. O que ele queria era que os deputados fizessem o que quisessem.
E nós resolvemos estabelecer uma relação democrática com o Congresso Nacional. Se conversa, todo dia, toda hora, os ministros com o presidente da Câmara, com os líderes do Congresso, com o presidente Pacheco, com os líderes do Senado. E as coisas estão indo. Estão indo. Se não 100% do que a gente queria, mas está indo. Está aí um percentual razoável: 60, 70% daquilo que a gente quer. E eu lembro, eu lembro, Mário, você também lembra, o que foi a Constituinte de 88. O nosso companheiro José Sarney, que era o presidente da República eleito em 85, em 86 o PMDB fez 306 constituintes e 23 governadores de estado. O Sarney tinha maioria absoluta no Senado, na Câmara e nos governos. E o Sarney tinha dificuldade de governar, mesmo sendo do partido dele a maioria. Você sabe disso, você se lembra. Até diminuíram o mandato do Sarney.
Ou seja, então, eu respeito muito as diferenças. E a diferença me permite negociar. Eu não quero saber se gosto de deputado e se ele gosta de mim, eu quero saber se o seu interesse num projeto de lei, ele tem um voto importante, eu preciso convencê-lo a votar aquilo que é de interesse do governo. Ele pode falar: "bom, eu não vou votar em tudo que o senhor quer, mas eu vou votar em uma parte". Ora, se essa parte interessar, vamos votar. É assim que a gente tem construído o dia a dia na relação governo com o Congresso Nacional. Às vezes, tem bate boca, que é necessário. Às vezes a imprensa insinua coisas que não aconteceram. Às vezes a imprensa fomenta guerra que não existe. Ou seja, mas eu acho que eu não tenho do que reclamar. Sinceramente, eu posso dizer: eu não tenho o que reclamar da relação do poder Executivo com o Congresso Nacional. A gente tem conversado sobre tudo e sobre todos os assuntos. E o Congresso Nacional tem tido a compreensão necessária das coisas que a gente tem que fazer. "Ah, mas derrubaram o Marco Temporal, o senhor vetou e eles derrubaram o veto". Obviamente eles derrubaram o veto, é só ver qual é a maioria no Congresso Nacional e saber que iam derrubar. Mas eu vetei por uma questão eminentemente política. Era preciso que a sociedade, a humanidade, soubesse que eu vetei o Marco Temporal que eles aprovaram e eles derrubaram o veto. Agora vão ficar com a decisão da Suprema Corte, que dá boas e muitas garantias aos indígenas brasileiros.
E assim, Mário, nós vamos governando o Brasil. Nós vamos governando. Esse ano nós vamos trabalhar mais, ano que vem mais, e 2026 mais. Eu tenho três anos, Mário. Eu tenho três anos para resolver o problema. O que é importante é saber, Mário, que nós estamos fazendo coisas extraordinárias nesse país. Você vai ver o que vai acontecer na educação deste país. Esse Instituto Tecnológico Aeroespacial que nós fomos lançar aí na Bahia, isso vai dar o que falar nesse país, na formação de novos profissionais qualificados e das empresas que vão participar. No dia que nós lançamos, já tinha seis empresas querendo se instalar lá. E nós saímos de Salvador e fomos a Fortaleza anunciar o ITA, um Instituto Tecnológico da Aeronáutica, que é um dos institutos de engenharia mais extraordinários do Brasil, que tem formado grandes engenheiros. Esse Instituto nós fomos levar ele para Fortaleza, porque o Ceará é o estado que mais aprova gente para ir fazer curso no ITA. Então, nós resolvemos levar o ITA para lá.
Então agora você tem o Instituto Tecnológico Aeroespacial na Bahia, tem o ITA em Fortaleza e nós vamos levar mais coisa também, logo, logo, estou anunciando outras universidades. Temos mais 100 institutos federais para anunciar nesses próximos dois anos, nós temos mais dois milhões de casas para anunciar nesses próximos dois anos e temos muito mais coisa: Escola de Tempo Integral, a Bahia se inscreveu, são mais de 400 municípios que vão participar do Escola de Tempo Integral. Nós já disponibilizamos milhões para a Bahia, acho que R$ 100 milhões para a Bahia acabar com a fila de espera de cirurgias. E o Jerônimo e os governadores do Nordeste são pessoas altamente competentes, que têm levado para o governo projetos que são condizentes com a realidade e a necessidade do povo.
