Pronunciamento do presidente Lula na cerimônia de entrega do Prêmio Mulheres das Águas
Bem, minha querida companheira Janja. Ministro André de Paula, ministro da Pesca e Aquicultura, e sua senhora, Patrícia de Paula. Cida Gonçalves, nossa ministra das Mulheres. Irajá Lacerda, Agricultura e Pecuária em exercício. Margareth Menezes, da Cultura. Nísia Trindade, da Saúde. Marina Silva, do Meio Ambiente. Sônia Guajajara, dos Povos Indígenas. Querida Sílvia, presidenta da Embrapa. Companheiros deputados aqui presentes. Ganhadoras dos prêmios entregues pelo Ministério da Pesca. Meu caro Décio, presidente do Sebrae. Espero que tenha aportado um pouco de dinheiro nas cooperativas das nossas pescadoras aqui, para elas poderem viver um pouco melhor.
Primeiro, André, é te dar os parabéns pelo evento. Eu já fui presidente oito anos e é a primeira vez que eu participo de uma premiação para as mulheres pescadoras. Acho que essa é uma novidade extraordinária, porque valoriza o feito que cada mulher faz na sua atividade, na sua cidade natal ou no seu estado.
A primeira coisa importante é que criar o Ministério da Pesca não necessita você ter um curso superior. Não precisa ser doutor ou mestre. É só olhar o mapa do Brasil para você perceber a quantidade de água que nós temos e que, portanto, uma atividade econômica importante como a pesca não poderia estar subordinada ao Ministério da Agricultura. Ou seja, a gente não planta peixe, a gente pesca peixe.
E, portanto, uma das primeiras coisas que eu fiz, em 2003, quando tomei posse, foi criar a Secretaria Especial de Pesca, muito a pedido de pescadores do Brasil afora. Pescadores de várias regiões do Brasil pediam para a gente criar o ministério e eu criei o ministério. E não estou arrependido de ter voltado para o terceiro mandato e ter criado o ministério outra vez.
Quem sabe, um dia, as pessoas percebam, nesse país, que o problema do Brasil não é ter 10, 15 ou 30 ministérios. O problema do Brasil é não ter os ministérios que cuidem das coisas específicas que necessitam ser cuidadas. Por que o Ministério da Mulher? Por que o Ministério dos Povos Indígenas? Por que o Ministério do Meio Ambiente? Por que o ministério específico que nós criamos para a pesca?
É porque nós queremos que o Brasil seja um país transformado numa nação em que a pesca faça parte da atividade econômica das pessoas. Não apenas porque temos 8 mil quilômetros de costa marítima, não apenas porque temos 12% ou 13% da água doce do mundo, mas porque, mesmo aonde tiver terra, se a gente cavar um buraco e a gente jogar água, a gente faz um tanque para a gente criar peixe. E não apenas tilápia, quem sabe algumas coisas até... Primeiro que eu gosto muito de tilápia, mas porque, também, tem outro tipo de peixe que a gente pode criar.
Eu, quando nasci, lá em Garanhuns, eu lembro que tinha um açude que não devia ser maior do que esse salão aqui. Um açude. E como eu só tinha 7 anos, eu achava que era o mar de tão grande que era. E, lá, a gente pegava piaba. Depois eu aprendi a pegar tilápia. Hoje eu pego pintado, eu pago pacu, pego tambaqui. Porque eu tenho, se vocês não sabem, pescadoras do Brasil, eu tenho mil peixes no lago da Alvorada e pesco eles.
Eu não tenho um anzol cor de rosa, mas o meu anzol não tem garra, é como se fosse um brinco, eu pego o peixe e solto o peixe, sem ele estar machucado, porque aquilo é quase que uma coisa esportiva e uma coisa que eu faço porque eu quero viver 120 anos e pescar é uma terapia, além de uma atividade econômica pra quem precisa da pesca para sobreviver. E sou bom pescador. Se vocês não sabem, eu já peguei, em Porto Murtinho, um jaú de 47 quilos, que a Janja não acredita que eu peguei esse peixe.
