Pronunciamento do presidente Lula durante sanção de projetos de lei em São Gonçalo do Amarante (CE)
Eu quero dizer para vocês que hoje é um dia feliz, porque todo mundo que governa alguma coisa, todo mundo que governa uma cidade, o prefeito sabe disso, o Elmano [Elmano de Freitas, governador do Ceará] sabe, todo mundo que governa um estado, ou um país, o maior momento de alegria da gente é quando a gente consegue transformar as coisas que a gente acreditava em realidade. E aqui no Ceará, eu queria que as pessoas mais jovens soubessem por que é que o Porto de Pecém tem uma siderúrgica. Essa siderúrgica, ela foi trazida para cá, depois de uma viagem que nós fizemos na Coreia do Sul. Essa siderúrgica veio quase como um pagamento dos parlamentares do Ceará, senadores e deputados, que fizeram uma briga enorme com a Petrobras, porque queria que a Petrobras fizesse uma refinaria aqui e a Petrobras não pode fazer essa refinaria. Eu tentei fazer, mas pararam quando eu deixei a presidência. Então, quando a gente estava lá na Coreia do Sul, chegou o momento de assinar a vinda da siderúrgica para o Ceará.
Estava comigo o ex-governador Lúcio Alcântara e nós estávamos sentados. E cadê o governador? O governador não estava. E precisava assinar, e o cara da Coreia queria assinar. Falei: “gente, pelo amor de Deus, alguém dá um pulo no quarto do governador para ver se ele está lá”. E ele estava, dando uma descansadinha, que todo mundo merece, e ele veio correndo para a gente assinar, e é com muito orgulho que eu posso dizer: eu também tenho dedo na vinda da siderúrgica para o Porto de Pecém, gerando tantos empregos e tanta garantia de futuro.
Mas um outro dia, Elmano, eu estava fazendo campanha em 1989 e eu fui à cidade do Crato para fazer uma visita à mãe do governador Miguel Arraes, que fazia acho que 90 anos. E o Arraes foi participar do meu comício, nós fomos visitar a mãe dele, fomos para o comício, foi um dia em que o palanque caiu, vocês estão lembrados.
E na volta eu tinha um avião alugado e o Arraes pediu carona, eu fui deixar o Arraes em Recife. E o Arraes falou para mim: “ô, Lula, se você ganhar as eleições, vamos fazer a Transnordestina. A Transnordestina é uma obra muito importante para o futuro do Nordeste brasileiro”. Eu fiquei com aquilo na cabeça. Perdi as eleições em 89, depois eu perdi em 94, depois eu perdi em 98 e depois eu votei em 2002. Ou seja, quando eu voltei, algumas coisas na minha cabeça diziam o seguinte: eu tenho uma imagem na minha cabeça, com 7 anos de idade, pegando um pote de água num açude em que a gente era obrigado a separar as fezes dos animais, onde eles faziam o xixi deles, e a gente tirar a lama, porque era uma água barrenta, encher um pote, levar para casa. Não tinha educação para que a gente aprendesse a ferver a água ou filtrar a água. Todo mundo sabe que lá em Caetés não tinha, e a gente deixava aquela água sentar. Aquela água sentava, a gente pegava com a caneca, caneca não, era uma latinha feita com uma coisa para a gente pegar e trocava de um pote para o outro, até que a gente começasse a beber aquela água. Sem nenhum tratamento. E essa imagem marcou a minha vida, porque alguns tempos depois a minha mãe teve que sair de Caetés com 8 filhos para ir para São Paulo. E ela foi, como foram tantos e tantos nordestinos e cearenses, então muitos, a partir da década de 50, que foram para São Paulo na perspectiva de fugir da seca e de tentar ajudar a questão da família sobreviver. E assim aconteceu comigo.
Quando eu ganhei a presidência, eu poderia querer esquecer de qualquer coisa, eu poderia querer assumir novos compromissos, mas eu não posso esquecer de onde eu vim, não posso esquecer quem eu fui e não posso esquecer para onde eu vou voltar. E tomei a decisão de fazer a Transnordestina. Eu briguei muito, briguei muito, Tufi [Tufi Daher, diretor-presidente da Transnordestina Logística], depois eu quero que você venha aqui e dê uma palavrinha, porque eu quero que você assuma um compromisso público aqui.
