Entrevista concedida pelo presidente Lula a jornalistas na saída de reunião bilateral com o presidente da Guiana, em Georgetown
Presidente Lula: Vocês vão para a CELAC?
Repórter: Nós não vamos para a CELAC. É que não tem voo direto.
Presidente Lula: O importante é a CELAC. É lá que nós vamos discutir os grandes problemas do mundo.
Repórter: O que a gente precisa saber é que havia uma grande expectativa em relação a essa conversa, a portas fechadas, agora, que o senhor teve com o presidente Ali, sobre o que ele está mais preocupado, com essa investida do Nicolás Maduro (presidente da Venezuela), em relação a Essequibo. Em que ponto está essa tratativa?
Presidente Lula: Deixa eu te dizer uma coisa. Primeiro, a reunião que fiz com o presidente Irfaan não foi a portas fechadas. Foi uma reunião em que participaram muitos ministros, porque foi a inauguração de uma sala que leva o meu nome. Porque, quando vim aqui, há dez anos, caiu o forro e eu estava presente. Não parei a reunião e eles resolveram me homenagear.
Veja, nós não discutimos a questão de Essequibo. Não discutimos. Por que não discutimos? Porque não é momento de discutir, era uma reunião bilateral para discutir desenvolvimento, discutir investimento. Mas o presidente Irfaan sabe, como sabe o presidente Maduro, que o Brasil está disposto a conversar com eles a hora que for necessário, quando for necessário. Porque queremos convencer as pessoas de que é possível, é possível, através de muito diálogo, a gente encontrar a manutenção da paz.
Eu não posso, da mesma forma que eu não vou discutir com o presidente Maduro essa questão, porque a reunião não é para isso, eu vou discutir a CELAC, vou encontrar com o Maduro lá. Não preciso discutir. A hora que eles quiserem marcar uma reunião e o presidente Ralph, que é o coordenador, quiser marcar, o Brasil estará totalmente à disposição para participar. Porque o Brasil tem uma decisão de que o mundo não comporta mais atrito. O mundo precisa encontrar paz para a gente poder construir um mundo mais humanitário, um mundo mais solidário, um mundo com menos sofrimento.
Repórter: Sem tratar da questão de Essequibo, fica claro que o Brasil quer que esse assunto seja esquecido?
Presidente Lula: Não, o assunto não pode ser esquecido, porque é um assunto quase secular. É um assunto que já tem anos e é um assunto que já passou pela justiça, já passou pela ONU e é um assunto que vai continuar. O que nós vamos trabalhar é para que esse assunto continue sendo motivo de muita conversa, de muito debate e que a gente possa encontrar uma solução da forma mais amigável possível. O que eu estou falando para você, eu vou falar para o presidente Maduro. Já falei para o presidente Maduro. O Brasil vai continuar empenhado para que as coisas aconteçam na maior tranquilidade possível. Se, em 100 anos, não foi possível resolver esse problema, é possível que a gente leve mais algumas décadas. A única coisa que eu tenho certeza é que a violência não resolverá esse problema, criará outros problemas.
Repórter: O presidente Ali, inclusive, disse que o senhor tem papel crucial na relação aqui da América do Sul, para a estabilidade, racionalidade e paz. O senhor deve levar esse recado para o Maduro também, lá?
Presidente Lula: Olha, eu acho que é gentileza dele falar isso. Veja, eu tento manter, com os presidentes da América do Sul, desde 2003, uma relação muito irmã, uma relação muito fraterna. Veja, porque eu nunca me preocupo apenas com quem é o presidente de um país, eu respeito todos os presidentes, porque eles foram eleitos pelo povo deles e eu acho que é o povo que decide. Então, não cabe a mim gostar ou não desse ou daquele presidente. Cabe a mim, como presidente do Brasil, permitir que o Estado brasileiro mantenha a relação mais civilizada possível com todos os problemas do mundo. Eu disse isso para o Zelensky, disse isso para o Putin. Eu digo isso para todo mundo, ou seja, é preciso que a gente tenha um pouco mais de paciência para que a gente não gere mais violência. Quando a gente começa a violência, a gente sabe como começa, mas a gente não sabe como termina. Então, é mais fácil recomeçar uma reunião antes da violência do que tentar fazê-la depois. É esse o sinal que o Brasil quer passar para o mundo. Para que a gente volte a ter paz.