Pronunciamento do presidente Lula no Fórum de Investimentos Prioridade 2024, no Rio de Janeiro
Eu quero, primeiro, agradecer a decisão dos companheiros da Arábia Saudita, sobretudo do seu representante, Al-Rumayyan, governador do Fundo Soberano do Reino da Arábia Saudita, presidente do Instituto e presidente do Conselho de Administração da Aramco, por ter decidido fazer esse evento aqui no Rio de Janeiro.
Quero agradecer ao prefeito Eduardo Paes, ao governador Castro, por participarem da sessão da cidade do Rio de Janeiro, para que a gente pudesse fazer um evento extraordinário como este.
Quero agradecer a todos os representantes da Arábia Saudita que estão presentes.
Quero agradecer aos companheiros do meu governo que vieram participar, representado pelo ministro Rui Costa [ministro da Casa Civil], pelo ministro Renan Filho [ministro dos Transportes] e pelo ministro Carlos Fávaro [ministro de Agricultura e Pecuária].
Quero cumprimentar também a nossa companheira Magda Chambriard, presidenta da Petrobras.
Quero cumprimentar Aloizio Mercadante, presidente do BNDES.
E quero cumprimentar os empresários brasileiros, cumprimentando o nosso companheiro Josué, presidente da FIESP em São Paulo.
Quero cumprimentar aqui os empresários brasileiros.
Não é fácil a gente imaginar o Brasil fazendo um evento dessa magnitude. Essas coisas, normalmente, a gente só via acontecer em países europeus ou nos Estados Unidos. Ou no Japão.
O Brasil nunca foi tão considerado país. Por isso, estou orgulhoso. É a primeira vez que o Brasil sedia uma edição da Iniciativa de Investimento Futuro.
Este espaço, que já se consolidou como a “Davos do Deserto”, não deixa nada a desejar para a Davos dos Alpes. Ele confirma a consolidação de atores emergentes no debate econômico mundial, para além dos centros tradicionais.
Já é passada a hora de reconhecer o crescente peso de países como a Arábia Saudita e o Brasil, sócios cada vez mais próximos e parceiros nos BRICS.
Com minha visita a Riade, em novembro passado, e a recente visita do vice-presidente Alckmin, estamos dando impulso muito grande a essa colaboração.
A escolha do Rio de Janeiro para receber este evento sinaliza a confiança que os mais de mil participantes depositam em nosso país. Estou aqui hoje para mostrar que o Brasil é e merece ser digno dessa confiança. Sempre digo que a coisa mais importante para um investidor é a estabilidade. E isso o Brasil tem de sobra para oferecer.
Na esteira da Constituição Cidadã de 1988, aperfeiçoamos nossos marcos legais e garantimos estabilidade jurídica. Da mesma forma que garantimos estabilidade social, estabilidade econômica e estabilidade fiscal.
Com determinação, vencemos os fantasmas da inflação e da dívida externa e conquistamos estabilidade econômica. Soubemos navegar pela crise de 2008 e, superado o impacto da pandemia, reencontramos o caminho do crescimento. Contrariando as expectativas pessimistas, nosso PIB cresceu 2,5% nos últimos 12 meses. Caminhamos para ser a oitava maior economia do mundo neste ano. Até o final do mandato, podemos voltar a ser a sexta economia mundial, como já fomos em 2011.
Nossa balança comercial bateu recorde em 2023, com o maior saldo da história. As exportações entre janeiro e abril deste ano alcançaram a marca recorde de 108 bilhões de dólares, com aumento da participação de produtos da indústria de transformação.
Estamos arrumando a casa e colocando as contas públicas em ordem para assegurar o equilíbrio fiscal. O aumento da arrecadação e a queda da taxa de juros permitirão a redução do déficit sem comprometer a capacidade de investimento público. A reforma tributária vai tornar nosso regime mais justo e eficiente, deixando de penalizar os mais pobres e dando mais competitividade à economia.
Mas sabemos que a economia não existe no vácuo. O mercado não é uma entidade abstrata, apartada da política e da sociedade. Nada disso se sustenta sem estabilidade política e estabilidade social.
Felizmente, demonstramos nossa resiliência frente à maior provação que o Brasil enfrentou em sua história recente. Nossas instituições sobreviveram à tentativa de desmonte do Estado brasileiro e a democracia prevaleceu sobre os ataques de forças extremistas. O governo reatou o Pacto Federativo com estados e municípios, retomou o diálogo com o Congresso e voltou a respeitar e cumprir as decisões judiciais.
Por meio do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável, a sociedade voltou a ser ouvida na definição de diretrizes e na formulação de políticas públicas.
Recuperamos a capacidade de planejar o desenvolvimento e enfim pudemos nos concentrar novamente no que realmente importa, ou seja, melhorar a vida das pessoas.