Eu briguei muito. Eu, quando era presidente, com o governador Wellington [Wellington Dias, ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome] do Piauí, com o governador Cid Gomes do Ceará, com o governador Eduardo Campos de Pernambuco, fizemos mais de 33 reuniões para tentar encontrar uma solução. Todo dia tinha um problema, todo dia.
Era supressão vegetal, desapropriação de casa, era não sei das quantas, ou seja, era um inferno. Trinta e três reuniões. Quando eu imaginei que essa ferrovia fosse inaugurada em 2012, eu deixei a presidência em 2010, voltei em 2023 e a ferrovia não foi feita.
As pessoas desse país precisam aprender uma lição prática. Muitas vezes, na hora que o governo tem que decidir de fazer uma obra, sempre aparece alguém dizendo: “custa muito, custa muito”. E, por conta desse “custa muito”, a gente nunca pára para pensar o quanto custa não fazer. Quanto o Nordeste deixou de ganhar desenvolvimento por conta do atraso de uma ferrovia? Quanto tempo de atraso o Nordeste teve pela falta da siderurgia? E aí, eu tinha outra coisa na cabeça: a água. E eu falei: nós vamos ter que fazer essa tal dessa transposição do São Francisco.
Aí logo me alertaram: “ô, Lula, você vai querer fazer isso? Alagoas é contra”. Porque Alagoas pensava que o rio era dela. “A Bahia é contra”. A Bahia pensava que o rio era dela. Até Sergipe era contra, o governador de Sergipe, ele chegou a ir de sunga branca no assoreamento no meio do rio para dizer: “O Lula quer tirar a água do povo de Sergipe”. Eu falei para ele: “coloca uma cueca e vai mergulhar no rio cheio de cocô que você não limpa, que você não faz tratamento, ao invés de ficar contando mentira para o povo”. E tomamos a decisão de fazer a Transnordestina.
Hoje eu tenho orgulho, porque se um dia vocês forem na Lua, vocês vão perceber que além da obra da muralha chinesa, vocês vão ver o canal do São Francisco. Vocês vão ver que quando a gente se dispõe a fazer uma coisa, a gente consegue fazer essas coisas.
E o papel do governo não é ficar vacilando, não é ficar brigando “Quanto custa? Isso custa muito caro. Isso custa não sei das contas”. É preciso a gente saber: aquele investimento vai significar quanto de ganho depois de amanhã. E é por isso que eu enfrentei, graças a Deus, a Bahia elegeu o Jaques Wagner em governador e já não teve mais problema com a Bahia. Graças a Deus foi eleito o governador que era o Téo lá de Alagoa, também não teve mais problema, e fiquei com o problema do Piauí.
Um dia, gente, eu fui num comício e meu compadre Marcelo Déda, em Sergipe, falou assim para mim: “ô, Lula, a coisa aqui está difícil, o governador tem falado mal da gente na televisão, eu queria pedir para você para me não defender a transposição”. Você acredita? Eu falei: Dedinho, pode falar, querido, pode esculhambar com a transposição, porque eu vou falar depois de você e eu vou dizer que eu vou fazer a transposição do São Francisco porque o Brasil precisa disso. Porque eu tenho que atender 12 milhões e meio de pessoas que historicamente sofreram não por conta da seca, a seca é um fenômeno da natureza, a falta de solução é falta de caráter e responsabilidade das pessoas que governaram esse país durante tanto e tanto tempo, de governadores de estados e de presidentes da república que ficavam criando frente de trabalho a cada vez que tinha uma seca, era frente de trabalho que não produzia nada para nada, era tirar a terra de um lugar, colocar no outro e depois voltar do mesmo lugar para outro lugar, uma coisa sem sentido, por falta de coragem.
Então, gente, eu estou com 78 anos, eu tenho conversado com Deus todo dia, eu quero viver 120 anos. Quero viver 120 anos. Eu me cuido, eu me cuido bem, a minha Janja me ajuda que eu fique bem cuidado. Às vezes eu até me acho mais bonito de tanto que ela cuida de mim. E eu tenho animação, eu nunca levanto achando que vai ter uma coisa difícil na minha vida, nunca levanto.
