Pronunciamento do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no lançamento do Compromisso Nacional Criança Alfabetizada
TRANSMISSÃO | Anúncio do Compromisso Nacional Criança Alfabetizada
É muita gente.
Eu, primeiro, quero pedir desculpas a vocês para não ler a nominata porque tem muita gente aqui e essas crianças daqui a pouco estarão com fome, precisam comer. E nós temos que ser rápidos nesse ato de lançamento desse programa extraordinário que é alfabetizar nossas crianças.
A primeira coisa, é que é uma coisa tão simples, é uma coisa tão fácil, é uma coisa tão visível para todos nós que deveria acontecer todo ano. Mas, lamentavelmente, no Brasil tivemos um período muito obscuro nesse país em que os entes federados não conversavam entre si. Muitas vezes governador não conversava com prefeito, prefeito não conversava com governador, ninguém conversava com o presidente da República e ele não conversava com ninguém e as coisas não aconteciam. É por isso que na pandemia as nossas crianças tiveram um prejuízo enorme na questão educacional. O governador do Mato Grosso disse uma coisa importante aqui. Possivelmente, quase todos os governadores, pelo menos os mais velhos, estudaram em escola pública. Se a gente for analisar, grande parte dos grandes intelectuais brasileiros estudaram em escola pública.
Se você quiser falar o Antonio Candido, se quiser falar Florestan Fernandes, todos eles têm origem na escola pública. O que aconteceu que a escola pública decaiu tanto que, hoje, se você chegar numa cidade e perguntar para o prefeito: "a tua educação é boa"? Ele vai dizer que é. Aí você pergunta: "teu filho estuda na escola boa da tua cidade"?. "Não, ele estuda numa particular". E por que que acontece isso? E por que que um setor da classe média brasileira fugiu do ensino público? Por causa da qualidade. Na medida em que você fez cair, sabe, a questão do salário, na medida em que você aprova, sabe, que todo mundo vai estar na escola pública, você coloca escola pra todo mundo, é preciso melhorar a qualidade e a qualidade não melhorou de acordo com a necessidade da população.
Então, é normal que um advogado procure uma escola particular pro filho, que o prefeito, que um deputado, que um pequeno empresário, pequeno empreendedor, ou seja, tem gente que gasta quase metade do salário que ganha para garantir o seu filho numa escola particular porque a escola pública não atingiu ainda esse grau educacional que a gente entende que seja perfeito para o nosso povo. O que nós estamos tentando fazer é dar um outro passo para ver se a gente faz com que no ensino fundamental as crianças saiam altamente mais preparadas do que hoje. Quem é mais velho sabe que a escola pública já teve qualidade. Era pra poucos, mas ela tinha qualidade.
Eu até brinco com a Nísia. A escola pública tinha dentista, a escola pública tinha médico, que ia, uma vez a cada tempo, na sala de aula conversar com as crianças, levava as crianças no laboratório para fazer um tratamento bucal. Isso tudo acabou. Isso tudo acabou.
Ou seja, nós chegamos ao ponto em que muitas crianças, na periferia dos grandes centros urbanos iam pra escola, muitas vezes, por conta da chamada merenda escolar — que hoje não se chama mais merenda escolar, é alimentação. Veja o absurdo que nós chegamos. Então, o que o Camilo está propondo aqui é a gente voltar a fazer o que todos nós sabíamos que tinha que ser feito sempre e que não foi feito. E o Camilo, ele traz nas costas dele uma responsabilidade muito grande. Eu digo pra todo mundo, companheiros, que o Haddad foi o melhor ministro da Educação que esse país teve. Durante toda a história desse país. Talvez não o maior educador, mas foi o melhor ministro da Educação, porque nós tivemos gente extraordinária que trabalhou aqui.
E o Camilo vai ter que fazer mais. O Camilo vem do estado que tem a melhor experiência educacional desse país. Se você quiser discutir Olimpíadas da Matemática, o Ceará sempre foi o estado que teve na frente. Se você quiser discutir a qualidade do ensino fundamental, o Ceará sempre esteve um pouco na frente. E, pasmem, é que 36% dos estudantes do ITA [Instituto Tecnológico de Aeronáutica] são cearenses. Demonstra que lá aconteceu alguma coisa que falta acontecer em outros estados desse país. E que, portanto, a gente não tem nenhuma vergonha de dizer: "quem bom, Camilo, que você vem trazer pro governo federal a experiência mais bem sucedida no ensino fundamental desse país nas últimas décadas".
Bem, dito isso, quando andamos na rua levando uma criança de 7 ou 8 anos de idade, não pensamos duas vezes. Seguramos sua mão para que chega ao destino livre dos perigos do mundo. Quando o poder público falha precisamos fazer a mesma coisa: dar as mãos aos pequeninos que não sabem se defender, proteger os seus direitos e o seu futuro antes de qualquer coisa. É exatamente esse o sentido do Compromisso Nacional da Criança Alfabetizada.
Em 2021, mais da metade de nossas crianças terminaram o segundo ano do ensino fundamental sem conseguir ler ou escrever. Mais de 1 milhão de crianças foram largadas à própria sorte no processo de alfabetização. Isso não aconteceu porque os professores falharam. Os professores sabem, e muito, o que devem fazer em sala de aula.
