Pronunciamento do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, na entrega de casas em Viamão (RS)
TRANSMISSÃO | Entrega de casas em Viamão (RS)
Meu caro governador Eduardo Leite; meu caro amigo e ex-governador, companheiro Olívio Dutra; ministro de Estado Jader Filho, das Cidades; Paulo Pimenta, da Secretaria de Comunicações; deputada federal Maria do Rosário; companheiro Bohn Gass; companheira Denise Pessôa; companheiro Dionilso Mateus Marcon; companheiro Alexandre Lindenmeyer e Reginete Bispo; Nilton Magalhães, prefeito da cidade de Viamão (RS); companheiros deputados estaduais Adão Pretto Filho, Miguel Rossetto, Stela Farias, Sofia Cavedon, Zé Nunes, Laura Sito, Matheus Gomes e Bruna Rodrigues.
Não sei se tem mais aqui. E o nosso companheiro Edegar Pretto, presidente da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), e querida Loiva Maria Vidal Medeiros, a nossa tesoureira da Cooperativa (Cooperativa Habitacional dos Metalúrgicos de Porto Alegre). Meus queridos companheiros da famosa Viver Coometal. Um prazer estar aqui com vocês.
Olhe, o que nós estamos assistindo hoje é o que eu chamo de governar. Eu sempre disse que governar nada mais é do que cuidar das pessoas. Quando você é eleito prefeito de uma cidade, quando você é eleito governador de um estado, presidente da República, você é eleito por todos ou pela maioria. Mas você tem que escolher quem é que você quer que receba os benefícios que podem ser oferecidos pela cidade, pelo estado e pela Presidência da República.
Você pode cuidar da urbanização, você pode cuidar da infraestrutura, mas é preciso ter um olhar muito carinhoso para as pessoas. Uma cidade, ela é feita de seres humanos, ela é feita de mulheres e homens que têm desejos, que têm aspirações, têm aspirações no campo da educação, no campo da saúde, no campo do trabalho, no campo do salário. A gente deseja viver melhor.
Eu vivi a minha vida inteira, governador, pagando aluguel. Até 1975, quando eu virei presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, eu pagava aluguel. A primeira casa que eu comprei tinha, simplesmente, 33 metros quadrados. E nessa casa de 33 metros quadrados morava eu, minha mulher, três filhos, a mãe da minha mulher, uma dálmata e um pequinês. Dentro de 33 metros quadrados. É difícil, eu sei que é difícil porque, às vezes, para acomodar a geladeira e o fogão dentro da cozinha é muito complicado. Às vezes, para juntar três ou quatro pessoas para ver um jogo de futebol é muito complicado. Às vezes, para ir dormir você dá tanta canelada no espelho da cama que você precisa engessar a canela para não se machucar tanto.
E quando nós começamos o Minha Casa, Minha Vida, uma das brigas que eu tinha, porque em março de 2009 eu pensei em construir um grande projeto habitacional, chamei a companheira Dilma Rousseff, que era chefe da Casa Civil, e pedi para a Dilma construir um programa habitacional. É muito engraçado, governador, porque o primeiro setor que eu chamei para discutir o Minha Casa, Minha Vida foram os empresários da ABDIB. E eu disse para eles: "eu quero que vocês me apresentem um grande projeto habitacional pra esse país. O que é que vocês têm capacidade de fazer?".
Eles me apresentaram um projeto de 200 mil casas. Eu falei: não dá. Duzentas mil casas é muito pouco para um grande projeto. Chamei o meu ministro da Fazenda Guido Mantega. "Ô Guido, eu preciso de um grande projeto habitacional". O Guido pensou, pensou, discutiu, me apresentou um projeto de 500 mil casas. Eu falei: "é muito pouco, Guido. Isso não é um grande projeto. Nós precisamos de um projeto que vá acima de um milhão, um projeto que possa fazer com que a gente comece a resolver o problema do déficit habitacional brasileiro que, na campanha do PMDB de 74, o Doutor Ulysses Guimarães (ex-deputado federal presidente da Câmara dos Deputados) já levantava um déficit habitacional de 7 milhões de residências. E ainda hoje, se você perguntar para a Inês, ela vai dizer que o déficit é quase 7 milhões.