Eu aprendi com a minha mãe, muitas vezes ela queria fazer comida num domingo e não tinha nada para colocar no fogo, eu nunca vi minha mãe reclamar, ela falava: “hoje não tenho, mas amanhã vai ter”. E foi com esse comportamento da minha mãe que eu fui criado. Não há nada, não há nada que a gente não possa fazer, a única coisa impossível é Deus pecar, o resto a gente pode fazer o que a gente quiser, é só ter disposição, discernimento e coragem de fazer as coisas.
Eu tinha uma loucura comigo, Renan [Renan Filho, ministro dos Transportes], que era, eu via nos jornais em São Paulo: “Lugar que tem mais analfabeto no Brasil: Nordeste”. “Lugar que tem mais mortalidade infantil: Nordeste”. “Lugar que tem mais evasão escolar: Nordeste”. “Lugar que tem mais fome: Nordeste”. Eu falava: porra, ô, Deus, será que nós do Nordeste somos tão ruim assim que nada acontece para nós?. E aí eu comecei a entrar na política, eu comecei a entrar que não era culpa de Deus não, não era a culpa da natureza, era a culpa da falta de visão das pessoas. Como é que podem deixar uma Transnordestina parada 12 anos? As pessoas mediram as consequências disso?
Por isso eu quero te dizer, Tufi, quero te dizer uma coisa, aqui está a nossa companheira, Luciana [Luciana, diretora de Infraestrutura, Transição Energética e Mudança Climática do BNDES] do BNDES. O Haddad [Fernando Haddad, ministro da Fazenda] deve estar ouvindo, eu quero dizer para o Haddad: Haddad. Haddad não, Aloizio Mercadante [presidente do BNDES]. Meu caro, eu estou convidando o Aloizio Mercadante aqui. Presta atenção, Aloizio, eu estou te convidando, primeiro para você liberar os recursos que tem que liberar para fazer a rodovia, segundo eu estou te convidando, porque nós vamos fazer um jantar, antes de eu deixar a presidência, andando nesse trem de onde for até chegar aqui no porto.
Porque é preciso a gente entregar as coisas, então eu sou um homem que eu tenho que agradecer ao Congresso Nacional. O Congresso Nacional, muitas vezes tão ofendido, muitas vezes tão destratado, muitas vezes tão avacalhado. Todo mundo sabe: o meu partido só tem 70 deputados de 513. O meu partido só tem 9 senadores de 81. Entretanto, até agora, a gente não perdeu um único projeto importante para esse país, porque a Câmara e o Senado têm votado as coisas de acordo com as intenções do governo.
E é muita negociação, é muita negociação, todo mundo tem que ir, o Dario [Dario Chaves, gerente executivo do Banco do Nordeste] sabe quantas vezes ele tem que conversar com o presidente da Câmara, com o presidente do Senado. Os ministros sabem quantas vezes. Porque é assim, cara, os caras não votaram em mim, mas os caras são deputados, eu não tenho nada com eles, mas eu sou o presidente da República, então eu não posso querer conversar só com quem gosta de mim. Eu não estou conversando para casamento, eu quero conversar com quem tem o poder de votar, e aí eu converso com todos indistintamente. Pode não gostar de mim, mas eu estou lá: companheiro, o governo está precisando do seu voto, companheiro, é o Brasil, é o povo do Ceará.
Vejam os deputados que votaram nessa lei, os senadores, muitos deles aqui do estado, mas outros de outros estados não têm noção do benefício que essas coisas vão trazer para uma região que historicamente foi esquecida. Eu lembro que nós tivemos presidentes, Camilo [Camilo Santana, ministro da Educação], que vinha aqui no Ceará e falava da transposição das águas do Rio São Francisco. “Eu vou fazer, eu vou fazer’. Chegava na Bahia, o ACM falava: “Não vai fazer, não vou fazer, não vou fazer, não vou fazer”. Olha, o presidente da República não tem que pedir favor ao governador, ele tem que ter um projeto e precisa brigar e fazer a opinião pública saber a qualidade do projeto para as coisas poderem acontecer.
