Pronunciamento do presidente Lula durante inauguração do Contorno do Mestre Álvaro, no Espírito Santo
Eu queria começar essa conversa dizendo da minha alegria de estar revendo o meu companheiro Perly Cipriano, que está aqui do lado. O Perly pensava que era comunista, mas, se tem um cara que é obrigado a acreditar em Deus, aqui no Espírito Santo, é o Perly. Porque, no dia 10 de julho de 1999, a gente estava indo de São Mateus não sei para onde, acho que voltando para Vitória, e a gente estava em uma turma, tinha três ou quatro carros. O João Coser me chamou e eu vim, mudei de carro. Eu estava no carro, exatamente o carro que pegou fogo e fui em uma blazer dirigida pelo companheiro João Carlos Coser. A minha secretária, que estava comigo no carro, foi na blazer. A gente não deixou ela ir, porque era preciso ficar no outro carro. E o companheiro Perly estava no carro de trás. No carro do companheiro Otaviano, que era o deputado nosso estadual, que faleceu.
Naquele dia, Renan, naquele dia, para os mais jovens que estão aqui, a gente estava tranquilo, tinha parado no posto, tinha enchido todos os tanques dos carros. Estávamos muito tranquilos, era uma subida, ninguém estava em alta velocidade e o tráfego parou. Eu parei, na verdade eu não parei, o Coser parou o carro dele, parou um carro atrás e atrás parou um Fiat que estava o companheiro Perly e o companheiro Otaviano. E a Bete, que era minha secretária. Bem, daqui a pouco veio um caminhão e, de forma desgovernada, não sei o porquê, o caminhão bateu no carro do Perly, estourou o tanque de gasolina e o carro deles pegou fogo. A Bete, a única coisa que eu lembro é que eu estava no carro da frente e eu ouvi as pessoas gritarem: "Vamos sair daqui que o carro vai explodir, vamos sair que o carro vai explodir". E um monte de caminhoneiro parava, pegava o extintor de incêndio e quase nenhum extintor conseguia funcionar, em uma demonstração de que faltava, como é que fala, investigação, para saber se os caminhões, quando vão, se nos carros, os extintores estão funcionando. Aí tentou-se abrir a porta. O Perly conseguiu sair. Eu encontrei com o Perly quando eu desci do carro. Parecia um bife ambulante. O Perly estava cheirando a carne assada, com o rosto todo queimado. E nós fomos para tentar ver o Otaviano. O Otaviano, sentado no carro, aquela proteção que tem no volante do carro para o cara não morrer na batida, pegou fogo. O Otaviano não conseguiu abrir o cinto de segurança. Nós tentamos abrir a porta do carro com machadada. Não conseguimos abrir a porta. E morreu, dentro do carro, o Otaviano e a minha secretária, Bete, que morava na cidade de Santos.
Aquele foi, possivelmente, um dos momentos mais tristes que eu vivi na minha vida e por isso que eu fiquei feliz de estar encontrando o companheiro Perly Cipriano, bonito, forte, rindo. E, ainda, com boné vermelho na cabeça. Agora eu também tenho muitas alegrias aqui no Espírito Santo. Aqui eu construí muitos amigos. Aqui eu tenho certeza que, no mandato de 2003 a 2010, eu fui o presidente da República que mais investi dinheiro neste estado. Nenhum governador, de qualquer partido político que fosse, poderia dizer que um dia a gente o destratou. Porque a gente tratou todo mundo com respeito. O Gerson Camata era o companheiro que mais falava: "Presidente Lula, nunca um governador do Brasil colocou tanto dinheiro aqui como o senhor colocou". E o Gerson Camata foi vítima, também, de uma desgraça, de um irresponsável que o matou.
Mas eu tenho recordações maravilhosas das quantas vezes eu vim aqui nesse estado. Eu viajei na construção da quantidade de amigos que eu fiz aqui. Mas o que me deixa saudade mesmo é que aqui foi o estado que a gente elegeu o companheiro Vitor Buaiz, prefeito da capital pela primeira vez. Em 2002, elegemos o primeiro governador do estado aqui, o companheiro Vitor Buaiz, um médico da maior competência, médico muito competente, que só cometeu um erro, Casagrande, ele acreditou demais no Governo Federal, que não ajudava como a gente faz. Ele acreditou demais e o Vitor Buaiz perdeu as eleições. Depois, não tinha reeleição naquele tempo e o Vitor Buaiz foi uma pessoa que eu guardo dele a melhor recordação de relação entre dois seres humanos. Eu sei que ele queria vir aqui, não pode vir, porque a mulher dele acho que teve um problema. Mas, vocês, quando encontrarem com o Vitor Buaiz, deem um abraço nele e digam que ele continua morando nesse coração velho aqui, que não sabe deixar nenhum amigo para trás.