Porque a grande maioria das casas feitas no Brasil é feita pelo povo sem participação de governo, sem participação de nada. Se o povo tiver um terreninho ele vai lá e faz o seu lugarzinho de morar. É que nem passarinho para fazer ninho, ele vai lá e faz. E quando ele tem a escritura do terreno, ele já faz mais sólido, faz de tijolo. Aí eu decidi fazer um milhão de casas. Nós começamos a organizar o programa em março de de 2009. É muito difícil estruturar um programa, sabe?, começa a pensar no financiamento, discutir com a Caixa Econômica. Eu só fui completar um milhão de pessoas cadastradas no dia 29 de dezembro de 2010.
Um ano e pouco depois a gente conseguiu cadastrar 1 milhão de pessoas. No final do governo Dilma já eram 4 milhões de pessoas. E agora nós resolvemos tomar uma atitude de fazer mais 2 milhões de casas. Mais 2 milhões de casas, e é pouco diante daquilo que vocês necessitam, porque a gente precisa cuidar das pessoas. Cuidar. A gente não pode nunca esquecer, e eu digo sempre, disse na última reunião ministerial pros meus economistas: "é importante que a gente consiga popularizar a compreensão do que é a economia neste país". E eu digo sempre o seguinte: você pega uma cidade como Viamão (RS) e você tem muito dinheiro na mão de pouca gente e muita gente sem dinheiro. Esta cidade representa o quê? Miséria. Representa desemprego, representa violência representa pessoas na rua porque o dinheiro precisa circular na mão de todo mundo pra a cidade poder crescer. Agora, se ao invés de muito dinheiro na mão de poucos você tiver pouco dinheiro na mão de muitos, significa progresso, significa distribuição de riqueza, significa aumento de consumo, significa elevar um pouco o padrão de participação das pessoas.
É esse país que nós precisamos construir. É esse país que vocês sonham. O povo, governador, não quer muita coisa. O povo não quer muita coisa, o povo quer ter o direito de ter um bom emprego. Ele quer ter o direito de ter uma casinha. Ele quer ter direito de construir a sua família e ter uma qualidade de educação pros seus filhos. Ele quer ter o direito de poder um dia comprar um carrinho, de poder levar a família para passear. Ele quer ter o direito de no sábado e no final de semana fazer um churrasquinho, assar uma costela, sabe?
Isso é tudo que está garantido pra nós na Constituição de 1988, é só pegar o capítulo social que você vai ver que tudo está garantido na Constituição. Portanto, a gente não deveria gritar, as pessoas teriam que cumprir aquilo que foi aprovado na Constituição de 88. E eu queria dizer uma coisa, governador, a minha experiência de oito anos na presidência e a minha experiência agora: é que a coisa mais barata é cuidar do povo pobre, é a coisa mais barata.
Eu cansei de viajar o mundo dizendo: a solução dos problemas dos países mais pobres é colocar o povo no orçamento. Colocar o povo no orçamento da cidade. Quando vai fazer o orçamento da cidade ao invés de ouvir apelo dos vereadores, ao invés de ouvir apenas a associação comercial, ao invés de ouvir apenas alguns setores empresariais, vamos ouvir o que o povo pensa, vamos ver o que que o povo quer no orçamento.
Vamos pedir para o povo decidir qual é a obra mais importante da cidade. Ele quer um campo de futebol ou uma escola? Ele quer uma praça ou um hospital? Ele quer, sabe? Vamos decidir, sabe?, de acordo com aquilo. Nós estamos fazendo agora, governador, uma experiência muito rica no Governo Federal. Nós estamos fazendo o PPA, a companheira ministra Simone (Simone Tebet - Ministra do Planejamento e Orçamento) e o companheiro Márcio (Márcio Macêdo - Ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República) estão viajando os 27 estados do Brasil fazendo reuniões com as pessoas para discutir o que que as pessoas querem que o Governo Federal coloque no orçamento. Depois, o orçamento vai pro Congresso Nacional. É o Congresso Nacional que tem a autoridade de fazer o orçamento, mas a sociedade tem o direito de pressionar o Congresso Nacional para fazer uma parte daquilo que o povo pensa. Se a gente fizer isso, o Brasil pode dar certo, porque não adianta a gente falar "o PIB cresceu 4%". Óbvio que é interessante dizer que o PIB cresceu, mas o mais interessante é se você distribuiu o crescimento do PIB. Com quem ficou esse crescimento do PIB? Ficou apenas com uma parte da sociedade ou você conseguiu distribuir para todos?