Então, Mário, eu estou feliz. Sou uma pessoa feliz, porque, em vez das pessoas dizerem que o Congresso cria confusão, o Congresso é o Congresso. O Executivo é o Executivo. Eu fui a Nova Iorque, estava junto comigo o Lira e o Pacheco. E um empresário americano, quando terminou a reunião, falou para mim: "Ô, presidente Lula, eu não sei como você consegue isso. É humanamente impossível, aqui nos Estados Unidos, você imaginar um presidente democrata sentado com um senador republicano com um democrata na mesma mesa. Presidente do Senado e da Câmara sentar com o Biden. Isso jamais acontece". Eu falei: "No Brasil isso pode ser normal, porque a gente tem uma relação civilizada, ele sabe o papel deles e eu sei o meu papel. E a gente sabe que, de vez em quando, a gente tem que convergir a bem do povo brasileiro. E é isso que está acontecendo".
Mário Kertész — Presidente Lula, olhe, às vezes eu recebo reclamações aqui de que quem fala mais pelo governo, isso eu acho bom, é o presidente Lula. Mas que seus ministros estão precisando tomar um apertinho seu aí pra se expor mais, falar, contar o que está acontecendo. Às vezes é difícil. E eu vejo muitos órgãos de comunicação se queixando disso. Aí eu tô passando, inclusive aqui agora, a partir de agora, com a sua entrada aqui, no nosso encontro de quinta-feira, as portas começam a se abrir. Estavam muito fechadas. Presidente, dá uma prensazinha nesse pessoal, porque tem tanta coisa sendo feita e ministro não fala, deixam tudo aí para o senhor falar. Como é que é essa história, presidente?
Presidente Lula — Deixa eu te contar uma coisa. Primeiro, eu tenho muita alegria do ministério que eu consegui montar. São grupos de companheiros altamente preparados. Eu tenho vários deles que são governadores altamente bem sucedidos em seus estados. Não vou ficar citando nomes aqui, mas eu posso citar um que você conhece bem, que é o companheiro Rui Costa, que é da Bahia é o chefe da Casa Civil. O Rui tem uma capacidade de trabalho extraordinária, ou seja, o Rui, às vezes, são 23:00 da noite e ele continua trabalhando. E qualquer informação que eu peço está na ponta da língua do Rui para ele me informar. Por isso é que ele fez um pacto pra Bahia e, só para a Bahia, a gente vai ter R$ 89,5 bilhões de investimento no PAC da Bahia. E depois eu tenho pessoas como o Wagner, que me ajuda muito. O Jerônimo foi uma eleição extraordinária, não sei onde que descobriram esse jovem de muita competência, muito alegre, muito competente, muito disposto. Eu tenho ministros que são extraordinários.
Ou seja, essa gente, esse ano, vai falar muito. Vai falar, porque o ano passado era o ano do redescobrimento, alguns ministérios tiveram que ser reconstruídos. Eu tenho o Ministério dos Povos Indígenas, Ministério das Mulheres, Ministério dos Direitos Humanos, Ministério da Igualdade Racial, que são jovens e pessoas muito competentes, que vão falar muito esse ano. Até porque eles tem que falar, porque eles precisam se autorizar diante da população que eles representam no governo. Eu estou tranquilo com relação a isso. Tem muita coisa para anunciar. Muita coisa.
Eu, agora, Mário, vou tomar atitude diferente. Vamos, agora, antes de fazer o lançamento dos programas, vamos falar com a imprensa. Vamos mandar chamar a imprensa especializada, quem é que entende de educação neste país? Daí nós vamos, primeiro, apresentar o programa para quem entende de educação. E depois nós vamos viajar o Brasil lançando o programa. O mesmo vai valer para a Saúde, o mesmo vai valer para Transportes, o mesmo vai valer para Portos e Aeroportos, o mesmo vai valer para a política indígena desse país, o mesmo vai valer para a questão ambiental. Porque a questão ambiental tomou uma dimensão extraordinária agora com a COP 30 a ser realizada em Belém, em 2025. Então, os ministros, você vai ver, Mário, que os ministros vão falar e vão falar bem, porque são, todos eles, altamente preparados.
