Pronunciamento do presidente Lula durante assinatura do decreto que cria o campus do ITA em Fortaleza
Olha, na verdade, essa festa deveria terminar depois das fotos com as crianças, porque me preparei para vir nessa solenidade, mandei buscar um livro do Montenegro [Casimiro Montenegro Filho, fundador do ITA] para conhecer um pouco a história do ITA [Instituto Tecnológico de Aeronáutica]. Pedi para o companheiro escrever um discurso para mim, falando do ITA e, quando eu chego aqui, coloca um monte de gente para falar antes de mim. E, aí, eu fui olhando o discurso de cada um, e cada um foi dizendo um pedaço daquilo que está escrito no meu discurso. Eu, então, ou eu proíbo os ministros de falarem antes de mim, falo depois, ou eu preciso fazer um jogo combinado, mas eu não preciso mais falar da importância do Montenegro na criação do ITA, mas falar um pouco de vocês aqui no Ceará.
Primeiro — não sei se vocês sabem —, em 2005 foi a primeira vez que eu ouvi falar em Olimpíadas da Matemática. Eu nunca tinha ouvido falar. E eu ouvi falar porque uma professora do Instituto de Matemática Aplicada foi no meu gabinete levar um grupo de alunos que tinham medalha de ouro. Ela me fez uma explicação e disse que a maioria dos alunos que participavam das Olimpíadas da Matemática, que não era muita gente, eram 200 e poucas mil pessoas, era do Ceará e um pouco do Piauí, e dizia que era de escola privada no Ceará, ainda não era de escola pública. E aquilo me despertou uma curiosidade: por que não levar as Olimpíadas da Matemática para a escola pública?
E, na época, algumas pessoas me disseram que possivelmente fosse difícil, que a garotada da escola pública não ia ter interesse de participar. Mas, mesmo assim, como a minha mãe sempre pediu para eu teimar, para eu fazer as coisas, eu resolvi fazer um teste e decidimos fazer a primeira Olimpíada da Matemática na escola pública, Camilo [Santana, ministro da Educação].
A primeira inscrição, se inscreveram 10 milhões de crianças de todo o território nacional. A segunda, em 2006, se inscreveram 14 milhões de crianças e, antes de eu deixar a presidência, a gente estava com 18 milhões de crianças se inscrevendo para participar das Olimpíadas da Matemática.
E, aí, me veio a certeza daquilo que eu acreditava o tempo inteiro, de que o que falta para as pessoas é oportunidade, é uma chance de poder dizer que ela pode fazer as coisas. Não importa a origem social, não importa a cor, não importa o sexo, o papel do Estado é garantir para todas as pessoas igualdade de oportunidades, ou seja, a chance de disputar a mesma coisa em igualdade de condições.
E depois a gente foi premiado porque a Rússia era o país que tinha mais alunos nas Olimpíadas da Matemática, mas estava longe de chegar a 18 milhões. O máximo deles era cinco milhões, e o Brasil passou a ser o país com maior participação de alunos nas Olimpíadas da Matemática. O maior.
E, depois, me veio a ideia de fazer a Olimpíada de Português porque tinha um problema sério, que na televisão toda hora falava que a meninada não aprendia a escrever no primeiro, no segundo, que a molecada escrevia errado. A molecada tinha dificuldade de fazer redação. Eu resolvi então criar a Olimpíada da Matemática [Português]. Ela foi criada, na primeira inscrição se inscreveram seis milhões de crianças para participar. E depois resolvemos criar as Olimpíadas da Ciência, mas aí já chegou o final do meu mandato, eu não sei o que aconteceu.
Por que que eu tô contando essa história? Porque no mês passado, no final do ano passado, o companheiro Camilo e eu fomos ao estado do Rio de Janeiro, na capital do Rio de Janeiro, nós fomos lançar uma escola, uma faculdade de matemática. Como é que vai funcionar essa faculdade? Essa faculdade, nós vamos fazer uma seleção entre os alunos que tiverem medalha de ouro e esses alunos vão ficar.
Ao todo, vai chegar a 400 alunos, vão primeiro ano que vem. Este ano, em março, já tem a primeira aula inaugural. Primeira aula inaugural. Vão ser 100 alunos, o ano que vem mais 100, o outro ano mais 100, até chegar a 400. E esses alunos vão para o Rio de Janeiro. Eles vão ter apartamento para morar, eles vão estudar o tempo inteiro e nós não vamos mais permitir que os gênios brasileiros tenham que sair do Brasil para poderem ser consagrados. Eles vão ser consagrados dentro do Brasil.