Peguei junto com o Zeca do PT, tinha muita gente no barco, muita gente no barco, que viu que eu peguei aquele peixe. Já cansei de pegar pintado lá em Porto Murtinho também. E, agora, essa semana, na Granja do Torto, um companheiro que trabalha lá pegou um pintado de 13 quilos. De 13 quilos. Tem fotografia, foto e filme para quem quiser ver. Eu, depois, vou mandar para as pescadoras saberem que é verdade.
Pois bem. Eu nunca consegui entender por que que um país tão pequeno como o Chile conseguia vender mais peixe ao mundo do que o Brasil. Eu nunca consegui entender por que que o Peru conseguia também ter mais pescado do que o Brasil. Então eu queria que a gente construísse uma verdadeira indústria de pesca, não só a indústria profissional, mas, sobretudo, a indústria familiar, de pequenas e pequenos empreendedores espalhados por esse país.
Porque, se nós temos 4,6 milhões propriedades rurais com menos de 100 hectares de terra, você pode, em cada propriedade dessa, você ter um, dois, três açudes e criar o tipo de peixe que você quiser. Do lado do peixe, criar galinha. Do lado do peixe, criar um porco. Do lado do peixe, criar o que você quiser e plantar o que você quiser. Agora, que é importante a gente educar as pessoas a criar um peixinho é muito importante, porque pescar é terapia. Pescar é uma grande terapia que eu acho que a gente tem que levar em conta.
E, sobretudo, quando a gente percebe, aqui na premiação, a grande participação das mulheres. As mulheres dando uma demonstração de que as mulheres não querem mais ficar prisioneiras de um erro histórico de que a mulher nasceu para casar, ter filho e cuidar da casa. Não. A mulher nasce para fazer o que ela quiser fazer, porque ela é dona do seu nariz.
Então, eu queria ler um pequeno texto aqui, que a minha assessoria fez com tanto carinho que, se eu não ler aqui, vai ser muito desagradável. Eles estão cansados de fazer discurso para mim e eu nunca leio, porque eu canso de ler. Mas eu vou ler aqui. Eu quero minha água aqui, meu amor. Eu quero minha água. Quem bebe água em uma garrafa dessa só pode ser um bom pescador.
Ora, eu vou ler esse pequeno texto aqui. Primeiro, não posso começar a minha fala de outra maneira que não seja parabenizar cada uma dessas mulheres pela premiação de hoje. E ressaltar que, se elas receberam um prêmio, nós fomos presenteados ao ouvir tantas histórias emocionantes e inspiradoras.
E é por isso que a noite de hoje tem um brilho especial. Não só pela energia sempre positiva de uma premiação. Mas, também, por falarmos de um tema que, em toda a história da humanidade, tem sido fonte de inspiração, mistério e vitalidade: a relação entre as mulheres e as águas.
Entre mitologias e crenças das mais distantes civilizações às culturas contemporâneas, as mulheres exercem um papel sagrado de guardiãs dos rios, dos lagos, dos mares e dos oceanos. De suas mãos, a água flui e nutre, sustentando todas as formas de vida que dela dependem.
Mas a conexão entre as mulheres e as águas vai muito além do papel de cuidado e nutrição. Ela é profundamente simbólica. As águas representam o ciclo da vida, a fertilidade e a renovação. Refletem a força, a resiliência e a grandeza das mulheres.
E o que nós ouvimos aqui, nas histórias da Joana, da Lilian, da Ofélia, da Maria José, da Myuki, da Joice e da Nara, são exemplos extraordinários dessas qualidades.
Por isso, quando falamos de mulheres, nunca é no singular. Vocês são únicas em suas histórias, mas também são várias. Vocês representam mulheres marisqueiras, indígenas, quilombolas, caiçaras, ribeirinhas, pantaneiras. Mas, também, mulheres gestoras, pesquisadoras e líderes. Empreendedoras. Mães. Mulheres que têm nas mãos, no olhar e na sabedoria os rumos de uma atividade, de uma comunidade, de uma família.