Uma coisa que nós criamos, essa semana, Mário, que anunciamos, é a bolsa para os alunos do ensino médio. Você sabe que nós temos uma evasão escolar muito grande, quando a criança termina o ensino fundamental e vai fazer o ensino médio. E elas desistem da escola, porque ela não acredita, está desmotivada, tem problema dentro de casa que tem que trabalhar. Nós estamos criando uma bolsa. Essa bolsa, na verdade, é uma bolsa de R$ 200 por mês. No total, nos três anos, a pessoa vai ter uma acumulo de R$ 9 mil na bolsa. Ela pode tirar um pedacinho durante o mês, mas só vai poder retirar todo o dinheiro, Mário, quando essa pessoa se formar no ensino médio. Esse plano já foi anunciado, já tem dinheiro aprovado pelo Congresso Nacional. E nós queremos que as pessoas que estão fazendo o ensino médio fiquem na escola, se formem, porque o Brasil precisa que as pessoas, além de se formar, aprendam uma profissão, porque a profissão ajuda a dar dignidade às pessoas.
Mário Kertész — Agora um pouquinho mais de política. Tem muita gente ou algumas pessoas que acham que na eleição de 2024 o senhor vai ficar de magistrado. Mas eu não estou vendo isso. Por exemplo, em São Paulo, eu vi uma articulação pessoal sua no sentido de trazer Marta Suplicy de volta ao PT e ser vice de Boulos, que não é do PT ou não era. Aqui na Bahia, o governador Jerônimo liderou 11 partidos e lançou a candidatura do vice-governador Geraldo Júnior, que é do MDB. O pessoal que ficou com o Bolsonaro na eleição passada, ou que disse que tanto faz votar em Lula ou Bolsonaro, acha que a sua participação aqui no caso da Bahia vai ser zero, porque aqui tem ministros seus que são do União Brasil, tem pessoas que estão no Congresso e aí o senhor vai ficar meio isento. Não foi o que eu vi em um episódio de quinta-feira da sua visita. Mas eu queria ouvir a sua palavra, que é o que importa. O que eu vejo não vale nada.
Presidente Lula — Mário, nós temos que nos colocar muito, mas muito, com o pé na realidade. A primeira coisa é que eu não posso, como presidente da República, fazer uma campanha como se eu fosse um cidadão comum. Eu tenho que levar em conta que, se tiver dois candidatos da base do governo disputando uma eleição, eu tenho que dar um tratamento mais respeitoso. Não posso ser acintoso em um apoio a um candidato nosso. Mas eu tenho candidato em todas as capitais, eu tenho candidato em todas as cidades. Sobretudo se for candidato do PT, se for candidato de partido aliado, que faz parte da base. Em algumas cidades, Mário, a gente vai ter candidato que não é do PT. E eu vou apoiar. Vai ter candidato que não é do PSB, e eu vou apoiar. Olha, isso vai depender de cidade por cidade.
Agora, na capital de São Paulo, é uma coisa muito especial, porque, na capital de São Paulo, é uma confrontação direta entre o ex-presidente e o atual presidente. É entre eu e a figura. E a gente vai disputar as eleições. Eu fiquei muito feliz de conseguir convencer a companheira Marta Suplicy, que é a prefeita que tem a melhor memória com o povo de São Paulo, a ser vice do companheiro Boulos. E, para isso, ela precisava voltar ao PT. Eu chamei ela aqui, conversei, ela ficou muito feliz e entrou. E eu acho que a gente pode ganhar as eleições em São Paulo. Acho que, pela primeira vez, a gente pode ganhar as eleições com uma pessoa como o Geraldo aí na Bahia. Eu acho que nós temos condições de ganhar as eleições em muitas capitais. Nós temos que fazer alianças em vários estados e vamos fazer aliança, Mário.
Eu não vou me jogar para criar conflito. Eu tenho que saber que eu sou presidente, que eu tenho que conversar com as pessoas, que eu tenho que fazer um jogo mais ou menos acertado para que eu não traga problema para depois, quando acabar as eleições aqui no Congresso Nacional. Mas eu também já fui presidente outra vez e já tive muitas eleições para prefeitura. Eu tô tranquilo com relação a isso. Eu acho que nós vamos ganhar em muitas capitais e, depois, a disputa é entre um governo que coloca o povo em primeiro lugar para tentar resolver os problemas dele e o governo da fake news, o governo do desastre, o governo que não acredita nas coisas normais que a humanidade tem que acreditar.