Quando você chega numa cidade, você pergunta pro prefeito: "prefeito, como é a saúde da sua cidade?". É maravilhosa!. "Como é a educação da sua cidade?" É maravilhosa!. Faça a seguinte pergunta pra ele: "você usa a rede pública, a rede municipal de saúde? Seu filho está na escola municipal?". Normalmente não está. E aí vale, vale pra governador, pra presidente da República. Ou seja, tudo aquilo que a gente fala que é bom a gente tem que provar que a gente está usando, que é a mesma dose do remédio que o povo está usando.
Eu vim aqui, sabe por quê? Eu vim aqui porque eu tenho dito o seguinte: o Serra, quando era governador de São Paulo, falava: “porra, Lula, você vem aqui até para anunciar empréstimo do BNDES”. Eu falava: “eu venho, sabe por quê? Porque quando o Mario Covas era governador o BNDES não liberava dinheiro pra ele”. Então eu venho porque eu quero passar ideia. Se vocês me convidarem aqui para inaugurar uma fábrica de palito de dente, eu venho. E por que é que eu venho? Porque é preciso passar a ideia de que as coisas estão acontecendo. Você não pode ficar dentro do Palácio. Dentro do Palácio não tem notícia boa.
Todo mundo que aparece no Palácio é para pedir alguma coisa ou para cobrar alguma coisa. Mas, quando você sai na rua você vai contar com o povo, o povo pode te cobrar porque muitas vezes nós, políticos, achamos ruim quando o povo vai à gente. Às vezes, a gente acha ruim. Quando o povo aplaude, a gente adora. Quando a gente é candidato, a gente anda com o carro aberto, esticando a mão para todo mundo.
Quando a gente ganha as eleições, quando a gente ganha, a primeira coisa que faz é arrumar um cerimonial, que não decida até onde você senta. E aí você arruma logo um monte de segurança que contrata carro preto. Quando você entra, a porta do carro não abre, você sai correndo, nem pode cumprimentar as pessoas. Ou seja, então, obviamente que o povo tem razão de desconfiar. O povo tem razão porque quando a gente é candidato a gente quer dizer, quer abraçar todo mundo e quer beijar todo mundo.
Quando a gente vira governante a gente desaparece, e não é nem por vontade do governante, é por conta do cerimonial e é por conta dos seguranças. "Ah, você não pode cumprimentar". É muito engraçado, é muito engraçado.
Eu era presidente da República. Contar uma coisa engraçada a vocês. Eu era presidente da República e eu recebia muita gente no Palácio. Quando iam trabalhadores, quando ia gente de comunidade, gente da periferia, sem-teto, catador de papel, de material reciclável; quando essa gente ia lá encontrar comigo — porque todo mundo entrava no Palácio — quando essa gente ia, governador, os seguranças todos ficavam cercando, olhando assim. Quando entravam os empresários ninguém ia lá. Ou seja, o meu adversário era o empresário, não era o catador de papel, que era meu aliado, que era meu companheiro.
Então, eu acho que a gente pode mudar esse país. A primeira coisa que a gente tem que fazer é o seguinte: nós precisamos tentar tirar o ódio de dentro das pessoas, sabe? Eu quero contar uma coisa pra vocês. Eu fico imaginando isso aqui no Rio Grande do Sul, que só tem dois times grandes que disputam o título todo ano, que é o Grêmio e o Internacional.
Se eu perguntar aqui pra esse povo que tá aqui, metade deve ser Grêmio e metade deve ser Internacional. Mas nem por isso, mas nem por isso a gente sai do estádio depois de um Grenal e vai para um bar brigar com o cara do outro time. É melhor a gente sentar e tomar uma cerveja com ele. É melhor a gente reconhecer que o adversário jogou mais do que nós e ganhou. Eu, por exemplo, sou corintiano. Eu tô massacrado porque a gente não ganha mais nada. Mas eu jamais vou brigar com um palmeirense ou vou brigar um cara de outro time. Eu sou Internacional por causa do Olívio Dutra. Ele era do conselho, depois eu descobri que o Ibsen também era do conselho e quase que eu saio do Internacional, mas aí eu preferi ficar. Mas eu tenho grandes amigos no Grêmio. Eu já fui na casa de companheiro assistir jogo do Grêmio e eu achava a torcida do Grêmio excepcional defendendo o seu time.