Para isso, foi preciso recolocar o pobre no orçamento. Restabelecemos a política de valorização do salário mínimo e reestruturamos programas sociais. O desemprego no trimestre fevereiro a abril foi o menor desde 2014.
O tema deste Fórum é “investir na dignidade”. E essa é nossa prioridade. Henry Ford já ensinava que os empresários só prosperam se os trabalhadores puderem consumir o que produzem. De nada adianta construir ilhas de prosperidade cercadas de miséria. Muito dinheiro na mão de poucos significa fome, doença, analfabetismo e criminalidade. Mas se muitos têm pelo menos um pouco, a sociedade pode melhorar de vida.
Em um cenário internacional de tantas incertezas, o Brasil se firma como porto seguro. Somos um país amante da paz e avesso a rivalidades geopolíticas. Dialogamos e negociamos com todos os que possam e queiram contribuir para o progresso do país e do mundo. Em qualquer constelação de poder que se forme no panorama global, a estrela do Brasil continuará brilhando. Estaremos lá para construir pontes e encurtar distâncias.
É esse o espírito das nossas presidências do G20 e dos BRICS e da COP30 no próximo ano, em Belém. O G20 é o lugar onde o Norte e o Sul se encontram para buscar consensos que tragam benefícios coletivos. É espaço privilegiado para combater as desigualdades que persistem dentro de nossos países e entre eles.
A COP30 será um evento determinante para o planeta. Sem o esforço de todos, conforme suas responsabilidades e capacidades, o aquecimento global poderá atingir níveis catastróficos. Estamos vivenciando isso em primeira mão com as enchentes no Rio Grande do Sul, cuja reconstrução demandará investimentos maciços do governo e do setor privado. Não há negacionismo capaz de refutar a tragédia que se abateu sobre nossos irmãos gaúchos.
O investimento público é decisivo para induzir o desenvolvimento. Mas o papel do capital privado pode ser um aliado dinâmico, se Estado e empresariado convergirem em torno de uma mesma visão de futuro.
O Brasil que vislumbramos é um gigante da sustentabilidade e um peso pesado da segurança alimentar. É um país capaz de ampliar sua produtividade agrícola com respeito ao meio ambiente e de renovar sua vocação industrial a partir da energia limpa e da inovação tecnológica.
O mapa do caminho para esse Brasil está desenhado no novo Programa de Aceleração de Crescimento e na Nova Indústria Brasil. O Novo PAC vai criar as condições necessárias para aumentar a competitividade da economia brasileira. Entre fontes públicas e privadas, serão investidos recursos da ordem de 320 bilhões de dólares, 75% dos quais até 2026.
Vamos promover a modernização de nossa infraestrutura logística, construindo e ampliando rodovias, ferrovias, hidrovias, portos e aeroportos, e da rede elétrica, levando luz para todos. Vamos tornar nossas cidades mais resilientes e aprimorar a infraestrutura de prestação de serviços sociais.
Também investiremos na integração física com nossos vizinhos, por meio de cinco rotas multimodais que cruzarão toda a América do Sul, ligando os oceanos Atlântico e Pacífico.
A Nova Indústria Brasil vai mobilizar linhas de financiamento, compras governamentais e melhorias regulatórias para fomentar setores estratégicos para nosso desenvolvimento sustentável.
Em 16 meses de governo, já foram aprovados 15 bilhões de dólares para projetos voltados à inovação, sustentabilidade e ampliação da produtividade e da capacidade exportadora brasileira.
Em um mundo cujas bases econômicas serão revolucionadas pelas transições energética e digital, o Brasil desponta como celeiro de oportunidades.
Nossa visão de desenvolvimento sustentável para a Amazônia, um dos biomas mais importantes do planeta, está alicerçada no potencial da nossa bioeconomia. Somos hoje um dos países com a matriz energética mais limpa do mundo, 88% de nossa eletricidade provém de fontes renováveis como a biomassa, a hidrelétrica, a solar, a eólica e, por que não dizer, logo, logo, o hidrogênio verde.
Fizemos a opção pelos biocombustíveis há quarenta anos, muito antes que a discussão sobre alternativas a combustíveis fósseis ganhasse atenção. Há alguns dias inauguramos a maior planta de etanol de segunda geração do mundo, fomos os pioneiros e continuamos na vanguarda da bioenergia. Isso nos coloca em vantagem para ocupar espaços em outros nichos importantes como o da produção do hidrogênio verde e de minerais críticos.
O Brasil tem potencial extraordinário para se tornar o maior produtor de hidrogênio verde do mundo. E temos grandes reservas de minerais estratégicos como nióbio, grafite, níquel e terras raras. Buscamos parceiros interessados em agregar valor a esses recursos em nosso território.
