Pronunciamento do presidente Luiz Inácio Lula da Silva após encontro com o presidente de Portugal, Marcelo Rebelo
Meu querido amigo presidente Marcelo Rebelo
Meus queridos companheiros do Brasil que me acompanham nesta viagem. Companheiro ministro Mauro Vieira, do Ministério da Relações Exteriores. Minha companheira esposa Janja; companheiros e companheiras jornalistas brasileiros e jornalistas portugueses. É sempre com grande prazer que me reúno com meus amigos portugueses.
Hoje a ocasião é totalmente especial. Realizo a minha primeira visita de Estado desde meu terceiro mandato e retribuiu a gentileza do presidente Marcelo Rebelo comparecer à cerimônia da minha posse.
Lá no Brasil ele cometeu um lapso. Você foi nadar no lago Paranoá e, na semana seguinte, apareceu um jacaré no lago Paranoá. Então, da próxima vez, por favor não deixe o presidente Marcelo nadar no lago Paranoá.
Esta visita também é especial por marcar o relançamento do nosso diálogo bilateral. Discuti com o presidente Rebelo iniciativas para ampliar nossas relações econômicas e comerciais e para dinamizar as atividades culturais e de cooperação educacional. É uma coisa muito importante. Ou seja, nós estamos com o comércio quase na casa dos 6 bilhões.
Os investimentos e as operações conjuntas de nossas empresas são cada vez mais encorajadoras e eu penso, presidente, que Portugal e Brasil têm um potencial extraordinário para dobrar o nosso fluxo de comércio exterior. É preciso que a gente seja mais ousado. É preciso que a gente seja mais desaforado. E é preciso que tanto os nossos empresários quanto os nossos ministros conversem mais, discutam mais, projetem perspectivas de futuro no financiamento das nossas indústrias e na produção de novos produtos entre os nossos dois países. Eu acho que muitas vezes nós pecamos porque nós conversamos pouco.
Muitas vezes nós pecamos porque pensamos, bom, Portugal é muito amigo do Brasil e não precisamos conversar. E nós precisamos conversar porque é o papel de um presidente da República é abrir a porta, mas quem sabe fazer negócio e quem tem competência para fazer negócios são os empresários. Portanto, nós temos que juntá-los em todas as nossas reuniões para que os nossos negócios possam crescer. A gente tem a perspectiva de emprego, de gerar crescimento econômico e melhorar a vida do nosso povo. E o desafio também tem que ser compartilhado.
É preciso que Brasil e Portugal entendam o seguinte: se é verdade que Portugal descobriu o Brasil em 1500, é verdade que neste século 21 os brasileiros descobriram Portugal.
Em nenhum outro momento da história houve tantos brasileiros em Portugal como estão agora. E prestem atenção: não são portugueses apenas portugueses pobres ou brasileiros pobres que vêm aqui para trabalhar.
Nós temos muita gente rica, muita classe média alta, muitos profissionais liberais que têm casa e trabalham também aqui em Portugal. Porque, com a loucura desse mundo digitalizado, fica fácil morar em Portugal e trabalhar no Brasil ou trabalhar no Brasil e morar em Portugal. Ou seja, não tem muita diferença. E só ontem recebi telefonemas de três empresários brasileiros que moram em Portugal.
Por isso eu acho que nós estamos avançando muito e eu estou com muita expectativa dessa reunião que vamos fazer na cidade do Porto com os empresários portugueses e brasileiros. Nós somos duas democracias que, neste momento, eu diria, nós estamos ameaçados pelo fenômeno dos extremismo, da violência política e do discurso de ódio alimentado por notícias falsas. Elas estiram a desconfiança nas instituições e na política.
É impressionante o que está acontecendo no mundo. Eu tenho 77 anos. Eu nasci no fim da 2a Guerra Mundial e eu não tinha visto ainda a política criar um clima de ódio que foi criada nestes últimos cinco ou seis anos em que a indústria do Fake News, em que esse mundo digital permite que, com algoritmos, se mexa com a cabeça do povo, se mude voto e que destrói quase 150 anos de democracia que foi construída a duras penas aqui na União Europeia e no mundo.
Sobretudo no Brasil, que nós temos democracia há 30 anos agora que nós vivemos o mais longo período democrata do Brasil. São 30 anos e estamos vivendo uma situação do renascimento do extremismo. Um documento efetivamente fascista porque nega tudo que é da democracia. Nega partido político, nega sindicato, nega organização social, nega imprensa livre. Ou seja, é quase que fazer política no submundo destruindo a ideia e os valores das instituições e vocês acompanharam as últimas eleições no Brasil. Vocês viram o que aconteceu. E não é só no Brasil. Foram em muitos outros países. Quando se começa a negar a política, o que vem depois é sempre o pior. É sempre muito pior. Eu não conheço bem a política portuguesa, mas eu sei que aqui tem um linguajar muito próximo do linguajar que foi utilizado no Brasil pela extrema direita, que eu diria que direito ideológica não tem nada. Tinha muito de fascismo mesmo. Sabe, de negação da política, de negação dos valores e eu penso que esse é um risco que nós começamos a ter na eleição do Trump nos Estados Unidos e eu não sei onde vai parar. No Brasil nós estamos trabalhando muito. Estamos, inclusive, com um projeto de lei que vai entrar no Congresso Nacional na próxima semana para a gente criar uma certa regulamentação para evitar a disseminação da mentira através da internet.
