Pronunciamento do presidente Lula durante a reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável
Eu tinha dito ao companheiro Padilha (Alexandre Padilha, ministro das Relações Institucionais) que eu não ia fazer o uso da palavra porque eu estou com a voz muito rouca. E também porque eu estava sentado de frente e eu percebi que, pelo adiantado da hora, muita gente teve que levantar e ir embora. Isso quando a gente está no sindicato é um horror. Você convoca uma assembleia e, antes de você votar as coisas principais, tanta gente precisa falar que quando você vai votar as coisas principais, não está quase ninguém que estava no começo da assembleia. Aí, a gente aprendeu, Padilha, que o principal, o principal é você dar atenção e cumprir o horário. Eu sei que eu não cumpri o horário hoje, sei que vocês estavam aguardando aqui há muito tempo. Hoje foi um dia um pouco complicado, mas eu queria trazer a lição que eu aprendi hoje aqui.
Vocês perceberam que não é difícil governar um país. Não é difícil governar uma cidade ou um estado. Basta que a gente tenha a capacidade de ouvir as pessoas e aprender com as pessoas. Eu estava imaginando todas as pessoas fazendo a apresentação dos grupos de trabalho. Eu imaginava uma mãe indo ao médico e descobrindo que vai ter um filho. E é maravilhoso porque o filho está aqui em todas as coisas que vocês fizeram. Agora, o ano que vem, a gente já descobriu que tem a criança, a gente vai ter que fazer ela andar. A gente vai ter que ensinar ela a andar. Ela vai aprender a comer e ela tem que crescer.
Então, qual é a próxima discussão que nós temos que fazer, Padilha? Nós precisamos fazer um estudo de viabilidade econômica de quanto será o investimento. Veja que eu não estou falando da palavra custo, nem gasto, de quanto será o investimento para a gente colocar essas coisas maravilhosas que vocês detectaram que é preciso fazer, para o Brasil dar certo. Quanto vai custar a gente fazer esse investimento? Porque aí é que entra a decisão política.
Se a gente vai dizer, como historicamente se disse nesse país: “é muito caro, eu não vou fazer”. E a gente não pergunta quanto custa não fazer as coisas na época certa. Quanto custou a esse país não tomar as decisões na época certa? A gente poderia ter resolvido muitos problemas, mas tudo custa muito, tudo é gasto e, portanto, a gente não pode fazer.
Recentemente, eu fiz uma reunião com os bancos públicos brasileiros, que foram os bancos que salvaram esse país da crise de 2008. Eu fiz uma reunião e todos eles me disseram o seguinte: está proibido emprestar dinheiro para estado, está proibido emprestar dinheiro para município. Ou seja, se você tem um município que está com as contas em dia e o estado com as contas em dia, qual é o crime um banco emprestar dinheiro para esse município? Qual é o crime esse banco financiar uma obra?
Nós passamos os últimos anos com o BNDES devolvendo parte do dinheiro que o Tesouro tinha colocado no BNDES para enfrentar a crise. E vocês sabem que nós saímos daquela crise com um crescimento de 7,5% e com o varejo crescendo quase a 14%. Então é uma decisão que a gente vai ter, depois da sabedoria de vocês, de produzir as soluções, de apresentar para nós um conjunto de propostas que a gente possa saber quais delas poderão ser aplicadas para a gente dar uma guinada e mudar os rumos desse país. Ou se a gente vai querer continuar sendo um país que tudo está ligado a muito gasto, tudo está ligado ao fato de a gente ser pobre e a gente nunca consegue fazer e continua pobre até o final do século XXI outra vez.
Quanto custou para esse país não fazer as coisas corretamente quando a economia crescia 14% ao ano na década de 70? E quando chegou em 74, a gente continuava pobre e a gente não tinha feito as coisas. Quanto custou a esse país não ter resolvido o problema da educação na década de 50, na década de 60? Quanto custou a esse país não fazer investimento em ciência e tecnologia no momento certo?
Ou seja, tudo para nós é sempre atrasado, sempre é mais difícil. Foi assim a nossa independência, foi assim o fim da escravidão, foi assim o voto da mulher e foi assim a criação de universidade nesse país. Eu digo sempre, não canso de repetir: o Brasil foi descoberto em 1500, a primeira universidade nossa foi feita em 1920, 420 anos depois. O Peru foi descoberto, a América, em 1492, oito anos antes do Brasil; em 1554 já tinha a Universidade de São Marcos no Peru.