Então, companheiros e companheiras, até um navio de regaseificação de carga a gente trouxe para cá. Eu não estou vendo ele aí, levaram embora o nosso navio? A gente trazia gás a 160 graus abaixo de zero para a gente poder aqui transformar em gás, para a gente poder utilizar. Ora, por que eu faço isso para o Nordeste? Não é porque eu não gosto do Sul. Eu devo tudo na minha vida a São Paulo, devo tudo a São Paulo, então eu adoro São Paulo, São Paulo faz parte da minha vida. Eu devo muita coisa a todo mundo, mas é preciso que a gente torne o Brasil um pouco mais igual. Eu quero o nordestino indo para o Sul do país de férias, para passear, para estudar e não para matar fome ou para trabalhar de servente de pedreiro. Eu ficava ofendido quando diziam para mim: “Não, quer contratar uma empregada doméstica, vá ao Nordeste”. “Quer contratar ajudante de pedreiro barato, vá para o Nordeste”.
Então é importante dizer agora: o Nordeste está de cabeça erguida e o Nordeste não quer exportar empregada doméstica, ele quer exportar, sabe, professor, físico, químico, médico, engenheiro, pessoas importantes. A gente efetivamente precisa ter consciência de que a gente não quer ser só pedreiro, a gente também quer ser engenheiro.
É isso que a gente deseja e eu quero tornar o Brasil igual. O Nordeste, o Norte do país, o Centro-Oeste ficarem com as mesmas possibilidades dos outros estados, que têm mais tecnologia, que têm mais infraestrutura, que ao longo da vida receberam mais recursos. Qual é o papel de um presidente da República? Qual é o papel, vocês que votam de quatro em quatro anos, qual é o papel de um presidente da República? O papel de um presidente da República não é detectar que tem dificuldades. O papel do presidente da República é encontrar facilidade, o papel do presidente da República não é dar consulta, é dar o remédio.
E é por isso que eu sou o brasileiro mais otimista desse país. Eu duvido que tenha nascido um brasileiro que esteja otimista do mesmo que eu. Sou otimista, esse país vai crescer, é o menor desemprego nos últimos 10 anos, é a maior massa salarial dos últimos 10 anos, 2.717.000 empregos em apenas 18 meses. Nós encontramos esse país com 87 mil casas do Minha Casa, Minha Vida paradas. Eu fui a Cuiabá esta semana inaugurar um conjunto habitacional que tinha sido começado a fazer pela Dilma em 2012. Ficou parado de 2012 a 2024. Que sensibilidade tem um presidente da República, um governador, que não leva em conta essa necessidade de um povo que precisa morar, precisa ter casa, e a Constituição garante.
É por isso que agora a gente está fazendo casa e o pessoal do Bolsa Família e do BPC não pagam mais agora, porque é um direito constitucional garantir que o pobre more, que ele tenha um ninho para ele poder esconder os seus filhotes e ensiná-los a voar. E agora eu vejo esses meninos falarem, eu nem precisava falar, gente, porque vocês viram a qualidade dessa gente minha aqui. Eu já fui presidente duas vezes, mas eu tenho um time agora que parece a Seleção Brasileira de 70.
É uma coisa intocável, e todos otimistas, e todos bom oradores, todos trabalhadores. A facilidade que é trabalhar com essa gente, eu posso dizer sem medo de errar: acho que nunca teve na história do Brasil um presidente da República que tivesse a felicidade de montar um governo da qualidade que eu montei. E eu estou cheio de ministro de gente que não votou em mim, eu estou cheio de ministro de pessoas que são de partido que votaram contra mim. Eu não quero saber, eu já ganhei as eleições, vocês já perderam, agora vamos trabalhar. Agora não é o Lula que precisa de vocês, agora é o Brasil que precisa de vocês. Vamos mostrar para quê que a gente serve e vamos fazer esse país dar um salto de qualidade.
E é assim que funcionam as coisas, sabe? E quando eu vejo esse pessoal falar de hidrogênio verde, de revolução, de energia solar, eólica, biomassa, hidrogênio verde, eu fico pensando qual é o país do mundo que pode competir com o Brasil? Qual é o país do mundo que tem condições de competir com o nosso país nessa questão da transição energética?