E é quase como obrigação nossa lutar contra a desinformação indiscriminada como é feita hoje. Para isso, precisamos de uma governança eficaz que leva em consideração também a responsabilidade de empresas de tecnologia em combater conteúdos ilícitos.
Eu sei que poderemos contar com Portugal para enfrentar essa ameaça comum. Esta sintonia entre os nossos governos se estende aos grandes desafios impostos pela mudança do clima. O Brasil será implacável em seu combate aos crimes ambientais. Vamos cumprir nossos compromisso de zerar o desmatamento até 2030 e seremos rigorosos na repressão ao garimpo ilegal e contra os que atentam contra os povos indígenas.
Vamos compartilhar nossa rica biodiversidade com cientistas e pesquisadores de todo o mundo para estimular a produção de fármacos. Queremos gear oportunidade (Trecho inaudível)
mas é importante lembrar, presidente, que nós estamos falando de governança mundial, de mudanças na governança (trecho inaudível)
tomavam decisões na dezenas de COPs que nós fazemos para discutir. Aliás, estamos reivindicando fazer a COP 30 no Brasil em 2025 no estado do Pará, um estado amazônico para que as pessoas vejam de perto da Amazônia. Mas, se você não tiver uma governança forte para se exigir o cumprimento das decisões, a gente vai nas reuniões, a gente toma decisões e no ano seguinte a gente faz outras reuniões, toma outras decisões e, no ano seguinte faz outras e as decisões nunca entram em vigor, porque quando a gente tenta aprovar no Estado Nacional, muita gente não consegue. A COP de Copenhague em 2009 até hoje as coisas que foram aprovadas. O acordo de Paris até hoje não foi colocado em prática. O Protocolo de Kyoto até hoje não foi colocado em prática.
Então é preciso que a gente crie uma nova governança mundial e é por isso que o Brasil tem brigado muito para que a gente reveja sobretudo o Conselho de Segurança da ONU dos membros permanentes. É preciso entrar mais países, mais continentes e estabelecer uma nova geografia, porque a geografia de 1945 não é a mesma. Os continentes mudaram os países mudaram e a gente não pode continuar com os membros do conselho fazendo guerra. Eles são os membros do conselho e ele decidem a guerra sem consultar sequer o conselho. Foram os Estado Unidos contra Iraque, a Rússia contra a Ucrânia, a França e a Inglaterra contra a Líbia.
Ou seja, eles mesmo desrespeitam as decisões do Conselho de Segurança e por isso nós precisamos tentar mudar e o Brasil está brigando para que a gente tente convencer outros países a fazerem pressão pra gente ter uma ONU mais representativa, acabar com o voto com direito de veto para que a ONU possa fazer valer as decisões que a gente toma na questão ambiental.
Ao mesmo tempo em que o meu governo condena a violação à integridade territorial na Ucrânia, defendemos uma solução política negociada para o conflito. Precisamos criar urgentemente um grupo de países que têm que sentar-se à mesa tanto com a Ucrânia quanto com a Rússia para encontrar a paz. Também tratamos de importa de transformações políticas econômicas e sociais em curso na América Latina e no Caribe. A América do Sul em particular passa por profundas mudanças que vão nos permitir resgatar parte da nossa dívida social.
Por meio da CPLP podemos trazer bons frutos a uma comunidade de quase 300 milhões de habitantes que faz de sua língua comum um poderoso instrumento de mobilização e conscientização. Aliás, eu acho companheiro Rebelo, eu acho companheiro que era importante que a gente começasse a exigir que a ONU reconhece essa língua portuguesa como língua oficial. Não é possível, não sei que jornalista talvez não saibam, mas a língua portuguesa não é tratada como língua oficial. Por isso quando a gente vai na ONU falar não é distribuído material que a gente vai falar em português para ninguém. Ou seja, temos que traduzir que traduzir sempre em outra língua. Eu acho uma falta de respeito dos outros conosco e uma falta de respeito de nós mesmos conosco. Eu acho que tem que brigar pela língua portuguesa ser valorizada é Brasil, Portugal, Angola, Moçambique, São Tomé e Príncipe, Cabo Verde e os nossos que falam outras línguas que são nossos aliados.
Caro companheiro, presidente Rabelo, meu governo tem dedicado especial atenção à promoção do crescimento com equidade a fim de fazer novamente do Brasil um exemplo de pujança econômica, solidez institucional e justiça social. Nessa tarefa, Portugal tem sido um parceiro especial. São poucos os pais de no mundo com as quais temos tanta identidade e valores comuns. São incontáveis os portugueses que em todas as épocas e nas mais diversas situações apostaram no Brasil. Por isso a relação do Brasil com Portugal eu diria vai melhorar muito porque eu vou me dedicar a fazer com que aconteçam mais coisas positivas entre o Brasil e Portugal. Que mais empresas brasileiras venham para Portugal, que mais investimentos brasileiros venham para Portugal e que mais investimento portugueses venham para o Brasil e que mais portugueses também venham para o Brasil para morar para trabalhar e para investir.
Por isso, meu amigo, é muito bom para estar aqui em Portugal na sua presença, agradecendo sua visita à minha posse em primeiro de janeiro.