A política é a mesma coisa. Quando eu venho ao Rio Grande do Sul eu não quero saber de que partido é o governador ou prefeito, eu quero saber se ele é o representante legal da cidade ou do estado, e eu tenho que manter a relação mais civilizada com ele. A primeira coisa que eu fiz depois de ganhar as eleições foi chamar os 27 governadores em Brasília para repartir com eles a responsabilidade de produzir projetos pra gente poder fazer investimento em infraestrutura. E o que vai acontecer esse ano? Esse ano só em infraestrutura nós vamos investir R$ 23 bilhões, só do orçamento, isso é mais, governador, do que o outro governo investiu em quatro anos, em apenas um ano.
Eu chego, eu não sei aqui no Rio Grande do Sul, mas eu viajo muito. Em todo estado que eu chego eu faço uma pergunta. Eu quero que alguém me diga uma obra pública feita pelo governo anterior. Porque é verdade. Não existe no Pará, no Amazonas, no Maranhão, Pernambuco, na Bahia, nada. Não tem uma obra. Por Deus do céu eu não sei o que foi feito durante quatro anos a não ser mentira, destilação de ódio, provocação de mentira, ofensas a todo mundo. Esse país não é assim, o povo brasileiro não é assim, o povo brasileiro é um povo muito fraterno, é um povo muito carinhoso. O povo brasileiro é um povo bondoso, gente. A gente não quer brigar. A gente não quer acordar todo dia azedo, com raiva de alguma coisa. A gente tem que acordar e falar bom dia pro nosso vizinho.
Eu quando era presidente do sindicato, às vezes levantava às 4 e meia da manhã para ir na porta de fábrica falar: "bom dia, companheiro”, “bom trabalho, que Deus te abençoe". É assim que a gente constrói a família da gente, a gente não quer o filho da gente brigando, a gente não quer que o filho da gente seja ofendido na escola. A gente não quer que ele seja discriminado. É por isso que eu fui conversar com o Papa porque eu quero fazer uma campanha contra a desigualdade nesse mundo. Não é possível. Não é possível a desigualdade racial, a desigualdade de classe, a desigualdade de gênero, a desigualdade de educação, a desigualdade na saúde, a desigualdade na rua que a gente mora. A desigualdade da comida. Tem uns que comem dez vezes por dia e tem outro que passa três dias sem comer. Não é justo e não é normal.
Isso não está na Bíblia, isso não está na Declaração Universal dos Direitos Humanos e não está na nossa Constituição. Essa pobreza, na verdade, na verdade, na verdade, eu vou dizer para vocês, é falta de vergonha na gente que governou esse país durante tantos anos.
Nós provamos em 2012 que era possível acabar com a fome nesse país. Acabamos. Quando eu voltei tinha 33 milhões de pessoas passando fome. Nós vamos acabar outra vez. Vamos acabar outra vez.
Governador, quando o Alckmin apresentou o resultado da transição antes da gente tomar posse, nós detectamos 14 mil obras paralisadas, 14 mil obras. Dentre as quais, 4 mil obras de escola, creche e escola técnica. E tudo isso a gente tem que retomar porque nós agora vamos querer escola de tempo integral no Brasil inteiro. Nós, agora, vamos conectar as nossas escolas públicas à internet banda larga pra vocês poderem brincar quanto quiserem, sabe? Ter o mesmo direito que tem o rico de utilizar a internet. A gente vai conseguir fazer isso e eu só tenho três anos de mandato. Mas nesses três anos nós vamos fazer mais do que nós fizemos em oito anos de governo nesse país, porque nós estamos mais sabidos, mais espertos e vamos trabalhar juntos com o governador e junto com o prefeito.
Prefeito, eu não acredito que exista alguém capaz de governar o país sem levar em conta a existência das prefeituras. As pessoas moram na cidade, as pessoas querem educação na cidade, as pessoas querem asfalto na cidade, as pessoas querem lazer na cidade. Então, o Governo Federal tem que trabalhar junto com o prefeito e tem que trabalhar junto com o governador. E é por isso que a gente vai melhorar a vida do povo brasileiro outra vez.
Um abraço. Que Deus abençoe cada um de vocês. E parabéns pela casa.