Declaração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à imprensa por ocasião da Cúpula da Amazônia
Bem. Companheiros e companheiras. Quer ficar aqui, Mauro? [Mauro Vieira, ministro das Relações Exteriores] Venha aqui. Um papagaio de pirata de vez em quando ajuda.
Eu vim atender a nossa gloriosa imprensa porque eu ainda tenho três bilaterais. Então, eu queria, primeiro, dizer pra vocês que é muito, é muito importante o que aconteceu aqui nesses quatro dias. Porque, na verdade, aqui começou no sábado com a participação do movimento popular, que foi uma coisa inédita e extraordinária pela capacidade de discussão e de elaboração de proposta que o movimento social teve. Essa, essa sociedade que muitas vezes passa-se como anônima porque não é vista – nem sempre é vista ou notada –, ela demonstrou uma extraordinária competência de debater a Amazônia e as soluções para a Amazônia.
Também o fato extraordinário da gente conseguir reunir os presidentes da América do Sul, dos países amazônicos, para discutir, pela primeira vez, uma saída conjunta, para discutir seja nos fóruns internacionais, seja na ONU, seja na discussão de elaboração de fundos para que a gente possa, sabe, dizer que não é o Brasil que precisa de dinheiro, não é a Colômbia que precisa de dinheiro, não é a Venezuela; é a natureza, que o desenvolvimento industrial, ao longo de 200 anos, poluiu que tá precisando que eles paguem a sua parte agora para a gente recompor parte daquilo que foi estragado. Então, é a natureza que está precisando de dinheiro, é a natureza que está precisando de financiamento.
Por isso, eu disse ontem que todo mundo, em qualquer país do mundo que você vai, fala da Amazônia. E esse encontro é a Amazônia falando para o mundo, dando resposta ao mundo do que que nós precisamos. Então, eu vou fazer uma declaração e depois eu vou voltar pras minhas atividades, sendo que uma delas é comer. E vocês também vão porque vocês precisam comer. Jornalista em pé, jornalista com fome não para em pé, então, é importante.
Bem, ontem me reuni com os presidentes dos países amazônicos para construir uma nova visão de desenvolvimento sustentável para a região. Havia 14 anos que os presidentes dos nossos países não se reuniam. A Cúpula de Belém ocorre em momento muito distinto das três que a precederam: em 1989, 1992 e 2009.
Hoje, negar a crise climática é apenas insensatez, mas valorizar a floresta não é só manter as árvores em pé, significa dar dignidade para as quase 50 milhões de pessoas que moram na Amazônia sul-americana.
Faremos isso, faremos isso oferecendo oportunidades sustentáveis de emprego e de geração de renda por meio de fomento à ciência, tecnologia e inovação, do estímulo à sociobioeconomia e da valorização dos povos indígenas e comunidades tradicionais e seus conhecimentos ancestrais.
A Declaração de Belém que adotamos ontem reúne iniciativas muito concretas para o enfrentamento dos desafios compartilhados por nossos oito países. Trabalharemos juntos no combate ao desmatamento e aos ilícitos, na criação de mecanismos financeiros em apoio às ações nacionais e regionais de desenvolvimento sustentável, na criação de um painel técnico-científico e na criação de uma nova, de novas instâncias de coordenação e participação.
Será indispensável contar com a OTCA fortalecida, com reuniões regulares de presidentes e autoridades, aumento da participação social por meio de mecanismo amazônico de povos indígenas e da institucionalização do Parlamento Amazônico.
Hoje, ampliamos o diálogo para envolver líderes de países em desenvolvimento que detêm florestas tropicais. A República Democrática do Congo, a República do Congo, a Indonésia, e São Vicente e Granadinas, representando a CELAC [Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos]. Incluímos a França, por conta da Guiana Francesa; e a Noruega, que foi apoiadora da primeira hora, de primeira hora, do Fundo Amazônia. O presidente da COP-28, de Dubai, também participou, bem como o representante de organismos multilaterais e entidades financeiras internacionais.
Identificamos enormes convergências com os outros países em desenvolvimento com florestas tropicais. Estamos convencidos de que é urgente e necessário a nossa atuação conjunta em fóruns internacionais. Reivindicamos maior representatividade em discussões que nos dizem respeito. Defenderemos juntos que os compromissos de financiamento climático assumidos pelos países ricos sejam cumpridos.
Teremos duas frentes de ação importantes. Uma delas é trabalhar pela definição de um conceito internacional de sociobioeconomia que nos permita certificar produtos das florestas e gerar emprego e renda. Outra é criar mecanismo para remunerar de forma justa e equitativa os serviços ambientais que as nossas florestas prestam ao mundo.
Medidas protecionistas, mal disfarçadas de preocupação ambiental, por parte dos países ricos não são o caminho a trilhar. A Declaração de Belém e o comunicado conjunto que adotamos nesses dois dias de cúpula são um passo na construção de uma agenda comum com os países em desenvolvimento com florestas tropicais e vão pavimentar nosso caminho até a COP-30, quando estaremos de volta aqui em Belém.
Quero, por fim, registrar que o Brasil como anfitrião deste encontro continuará valorizando o intenso diálogo com a sociedade civil que vivenciamos nos últimos dias. Foram quase 30 mil pessoas credenciadas nos Diálogos Amazônicos. Ouvimos as vozes dos povos indígenas, ribeirinhos e quilombolas, mulheres, jovens e de todos aqueles que lutam e arriscam sua vida para preservar a Amazônia. Vocês podem ter certeza de que esta Cúpula vai gerar muitos frutos e que vai ser lembrada no futuro como um marco no desenvolvimento sustentável.
Quero aproveitar, agradecer ao ministro Mauro Vieira pelo trabalho extraordinário; agradecer ao companheiro Márcio Macêdo, ministro-chefe da Secretaria-Geral [da Presidência da República], que organizou a participação da sociedade civil. Agradecer aos companheiros que trabalharam, que ajudaram – aqueles que colocam a mão na massa de verdade – e agradecer à imprensa pela cobertura que vocês fizeram.
Eu acho que o que nós fizemos foi dizer ao mundo que nós não aceitaremos mais ficar criando teses que não sejam colocadas em prática. Nós vamos para a COP-28 com o objetivo de dizer ao mundo rico que se quiserem preservar, efetivamente, o que existe de floresta, é preciso colocar dinheiro não apenas para cuidar da copa da floresta, mas para cuidar do povo que mora lá embaixo, que quer trabalhar, que quer estudar, que quer comer, que quer passear e que quer viver decentemente. É cuidando desse povo que a gente vai cuidar da floresta, porque o exemplo que nós temos no Brasil é que parte das terras mais preservadas nesse país são as terras indígenas, numa demonstração que nós já temos os fiscais naturais para cuidar da nossa floresta. É só respeitá-los e garantir a ele condições de vida digna e decente.
Nós vamos colocar mais Polícia Federal para cuidar da nossa fronteira. Vamos fazer convênios com todos os países fronteiriços. Vocês sabem que o Brasil tem 16,8 mil quilômetros de fronteira seca. Não é uma fronteirinha qualquer, é uma fronteira muito longa e nós vamos ter que utilizar convênio com as Forças Armada de todos os países, convênio com a Polícia Federal, porque nós também da mesma forma que vamos brigar para garantir a floresta, nós vamos brigar muito para expulsar da floresta o narcotraficante e os traficantes de arma nesse país e o crime organizado. É uma tarefa que foi assumida aqui. E eu espero que quando tiver o próximo encontro vocês já possam cobrar de nós algum resultado.
No mais, um beijo no coração de vocês e até lá, porque eu vou trabalhar agora. Um beijo.