A segunda coisa da minha relação com este estado aqui, da minha relação com as cidades do interior. Da quantidade de coisas que a gente pode aqui vir inaugurar. E fazia um tempo que eu não vinha aqui. Fazia um tempo. E eu queria fazer uma pergunta para vocês. O nosso país, ele passou por um momento muito difícil. Muito difícil. É que eu não estou indo muito para esse lado, porque esse lado está sol e eu não posso. Eu queria fazer uma pergunta para vocês. Eu quero que vocês sejam honestos aqui. Não honestos comigo, honestos com vocês mesmo. Se algum de vocês se lembra de um metro de rodovia inaugurado pelo governo passado neste estado. Se alguém souber, me conte. Porque em todos os estados, Casagrande, em todos os estados da Federação que eu vou, em todos, eu pergunto para todo mundo se alguém lembra uma obra que aquela coisa inaugurou. Eu vou dar um exemplo para vocês. Eu vou dar um exemplo para vocês. O companheiro Casagrande falou, o nosso prefeito falou e o nosso ministro dos Transporte, falaram aqui aqui. Olha, nós começamos a governar este país, é uma situação inusitada, nunca houve, no mundo político, uma situação dessa. Faltava dois meses para tomar posse e nós tivemos que começar a governar este país, porque este país não tinha, sequer, orçamento para que a gente administrasse 2023. E ainda colocamos, na PEC de Transição, dinheiro para pagar as contas dele. De um cidadão que não merecia nenhum respeito. Porque é verdade que ele não inaugurou nenhuma obra aqui, mas ele inaugurou o ódio, o ódio entre filhos, o ódio entre pais, a mentira, as mais deslavadas mentiras. As intrigas entre família. Tem família que não conversa mais. Tem pai que não conversa com o filho. Tem filho que não conversa com mãe. Tem irmão que não conversa com irmão. Por causa de uma facínora que pregou o ódio durante quatro anos nesse país. Mentiu e pregou o ódio. Vê se alguém lembra quantas faculdades ele inaugurou. Vê se alguém lembra quantas escolas técnicas ele inaugurou. A verdade, Casagrande, é que eu vou contar uma novidade para você. Em 4 anos que ele governou este país, ele gastou, nos transportes, em 4 anos, gastou 21 bilhões de reais em quatro anos. Nós, em apenas um ano de 2023, já colocamos 23 bilhões de reais no transporte. Isso vale para o transporte. Vale para a educação. Isso vale para a saúde. Isso vale para qualquer coisa, inclusive para financiamento. Para financiamento do pequeno e médio produtor rural. A política de crédito que nós estamos fazendo para o pequeno e médio empresário, para o pequeno e médio empreendedor individual, é quatro vezes, neste ano, o que ele fez em quatro anos. Este país saiu de um momento de tortura para voltar para um momento de paz, de tranquilidade, de crescimento econômico, de geração de emprego e distribuição de riqueza.
Se preparem, porque muita coisa boa vai acontecer neste país. Se preparem, se preparem, porque o emprego vai crescer. Junto com o emprego vai crescer o salário. Se preparem, porque nós vamos criar uma poupança para o ensino médio, para que nenhuma menina e nenhum menino desista de fazer o ensino médio e ainda aprender uma profissão. Se preparem, porque nós vamos fazer escola em tempo integral neste país, para que a gente possa colocar as crianças o dia inteiro na escola. Se preparem, porque eu tô com o compromisso de fazer mais 100 institutos federais neste país. E fazer mais universidades neste país.
Se preparem, porque a gente vai provar que o que resolve o problema de um povo não é a instigação do ódio. Utilizando a boa fé do povo evangélico para mentir, dizendo que a gente ia fechar igreja. Dizendo que a gente ia fazer banheiro unissex. Dizendo que a gente ia fazer isso ou aquilo. Eles tem que saber de uma coisa. Eles tem que saber de uma coisa: se tem um cara neste país que acredita em Deus é este que está vos falando aqui. Porque somente Deus é que poderia fazer um menino de 5 anos de Garanhuns, com sete irmãos, predestinados a morrer de fome, sair de um pau de arara de Pernambuco, andar 13 dias até São Paulo. Chegando lá e encontrando meu pai com outra família, a minha mãe se separou do meu pai, nós fomos morar sozinho. E esse filho, que escapou da morte até os 5 anos de idade, que não teve diploma universitário, é o presidente da República mais eleito deste país. Isso só pode ser coisa de Deus. Não tem outra explicação. Não está escrito nos livros de história. Não está escrito nos livros de sociologia. Não está escrito nos livros de filosofia. Somente Deus é que poderia fazer que um filho de dona Lindu, semianalfabeto, que não morreu de fome, fosse eleito três vezes presidente da República deste país.