Então, vai ser essa disputa que vai se dar e eu terei um imenso prazer de fazer essa disputa. E, por falar em disputa, é importante o seguinte: quando eu falei das pessoas baianas que estão no governo, eu tinha esquecido da minha querida e gloriosa companheira Margareth Menezes, ministra da Cultura, que, só nesse primeiro mandato da Lei Paulo Gustavo, a Bahia recebeu R$ 285,6 milhões para investimento em cultura, que tinha totalmente acabado no tempo do governo passado. E tá voltando, a cultura voltou a funcionar 100% em todos os estados brasileiros. Vamos fazer a Conferência de Cultura este ano, aqui, talvez no mês de maio, vamos fazer uma grande conferência para estabelecer a nova política de cultura para o Brasil. cultura é conhecimento. Cultura é emprego. Cultura é consciência política e nós vamos fazer os investimentos necessários e eu agradeço de coração a Bahia por ter me cedido a Margareth Menezes.
Mário Kertész — Presidente, eu vou insistir um pouquinho em política porque, no último congresso do PT, em Brasília, estavam Rui, acho que Rui não estava, porque ele tinha o compromisso do nascimento do filho dele, se não me engano. Mas estava Wagner e Jerônimo. E o senhor virou para Jerônimo, que é um excelente governador, uma grande figura humana, viu? Desde Wagner, Rui e Jerônimo, a Bahia tem sido presenteada por excelentes governadores do PT. Claro que o pessoal aqui sai dizendo que a rádio aqui é puxadinho do PT e que, daqui a pouco, o senhor vai mandar um bocado do PIX para mim aqui, pra nossa entrevista. Mas nessa reunião em Brasília o senhor virou para Jerônimo e Wagner e disse que não é possível que vocês, dezessete anos no governo, nunca tenham elegido um prefeito de Salvador do PT. O candidato agora é do MDB, mas escolhido e apoiado pelo PT. Essa provocação sua, como é que é? É para valer? Não sei, é aí que eu queria que o presidente Lula me esclarecesse.
Presidente Lula — É para valer mesmo, sabe por quê? Porque aqui em São Paulo, em São Paulo, a gente nunca ganhou o governo do Estado, mas já elegemos três vezes prefeitura de São Paulo. E eu falei: é uma contradição, na Bahia a gente elege o governador, vai completar 20 anos de mandato, e a gente não elege um prefeito? Eu acho que a gente tem obrigação de eleger um prefeito aí na Bahia, apoiado, um prefeito que combine com o governador, que possa fazer um jogo acertado com o governador. Eu penso que pode melhorar, inclusive, a gestão da Prefeitura se isso acontecer. Mas, obviamente que eu sempre estarei respeitando a decisão do povo baiano.
Olha, a Bahia é uma escola política. A Bahia é uma escola política. Eu lembro, Mário, eu não queria que o Jaques Wagner deixasse a Prefeitura, o Ministério, para ele ser candidato a governador em 2006, pois ele falou para mim: “eu vou ser eleito”. Eu falei: Wagner, você não vai ser eleito, cara, você só tem 3% de voto. Você vai disputar com uma turma do ACM, você não vai ganhar. Pois ele saiu do Ministério, foi para a Bahia no primeiro turno. Depois foi candidato a reeleito no primeiro turno. Depois eu queria que ele indicasse uma outra pessoa candidata a governador, ele apoiou o Rui Costa no primeiro turno. O Rui Costa foi candidato no primeiro turno. Aí, teve toda uma confusão que você acompanhou na Bahia, quem é que ia ser o candidato para suceder o Rui. Se imaginava, teoricamente, que seria o Jaques Wagner, mas eu sabia que o Jaques Wagner, não queria. Bom, se não era o Jaques Wagner, então era para ser o nosso, sabe... Encontrar uma pessoa que merecesse a confiança deles. Aí, se pensou no Otto. Aí, até trouxeram o Otto numa conversa comigo em São Paulo. E na conversa, veja, na conversa, foi uma coisa interessante. Eu estou contando isso em primeira mão. Na conversa, o Rui disse que o Otto tinha aceito ser candidato. O Jaques Wagner, estava eu, o Rui e o Jaques Wagner. E o Otto não estava com a cara boa. Estava com a cara triste. Sabe a cara de uma criança que o pai dá uma bronca e manda ele ser e ele vai ser? Aí, eu senti que o Otto não queria. Senti que o Otto não queria.