E, aí, as coisas vão acontecendo. Um dia, eu estava reunido com o ministro José Múcio [ministro da Defesa]. E o Zé Múcio falou: “ô presidente, por que é que a gente não leva o ITA para o Ceará?”. Aquilo foi como se fosse uma palavra mágica, porque a vida inteira eu tinha uma obsessão de terminar as desigualdades entre o Nordeste e o restante do Brasil. Eu não quero que o Nordeste tenha as coisas tiradas dos outros estados. A única coisa que eu quero é que o Nordeste tenha a mesma oportunidade que tenha qualquer outro estado dos mais ricos deste país, e a educação é a base fundamental. E, aí, eu falei: vamos tentar levar.
E hoje eu estou consagrado, assinando esse decreto da instalação do ITA aqui na cidade de Fortaleza. Parabéns ao Ceará, parabéns a Fortaleza, parabéns ao ITA, à Aeronáutica, ao ministro da Defesa, ao Camilo e à equipe do Camilo. E eu queria dizer para vocês uma coisa: nós vamos criar, nós vamos ter que assumir um compromisso de aproveitar esse mandato, que me falta três anos de governo, para que a gente possa resolver o problema da educação no Brasil, ou pelo menos consolidar um processo de revolução na educação.
Essa bolsa que o Camilo falou é uma das armas que nós temos. Nós não podemos deixar que alunos do ensino médio desistam da escola porque não gostam, porque estão cansados, porque têm que trabalhar, porque precisam ajudar em casa. Então, nós vamos criar uma poupança para que esse menino receba poupança total quando ele terminar o terceiro ano do ensino médio. Ele vai poder gastar um pouquinho por mês se ele quiser, mas o total ele só vai tirar quando ele se formar.
A segunda coisa é que nós vamos lançar um programa de educação. Nós vamos lançar mais 100 institutos federais nesse país, para que a gente mostre ao mundo que a gente gosta de exportar soja, a gente gosta de exportar milho, a gente gosta de exportar carne, a gente gosta de exportar avião, a gente gosta de exportar qualquer produto, minério de ferro, mas a gente agora quer começar a exportar conhecimento. A gente quer começar a exportar inteligência brasileira, porque nós fomos agora na Bahia lançar o Instituto Tecnológico Aeroespacial, no mesmo aeroporto de Salvador. Uma coisa que vai ser extraordinária.
Aliás, Zé Múcio, eu não sei se você teve a oportunidade de ver: o Cimatec da Bahia fez o primeiro robô que desce a 3.000 metros no fundo do mar, faz todas as pesquisas que ele for programado, sem precisar de ajuda de ninguém. Ele faz sozinho e depois ele vem para a gente estudar o que ele fez. Isso é uma coisa brasileira, numa demonstração que quando a gente acredita, quando a gente investe, quando a gente dá oportunidade, as pessoas pegam com as duas mãos, não largam, e o sucesso é absoluto.
Da mesma forma, nós fomos inaugurar — veja o que vai acontecer no Brasil —, nós fomos inaugurar hoje o início de uma escola de formação de sargento em Recife. Ou seja, hoje você tem escola de sargentos em 19 locais. Tem 19 locais. Agora, todos os sargentos do Brasil serão formados numa escola de sargentos de Recife, que vai precisar do investimento de quase R$ 2 bilhões para a gente fazer com que as pessoas no Brasil se preparem melhor.
Mas, aí, não vai parar nisso. Eu vou tirar uma semana com o Camilo viajando o Brasil para falar de educação. Nós precisamos despertar, essa escola do ensino integral, aonde Fortaleza e o Ceará é o estado mais avançado do Brasil, não é só importante por conta do aluno ficar o dia inteiro aprendendo, é importante também, Camilo, porque você está tirando a meninada da rua, que fica à mercê do crime organizado, da droga, da bandidagem. É proteger a criança, muitas vezes, para que a mãe possa ter muito mais facilidade de trabalhar e voltar tranquila para casa, sabendo que o seu filho foi cuidado.
Nesses três anos que eu tenho para governar este país, a gente vai fazer pela educação do Brasil o que não foi feito em muitos anos nesse país. Porque o Camilo sabe que, neste país, uma parte das pessoas que dirigiram o país, desde que Cabral colocou os pés aqui, não gostava que o povo estudasse. Não gostava.