E voltamos. Voltamos porque eu quero provar mais uma vez. É preciso provar. Eu quero provar mais uma vez que o metalúrgico, torneiro mecânico, pode fazer por esse país o que, em 500 anos, a elite brasileira não fez pelo povo brasileiro. Porque o ódio contra nós é porque eles não gostam de trabalhador pobre. Eles não gostam de negros. Eles não gostam de liberdade e autonomia das mulheres. As mulheres têm que ser objeto. Não. A mulher é cidadã, é sujeito da história. E ela não tem que pedir licença para ninguém. Ele não gosta de LGBT. Não gosta de negro. Não gosta de nada que não seja o tradicional neste país. E é tudo que eu gosto. É tudo que eu gosto. Eu gosto de gente. Eu gosto de ser humano. Eu tenho sentimento. Eu não sou algoritmo. Eu sou um ser humano com sentimento. Que eu governo com o coração. Eu estou aqui, mas eu tô sentindo o batimento do coração de vocês. E o nosso coração bate no mesmo ritmo, por um Brasil mais justo, por um Brasil mais saudável, por um Brasil mais desenvolvido. Por um Brasil que não tem que esperar 40 anos para fazer uma operação na artéria de transporte mais importante da Serra. Essa coisa poderia ter sido feita em 2013, a 8 anos atrás, a 10 anos atrás. Mas não fez. E ela só foi sendo tocada – e eu quero agradecer aos deputados, à bancada do Espírito Santo, que colocaram dinheiro para essa obra não parar. Por isso, gente, eu queria pedir para vocês uma coisa: quando a gente vem para um palanque como este e a gente traz um deputado, ou um senador, de outro partido político, é importante que vocês não os tratem como adversários. Porque nós precisamos trabalhar junto com eles, dentro do Congresso Nacional. A gente vai disputar na época da eleição, mas, depois da eleição, eu preciso governar. De 513 deputados, o PT só tem 70. Então, nós precisamos conversar com muita gente. Nós precisamos tentar convencer as pessoas. E é assim que a gente governa. É assim que o Casagrande governa. É assim que o Renan governou. É assim que o prefeito de Serra governa. E é assim que a gente vai recuperar este país.
Ontem eu participei da Conferência Nacional da Juventude. Mais de 3 mil jovens estavam lá. E a juventude é uma preocupação permanente minha. Porque eu tenho cinco filhos. Eu tenho oito netos. E tenho uma neta. E eu sei que no coração de cada mãe que está aqui, eu sei que no coração de cada pai que está aqui, a preocupação maior não é deixar fortuna para o filho, não. É deixar a educação para que o filho possa ter uma profissão, se formar e ajudar a construir sua família e viver decentemente. Eu sei que cada um de vocês quer ter um emprego de melhor qualidade, quer ter mais oportunidade e é isso que a gente vai fazer, através de investimento em educação. E vocês tem que ajudar. Cada mentira que vocês verem na internet, desminta na hora, não fique quieto, não deixe a mentira vencer a verdade. Não fique com medo dos desaforados. Não fique com medo do garganta, do cara que acha que pode, do cara que bate em mulher. Minha mãe era analfabeta. E a minha mãe dizia para mim: "Meu filho, se um dia você tiver que levantar a mão para bater na sua mulher, é melhor que a sua mão caia". E é assim que nós, homens, temos que nos comportar. Nunca levantar a mão para bater em uma mulher, por mais errada que ela esteja. Porque, se você desrespeitar sua companheira, o seu filho e a sua filha vão crescer com isso na cabeça e a gente tem que trabalhar a vida inteira para que o filho da gente e a filha da gente sejam melhores do que a gente, tenham mais sorte que a gente, ganhem mais do que a gente e vivam melhor do que a gente.
Por isso, Casagrande, é um prazer. Eu tenho ainda três anos de mandato. Você tem três anos de mandato. E você pode ficar certo que a gente vai resolver o problema das ferrovias que o Renan falou. Que a gente vai resolver o problema das rodovias que ele falou. Mas a gente quer resolver de forma prioritária, a garantia de que, neste país, nunca mais, uma criança vá dormir com fome por falta de um copo de leite. A gente quer garantir que todas as pessoas tenham oportunidade de um trabalho decente e digno. A gente quer garantir que qualquer criança, qualquer adolescente, independente da origem que ele nasceu, independente do bairro que ele mora. Independente da casa que ele mora. Ele tem direito de disputar uma vaga na universidade com o filho do mais rico deste estado. Nós não queremos tirar nada de ninguém. Nós queremos apenas dar chance a quem nunca teve chance nesse país. Nós queremos comer comida de qualidade. Vestir roupa de qualidade. Usar sapato de qualidade. Namorar no final de semana. Comer uma moqueca capixaba. Comer um churrasco. E viver bem com a nossa família. É esse mundo que nós temos que construir. E é esse mundo que eu prometo a vocês, junto com vocês, ninguém impedirá que a gente construa.
Um beijo no coração de cada uma de vocês, de cada um de vocês. Até a próxima oportunidade, se Deus quiser.