E nós ainda estamos aprendendo, porque uma das coisas que a gente vai fazer, meu presidente da federação, é cobrar do mundo rico que mande o crédito de carbono para nós, porque somos nós que temos floresta para preservar. Eles já queimaram as deles, então ajude o que a gente está fazendo sequestrando o carbono para o mundo ficar melhor. Tem gente que ao invés de ajudar está fazendo foguete e tentando procurar um lugar para morar. Não tem, babaca, é aqui. É aqui na Terra, e por isso todos estão convidados a cuidar desse planeta, é a única Arca de Noé que nós temos. Se ela capotar, não tem rico, não tem pobre, não tem mulher, não tem homem, não tem branco, nem tem negro, nós afundamos.
E como eu quero viver 120 anos, eu vou cuidar desse planeta Terra como eu cuidaria do bumbum do meu filho de um mês de nascimento. É assim que eu vou cuidar desse país, e é por isso que eu sou otimista. E quero terminar para vocês dizendo que recebi um recado aqui: a nossa companheira Beatriz Souza, do judô, acaba de ganhar a primeira medalha de ouro do Brasil nas Olimpíadas.
Ô, gente, é importante lembrar que 80% dos atletas que estão em Paris recebem uma coisa chamada Bolsa Família. Não, Bolsa Atleta, que nós criamos em 2004. Então, não sei quanto a Rebeca ganha, você tem várias faixas salariais, mas todo mundo ganha. Uns ganham R$ 10 mil, outros ganham R$ 15 mil, outro ganha R$ 3 mil, outro ganha R$ 4 mil. E por que a gente fez isso? Porque quando o atleta fica famoso, ele tem patrocínio, aí os bancos vão atrás deles, os empresários vão atrás e não sei das quantas. Mas enquanto ele não é famoso, às vezes ele não tem um tênis para andar, às vezes ele não tem um lugar para a menina jogar bola, para o menino saltar, para o menino dançar. Não é bonito a gente ver aquilo na televisão? Por que a gente não garante que as nossas crianças nascidas em um lugar mais pobre tenham o direito de chegar ali? Por que a gente não garante? É só a gente direcionar o dinheiro público para isso. É só isso.
E eu estou feliz também, Camilo, porque nós acabamos de tirar 24,5 milhões de pessoas da fome. E vamos acabar com a fome outra vez nesse país.
Olha a minha meia aqui. Olha a minha meia. Isso aqui é a novidade última do companheiro Camilo da área da Educação. Quando eu levei o Camilo para ser ministro da Educação, era porque o Ceará é o estado em que a gente tem melhores resultados na educação. Quando eu fui criar a Olimpíada da Matemática, em 2005, eu aprendi com o Ceará, que tinha a maior Olimpíada do Brasil. Era que tinha mais estudantes, mas só de ensino privado. Aí nós colocamos o ensino público. E aí os pessimistas de sempre diziam, diziam para mim: “Lula, as crianças pobres não querem participar, as crianças pobres não vão ter interesse, escola pública não vai ter interesse”. Sabe quantas pessoas se inscreveram no primeiro ano? Dez milhões de crianças. Sabe quantas se inscreveram no ano passado? Vinte milhões de crianças.
Então, gente, esse cara inventou esse Pé-de-Meia. E o que é esse Pé-de-Meia? Nós descobrimos que quase 480 mil jovens que fazem o ensino médio desistem da escola para poder ajudar no orçamento familiar. Ele me procurou para me dar os números. E eu falei: “vamos encontrar uma solução”. Se não tiver dinheiro, vamos lá para o Dario. Se ele reclamar, vamos forçar. Porque também, tanto político, presidente, quanto o ministério da Fazenda só trabalham com pressão. Se a gente não pressionar, não sai. Porque é mais fácil dizer “não”. É mais fácil dizer “não tem”. Para você concordar, você tem que pensar e você tem que elaborar.
Elaboramos um programa chamado Pé-de-Meia. A gente criou uma poupança para os meninos, até todos aqueles que estão abaixo do CadÚnico, ou todos que pertencem às famílias que estão no CadÚnico. A gente está garantindo R$ 200 por mês durante 10 meses. Se no final do ano ele tiver passado de ano e tiver 80% de comparecimento na escola, a gente vai depositar mais R$ 1 mil. Então, 10 de R$ 200 são R$ 2 mil, mais R$ 1 mil são R$ 3 mil. No ano seguinte, a mesma coisa, 10 de R$ 200 e uma de R$ 1 mil. No terceiro ano, a mesma coisa, 10 de R$ 200 e uma de R$ 1 mil. Quando ele terminar o ensino médio, se ele não tiver precisado gastar os R$ 200, que é a poupança dele, ele vai ter R$ 9 mil para começar a vida.
