Pronunciamento do presidente Luiz Inácio Lula da Silva após encontro com o primeiro-ministro português, António Costa
Agradecendo ao primeiro-ministro António Costa o carinho com que ele recebeu a nossa delegação brasileira e o carinho com que nós podemos ver os nossos ministros se relacionarem com os ministros de Portugal, com as ministras e as nossas ministras
Isso dá para a gente imaginar a irresponsabilidade de quem governou o Brasil nos últimos 6 anos porque imaginem estatisticamente na nossa primeira Cimeira depois de 6 anos nós assinamos onze acordos -- imagina se nós pudéssemos assinar uma média de 11 acordos a cada ano que tem uma Cimeira. Significa que nós deixamos de assinar com Portugal no mínimo 66 acordos, que já poderiam fazer com a qual a nossa relação fosse mais extraordinária do que ela é.
Política é uma coisa um pouco química. A relação humana é uma relação química. Se as pessoas não se conhecem, não conversam olho no olho, não se abraçam, não tocam na mão, a política perde muito valor.
A política feita pelo Fake News não é política, é monstruosidade porque temos a prevalência da mentira e não da verdade.
E o que nós estamos fazendo aqui em Portugal é dizendo ao povo português, já disse ao presidente Marcelo e agora ao primeiro-ministro, é que nós nos sentimos em casa quando estamos em Portugal.
Portugal para nós não é um país estrangeiro. Portugal pra nós é uma extensão da nossa casa chamada Brasil e eu acho que o Brasil é a extensão da casa chamada Portugal.
É assim que nós precisamos nos relacionar, sem disputa, sem profunda divergência porque as divergências entre nós serão resolvidas em uma mesa de negociação, porque a grande arte da política é a gente aprender a conviver democraticamente na diversidade.
E o que nós fizemos hoje aqui no acordo da saúde, no acordo da educação, no acordo das pessoas portadoras de deficiência física, ou seja, é uma coisa muito nobre na relação Brasil e Portugal.
Eu lembro que quando eu vim receber o título de doutor honoris causa em Coimbra. Quem não sabia precisa ficar sabendo. Eu sou doutor honoris causa em Coimbra. Os companheiros de Portugal se queixavam de que a gente tinha feito muito convênio com universidades para o “Brasil sem Fronteira” e a gente não tinha incluído Portugal, porque uma das coisas do “Ciência sem Fronteira” era que as pessoas também tivessem chance de ir para países que pudesse falar outras línguas e o pessoal entendeu que aqui em Portugal era para falar a mesma língua que era menos interessante.
O que eu acho um equívoco porque não é sua língua o que importa. O que importa são os séculos de cultura que Portugal tem. O que importa é a história deste país, que poderia ser ensinado aos brasileiros nas universidades. O conhecimento científico tecnológico, a arte.
Todas essas coisas poderiam ser ensinadas para nós. Quando a gente traz uma ministra como a nossa querida Margareth Menezes - eu até achei que ela ia cantar - mas cantou só pra você. Ou seja, quando ela cantou eu não estava aqui. Ela cantou para o Xi Jinping na China.
O Xi Jinping falou para mim: eu não entendi nada, mas gostei. Ela canta muito bem.
E quando a gente estabelece essa relação que ela já existia, é natural a gente perceber a quantidade de artistas brasileiros que vivem aqui em Portugal.
É importante a gente saber a quantidade de pessoas que vivem em português. Nenhum brasileiro consegue comprar pão de manhã se não conversar com um português. Nenhum.
Ou seja, essa é uma coisa que Deus nos deu de graça. Ninguém precisou trabalhar muito para essa relação Brasil Portugal acontecer.
Você sabe que toda vez, ministro, quando eu chego na frente daquele monumento em que Cabral saiu daqui -- eu estava dizendo para a minha mulher hoje: eu fiquei emocionado, porque eu fico imaginando que há 1520 anos atrás, alguém pega um barquinho, que não era grande coisa -- não era nenhum grande barco e sair daqui para encontrar um novo mundo.
E encontrar o Brasil e ajudar a fazer do Brasil que o Brasil é hoje. Esse povo extraordinário, que é resultado da miscigenação do povo europeu, começando com os portugueses, com os nossos índios e com os nossos negros que foram trazidos durante 350 anos para o nosso país.
Essa gente nos ensinou a falar, nos ensinou a cantar, nos ensinou a fazer comida, nos ensinou a cultura de cada país.
É uma coisa extraordinária. É por isso que tenho muita gratidão pela África e é por isso que eu visito muita África. Porque eu acho que o Brasil não pode pagar em dinheiro a dívida que ele tem com os africanos.
A gente tem que pagar em solidariedade, em fraternidade, em transferência de conhecimento, em transferência de ciência e tecnologia, na ajuda na (trecho inaudível).
Eu construí em Moçambique uma fábrica de remédios antirretrovirais que eu nem sei se está funcionando mais. Nós fizemos uma escola sabe que já contava com 900 alunos em Moçambique e eu não sei se realmente está funcionando mais porque eu não fui mais a Moçambique.
Nós levamos a Embrapa para Gana, na perspectiva de que a savana africana tinha a mesma capacidade de produção que o cerrado brasileiro e também acabou. Não está mais em Gana.
Tudo isso eu quero voltar a visitar a África para renegociar.
E tudo isso passa por uma conversa com Portugal, porque Portugal é o grande aliado nessa relação.
Eu então quero dizer que eu saio daqui feliz, saio daqui alegre.