Isso também não é um erro das famílias. Qualquer pai ou mãe sabe que a educação é o caminho para uma vida melhor para suas crianças e incentiva estudo acima de tudo. A grande verdade é que o atraso na alfabetização ocorre porque o estado brasileiro falhou miseravelmente nos últimos anos. Falhou porque achou que repassar recursos para as escolas de ensino fundamental era gasto e iria comprometer o tal do equilíbrio fiscal; falhou porque não garantiu a alimentação escolar de qualidade; falhou porque quando a pandemia levou ao fechamento das salas de aula o governante anterior não cobrou soluções emergenciais para a educação, preferiu o negacionismo e o discurso do ódio. O resultado não poderia ser outro.
Mesmo tendo uma rede de educação pública em todo o território nacional, aprimorada ao longo de décadas de experiência e de cooperação entre a União, os estados e os municípios, o Brasil sofreu vergonhosos retrocessos — retrocessos que nunca mais devamos permitir que aconteça nesse país. Hoje estamos virando essa página, estamos dando fim ao fim ao descaso e às disputas menores para nos concentrarmos no que realmente importa: as nossas crianças que precisam, mais do que nunca, de adultos que lhes deem as mãos e a garantida proteção.
Minhas amigas e meus amigos,
O Compromisso Nacional Criança Alfabetizada é por definição uma ação conjunta. É uma aliança que une o Governo Federal, os governos estaduais e as prefeituras em torno de ações que vão rapidamente reverter o terrível quadro revelado na pesquisa do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, o popular Inep. O Compromisso não é uma ideia que o Ministério da Educação tirou do seu chapéu. Pelo contrário, foi construído após muito diálogo com especialistas e gestores dos demais níveis federativos. Ele nasceu da colaboração e com a cooperação sairá do papel e fará diferença nas salas de aula.
Os governadores que aderirem ao Compromisso — e tenho certeza de que todos os 27 farão isso — serão responsáveis por estabelecer, em conjunto com seus municípios, as políticas locais de alfabetização. Temos iniciativas feitas com os pês no chão, de acordo com a necessidade e a realidade local e não concebidas à distância ou em um gabinete na Esplanada dos Ministérios.
Já o Governo Federal investirá R$ 1,950 bilhão no Programa em 2023, e mais R$ 550 milhões por ano, entre 2024 e 2026. Serão recursos para a formação de professores e gestores, para materiais de ensino, e mesmo para a infraestrutura das escolas. Juntos, vamos garantir que 100% das crianças estejam alfabetizadas ao concluir o 2º ano do ensino fundamental. E mais. Vamos correr atrás do tempo perdido e dar um apoio especial para as crianças do 3º ao 5º ano que tiveram a sua aprendizagem atrasada nos anos anteriores. Nosso compromisso é claro: nenhuma criança brasileira ficará para trás.
Estados, municípios e especialistas, os gestores e os professores, mostrarão que juntos somos capazes de ajudar as nossas meninas e meninos a superarem os males que pandemia e o descaso causaram a elas. Não há nada mais importante do que garantir que as crianças exerçam os seus direitos, inclusive, o direito de serem alfabetizadas.
Amigas e amigos,
Desde o início do governo temos priorizado os investimentos em educação. Depois de anos corroídos pela inflação, as bolsas para formação de professores da educação básica tiveram reajustes de 40 a 75% no mês de fevereiro. Em 2023 serão concedidas mais de 125 mil bolsas desse tipo. Em março, fizemos reajuste de até 39% nos repasses do Programa Nacional de Alimentação Escolar, o PNAE. Com isso, aumentamos em R$ 1,5 bilhão os valores para a alimentação, que chegarão ao total de R$ 5,5 bilhões este ano.
Em abril, anunciamos um pacote de R$ 3 bilhões para prevenção e combate à violência nas escolas públicas de educação básica. O ambiente escolar continuará sendo (como sempre deveria ter sido) o espaço da harmonia e da aprendizagem. Não deixaremos nunca que o discurso do ódio das redes tome conta de onde é construído o futuro do nosso país. Em maio, assinei a medida provisória do Pacto Nacional pela Retomada de Obras da Educação Básica. São cerca de R$ 4 bilhões para concluir 3.500 construções que estão paralisadas ou inacabadas em todo o país, incluindo quase mil escolas de ensino fundamental.
Tudo isso, contudo, é apenas o começo de uma grande construção coletiva, de uma tarefa que continuará exigindo os esforços de cada um de nós, do Governo Federal, estadual e dos municípios. E que, tenho certeza, seguirá contando com a mais profunda dedicação de cada um de vocês que estão aqui. Faremos tudo isso pelas nossas crianças. Em troca, ganharemos um sorriso aberto, as brincadeiras e a alegria que contagiam o coração de cada adulto. Ganharemos também a certeza de que estamos cumprindo nosso dever: não deixar nenhuma criança sem exercer o sagrado direito de ser alfabetizada.
Que Deus nos ajude a cumprir essa tarefa que estamos assumindo agora.
Obrigado.