Pronunciamento do presidente Lula durante inauguração de fábrica de medicamentos da Hemobrás, em Goiana (PE)
Eu disse que não queria falar, mas olha o tamanho do discurso aqui. Na verdade, é o seguinte: eu tô com problema de horário, que eu tô com medo que chova em Recife, a gente não pode sair daqui de helicóptero, e se tiver que sair de carro, eu descobri que Recife é mais longe daqui do que João Pessoa. Por isso é que o João (Azevêdo, governador da Paraíba), acho que combinou com o Eduardo Campos de trazer pra cá, porque pra cá a fábrica gera imposto aqui, mas os trabalhadores pegam renda para gastar lá na Paraíba.
Então, eu tô com um problema de atraso e também porque nós temos hoje um ato muito importante em Recife, que é o marco legal da nossa política cultural. O Brasil, definitivamente, vai ter uma política cultural de Estado, que eu espero que nunca mais na vida apareça alguém que ouse acabar com o Ministério da Cultura e acabar com a cultura nesse país.
Eu quero, primeiro, cumprimentar a todos que estão aqui, e quero cumprimentar a nossa governadora Raquel Lira, cumprimentar os companheiros deputados federais, deputados estaduais, os nossos prefeitos, e cumprimentando o prefeito, sabe, de Goiana, cumprimentar o nosso prefeito de Recife, companheiro João Campos, cumprimentar os nossos senadores, nossas senadoras, cumprimentar os trabalhadores da Hemobrás, e dizer para vocês que a gente colhe aquilo que a gente planta.
E nós, um dia, o Humberto Costa, meu ministro da Saúde, num longínquo 2005, porque depois, eu não queria que ele saísse, mas ele saiu para disputar o governo do Estado. Eu acho que ele teve a ideia de a gente criar a Hemobrás e trazer ela para Goiana. Da mesma forma que um dia a gente sonhou trazer para Goiana uma indústria automobilística. Da mesma forma que nós aprovamos, na semana passada, trazer para cá mais um instituto federal, que o prefeito disse que já tem o terreno. Se o terreno existe, o Governo Federal tem o dinheiro, portanto, prefeito e governadora, mãos a obras, porque Goiana está precisando de mão de obra qualificada para atender a demanda do crescimento e do desenvolvimento.
Veja, acho que Pernambuco nunca teve a primazia que tem agora. Você pensa que a Bahia que é importante, você pensa que o Amapá que é importante, você pensa que São Paulo que é importante, mas Pernambuco tem cinco ministros no meu governo. Cinco. E além de cinco ministros, tem o presidente da República. Quando é que Pernambuco já teve? Nós temos o André de Paula (ministro da Pesca e Aquicultura), nós temos o nosso companheiro Silvinho (Silvio Costa Filho, ministro de Portos e Aeroportos) nós temos a Luciana (Santos, da Ciência, Tecnologia e Inovação), nós temos o Zé Múcio (Defesa), que não está aqui, e temos o advogado-geral da União, que não é pouca coisa. É o cara que defende o Estado contra a ganância de quem quer ganhar dinheiro fácil às custas do Estado, do poder judiciário, é ele que vai lá bancar. Então eu, na verdade, vou tentar falar. Uma das formas que eu encontrei de falar pouco é fazer o discurso por escrito e não ficar improvisando. Porque a gente, muitas vezes, começa a falar e a gente não sabe como terminar. E a gente vai dizendo “e para terminar” e não termina. Aqui está escrito “obrigado”, eu sei quando eu tenho que terminar.
Faz exatamente 27 anos, na verdade, há 36 anos a gente perdeu um companheiro da mais alta importância para a cultura brasileira, que era o companheiro Henfil. E há 27 anos, a gente perdia outro Henfil, que era o Betinho, irmão dele, que foi o cara que motivou a música “O bêbado e o equilibrista”, tão bem cantada pela Elis Regina.
E esses companheiros eram hemofílicos e eu tive o prazer de conviver muito com eles. Eu lembro que andar na casa do Henfil não tinha nada, nada na parede, nada que pudesse cair. Não tinha nada que pudesse se machucar, porque se ele se machucasse, qualquer coisinha, demorava meses e meses para se recuperar. E eu tinha muita pena porque o Henfil era muito criativo. Quem não se lembra do Henfil, eu lembro que no tempo da TV Mulher, ele tinha um programa chamado TV Homem. Eram três minutos e ele fazia com o pessoal que trabalhava. Um dia eu fui lá e ele me pegou no corredor e fez eu participar do TV Homem dele. Era um dos gênios que esse país tinha e morreu por causa que ele era hemofílico.
Mas, em meio à luta por um país melhor, Betinho e Henfil também travaram uma dura batalha contra as consequências e complicações da hemofilia. Era um tempo em que as pessoas com hemofilia sofriam com a falta de tratamento profilático, constantes internações e transfusões de sangue. Uma época em que não tínhamos ainda o rigor de hoje na coleta e destinação das doações de sangue. Perdemos vidas precocemente por não termos tratamento adequado aos portadores de hemofilia. Perdemos o Betinho, perdemos o Henfil, perdemos muitos outros companheiros nossos e perdemos muitos brasileiros e brasileiras.