Mas, infelizmente, mulheres que têm sido historicamente silenciadas. Estamos falando de cerca de 500 mil pescadoras profissionais, quase metade do total de profissionais da pesca do Brasil. Apesar disso, o reconhecimento não está à altura da presença, da dedicação e da importância das mulheres neste setor.
É um trabalho invisibilizado, como tantos exercidos pelas mulheres. Invisibilidade que exclui ou limita o acesso à autonomia financeira, à ascensão profissional, à cidadania.
Não é aceitável que ainda tenhamos que conviver com depoimentos de trabalhadoras apontando o preconceito que sofrem e que faz com que muitas tenham medo de afirmar a sua identidade como pescadoras.
A afirmação e o orgulho de ser quem são devem ser valores invioláveis na vida de todas as mulheres deste país.
Hoje, portanto, mais que homenagear, este prêmio tem um papel muito importante de dar visibilidade para que estas mulheres sejam referências para outras mulheres e para tantas meninas.
Minhas amigas e meus amigos,
Meu governo tem um compromisso muito sério com o desenvolvimento de ações em defesa e de incentivo às mulheres brasileiras.
Porque acreditamos que não há democracia sem diversidade. Não há desenvolvimento social ou econômico sem inclusão. Não há justiça sem reparação histórica. Não há país forte sem reconhecimento e valorização da força, do trabalho e do saber de todas as suas mulheres.
Um compromisso, por exemplo, de combate à histórica desigualdade salarial entre homens e mulheres.
Basta olharmos para estas mulheres aqui para termos exemplos dessa desigualdade. São mulheres que exercem um trabalho árduo. Preparar arreios e redes, gaiolas, facão, canoa, remo. Acordar de madrugada, andar rio adentro, ou no mar, ou mangue, ou remar até o local mais adequado. Lançar a rede, subir rio, remar contra a maré. O dia inteiro assim. Sem falar no cuidado da casa e com os filhos, quando os têm.
Porque a gente sabe que, mesmo naquelas famílias em que o pai está presente, as mulheres ainda têm uma carga maior de trabalho. E ainda ganhando menos, em muitos casos.
Então, se temos que celebrar o aumento da renda do trabalhador em 11,7% – o maior em 30 anos – precisamos entender que isso não seria suficiente se a gente não tivesse, também, trabalhado pela equidade salarial entre homens e mulheres.
Por isso, garantimos em lei que homens e mulheres que exercem a mesma função recebam o mesmo salário.
Cuidamos também da saúde das mulheres brasileiras.
Veja a rotina que citei dessas mulheres. Ela expõe as mulheres a diversos riscos, como acidentes de trabalho, doenças de pele, doenças respiratórias. Por isso, o ministro André de Paula já está em conversa com a Fiocruz para formação de profissionais da saúde para que possam estar qualificados a atender as necessidades específicas da população pesqueira.
E fizemos mais.
Lançamos, no ano passado, o Programa Povos da Pesca Artesanal, que tem um olhar muito especial para as mulheres.
Promovemos a capacitação de mulheres em cursos voltados à aquicultura, para que se tornem multiplicadoras aquícolas.
Garantimos, ainda, que as mulheres tenham acesso igualitário a contratos de cessão de áreas para prática aquícola. Já são mais de 300 contratos celebrados com essas profissionais.
Definimos, para este ano, a prioridade para mulheres, jovens, quilombolas e indígenas no Programa Fortalecimento Produtivo dos Territórios Pesqueiros Artesanais.
Sem falar nas dezenas de ações que este Governo já lançou para incentivar uma maior participação das mulheres nas mais diferentes áreas.
Na pesquisa, por exemplo, investimos, pelo CNPq, R$ 100 milhões na seleção de projetos para incentivar a inserção de meninas na ciência, em áreas predominantemente masculinas como as exatas, engenharias e computação.