Os ricos mandavam o povo para Coimbra, em Portugal, mandavam para Londres, mandavam para França, mandavam para os Estados Unidos. E os pobres tinham que ser analfabetos e tinham que trabalhar ainda mais, cortando cana em muitos estados desse país. Nós não temos nada contra o corte de cana, mas nós preferimos os jovens com uma caneta na mão, com um computador na mão, trabalhando e produzindo tecnologia do que trabalhando em coisas que as máquinas podem fazer. Por isso, eu quero, Zé Múcio, agradecer a você. Aliás, você ganhou um prêmio de doutor cearense. Será que o povo Pernambucano vai gostar que você vai ser um traíra, vai trocar Pernambuco pelo Ceará?
Mas o Zé Múcio, na verdade, eu queria dizer para vocês: o Zé Múcio é o responsável da ideia da gente trazer o ITA para Fortaleza e para o estado do Ceará. E nós trouxemos o ITA para cá, nós trouxemos o ITA para cá — importante dizer, Elmano [de Freitas, governador do Ceará] — em gratidão ao Ceará. A decisão de trazer para cá é uma dívida de gratidão pelo que vocês fizeram e pelo que vocês dizem a nós, brasileiros, o que pode ser feito na educação deste país, mesmo sendo um estado não muito rico.
Por isso, parabéns, companheiro, Camilo. Parabéns. Eu acertei quando convidei você para ser ministro da Educação. Parabéns, Zé Múcio, e parabéns para o nosso querido... Eu tenho certeza que o Elmano tem uma tarefa muito maior do que a minha. Porque para eu fazer um bom governo, eu só tenho que ser melhor do que eu mesmo. Agora, você para fazer um bom governo, você tem que provar que você vai ser melhor do que o Cid e melhor do que o Camilo, ou pelo menos igual. Ou pelo menos igual. Tá?
Então, gente, olhe, é um dia gratificante para mim. Vocês não sabem o orgulho que eu tive de estar aqui hoje, de assinar esse decreto, de ver essas crianças todas. É uma coisa que me faz crer que esse país só é pobre porque esse país sempre foi governado por gente da cabeça pequena, por gente que sonhava pequeno, por gente que só pensava neles. E esse país precisa, efetivamente, melhorar.
Por isso, Ceará, muito obrigado de coração. Camilo, obrigado, Camilo. Obrigado, Elmano. Obrigado, Izolda [Cela, ex-governadora do Ceará], que está por aí perdida. Está aqui a Izolda. Sabe… Eu quase que ia… Eu quase que levei tudo do Ceará para o Brasil, mas como o Brasil é muito grande, eu tenho que respeitar os outros estados. Mas o Ceará tá na minha conta, em se tratando de educação.
E outra coisa importante, Camilo, que a gente vai ter que resolver, é que o salário de professor é pequeno. O piso. Às vezes, a gente não pode pagar, mas a verdade é o seguinte: a função de professora nesse país era uma coisa muito nobre. Ser professora na década de 60, na década de 70, na década de 50 era até motivo dos grandes compositores fazerem música.
A professora era uma referência para a família. O professor era uma referência. Aí foi rebaixando, foi rebaixando, foi rebaixando. Hoje, a professora sai para trabalhar ganhando um salário que, muitas vezes, não dá para ela dar para os filhos comerem aquilo que seria necessário para comer, porque o piso salarial ainda é baixo. Nós estamos tentando recuperar a economia desse país e, quando a gente recuperar a economia desse país, a gente tem duas coisas que a gente tem que ter gratidão.
Primeiro, a gente cuidar da educação com mais carinho, e cuidar da educação é melhorar o salário e a quantidade de trabalho dos professores brasileiros. E a outra coisa é a gente aumentar o salário mínimo todo ano para que as pessoas de salário mínimo possam viver decentes. E a gente espera que daqui deste instituto saiam alguns gênios, que a gente possa ver produzir uma nave que vai chegar não na Lua, não em Marte, ainda não conhecemos um planeta que a gente vai poder chegar depois que o ITA começar a funcionar aqui.
Um beijo no coração de cada um de vocês, um beijo muito grande e até outra oportunidade, se Deus quiser. E avisar para o nosso governador que ele precisa voltar para casa e deitar, que ele está com pneumonia. Ele não pode ficar se expondo com muita facilidade aqui.
Gente, um beijo no coração. Um beijo.