A condição de mero exportador de matérias-primas não nos interessa e não nos convém.
Podemos produzir localmente aço verde e componentes de baterias elétricas e gerar assim mais renda para nossa população. Os veículos elétricos são o motor do atual renascimento da indústria automotiva brasileira. Não queremos simplesmente instalar maquiladoras. Somos perfeitamente capazes de produzir peças e componentes no nosso país.
Já somos líderes em vários setores ligados à alta tecnologia. Nossa competência é amplamente reconhecida na produção de ônibus elétricos e aeronaves. O potencial da indústria aeronáutica brasileira é de tão grande importância que já estamos falando nos primeiros protótipos de veículos elétricos de decolagem e pouso vertical. Estamos prontos para explorar novas fronteiras tecnológicas.
Vamos elaborar um plano nacional sobre inteligência artificial, que vai mapear a infraestrutura de processamento necessária para atender áreas estratégicas.
Essas são as razões que explicam porque o Brasil se tornou o segundo maior destino de investimentos estrangeiros diretos desde 2023.
Vejo no relacionamento com a Arábia Saudita grande potencial de ganhos recíprocos e quero que seja exemplo modelar para as relações sul-sul que almejamos promover. Há claros pontos de convergência entre nossos projetos de desenvolvimento.
O objetivo da “Visão 2030” de diversificar a economia e fazer crescê-la com inovação, é também o que nos move. Temos grandes expectativas em relação à criação do Fundo bilateral para Investimentos em Oportunidades Especiais, que fortalecerá ainda mais a parceria entre nós.
A Arábia Saudita sempre terá no Brasil um aliado privilegiado. Tenho certeza que este evento proporcionará proveitosos debates e negócios e convido todos a investirem, cada dia mais e cada vez, em nosso país.
Minhas amigas e meus amigos,
Eu, embora tenha trazido meu discursinho aqui por escrito, para cumprir o ritual internacional, eu precisava dizer algumas palavras do meu coração.
Eu quero que vocês saibam que o Brasil está procurando se tornar não mais um país emergente ou um país em via de desenvolvimento. Nós estamos determinados a nos tornar um país grande.
E, para que a gente seja um país grande, nós temos que pensar grande. A gente não pode pensar pequeno. A gente precisa definir, claramente, quais são as prioridades que esse país pode oferecer a qualquer investidor estrangeiro neste país.
Quando se fala da questão climática, quando se fala da questão energética, eu posso assegurar para vocês, com todo respeito ao planeta Terra: não tem nenhum país que pode oferecer a qualidade das coisas que nós vamos oferecer para os investidores que aqui quiserem produzir, que aqui quiserem criar um novo ciclo de produção de energia e que aqui quiserem fazer suas empresas crescerem.
O Brasil não vai jogar fora a oportunidade de se transformar em uma grande economia. Vocês sabem que, neste ano, nós temos o G20 no Brasil. Nós temos o BRICS na Rússia. Ano que vem, temos os BRICS aqui no Brasil e temos a COP30 aqui no Brasil.
São megaeventos que podem mostrar a faceta do Brasil. A cara do Brasil. Nós não somos mais apenas o Brasil do carnaval, o Brasil do futebol e o Brasil da violência. Nós somos o Brasil composto por homens e mulheres que querem crescer, que querem trabalhar, que querem estudar. E é por isso que eu não consigo falar de economia sem colocar a questão social na ordem do dia.
Todos os debates que se faz, se tratando de economia, a gente fala de um monte de coisa, mas me parece que os problemas sociais não existem. E eles existem. E estão no nosso calcanhar. Estão nas nossas portas. Estão nas ruas.
E é por isso que esse mundo extraordinário, digitalizado, ainda permite que 735 milhões de pessoas vão dormir, toda noite, sem ter o que comer, em um mundo que a gente tem conhecimento genético para produzir alimento de sobra para todo mundo. Alguma coisa está faltando. Alguma coisa nós estamos fazendo.
Nos últimos anos, foram gastos quase 3 trilhões de dólares em guerra, quando esse dinheiro poderia ser gastado em paz, poderia ser gastado em investimento, poderia ser gastado em reduzir a miséria, a desigualdade e a pobreza no mundo.
Eu digo isso porque eu tenho um compromisso de fé. Não é um compromisso de um mandato. Só tem sentido um governante governar alguma coisa se ele estiver com o compromisso de cuidar do seu povo, de dar oportunidade a todos, de permitir que todos, sem distinção, todos, independente do berço em que nasceram, independente da cor, independente de gênero, tenha a oportunidade de se desenvolver, de crescer e de viver uma vida digna e ser uma pessoa respeitada na sua passagem pela Terra.