Além de destinarmos bolsas de estudo no exterior a mulheres negras, pardas, indígenas, quilombolas e ciganas pelo programa Beatriz Nascimento, envolvendo os ministérios das Mulheres, dos Povos Indígenas, e da Ciência, Tecnologia e Inovação.
Posso citar, ainda, o Auxílio-aluguel para vítimas de violência doméstica. A priorização das famílias que tenham mulher como chefe no programa Minha Casa, Minha Vida. A distribuição gratuita de absorventes para pessoas de baixa renda. Os benefícios no Bolsa Família a mulheres gestantes ou em fase de amamentação – lembrando que 17 milhões de famílias beneficiárias do programa são chefiadas por mulheres.
Amigas e amigos,
Este evento nos mostra que, para a construção de um país melhor, precisamos conhecer as histórias das mulheres para que possamos reconhecer seu potencial e valorizar o papel fundamental que exercem nos esforços para o desenvolvimento social, econômico e sustentável do Brasil.
Por isso, quero parabenizar todas as premiadas de hoje. Em nome de vocês, agradeço a todas as mulheres pesqueiras do nosso Brasil! Vocês nos fazem ter ainda mais orgulho deste país.
E quero terminar dando parabéns ao ministro André de Paula pela inteligente premiação que você promoveu nesta noite. Espero que isso sirva de alento para que as pessoas saibam que tem financiamento, tem financiamento para que as pessoas possam exercer uma atividade profissional de empreendedorismo. E a pesca é uma coisa muito importante, porque, além de produzir alimento saudável, vai produzir renda para aquelas pessoas que nela acreditaram e trabalharam.
André, meus parabéns. Ao teu ministério, meus parabéns a todos que trabalham com você. À sua esposa, que você chamou de amor, meus parabéns. Porque depois de 40 anos, o cara ser tão carinhoso com você ainda, eu acho que o André é um inovador nessa história de tratar com respeito e com carinho a sua digníssima esposa. Parabéns, André, certamente ela merece, senão você não faria isso apenas para enganar a gente aqui.
Parabéns. Parabéns ao casal, parabéns às pescadoras, parabéns aos pescadores que vieram aqui e parabéns a todos os convidados. Hoje é um dia marcante. Vale a pena a gente lembrar de uma coisa, vale a pena a gente lembrar de uma coisa que eu faço questão de dizer sempre. Preste atenção. Muito dinheiro na mão de poucos significa empobrecimento de uma nação. Significa gente com fome, significa desemprego, significa desnutrição, significa prostituição, significa violência. Pouco dinheiro na mão de muitos, significa exatamente o contrário, significa distribuição de riqueza, significa a gente construir uma sociedade de iguais. Uma sociedade onde todos trabalham, todos comem, todos têm acesso a lazer, a cultura e todos podem construir a sua família da forma mais harmônica possível, porque é isso que nós sonhamos. Viver bem, em harmonia, na nossa família e com nossos vizinhos.
Um beijo no coração e parabéns às nossas queridas pescadoras.
Quem não acreditou, eu vou mostrar para o ministro o pintado pegado no Torto. E ele foi solto. Ele foi solto. Eu não sei quanto tempo vive um pintado, mas esse pintado aqui é do tempo que eu era presidente até 2010. Eu tinha muito pintado lá. Depois, não sei o que aconteceu, sumiu muito e apareceu esse. Como eu não coloquei pintado novo lá, só pode ser o remanescente que vai viver, como o dono, 120 anos também. Mas depois eu vou mandar para as pescadoras. Quem tiver zap, eu vou mandar esse peixe para vocês saberem que eu sou um grande pescador. Eu vou mandar depois. Vou mandar fotografia do jaú de 47 quilos que eu peguei em Porto Murtinho, tá? Vou mandar para você colocar no teu gabinete o meu peixe.
No mais, gente, um abraço, beijo no coração. Décio, mais financiamento para as nossas pescadoras, Décio.