Aí os contra sempre dizem assim: “É, mas isso aqui é gastar dinheiro, porque vai gastar dinheiro com o ensino médio, porque tem que fazer estrada, fazer ponte”. Eu tenho dito: “Eu não estou gastando dinheiro. O dinheiro mais sagrado que um presidente da República pode dar é o dinheiro que ele dá para a educação, porque o que eu não investi na educação eu vou gastar fazendo cadeia para colocar esses meninos que não tiveram oportunidade, que vão pro narcotráfico”.
Então é esse país, companheiros, que nós temos que construir. E é por isso que eu saio do Ceará hoje agradecido pela quantidade de coisa que nós assinamos aqui, tudo boa para o Ceará e para o Nordeste. E eu espero que vocês tirem proveito. Espero, Elmano, que você tenha a mesma sorte do companheiro Camilo. Eu falo sorte, porque competência você tem, mas a gente precisa de um pouquinho de sorte, né? Sem sorte nem o goleiro do Corinthians vai para frente. Então tem que ter sorte. E na política nós temos que ter sorte.
E eu fico feliz, sabe, quando eu vejo o discurso do empresário otimista, porque, normalmente, a gente recebe empresário, a gente discute 4 ou 5 horas, aí você atende lá um monte de coisa. Quando termina, vai a imprensa no empresário e fala: “E daí, tudo bem?”. “Não, foi insuficiente”. “Ainda falta”. Eu estou dizendo, não tem um “obrigado”. Não tem um “obrigado”. “Obrigado por isso, obrigado por aquilo”. Nós fizemos um Plano Safra de R$ 475 bilhões, é o maior dos maiores. Aí eu pego lá o presidente da CNA: “É insuficiente”.
Então é o seguinte, gente, essas pessoas não percebem que a gente não pode tomar toda a água da fonte sozinho, nós temos que repartir. E nós fazemos o mesmo para a agricultura familiar. Por isso eu tenho muita alegria de ter trazido o meu companheiro Paulo Câmara, ex-governador de Pernambuco, para ser presidente do BNB. Por isso que eu estou feliz de ter um companheiro como o Carlos [Antônio Vieira Fernandes, presidente da Caixa Econômica Federal] na Caixa Econômica Federal, de ter o Aloizio Mercadante no BNDES. De ter, sabe, as coisas funcionando. Tem que funcionar, o dinheiro tem que circular.
Você tem que aprender uma lição: pouco dinheiro na mão de muitos significa distribuição de riqueza. Muito dinheiro na mão de poucos é concentração de riqueza, empobrecimento, analfabetismo, fome, prostituição. Então é preciso fazer o dinheiro circular nesse país, para as pessoas poderem comprar as coisas que necessitam. E é por isso que eu sou otimista.
Estejam preparados, porque quando terminar o meu mandato, vocês vão ter a alegria que tiveram em 2010, quando a economia crescia 7,5%, o varejo crescia 13%, a inflação era baixa, o salário era mais alto. Porque esse ano, só em 18 meses, 90% das categorias profissionais fizeram acordos salariais com ganhos acima da inflação. Esse país, cara, porque quando o povo menor, o povo de baixo, tem R$ 10, ele não vai comprar dólar, ele vai comprar comida, ele vai comprar roupa, ele vai comprar caderno. E é esse país que eu quero dizer para vocês que está acontecendo.
E eu digo para todo mundo: não precisam gostar de mim, precisam apenas ser generosos com esse país, que precisa de uma oportunidade de todos. Eu sou síndico dessa grande família de 203 milhões de habitantes. E vou cuidar. Vou cuidar, enquanto eu tiver força, vou cuidar de cada criança, de cada mulher, de cada homem, de cada velho, de cada negra, de cada negro, de cada branco e de cada branca, das pessoas com deficiência. Vou cuidar como se fossem meus filhos. Porque o dia que eu encostar a cabeça no travesseiro, eu terei certeza de missão cumprida na minha passagem pela terra.
Obrigado, companheiros do Ceará. Obrigado aos nossos companheiros que tanto nos enchem de alegria. Um beijo no coração de cada um de vocês.