Quando terminou a reunião, foi todo mundo embora e eu liguei para o Otto. Eu falei: "Otto, deixa eu lhe dizer uma coisa, meu amigo. Eu vi que você não estava gostando desse negócio de ser candidato a governador. Você não é obrigado a ser governador. Se você não quer, não seja. Não seja. Diga que não é, e nós vamos ter que arrumar outro". E o Otto disse que não queria. E aí eu fiquei preocupado. Eu fiquei preocupado, quem é que vai ser agora? Aí, eles apresentam o Jerônimo. E eu fiquei pensando: será que esse menino vai dar conta do recado? Será que esse menino vai, sabe? Pois o Jerônimo foi. Quase ganha no primeiro turno. Quase ganha. Não ganhou por pouquíssimo. O adversário dele, certamente, deve ter tomado muita cerveja, muita champanhe, muito uísque quando nós indicamos ele, porque ele falou: “agora vai ser baba. O Jerônimo não tem nada na pesquisa, eu tenho 67, eu vou ganhar as eleições”. O que aconteceu? Jerônimo virou governador da Bahia e eu acho que vai ser um extraordinário governador, não só pela sua simpatia, pela competência de trabalhar, pela mulher extraordinária que ele tem, que eu acho que ajuda muito ele, porque ela é muito competente também, e pelo apoio indireto do Wagner, do Rui, do Otto e de tantas outras pessoas na Bahia.
Então, eu acho que a eleição para prefeito é muito importante e nós queremos fazer o maior número de prefeitos, o maior número de vereadores, porque muitas vezes a gente não está elegendo vereador porque a gente não lança a pessoa certa na hora certa. É preciso que o PT leve muito em conta a importância de eleger vereador. Um vereador numa cidade faz a diferença do partido naquela cidade. Então, a gente precisa parar de menospreza a eleição de vereadores e priorizar em muitas cidades a eleição de vereadores. E aí, na Bahia, nós queremos fazer vereadores e o prefeito. Queremos fazer em Feira de Santana, queremos fazer em Vitória da Conquista e tantas outras cidades grandes da Bahia.
Mário Kertész — Presidente, olhe, sabe de uma coisa? Quando eu participei dessa solenidade na quinta-feira passada, eu fiquei impressionado com a sua vitalidade. Nós temos, eu sou um pouquinho mais velho que você, nós temos mais ou menos a mesma idade. Eu vi ali uma solenidade, mais de três horas, e o presidente Lula ali na dele, conversava às vezes com Jerônimo, prestava atenção, participava, levanta, faz um discurso fantástico, fala, fala andando, vai pra lá, vem pra cá, sai e vamos para um almoço. No almoço, conversa com todo mundo, com alegria, com bom humor, sai e vai viajar pelo Nordeste, Recife, Fortaleza e digo: diabo, onde é que este homem consegue essa energia toda? Fale agora do homem Luiz Inácio Lula da Silva. É dona Janja também, ela tem um papel importante. O pessoal que fica falando que ela fala demais, tudo bobão, tudo bobão, porque mulher tem que participar mesmo e participa, eu acho ótimo. Mas, como é que o presidente Lula, o presidente não, o cidadão Lula consegue essa energia toda? Porque eu tô com uma inveja danada, inveja boa, mas é inveja. Diga aí.
Presidente Lula — Ô, Mário, a primeira coisa é que eu gosto da vida. A vida é o maior dom de Deus. Então, eu gosto da vida. Eu não quero enfrentar a velhice, eu quero que a minha velhice seja saudável. Eu quero que os anos não pesem nas minhas costas para que eu deixe de fazer as coisas que eu gosto de fazer. Então, eu sou uma pessoa que me cuido, eu sou uma pessoa que faz ginástica, levanto todo santo dia 6 horas da manhã, eu faço esteira, eu faço alongamento, sabe? Porque é necessário. Eu não quero ficar uma pessoa prostrada, uma pessoa, sabe… Não, eu quero ter vitalidade. Eu quero ter vitalidade. Eu quero andar, eu quero falar, eu quero correr, eu quero, sabe? Enquanto eu tiver força para isso eu vou fazer. É uma luta diária. Eu não quero achar: ah, eu estou com 78 anos. Eu estou cansado. Não, não estou cansado coisa nenhuma.
