Pronunciamento do presidente Lula na cerimônia de outorga da medalha Oswaldo Cruz
Olha, eu, na verdade, não ia fazer discurso, porque eu comecei atrasado aqui. A minha agenda está muito atrasada, mas eu só queria agradecer a todos vocês por terem nascido, por serem como vocês são e fazerem com que a gente não perca nunca a fé, nunca a esperança de que tem mais gente querendo salvar do que gente querendo matar.
Eu, sinceramente, nunca pensei viver um momento na história do Brasil em que você tinha uma linguagem oficial do presidente da República, de ministro da Saúde, de médicos com mandato de deputado, com personalidades públicas, tendo a desfaçatez de inventar tantas mentiras contra a vacinação.
Me parece que essa gente não viveu no nosso tempo. Me parece que essa gente nunca teve noção do que a vacina significou para a humanidade. Me parece que essa gente nunca teve, sequer, a sensatez de ser um pouco humanista, de ser um pouco fraterno, de ser um pouco solidário e de ser um pouco, quem sabe, mais, de verdade, humano.
A existência de vocês, a existência de uma instituição como o SUS [Sistema Único de Saúde]... Porque é importante toda vez que a gente falar de enfermeira, de enfermeiro, de motorista, de médico, das pessoas que carregam o SUS nas costas, é importante a gente sempre lembrar – não é que a gente faz disso o nosso dia a dia na política – , mas a gente tem que lembrar que, desde que o SUS foi criado, abriu-se uma guerra na tentativa de desacreditar o SUS, de que os serviço não era de qualidade, que as pessoas eram mal atendidas, que as pessoas eram vistas sendo atendidas em corredores de pronto-socorro.
Sem levar em conta que, toda vez que a gente tenta fazer com que todos tenham o direito, o tratamento não é igual àquele que você atende meia dúzia de pessoas. A universalização, ela tem um preço. O primeiro: o bom de atender toda a humanidade. O segundo: que ela exige mais recursos, exige, portanto, mais trabalho e, muitas vezes, com a quantidade de gente, cai um pouco a qualidade. Mas isso nunca foi motivo para que a gente aceitasse o descrédito do SUS.
Eu não esqueço nunca quando tiraram o imposto sobre transação financeira, que tirou do governo 40 bilhões de reais em 2007, apenas com o intuito de prejudicar o nosso governo naquela época.
E eu me lembro que eu disse a alguns senadores de que eles não estavam me prejudicando. Eles estavam prejudicando os milhões e milhões e milhões de meninas, de meninos, de mulheres, de homens, de adultos e de velhos que precisavam do SUS e que a gente poderia, com aquele dinheiro, melhorar a qualidade.
Não tiveram compaixão. Ganhamos, mas perdemos porque faltou um voto. E, de lá para cá, a gente tentou várias vezes criar algum mecanismo que pudesse dar mais dinheiro para que o SUS pudesse atender efetivamente, de muita qualidade.
E veio a Covid. E quando todo mundo imaginava que o SUS era aquilo que se vendia de forma equivocada em determinados meios de comunicação nesse país, quem apareceu para salvar milhões de vidas, para salvar aquilo que pouca gente imaginava?
Porque é importante lembrar que o Brasil só tem 3% da população mundial, mas foi responsável por 10% das mortes das pessoas da Covid. E se não morreu mais de 700 mil, a gente deve à honra, à capacidade de trabalho e à honradez de mulheres e homens que trabalham no SUS e que acreditam que a saúde pública pode ser a salvação.
Eu quero dizer para vocês que eu sou eternamente grato a vocês antes de ser presidente, agora que eu sou presidente, e depois que eu deixar a Presidência. Porque não é fácil. O Brasil é o único país do mundo com mais de 100 milhões de habitantes que tem um sistema de saúde universalizado para cuidar efetivamente de quem o Estado deve cuidar: das pessoas mais humildes, das pessoas mais pobres, das pessoas mais necessitadas. Porque o rico não precisa. O rico pode contratar um plano de saúde muito caro, pode visitar meia dúzia de hospitais de qualidade.
Quem precisa do Estado e quem precisa do SUS é exatamente 90 milhões de brasileiros que ainda não chegaram a viajar na primeira classe da sociedade. E é o que nós queremos, que essas pessoas sejam tratadas com respeito, com dignidade e que o Zé Gotinha produza logo muitos filhos para que a gente tenha uma família de Zé Gotinhas muito importante nesse país, para que nunca mais, nunca mais, alguém tenha coragem de falar contra a vacina.
E eu não sei por que algumas pessoas que falaram ainda não foram processadas, senador Humberto Costa, como genocida nesse país. Porque pelo menos 400 mil pessoas poderiam ter sido salvas se a gente tivesse, no governo, alguém que tivesse o mínimo de respeito pelo ser humano.
Obrigado, companheiros, por vocês existirem.