Ainda não pude comer um bacalhau porque eu cheguei ontem e não consegui sair do quarto. Cheguei cansado, fui dormir. Espero que hoje tenha um bacalhau. Se não tiver um bacalhau, eu tenho amanhã para comer esse bacalhau. Não posso sair de Portugal sem comer um bacalhau.
Mas eu queria dizer para vocês da minha alegria. O Brasil passou praticamente seis anos, principalmente nos últimos quatro anos o Brasil passou isolado do mundo.
A gente teve um governo que não viajava porque ninguém queria recebê-lo e não recebia ninguém porque ninguém queria visitá-lo.
Então o Brasil ficou isolado. Talvez tenha sido o país mais rejeitado do planeta Terra, que ninguém queria receber.
Então nós voltamos para governar o país. Primeiro para recuperar todas as políticas de inclusão social que nós tínhamos feito, porque nós passamos 13 anos para acabar com a fome no nosso país. Nós passamos 13 anos para fazer as universidades e as escolas técnicas, para fazer programa de saúde. Eles destruíram tudo em quatro anos.
É como se eu fosse uma praga de gafanhoto atacando milharal num país qualquer.
E nós estamos a reconstruir. Você viu que eu falei agora "nós estamos a reconstruir"? É um comportamento português. É um jeito de português falar.
Nós estamos a reconstruir as políticas sociais.
Nos primeiros três meses, nós remontamos tudo que nós temos que fazer. Todas as política públicas e nós agora vamos passar nesse mês de maio a discutir política de desenvolvimento.
Nós vamos estabelecer programa de infraestrutura. Vamos ver o que que tem para fazer de ferrovia, de rodovia, de ponte. O que é que tem que fazer de escola.
Só de obras atrasadas, que nós começamos a fazer - o governo Dilma também continuou fazendo - só de obras paralisadas são 14.000 obras paralisadas. Só na área da Educação são 4.000 obras paralisadas.
Nós agora vamos assumir o compromisso de imediatamente começar a entregar 1.600 creches que deixaram de ser feitas desde que eu deixei a Presidência da República.
Então, é um país que ficou praticamente abandonado e isso está demonstrado na relação com Portugal.
Como é que se explica, como é que se explica, um país não reconhecer a importância de Portugal, não pela grandeza populacional, mas pela importância histórica, pela importância geográfica.
Porque é daqui de Portugal a gente pode ter mais fácil penetração no continente europeu.
Todo mundo sabe disso e nós muitas vezes abusamos de não levar isso a sério.
Então, meu caro primeiro-ministro, companheiros portugueses jornalistas, eu quero dizer para vocês: o Brasil está de volta e o Brasil está de volta para melhorar a nossa relação.
O Brasil está de volta para compartilhar com Portugal as nossas oportunidades de crescimento e queremos compartilhar com Portugal as possibilidade de investimento de Portugal.
Queremos convencer o nossos empresários a não comprar empresas portuguesas ou os portugueses comprarem empresas brasileiras. Não. O que nós queremos é construir as políticas de compartilhamento de sociedade. De que as empresas possam crescer juntos.
Somente isso vai fazer com que a gente tenha a possibilidade de dar ao Brasil um lugar no mundo que ele já deveria ter conquistado.
Não é possível que, em 500 anos, o Brasil não tenha merecido uma chance de crescer.
Eu, quando deixei a Presidência, primeiro-ministro, o Brasil tinha se transformado na sexta economia do mundo.
Quando eu voltei, o Brasil era a décima terceira economia do mundo. Ou seja, significa que nós andamos.
Nós tínhamos em 2012 tirado o Brasil do mapa da fome, reconhecido pela ONU.
Quando nós voltamos, o Brasil tinha 33 milhões de pessoas passando fome.
Ou seja, nós provamos que é possível fazer o nosso país crescer e se ele crescer vai receber mais turistas de Portugal.
Mais gente vai deixar o final de semana e não ir na praia de Nazaré para ir na praia de Pernambuco, na praia do Ceará, na Praia da Baía, na praia de Sergipe, na praia da Paraíba, na praia do Rio Grande do Norte, na praia de Alagoas -- eu não posso esquecer nenhum estado do Nordeste porque eu lá fui muito bem votado então eu tenho que lembrar - e é isso que nós vamos trabalhar.
Eu quero primeiro-ministro que saiba o seguinte: no que depender de mim a gente vai fazer o acordo União Europeia e Mercosul.
Faltam pequenos ajustes e nós temos condições de fazer.
Se depender de mim, a gente vai tentar concluir a discussão mais séria do acordo da União Europeia e Celac. Se depender de mim, a gente vai rearticular a unidade da América do Sul, porque a gente quer provar que juntos nós somos um grande bloco econômico.
Juntos nós temos muito mais chance de negociar em igualdade de condições com a União Europeia.
Então eu saio daqui feliz. Quero agradecer ao governo português, ao nosso primeiro-ministro, ao presidente. A minha visita não terminou porque amanhã vou estar de folga.
Nazaré que me espere. Vou estar de folga.
Na segunda-feira nós vamos para o Porto fazer uma grande reunião com os empresários e eu comuniquei ao ministro que, a pedido do embaixador de Portugal, a APEX, que é a agência de exportação brasileira vai montar um escritório aqui em Lisboa para que a gente possa mostrar a seriedade e o carinho da nossa relação.
Por isso -- obrigado primeiro-ministro e até segunda-feira, quando a gente vai se encontrar, para convencer os nossos empresários a confiar naquilo que a gente está fazendo.