Eu se for... posso te dizer aqui de coração, quando eu saio para viajar o Brasil, a minha equipe jovem, de jornalistas de 30 anos, de 40 anos, não aguenta o baque. Eu não tenho problema com comida, se eu não almoçar, não tem nenhum problema. Eu não... Se não tiver janta, eu não tenho nenhum problema. Se tiver assunto para eu discutir, eu estou acordado e com disposição. Agora, quando eu deito, eu durmo as minhas quatro horas, cinco horas. Eu também não durmo muito, não, e acordo com muita vitalidade. Sabe o que acontece, Mário? Eu aprendi desde muito cedo. Eu quando era presidente do sindicato, eu, às vezes, eu mesmo rodava o boletim de noite. Eu cortava o papel, eu fazia os pacotes de boletim, levantava 4 horas da manhã para ir na porta de fábrica distribuir. Eu não ficava esperando as pessoas fazerem para mim, e assim é a minha vida, sabe?
Eu converso muito com os meus ministros. Eu cobro deles, eu peço para eles. Sabe? Eles podem falar o que eles quiserem, não tem nenhum problema, não tem um veto para te falar, mas eu gosto de fazer as coisas. Eu gosto de estar presente, eu gosto de abraçar o povo, eu gosto de cumprimentar e eu gosto de mostrar o que que está acontecendo no Brasil. Eu gosto. Sinceramente, eu estou vivendo com 78 anos de idade um momento muito especial da minha vida. Eu digo, digo para animar as pessoas: eu tenho 78 anos de idade, eu tenho energia física, sabe, de um moleque de 30. Tenho disposição. Tem muita gente que não aguenta andar de esteira como eu ando. Tem muita gente que não consegue fazer os exercícios que eu faço, porque eu faço não só porque eu gosto, mas porque é necessário fazer.
E eu gosto da política, eu vivo a política. E quero te dizer uma mulher... quero dizer que tem uma mulher especial. A Janja, ela é uma espécie de meu farol. Sabe aquele farol que guia assim? Ou seja, quando tem coisa errada, ela me chama atenção. Quando tem alguma coisa no jornal errada, ela me chama atenção. Quando tem alguma coisa na rede, ela me chama atenção, às vezes ela fala coisas para mim que a minha assessoria não fala e ela fala, sabe? E isso me ajuda, obviamente que me ajuda, sabe, você discutir em casa, o que é que você pode fazer, o que você pode melhorar. Se você está feio, se você está mais bonito. Ela levanta de manhã, está preocupada com a camisa que eu uso, está preocupada com o meu rosto, está preocupada com meu cabelo. Ou seja, é muito bom, e depois ela é preocupada com a política. Ela vive a política também 24 horas por dia. Ela é muito interessada nessa questão, sabe ,social, sobretudo no que diz respeito à questão ambiental, da sustentabilidade. Ela é muito preocupada com a questão das mulheres, sabe? Me cobra, você não tem noção como me cobra, quando o Stuckert tira uma fotografia minha e só tem homem.
Quando ela vê a foto, ela fica horrorizada, se não tinha mulher para colocar na foto. "Por que que só homem, só homem, só homem"? E, às vezes, a maioria é homem mesmo, fazer o quê? Sabe, eu lembro em 74, eu fui fazer o primeiro congresso da trabalhadora metalúrgica. Minto, dia primeiro de janeiro de 1978, eu fui fazer o primeiro congresso de metalúrgica em São Bernardo do Campo. Era a primeira vez que a gente fazia um congresso de mulher e a diretoria era só de homem, só tinha homem. E as feministas daquela época quase me matam porque não tinha mulher na mesa, não tinha mulher na mesa. E agora não é mais uma questão de feminista, é uma questão que as mulheres conquistarem empoderamento e elas querem falar, elas querem participar, elas querem ser o sujeito da história. Elas não querem mais ser coadjuvantes.
Então, a Janja me ajuda muito nisso. Eu sou muito, muito, muito grato ao comportamento dela com relação a mim. A gente discute todo e qualquer assunto sem nenhuma frescura, não é porque ela é minha mulher que ela tem que ficar quieta, não, é por ser minha mulher que ela tem que falar, mas muito mais porque ela é militante política, ela gosta de política, ela faz política. Então, ela tem que colocar o posicionamento dela. Quando a gente não tá de acordo a gente para de discutir porque a gente também não quer brigar, porque tudo sempre termina em muita paz, muito carinho, muito amor. Essa é a minha vida, meu querido.