Felizmente, aqui tem um companheiro chamado Deivid, nasceu muitas décadas depois e já nos anos 2000. O Deivid é um jovem pernambucano cuja hemofilia foi descoberta quando ele tinha quatro meses de idade. A família nunca tinha ouvido falar dessa doença, mas ele pôde contar com a implementação da profilaxia e com o medicamento Hemo-8r, este que a Hemobrás está agora preparada para produzir nesta fábrica que inauguramos hoje. Uma fábrica que tem no seu quadro de funcionários justamente o companheiro Deivid.
Hoje, portanto, este jovem não só tem o privilégio de poder receber um tratamento adequado, ter uma vida saudável, ativa e promissora, como tem também a oportunidade de trabalhar na empresa que proporciona a ele esse benefício. Mais que isso, a oportunidade de contribuir para a melhoria da qualidade de vida de milhares de outros brasileiros e brasileiras que lidam com a hemofilia.
Queridas amigas e queridos amigos, em meu governo, mantenho e persigo um objetivo muito claro: conduzir o Brasil de volta ao rumo do progresso e do desenvolvimento sustentável, tanto econômico quanto social. A Hemobrás, criada ainda no meu primeiro mandato, ilustra muito bem esse objetivo. A inauguração desta planta do Fator 8 Recombinante, não marca apenas o início da produção nacional de todo o parque industrial da Hemobrás. É também uma resposta concreta à Estratégia Nacional para o Desenvolvimento do Complexo Econômico-Industrial da Saúde, que lançamos no ano passado.
Nosso objetivo, ao criar essa Estratégia, é expandir a produção nacional de itens prioritários para o SUS, além de reduzir a nossa dependência de insumos, medicamentos, vacinas e outros produtos estrangeiros de saúde. E é também investir em uma nova proposta de industrialização do país, voltada às demandas prioritárias da nossa população. A saúde é, sem dúvida, uma das coisas mais urgentes.
E eu queria aproveitar para dizer, sobretudo para a juventude, que muitas vezes só ouve falar do SUS pela televisão, e muitas vezes quando ouve falar, ouve falar porque uma pessoa não foi atendida, ou porque uma pessoa morreu na fila, ou porque uma pessoa “não sei das quantas”, porque a gente nunca ouve falar da quantidade de coisas boas que o SUS faz. E é importante cada brasileiro ter ciência para ter orgulho. Não existe no planeta Terra nenhum país com mais de 100 milhões de habitantes que tenha um sistema único de saúde universal como é o SUS. Que 99% dos transplantes feitos nesse país, inclusive por gente rica, é feita pelo SUS. Isso nunca é divulgado. Isso nunca é divulgado.
E se nós, brasileiros, que queremos um país soberano, que queremos um país capaz de ter uma indústria da saúde, porque nós temos o órgão consumidor, que é o SUS, que pode comprar as máquinas que a gente produzir, que pode comprar os remédios que a gente produzir, que pode comprar as vacinas que a gente produzir, a gente não tem por que não acreditar que a gente pode ter um polo industrial na área da saúde para competir com qualquer outro país do mundo, por mais rico que seja.
Eu digo sempre, e não é presunção minha não, é que todo país do mundo pode precisar de inteligência artificial. Agora, um país que tem um povo da qualidade do povo brasileiro, um povo que é capaz de contar piada da sua pior desgraça, um povo que sofre com o futebol, que sofre com o carnaval, que sofre com a fome, que sofre com o preconceito racial, que sofre com o preconceito de gênero, que sofre com todo tipo de preconceito. Esse povo que consegue sobreviver ganhando muitas vezes um salário mínimo, não precisa de inteligência artificial porque ele é suficientemente inteligente para dar respostas às coisas que nós precisamos.
E por falar em inteligência artificial, a companheira Luciana me convidou um dia desses para participar do Conselho Nacional de Políticas de Ciência e Tecnologia. É uma reunião que tem só gente cabeça, só gente inteligente, só inteligência humana, nada artificial. E a discussão era sobre inteligência artificial E na reunião do Conselho Nacional de Políticas de Ciência e Tecnologia, eu fiz um desafio: o Brasil não tem que ficar esperando ajuda dos Estados Unidos, ajuda da Rússia, ajuda da China, ajuda da Alemanha ou ajuda do Japão, ou a gente ficar vendo eles se desenvolverem mais do que nós na questão da inteligência artificial.
E eu disse à companheira Luciana e aos pesquisadores que estavam lá, os cientistas: “vamos criar vergonha, nós vamos ter uma conferência nacional de ciência e tecnologia em junho e, até junho, vocês estão desafiados a me apresentar um projeto brasileiro de inteligência artificial, para a gente não ter que copiar de outro país as coisas importantes que nós precisamos”.
Bem, hoje nós entregamos para a sociedade brasileira esse importante resultado do nosso trabalho que teve muita participação do companheiro Padilha como ministro da Saúde, do Humberto Costa, do companheiro Temporão, da companheira Dilma Rousseff e de tantos outros companheiros que participaram pelo governo brasileiro.