Então a pergunta que eu faço sempre é essa: quando é que a gente vai tomar a decisão de dar o salto de qualidade? E aí é que entra a decisão política. Não é decisão de mercado, não é apenas uma questão fiscal, é a gente nesse conselho discutir que país a gente quer para a próxima década. Porque se for necessário esse país fazer um endividamento para esse país crescer, qual é o problema? Qual é o problema de você fazer uma dívida para produzir ativos produtivos para esse país? Para investir mais em matemática? Eu, por exemplo, disse ao ministro Camilo (Santana, da Educação) hoje: eu não quero saber onde a gente vai ter dinheiro, mas eu quero nos próximos anos 100 institutos federais nesse país, para que a gente cubra a nossa deficiência.
Nós acabamos de anunciar uma faculdade de matemática no Rio de Janeiro, para a gente aproveitar os gênios que esse país tem, que participam das Olimpíadas da Matemática, ganha uma medalha de ouro e depois não têm a chance de estudar no Brasil. Nós vamos, criamos a faculdade, vamos fazer uma experiência com 100 alunos num ano, 100 no outro, até chegar a 400 alunos com apartamento para eles morarem e com salário para eles receberem. Chega dos nossos gênios terem que sair do Brasil para sobreviver. “Ah, vai custar 25 milhões, 30 milhões”... Paciência. Temos que arrumar dinheiro, temos que fazer.
Então, a lição que vocês me deram hoje é a seguinte: nós temos o caminho das pedras. Nós temos que decidir agora se nós vamos fazer, retirar essas pedras ou não. Ou se a gente vai chegar à conclusão de que: “Olha, por um problema da lei de responsabilidade fiscal, por um problema de superávit primário, por um problema disso, por um problema de inflação, a gente não pode fazer. E vamos todo mundo nos animar e voltar para a nossa vidinha, sendo o que é. Um ano ganha, um ano perde, um ano ganha, um ano perde.
A massa salarial de hoje é menor do que a massa salarial de 2010. É um retrocesso. Esse país ficou seis anos sem reajustar a merenda escolar. Esse país ficou seis anos sem reajustar ciência e tecnologia, bolsa de estudo. Aonde que a gente vai se a gente continuar assim? Então eu queria dizer para vocês: obrigado por vocês terem a inteligência que faltava a mim. De vez de quando o cara fala: porra, Lula, é preciso fazer um grupo de inteligência artificial. Ô, gente, com a inteligência que eu vi aqui, para que eu quero inteligência artificial? Vamos utilizar a nossa inteligência humana e vamos levar em conta o que essa inteligência é capaz de produzir. Artificial é de graça, é barata, não paga imposto? Não, vamos aproveitar a nossa inteligência e vamos tentar colocar em prática aquilo que vocês fizeram.
Eu vou terminar dizendo o seguinte: tudo o que eu vi vocês apresentarem, tem um pequeno problema. Eu pensei que ia tirar um descanso do dia 26 de dezembro ao dia 3 de janeiro e já vi que eu vou levar todo esse material para ler, porque eu tenho que aprender a decorá-los para quando encontrar com vocês, eu saber das coisas que vocês produziram. Isso chama-se simplificar a arte de governar. Ou seja, eu não tenho que ser um gênio. Eu não tenho que saber de tudo. Eu só tenho que ter capacidade de ouvir. E de ouvir e de aprender. E é isso que vocês fizeram comigo hoje, tá? Me deram uma lição. A nossa inteligência está viva, é humana, é homem, é mulheres, é branca, é preta, é baixa, é alta, é gente. E é esta gente que tem que produzir a solução para esse país.
Portanto, queridos companheiros, muito obrigado. Vocês não sabem a alegria que vocês me deram, de que eu vou começar o ano de 2024 dizendo uma coisa para vocês: eu fui para Hiroshima em 2023. Eu fui participar do G7. E no G7 estava um pessimismo muito grande. Eu encontrei com uma mulher que era presidenta do FMI. E essa mulher é muito agradável, muito simpática. Tá certo que o Brasil não deve mais. Muito agradável, sabe? Ela vem: ‘presidente, a situação econômica não está muito boa, porque a economia não vai crescer na China’, sei lá onde. Não falou das guerras, estou falando da China e tal. E o Brasil só vai crescer 0,8%. Ou seja, 0,8%.