Mário Kertész — Presidente Luiz Inácio Lula da vida, que alegria conversar com você. Que alegria lembrar das conversas que a gente tem há 40 anos, do respeito, admiração por esse homem extraordinário que, felizmente, voltou à Presidência da República. Muito obrigado, presidente Lula, muita energia. Tudo de bom, saúde, felicidade, amor. Parabéns por ter uma mulher como Janja e ter espaço para ela assim. Parabéns por tudo. Você, presidente alegrou a vida aqui. São 300 municípios, fora o pessoal que está no YouTube e tudo, lhe vendo alegre, positivo, bonito e com energia. Muito obrigado, presidente Lula. Muito obrigado mesmo.
Presidente Lula — Se você me permite, eu queria terminar esta entrevista dando um recado ao pessoal da região sul da Bahia, sobretudo a questão indígena dos Tapajós. Eu sei o que aconteceu lá, eu sei que morreu uma pessoa, outras estão feridas. Eu conversei com o Jerônimo domingo à noite. Conversei com Jerônimo ontem à noite. Conversei com o Jerônimo agora de manhã. Ele me mostrou o que ele está fazendo. A minha ministra, a Sonia Guajajara foi à região e esteve lá conversando com todo mundo. E o que eu queria terminar era dizendo para o povo baiano que pode ficar tranquilo que eu vou discutir muito esse assunto hoje, hoje à tarde, aqui em Brasília com a ministra. Vou falar com Jerônimo e quero colocar o Governo Federal a disposição para ajudar, sabe, o Jerônimo, os povos indígenas a encontrar uma solução para que a gente resolva isso de forma pacífica. Eu não poderia deixar de falar isso. E a minha solidariedade aos familiares da indígena que foi assassinada.
Eu trabalho para isso, Mário, eu pedi pro meu ministro do Desenvolvimento Agrário que eu quero uma prateleira de propriedades improdutivas desse país, para que a gente não precise ficar discutindo mais ocupação de terra ou invasão de terra. Se a gente tiver pronta a prateleira de todas as terras disponibilizadas nesse país, a gente pode resolver o problema dos quilombolas nesse país, a gente pode resolver o problema de todo o trabalhador rural que quer terra, do Movimento Sem Terra e de todos os outros movimentos, a gente pode ajudar.
Então, eu pretendo, esse ano, sabe, anunciar ao Brasil a prateleira da quantidade de terra que nós temos disponibilizada, seja a terra da União, seja a terra que já está aprovada, que não é produtiva, que a gente tem que tomar uma atitude de tornar essa terra produtiva. A mesma coisa, mas nós vamos fazer com propriedade do Governo Federal. Tem muitos prédios, tem muito terreno, tem muita coisa que estão aí criando barata, criando rato, ou seja, e não é possível que a gente não dê utilidade para isso. Então, a gente vai pegar tudo o que tiver, tudo o que tiver, e a gente vai ver o que é possível vender para construir outra coisa nova, o que é possível reutilizar, mas a gente vai fazer com que o povo brasileiro tenha acesso a esses lugares, sabe, que o Governo Federal não utiliza. Tem, só o INSS, tem 3 mil prédios, ou seja, não tem sentido, não tem sentido. No Rio de Janeiro, tem muita coisa, em São Paulo tem muita coisa, na Bahia tem muita coisa, então, nós precisamos fazer com que isso volte para as mãos do povo. Nós vamos tentar dar um jeito. Aí, a minha alegria, porque o terreno do Cimatec, na Bahia, é no aeroporto. É um espaço que a Aeronáutica nos cedeu. E também o ITA, no Ceará, é um espaço que a Aeronáutica nos cedeu para que a gente possa qualificar a educação nesse país de forma gente altamente qualificada para melhorar a situação do povo brasileiro.
Então, Mário, muito obrigado, muito obrigado. É muito importante no país a gente ter jornalista qualificado como você, sabe, com o teu temperamento, com o teu conhecimento, e isso ajuda a bem informar o povo brasileiro.
Um abraço, um abraço ao Jerônimo, um abraço à esposa do Jerônimo e ao povo baiano como um todo. E beijo no coração, Mário.