Eu vou terminar sem dizer tudo que tem que dizer aqui porque já está ficando chato e está ficando escuro e eu tenho medo de helicóptero. É bom vocês saberem. Eu acho que esse bicho não foi feito para voar, mas de qualquer forma a gente é obrigado a seguir. Eu queria dizer uma coisa para vocês, gente: esse país tem uma chance. Deus é tão generoso que de vez em quando ele dá uma coisa boa para a gente, de vez em quando acontece uma desgraça com a gente e a gente sempre espera que com a desgraça que aconteceu a gente aprenda de que a gente não pode permitir que outra desgraça aconteça conosco.
Esse país, ele será do tamanho que a gente quiser, esse país ele será da qualidade que a gente quiser. Agora, esse país só pode crescer se tiver alguém comprometido com esse país, comprometido com a soberania da nossa indústria, com a soberania da nossa pesquisa, com a soberania da nossa saúde, com a soberania das nossas forças armadas e com a soberania do nosso povo. Nós agora estamos discutindo a questão da transição ecológica, da transição energética, não tem no mundo nenhum país capaz de competir com o Brasil, nenhum país do mundo capaz de competir com o Brasil nesse negócio da transição do clima e da transição energética. Ninguém tem o potencial do Brasil, só para vocês terem ideia, o Brasil já é o segundo país a receber investimento externo esse ano.
O Brasil já teve a economia crescendo acima daquilo que os especialistas previam. A massa salarial cresceu 7,8%. É o maior crescimento desde o Plano Real. O salário mínimo já aumentou duas vezes acima da inflação. A massa salarial, 87% dos acordos salariais, foram feitos acima da inflação, enquanto há pouco tempo atrás os trabalhadores nem recebiam inflação.
Nós voltamos a investir na educação com muito peso, anunciamos mais 100 institutos federais nesse país e eu quero ver se até o final do meu mandato a gente chega a mil institutos para que a gente dê, de vez, um pagamento à dívida que esse país tem com os seus jovens, com os seus adolescentes na questão da educação. Esse país criou agora a Escola de Tempo Integral, nós temos o compromisso de até o final do meu mandato colocar mais quatro milhões de jovens em escola de tempo integral. Agora, esse primeiro ano, vai ser 1,3 milhão de crianças.
Nós, agora, criamos o Pé-de-Meia do ensino médio, nós descobrimos o ano passado que 480 mil meninos e meninas desistiram da escola porque tinham que trabalhar em casa e ajudar a família. Nós resolvemos criar uma bolsa, uma poupança que vai nos custar de investimento R$ 7 bilhões. Cada menino no ensino médio, nós pegamos um paradigma que é o Bolsa Família, cada criança pobre, sabe, vai receber R$ 200 por mês durante 10 meses. No final do ano, se ele tiver 80% de comparecimento na escola e ele passar de ano, ele vai ter mais mil. Então os dois, 10 de 200 são 2 mil, mais um de mil dá 3 mil no ano. Ele vai receber no ano seguinte, vai receber no terceiro ano. Quando ele terminar, ele vai ter R$ 9 mil na poupança dele, para ele não ter que desistir do ensino.
Muita gente diz: “ah, porque ele está gastando o dinheiro, está gastando”. Não, eu estou gastando dinheiro se eu tivesse cuidando de cadeia, se eu tivesse cuidando de tirar jovens do narcotráfico, de crianças que estivessem ligadas ao crime organizado. Ou seja, investir em educação é a coisa mais barata, a coisa mais decente e a coisa mais digna que um governo pode fazer, é investir na educação. Investir na educação é dar oportunidade para todo mundo. E quando a gente vem inaugurar uma fábrica dessa, a gente fala: por que o Brasil não pode ser exportador desse material? Por que o Brasil tem que ficar dependente de alguma coisa? Por que o Brasil não pode investir mais, investir em pesquisa, investir em ciência e tecnologia, investir nos estudantes, investir na universidade? Ou seja, isso é o mínimo que a gente tem que fazer.
E, por isso, eu queria dizer para vocês: eu tenho mais dois anos e nove meses de mandato. Fiquem certos de que a gente vai fazer nesses dois anos e nove meses aquilo que não foi feito nos últimos seis anos nesse país, depois do impeachment da Dilma e depois dessa tranqueira que vocês sabem quem é, que eu não pretendo falar.
Agora, vocês precisam ajudar, porque esse país não pode ficar subordinado à fábrica de mentira, à fábrica de fake news, à fábrica de ódio. É importante que vocês estejam dispostos a inclusive cuidar dos filhos de vocês, para não permitir que as meninas e os meninos desse país sejam vítimas da quantidade de insinuações, de mentiras, de leviandades, de acusações, de coisas que não têm pé nem cabeça. E são vocês que têm que cuidar, não é o presidente da República. Esse país não será o que o Lula quiser, esse país não será o que a nossa governadora quiser, esse país será o que vocês quiserem. Então, levante a cabeça e participe da construção do futuro do país de vocês.
Um abraço. Parabéns, Nísia; parabéns, companheiro da saúde. E até outro dia, se Deus quiser. Obrigado.