Por isso, eu queria dizer aos meus companheiros sauditas. Ao nosso presidente do fundo. Aos companheiros ministros que estão aqui. Aos empresários que estão aqui. Eu queria dizer para vocês, de forma muito taxativa. Vocês vão ouvir os meus ministros falarem. Vocês vão ouvir o que a gente está fazendo aqui neste país. Vocês vão ouvir o presidente do BNDES falar. Vocês vão ouvir, talvez, a presidenta da Petrobras falar, que é importante, porque a nossa Petrobras está quase disputando com a Aramco.
Então é importante ter em conta que nós, na hora que começarmos a explorar a chamada Margem Equatorial, eu acho que a gente vai dar um salto de qualidade extraordinário. Queremos fazer tudo legal, respeitando o meio ambiente, respeitando tudo. Mas nós não vamos jogar fora nenhuma oportunidade de fazer esse país crescer, de fazer com que esse país, junto com a Arábia Saudita nos BRICS, possa criar uma nova forma de investimento. Possa criar um novo sistema de tratamento das pessoas.
É por isso que eu quero terminar agradecendo a vocês. E dizendo a vocês: esse país, entre 1950 e 1980, cresceu, em média, a 7,5% ao ano. Entretanto, esse crescimento não foi muito bem distribuído e, quando você termina essa fase de crescimento, você percebe que o país cresceu, mas o povo continua pobre. E nós não queremos mais isso.
Nós queremos crescer todo mundo junto. Por isso é que o Brasil não tem contencioso. Por isso que o Brasil não quer guerra. Por isso que a gente está pedindo paz entre a Rússia e a Ucrânia. Fica mais barato a paz. A paz não gasta dinheiro com bomba, não mata ninguém, não destrói ninguém.
Eu lembro, companheiro Aloizio Mercadante, que, em 2003, o Bush me chamou na Casa Branca para discutir a guerra do Iraque. E, naquele ano, o Bush estava, obsessivamente, querendo encontrar alguém para poder criminalizar pelo atentado nas torres.
E o Bush tentava me convencer que era preciso invadir o Iraque, que era preciso fazer a guerra com o Iraque e que o Brasil tinha que participar. E, se o Brasil participasse, o Brasil iria participar da reconstrução do Iraque. Aí eu falei: "Presidente Bush, espere aí, você está me convidando para destruir e reconstruir depois? Não fica mais barato deixar pronto do jeito que está e a gente não destrói nada e não constrói mais nada?". E eu disse, naquela época, ao presidente Bush: "Presidente Bush, eu não conheço o Saddam Hussein, eu não conheço o Iraque, e o Iraque fica 14 mil quilômetros de distância do Brasil. Eu não tenho nada contra o Saddam Hussein, eu tenho contra a pobreza e a fome nesse país. E eu quero governar o Brasil para acabar com a fome e a pobreza".
E conseguimos, em 2014, tirar o Brasil do Mapa da Fome. Ficamos fora do governo e a fome voltou. Voltamos com 33 milhões de pessoas com fome. É importante vocês saberem, porque, normalmente, quando a gente recebe gente rica, gente de dinheiro, a gente tem que esconder a pobreza. Não. A pobreza existe, ela é real, e nós temos responsabilidade. Esse é o papel do governante. E, por isso, que o investimento de vocês é bem-vindo. Por isso que a confiança de vocês no Brasil é bem-vinda. É porque, nós agora, o Brasil e a Arábia Saudita, nós fazemos parte do Sul Global. Nós não somos mais tratados como se fossemos insignificantes, nós somos o Sul Global.
Você sabe que é chique falar que nós somos do Sul Global. E nós queremos elaborar projetos de desenvolvimento que interessam aos países do Sul Global. Nós não podemos passar mais um século dependendo do Norte. A gente não quer nem tirar nada deles, a gente só quer ser igual. A gente quer oferecer a mesma oportunidade que todo mundo tem. E, nesse aspecto, a Arábia Saudita é muito importante.
Por isso, companheiros e companheiras, empresários e, sobretudo, companheiros da Arábia Saudita, eu quero dizer para vocês: sejam bem-vindos ao Brasil. Seja bem-vindo ao Rio de Janeiro. Que esse encontro possa determinar, da forma mais positiva possível, a definição do investimento do fundo aqui no Brasil.
Estamos esperando por isso e espero encontrar, lá em Kazan, por ocasião dos BRICS na Rússia, e espero encontrá-los aqui outra vez, na COP 30 e também nos BRICS aqui no Brasil. E também no G20, que é importante saber que o G20, para nós, é uma coisa fundamental, porque nós vamos tentar discutir três assuntos que interessam à Arábia Saudita. Nós vamos discutir a questão da desigualdade, vamos discutir a questão da governança mundial e vamos discutir a questão da transição energética.
Muito obrigado a todos vocês.