Eu falei: mas quem disse isso para a senhora? “Não, os nossos estudos”. Eu falei: você está enganada. Então, a senhora vai encontrar comigo no final do ano e a senhora vai ver que a nossa economia vai crescer mais do que 0,8%. Agora, quando a gente conversa com o economista, é a mesma conversa. É a mesma conversa: não, porque a China não está bem, porque a Europa não está bem, porque a Rússia está em guerra com a Ucrânia, porque Israel e Faixa de Gaza estão se matando, e a economia não vai bem. Não vai bem, não vai bem. Eu vou dizer um exemplo para vocês: quem não está bem é a cabeça de quem pensa assim. Porque nós somos um país de 200 milhões de habitantes, um país que só esse ano, só nesse ano, cresceu, abriu 71 novos mercados para o nosso agronegócio. 71 mercados novos.
Esse país que tem um projeto de investimento de R$ 1,7 trilhão, que é o PAC Novo, esse país que tem um compromisso de fazer mais dois milhões de casas novas, além de recuperar as outras 187 mil casas que não foram construídas, esse país que tem quase 10 mil obras de construção que vai ser começada agora. Porque o que nós fizemos nesse primeiro ano foi o que vocês fizeram, o que vocês fizeram é exatamente o que nós fizemos, a gente teve que arrumar a casa. A gente teve que consertar, colocar as coisas no lugar e eu tenho dito o seguinte: se preparem, porque o ano que vem a economia brasileira não vai decepcionar.
Hoje eu fiz uma reunião. Nós emprestamos R$ 10 bilhões para o governo de São Paulo, mais dinheiro para o Mato Grosso, mais dinheiro para o Pará, mais dinheiro para Santa Catarina, mais dinheiro para o Ceará, dinheiro de banco público. E aí eu estava vendo o discurso do presidente da Caixa Econômica: “Porque, presidente, esse ano, sabe, nós emprestamos o dobro do que foi emprestado nos quatro anos passados”. Aí eu ouvi a menina do Banco do Brasil: ‘Porque, presidente, nós emprestamos esse ano o dobro de tudo que foi emprestado no ano passado’. Aí eu converso com a Luciana (Santos, ministra da Ciência, Tecnologia e Inovações do Brasil), ela fala: “presidente, em ciência e tecnologia, nós investimos nesse ano 4 bilhões, é mais do que tudo que foi investido em quatro anos passados”. Aí vem Aloizio Mercadante do BNDES e fala: “Presidente, esse ano nós estamos investindo 56 bilhões, é dez vezes mais do que o ano passado”. Aí vem o Fávaro (Carlos Fávaro, ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento do Brasil) e fala: “porque o Plano Safra é o maior da história”. Aí vem o Paulo Teixeira (ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar do Brasil) e fala: “porque é o maior da história”. Eu fico me perguntando, aonde que esse dinheiro vai parar? Esse dinheiro vai começar a gerar emprego no ano que vem. Esse emprego vai começar a gerar consumo no ano que vem. Esse dinheiro vai começar a gerar melhoria da vida do povo.
Vocês estão lembrados que nós fizemos uma campanha muito grave do Desenrola, porque 72 milhões de brasileiros estão devendo, 72 milhões de brasileiros estão devendo, o Brasil está quebrado, o Brasil está quebrado. Não era isso que a gente ouvia durante a campanha? Pois bem, nós fizemos um programa genial. Se o pessoal que discute o Prêmio Nobel da Economia estiver me ouvindo, ele precisa pegar a turma de transição nossa, a turma de transição da minha campanha e a turma do Haddad (Fernando Haddad, ministro da Fazenda) e dar o Prêmio Nobel da Economia, porque nada é mais inteligente do que o Desenrola. Mas desses 72 milhões, só apareceram 10 milhões de pessoas para fazer a renegociação. E desses 10 milhões, 8,7 milhões até 100 reais.
Então, companheiro Paulo Câmara, cadê os devedores que não apareceram fazendo negociação de até 90% de desconto? Eu não sei se é por causa da publicidade nossa, mas nós vamos continuar. Vou prorrogar a data, porque se tem “nêgo” devendo, nós queremos que ele pague o mínimo possível para que ele volte a ser cidadão, para que ele volte a consumir nesse país, porque somente com consumo vai ter indústria, somente com indústria vai ter salário, somente com salário vai ter distribuição de renda, é tão simples assim.
Então, queridos companheiros e companheiras, obrigado pelo depoimento de vocês, obrigado pela produção intelectual, da inteligência humana de vocês, que eu não sei se a artificial seria capaz de fazer tudo que vocês fizeram.
Parabéns a vocês e até a nossa próxima reunião.